Quem está presente: o Senhor ou o Espírito?
O Espírito Santo está presente em qualquer lugar onde sua Palavra é pregada, pois é o Espírito quem convence as pessoas do pecado e as leva a crer no Salvador. Isso pode acontecer até nos cultos dos piores pregadores picaretas, desses que vivem pedindo dinheiro. O poder está na Palavra de Deus aplicada pelo Espírito Santo na alma, e não na eloquência do pregador ou em sua persuasão. O pregador pode até ser incrédulo e mesmo assim o Espírito Santo usar a Palavra que ele lê na Bíblia para converter pessoas.
Já a presença do Senhor só pode ser reivindicada por aqueles que estão congregados ao seu nome, ou seja, com o reconhecimento de sua autoridade delegada. Se estivermos congregados “autorizados”, isto é, com a autoridade que o Senhor concede, então ele está no meio. Mas se não existe dependência do Senhor e principalmente julgamento de pecado moral, má doutrina, divisões ou heresias, etc., ele não estará no meio, pois o Senhor não pode ser conivente com o pecado.
Dou um exemplo. Digamos que o presidente de um país envie dois embaixadores para nações estrangeiras. O primeiro estará lá fazendo tudo de forma responsável em nome do presidente do país. É como se o presidente do país estivesse lá, pois o embaixador tem autoridade para tanto e seu posto é reconhecido pelo país de origem. Tudo o que ele decidir ali terá o aval do presidente do país que o enviou e será registrado nos documentos do governo.
Porém, o outro embaixador no outro país não é confiável. Ele começa a roubar, traficar drogas, envolver-se em escândalos, etc. O presidente imediatamente irá tirar a sua autoridade. Ainda que ele permaneça no exterior agindo como se nada tivesse mudado, tudo o que fizer não terá valor no país de origem, pois ele não está credenciado para agir em nome do presidente de seu país. Agora imagine uma terceira situação onde alguém no exterior se diz embaixador de um determinado país sem jamais ter recebido tal delegação. Ele é um usurpador da autoridade, portanto seus Atos também não têm validade no país de origem.
Agora vamos pensar no que vemos na cristandade, lembrando que temos uma Cabeça no céu, o Senhor, e seu corpo aqui na terra, a Igreja. Esta só estará devidamente representada quando dois ou três estiverem congregados ao nome do Senhor ou com a autoridade que ele delega.
Mas quando olhamos o modo de funcionamento de qualquer denominação religiosa, o que vemos?
Ainda que cada crente ali, individualmente, possa reconhecer a Cristo como a Cabeça, na prática encontra uma hierarquia de comando, geralmente formada por um presidente da organização em nível mundial, e aí os cargos vêm descendo como se fosse uma pirâmide, até chegar ao pastor local, um homem que fica na direção da congregação. Embora essa estrutura possa variar, esse modelo que se iniciou com o romanismo não é muito diferente do que vemos numa empresa, mas não é o que encontramos na Palavra de Deus.
Na Palavra de Deus não temos um “presidente” humano, mas Cristo, a própria Cabeça da igreja ocupando o centro de todas as atenções. Abaixo dele estão todos os membros do seu corpo e todos sujeitos à Cabeça que é Cristo. Na prática isso funciona com a presença do Senhor no meio dirigindo tudo por meio do Espírito Santo e delegando sua autoridade à assembleia (os “dois ou três” congregados ao seu nome). A presença do Senhor tem vários aspectos, mas vou me concentrar ao aspecto da autoridade.
(Mt 18:18-20) “Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra será desligado no céu. Também vos digo que, se dois de vós concordarem na terra acerca de qualquer coisa que pedirem, isso lhes será feito por meu Pai, que está nos céus. Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles”.
Por estarem os dois ou três reunidos “ao” ou “em nome” do Senhor, ele delega sua autoridade administrativa para a assembleia agir em seu nome. Os céus reconhecem o que é ligado por aqueles agindo assim revestidos dessa autoridade e por esta razão o pecado pode ser julgado e extirpado do lugar onde se expressa comunhão, que é à mesa do Senhor. Se não existisse autoridade, cada um faria o que bem entendesse e as coisas não funcionariam, pois quem ousaria assumir o papel de “chefe” em algo que pertence a Deus? A alternativa seria a adotada pelas organizações religiosas, que é a de colocar um homem à frente da congregação.
Quando meus filhos eram pequenos, costumávamos exortá-los à obediência do Senhor, dizendo coisas do tipo “o Senhor não gosta que você faça isso”, “o Senhor ficou triste com seu modo de agir”, etc. E quando precisavam de disciplina, avisávamos que seriam disciplinados porque desobedeceram, não ao papai ou à mamãe, mas ao Senhor. Fazíamos assim para que eles mantivessem obediência ao Senhor mesmo se um dia seus pais viessem a falhar e cair em contradição. Eu e minha esposa éramos pessoas falhas que receberam de Deus a autoridade paterna e materna para agirmos em nome dele na educação de nossos filhos, do mesmo modo como um policial recebe do Estado autoridade para agir em sua esfera de ação.
