A qual autoridade devemos obedecer na igreja?

O cristão deve viver sujeito às autoridades instituídas por Deus. Se não existissem as autoridades, a sociedade seria uma anarquia, com cada um fazendo aquilo que bem entender. Para que as coisas funcionem precisamos de presidentes, comandantes, governadores, prefeitos, pais, professores, etc.

(1 Pe 2:13-14) “Sujeitai-vos a toda instituição humana por causa do Senhor, quer seja ao rei, como soberano, quer às autoridades, como enviadas por ele, tanto para castigo dos malfeitores como para louvor dos que praticam o bem”.

(Ef 6:1) “Filhos, obedecei a vossos pais no Senhor, pois isto é justo”.

(Ef 6:5) “Quanto a vós outros, servos, obedecei a vosso senhor segundo a carne com temor e tremor, na sinceridade do vosso coração, como a Cristo,”.

E na igreja, quem é autoridade? Existe apenas uma autoridade na igreja, e é a Cabeça do corpo de Cristo, ou seja, o próprio Senhor Jesus. Ele e somente ele é autoridade, mais ninguém. Mas o que dizer da obediência aos “guias” ou “pastores” citados em Hebreus 13?

(Hb 13:17) “Obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam por vossa alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e não gemendo; porque isto não aproveita a vós outros”.

Nesta passagem a palavra “guias” é às vezes traduzida como “pastores” ou “líderes”, mas em nenhuma circunstância ela está se referindo a um homem. É sempre plural: “guias” ou “pastores” ou “líderes”, no sentido daqueles que velam ou cuidam do rebanho de Deus.

Esses são irmãos que no início da igreja eram especialmente designados pelos apóstolos e eram chamados de “bispos”, “anciãos” ou “presbíteros”, também dependendo da tradução e da versão da Bíblia utilizada. Não se tratava de um dom, como era o caso dos “evangelistas, pastores e doutores” de Efésios4:11, pois os dons desta passagem são universais e não locais, como era a função dos “presbíteros” ou “anciãos”.

Hoje, quando já não temos apóstolos para elegerem ou mandarem alguém eleger (como Paulo fez com Tito em Tito 1:5), continuamos tendo irmãos responsáveis atuando na função de zeladores do rebanho, os quais são reconhecidos pelos irmãos, porém não ordenados, já que não existe na Palavra indicação para isso.

Porém esses não atuam com base em seus próprios caprichos, e sim na instrução dada pelo apóstolo Paulo aos anciãos de Éfeso, quando já previa sua partida. É proveitoso ler a passagem inteira, principalmente para nossos dias quando há tantos homens se gabando de ser alguma coisa no rebanho de Deus:

“E de Mileto mandou a Éfeso, a chamar os anciãos da igreja. E, logo que chegaram junto dele, disse-lhes: Vós bem sabeis, desde o primeiro dia em que entrei na Ásia, como em todo esse tempo me portei no meio de vós Servindo ao Senhor com toda a humildade, e com muitas lágrimas e tentações, que pelas ciladas dos judeus me sobrevieram Como nada, que útil seja, deixei de vos anunciar, e ensinar publicamente e pelas casas... Olhai, pois, por vós, e por todo o rebanho sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue. Porque eu sei isto que, depois da minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não pouparão ao rebanho; E que de entre vós mesmos se levantarão homens que falarão coisas perversas, para atraírem os discípulos após si. Portanto, vigiai, lembrando-vos de que durante três anos, não cessei, noite e dia, de admoestar com lágrimas a cada um de vós. Agora, pois, irmãos, encomendo-vos a Deus e à palavra da sua graça; a ele que é poderoso para vos edificar e dar herança entre todos os santificados. De ninguém cobicei a prata, nem o ouro, nem o vestuário. Sim, vós mesmos sabeis que para o que me era necessário a mim, e aos que estão comigo, estas mãos me serviram. Tenho-vos mostrado em tudo que, trabalhando assim, é necessário auxiliar os enfermos, e recordar as palavras do Senhor Jesus, que disse: Mais bem-aventurada coisa é dar do que receber.” (Atos 20:17-38).