(Ef 6:4) “E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação DO Senhor”.
Assim é a assembleia e assim é que o Senhor está no meio dela agindo por delegação de poder e autoridade. Quando o embaixador de um país participa de uma reunião em algum lugar ele tem autoridade delegada pelo Presidente para falar e agir no lugar do Presidente. Em outras palavras, é como se o Presidente estivesse ali no meio daquela reunião decidindo as coisas. O que o representante do Presidente decidir será endossado pelo próprio Presidente, porque foi ele quem autorizou seu embaixador a agir em seu lugar.
Em outras palavras, o que o embaixador “ligar” ou “desligar” em termos de decisões numa reunião local, o Presidente irá “ligar” e “desligar” na sede do governo, no sentido de reconhecer que aquela pessoa está agindo com sua autoridade delegada. Até mesmo quando essa pessoa “ligar” ou “desligar” de forma errada, o Presidente irá endossar sua decisão, mesmo que venha a corrigir a decisão mais tarde, pois autoridade delegada não significa necessariamente infalibilidade. Você pode ser multado injustamente pelo guarda de trânsito, mas a polícia irá endossar a decisão dele até que seja provada injusta, e então corrigi-la. Obviamente, como já expliquei, em casos de insubordinação ao governo do Presidente, crimes, etc., o embaixador perderá suas credenciais. Deixará de representar o país.
Voltando agora à assembleia e ao Senhor em seu meio, creio que você já entendeu o que é ter o Senhor no meio dos que tomam decisões em nome dele e com a autoridade que ele delegou. Sua presença e autoridade ali faz toda a diferença, e a assembleia não age de moto próprio ou com sua própria autoridade, mas com a autoridade que lhe foi delegada.
Se não fosse assim, que direito teriam aqueles de 1 Coríntios 5 de expulsarem de seu meio um malfeitor? Seria muita pretensão tomarem tal decisão, já que todos poderiam também ter alguma falha, mesmo que não fosse tão grave quanto à do homem imoral. O que lhes dava autoridade para decidir quem devia sair da comunhão e quem devia ficar? O Senhor no meio daqueles que estavam tomando decisões em seu nome. em Mateus 18:18-20 o Senhor garantiu isso à assembleia (não a um homem ou colegiado de homens, mas à assembleia local).
Tire Mateus 18 de vista e será preciso eleger um “pastor” como fazem as denominações a fim de manter a ordem. Porém aí não será a autoridade do Senhor sendo exercida por “dois ou três reunidos” ao seu nome, mas a autoridade do homem que está à frente daquelas pessoas.
Tire a autoridade do Senhor de um grupo de cristãos reunidos e não será possível julgar o mal. É por isso que em muitas denominações cristãs você encontra pessoas sabidamente levando uma vida de pecados, misturadas na comunhão com irmãos sinceros sem que ninguém tome qualquer atitude. Como a autoridade ali é do “pastor”, fica a critério de ele decidir quem fica e quem sai, num estilo muito parecido ao de Diótrefes na assembleia descrita por João em sua terceira epístola:
(3 João 1:9-10) “Tenho escrito à igreja; mas Diótrefes, que procura ter entre eles o primado, não nos recebe. Por isso, se eu for, trarei à memória as obras que ele faz, proferindo contra nós palavras maliciosas; e, não contente com isto, não recebe os irmãos, e impede os que querem recebê-los, e os lança fora da igreja”.
Quando existe um homem exercendo o “primado”, já não é a autoridade do Senhor dada à assembleia que tem a palavra final, mas sim os caprichos desse “primaz” (curiosamente alguns líderes religiosos adotaram esse mesmo termo para si mesmos!!). Naquele tempo ainda havia apóstolos como João, que podiam ir lá e, por assim dizer, colocar a casa em ordem. Hoje a casa está em completa desordem, principalmente porque tiraram o lugar que era devido ao Senhor e o entregaram a homens.
O que fazer num estado de tamanha ruína? Evitar julgar quem é do Senhor ou não, mas simplesmente apartar-se do mal e da iniquidade. Mas não só isso. É preciso apartar-se também dos vasos existentes nessa grande casa, porém isso não para ficar só, e sim para seguir com aqueles que já se purificaram dessas coisas para reconhecerem a Pessoa, a autoridade do Senhor em seu meio.
(2Tm 2:19-22) “Todavia o fundamento de Deus fica firme, tendo este selo: O Senhor conhece os que são seus, e qualquer que profere o nome de Cristo aparte-se da iniquidade. Ora, numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra. De sorte que, se alguém se purificar destas coisas [dos vasos], será vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra. Foge também das paixões da mocidade; e segue a justiça, a fé, o amor, e a paz com os que, com um coração puro [purificado destas coisas], invocam o Senhor”.
(Hb 13:13-15) “Saiamos, pois, a ele fora do arraial, levando o seu vitupério... Portanto, ofereçamos sempre por ele a Deus sacrifício de louvor, isto é, o fruto dos lábios que confessam o seu nome”.