Alguns pontos são importantes a serem destacados:

1. Paulo lhes faz lembrar de seu comportamento exemplar;

2. Ele anunciou a eles tudo o que era útil e de acordo com a verdade de Deus;

3. Os bispos ou anciãos haviam sido constituídos pelo Espírito, e não por juntas de homens;

4. Depois de sua morte entrariam lobos (incrédulos) no rebanho para destruir;

5. De dentro do próprio rebanho homens se levantariam falando coisas distorcidas para atrair discípulos;

6. A segurança contra isso só poderia ser encontrada em Deus e em sua Palavra;

7. Paulo não cobiçava prata, ouro ou vestuário, mas trabalhava com as próprias mãos para ganhar seu sustento, pois “mais bem-aventurada coisa é dar do que receber”.

Portanto temos aqui uma indicação para um tempo depois da partida dos apóstolos, quando os guias ou anciãos não poderiam mais ser eleitos pelos apóstolos ou indicação direta deles. Continuaria valendo o fato de o Espírito Santo levantar homens com responsabilidades entre os irmãos, podendo ser reconhecidos por eles, mas não indicados, eleitos ou nomeados, e muito menos levarem um título antes do nome.

Os irmãos deveriam respeitá-los e se submeter a eles (nunca “a ele” no singular) para que existisse ordem na assembleia local, que seria o limite da esfera de ação desses irmãos. Mas mesmo esses irmãos não teriam, de si mesmos, autoridade para agir, porém seriam apenas vigias ou zeladores, por assim dizer, da ordem entre os irmãos. A assembleia, como um todo, esta sim, teria autoridade para tomar decisões, porém tal autoridade não seria dela. De quem seria então?

Quando olhamos o modo de funcionamento de qualquer denominação religiosa, encontramos uma hierarquia de comando, geralmente formada por um presidente da organização em nível mundial, e aí os cargos vêm descendo como se fosse uma pirâmide, até chegar ao pastor local, um homem que fica na direção da congregação. Embora essa estrutura possa variar, ela não é muito diferente do que vemos numa empresa, mas não é o que encontramos na Palavra de Deus.

Primeiro porque na Palavra de Deus não temos um “presidente” humano, mas a própria Cabeça da igreja, que é Cristo. Abaixo dele estão todos os membros do seu corpo e todos sujeitos à Cabeça. Mas como operacionalizar isso? Com a presença do Senhor no meio dirigindo todas as coisas por meio do Espírito Santo, e delegando sua autoridade à assembleia (os “dois ou três” congregados ao seu nome). Essa presença do Senhor tem vários aspectos, mas vou me concentrar no aspecto da autoridade, que é nosso assunto aqui.

(Mt 18:18-20) “Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra será desligado no céu. Também vos digo que, se dois de vós concordarem na terra acerca de qualquer coisa que pedirem, isso lhes será feito por meu Pai, que está nos céus. Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles”.

Por estarem os dois ou três reunidos em nome do Senhor, ele delega sua autoridade governamental ou administrativa para aquela assembleia agir em seu nome. Por isso os céus reconhecem o que é ligado por aqueles agindo assim revestidos dessa autoridade. Por isso o pecado pode ser julgado e extirpado do lugar onde é expressada comunhão, que é à mesa do Senhor. Se não existir autoridade, cada um faz o que quer e não funciona, pois quem ousaria assumir o papel de “chefe” em algo que pertence a Deus?

Quando nossos filhos eram pequenos, costumávamos exortá-los à obediência do Senhor, dizendo coisas do tipo “o Senhor não gosta que você faça isso”, “o Senhor ficou triste com seu modo de agir”, etc. E quando precisavam de disciplina, avisávamos que seriam disciplinados porque desobedeceram, não ao papai ou à mamãe, mas ao Senhor.

Fazíamos assim para que eles mantivessem obediência ao Senhor mesmo que um dia seus pais viessem a falhar e a cair em contradição. Eu e minha esposa éramos pessoas falhas que receberam de Deus a autoridade paterna e materna para agirmos em nome dele na educação de nossos filhos, do mesmo modo como um policial recebe do Estado autoridade para agir em sua esfera de ação.

(Ef 6:4) “E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação DO Senhor”.

Assim é a assembleia e assim é que o Senhor está no meio dela agindo por delegação de poderes e autoridade. Quando um representante do Presidente de um país participa de uma reunião em algum lugar ele tem autoridade delegada pelo Presidente para falar e agir no lugar do Presidente. Em outras palavras, é como se o Presidente estivesse ali no meio daquela reunião decidindo as coisas. O que o representante do Presidente decidir será endossado pelo próprio Presidente, porque foi ele quem autorizou seu representante a agir em seu lugar.

Em outras palavras, o que o representante “ligar” ou “desligar” em termos de decisões numa reunião local, o Presidente irá “ligar” e “desligar” na sede do governo, no sentido de reconhecer que aquela pessoa está agindo com sua autoridade delegada. Até mesmo quando essa pessoa “ligar” ou “desligar” de forma errada, o Presidente irá endossar sua decisão, mesmo que venha a corrigir a decisão mais tarde, pois autoridade delegada não significa necessariamente infalibilidade. Você pode ser multado injustamente pelo guarda de trânsito, mas a polícia irá endossar a decisão dele até que seja provada injusta, e então corrigi-la.

Voltando agora à assembleia e ao Senhor em seu meio, creio que você já entendeu o que é ter o Senhor no meio dos que tomam decisões em nome dele e com a autoridade que ele delegou. Sua presença e autoridade ali faz toda a diferença, e a assembleia não age de moto próprio ou com sua própria autoridade, mas com a autoridade que lhe foi delegada.

Se não fosse assim, que direito teriam aqueles de 1 Coríntios 5 de expulsarem de seu meio um malfeitor? Seria muita pretensão tomarem tal decisão, já que todos poderiam também ter alguma falha, mesmo que não fosse tão grave quanto à do homem imoral. O que lhes dava autoridade para decidir quem devia sair da comunhão e quem devia ficar? O Senhor no meio daqueles que estavam tomando decisões em seu nome. em Mateus 18:18-20 o Senhor garantiu isso à assembleia (não a um homem ou colegiado de homens, mas à assembleia local).

Tire Mateus 18 de vista e será preciso eleger um “pastor” como fazem as denominações a fim de manter a ordem. Porém aí não será a autoridade do Senhor sendo exercida por “dois ou três reunidos” ao seu nome, mas a autoridade do homem que está à frente daquelas pessoas.

Tire a autoridade do Senhor de um grupo de cristãos reunidos e não será possível julgar o mal. É por isso que em muitas denominações cristãs você encontra pessoas sabidamente levando uma vida de pecados, misturadas na comunhão com irmãos sinceros sem que ninguém tome qualquer atitude. Como a autoridade ali é do “pastor”, fica a critério de ele decidir quem fica e quem sai, num estilo muito parecido ao de Diótrefes na assembleia descrita por João em sua terceira epístola:

(3 João 1:9-10) “Tenho escrito à igreja; mas Diótrefes, que procura ter entre eles o primado, não nos recebe. Por isso, se eu for, trarei à memória as obras que ele faz, proferindo contra nós palavras maliciosas; e, não contente com isto, não recebe os irmãos, e impede os que querem recebê-los, e os lança fora da igreja”.

Quando existe um homem exercendo o “primado”, já não é a autoridade do Senhor dada à assembleia que tem a palavra final, mas sim os caprichos desse “primaz” (curiosamente alguns líderes religiosos adotaram esse mesmo termo para si mesmos!!). Naquele tempo ainda havia apóstolos como João, que podiam ir lá e, por assim dizer, colocar a casa em ordem. Hoje a casa está em completa desordem, principalmente porque tiraram o lugar que era devido ao Senhor e o entregaram a homens.

O que fazer num estado de tamanha ruína? Evitar julgar quem é do Senhor ou não, mas simplesmente apartar-se do mal e da iniquidade. Mas não só isso. É preciso apartar-se também dos vasos existentes nessa grande casa, porém isso não para ficar só, e sim para seguir com aqueles que já se purificaram dessas coisas para reconhecerem a Pessoa e autoridade do Senhor em seu meio.

(2Tm 2:19-22) “Todavia o fundamento de Deus fica firme, tendo este selo: O Senhor conhece os que são seus, e qualquer que profere o nome de Cristo aparte-se da iniquidade. Ora, numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra. De sorte que, se alguém se purificar destas coisas [dos vasos], será vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra. Foge também das paixões da mocidade; e segue a justiça, a fé, o amor, e a paz com os que, com um coração puro [purificado destas coisas], invocam o Senhor”.

(Hb 13:13-15) “Saiamos, pois, a ele fora do arraial, levando o seu vitupério... Portanto, ofereçamos sempre por ele a Deus sacrifício de louvor, isto é, o fruto dos lábios que confessam o seu nome”.