Onde estava Daniel no episódio da estátua?
Sua dúvida é por que Daniel não aparece junto com seus amigos Sadraque, Mesaque e Abednego quando estes foram denunciados por não terem se curvado diante da estátua construída por Nabucodonosor. Vamos ver a ordem dos acontecimentos para entender.
No capítulo 1 de Daniel vemos que o rei Nabucodonosor pediu aos seus oficiais que escolhessem dentre os cativos israelitas jovens nobres e cultos para serem introduzidos na corte e educados como nobres caldeus.
(Dn 1:1-7) “E disse o rei a Aspenaz, chefe dos seus eunucos, que trouxesse alguns dos filhos de Israel, e da linhagem real e dos príncipes, jovens em quem não houvesse defeito algum, de boa aparência, e instruídos em toda a sabedoria, e doutos em ciência, e entendidos no conhecimento, e que tivessem habilidade para assistirem no palácio do rei, e que lhes ensinassem as letras e a língua dos caldeus. E entre eles se achavam, dos filhos de Judá, Daniel, Hananias, Misael e Azarias; e o chefe dos eunucos lhes pôs outros nomes, a saber: a Daniel pôs o de Beltessazar, e a Hananias o de Sadraque, e a Misael o de Mesaque, e a Azarias o de Abednego”.
No capítulo 2 Daniel recebe de Deus sabedoria para interpretar o sonho de Nabucodonosor, e por isso é promovido a governador de Babilônia e chefe dos governadores e dos sábios. Por pedido de Daniel, Nabucodonosor também promove seus amigos Sadraque, Mesaque e Abednego a posições administrativas na gestão pública do reino, obviamente abaixo do cargo de destaque que Daniel recebeu.
(Dn 2:47-49) “Respondeu o rei a Daniel, e disse: Certamente o vosso Deus é Deus dos deuses, e o Senhor dos reis e revelador de mistérios, pois pudeste revelar este mistério. Então o rei engrandeceu a Daniel, e lhe deu muitas e grandes dádivas, e o pós por governador de toda a província de Babilônia, como também o fez chefe dos governadores sobre todos os sábios de Babilônia. E pediu Daniel ao rei, e constituiu ele sobre os negócios da província de Babilônia a Sadraque, Mesaque e Abednego; mas Daniel permaneceu na porta do rei”.
No capítulo 3 o rei manda construir uma estátua e convoca a todos os nobres e administradores de Babilônia para se apresentarem diante da estátua e, a um determinado sinal, se prostrarem e adorarem a estátua de ouro. Quem não fizesse isso seria lançado na fornalha de fogo.
No versículo 9 vemos alguns caldeus indo a Nabucodonosor com uma denúncia: Sadraque, Mesaque e Abednego não tinham se prostrado e adorado a estátua, conforme a ordem do rei. Portanto deviam ser mortos na fornalha. O restante da história pode ser encontrado no capítulo 3 e a grande dúvida é onde estaria Daniel naquele momento, já que ele não aparece entre os que foram denunciados como não tendo adorado a imagem.
A Bíblia não diz, portanto qualquer resposta será por suposição. Eu pessoalmente vejo três ou quatro possibilidades. A primeira tem a ver com aquele episódio em que os fariseus levaram ao Senhor Jesus uma mulher pega em flagrante adultério para ser apedrejada, porém não explicaram o que fizeram com o homem. Um flagrante de adultério precisa que dois sejam flagrados. Portanto, já na denúncia que fizeram havia dolo, provavelmente porque o homem adúltero era algum deles ou uma pessoa de destaque na sociedade que não podia ser exposta.
Se todos deviam se prostrar para adorar a estátua, esses que fizeram a denúncia só podiam ser os últimos da fila e, ainda assim, não totalmente prostrados, para poderem observar que três pessoas permaneceram em pé. É só imaginar uma situação em que o presidente ordene para que todos os funcionários públicos de primeiro escalão encham aquele gramado da esplanada dos três poderes em Brasília e se prostrem diante da enorme bandeira do Brasil que existe ali. Quem é capaz de dizer se alguém se prostrou ou não, se todo mundo está com a cara no chão?
Portanto a denúncia feita pelos caldeus devia ter uma boa dose de ciúme e animosidade contra os estrangeiros que haviam adquirido posições de destaque iguais ou maiores que os próprios nativos de Babilônia.
A segunda possibilidade tem a ver com o cargo que Daniel ocupava. Enquanto Sadraque, Mesaque e Abednego estavam no mesmo nível dos outros oficiais, Daniel era o segundo abaixo do rei, portanto acima de todos esses. Podemos pensar que tenha sido o caso de os denunciantes não terem incluído Daniel pelo risco que isso lhes traria. Afinal, seria uma denúncia contra alguém muito acima deles e apadrinhado do rei Nabucodonosor por sua sabedoria. Falar mal de alguém assim não era coisa simples.
Outra possibilidade seria que Daniel não se curvou diante da estátua, mas sua desobediência à ordem só teria sido testemunhada por seus escravos diretos. Digamos assim que Daniel estava em uma posição confortável o suficiente para ter seu próprio camarote ou gabinete e não se misturar com os outros funcionários públicos menos graduados do reino.
Uma quarta possibilidade que também deve ser considerada é a de Daniel ter sim se curvado diante da estátua. Esta parece criar certo desconforto entre alguns que têm Daniel como um herói, mas devemo-nos lembrar de que o único ser humano perfeito que encontramos nas páginas das Escrituras é o Senhor Jesus. Todos os outros eram sujeitos a falhas (algumas gravíssimas, como Davi). Eles eram seres humanos iguais a qualquer um de nós, e basta ler a história de cada um dos que costumamos chamar de “heróis da fé” para perceber isso.
(Tg 5:17) “Elias era homem sujeito às mesmas paixões que nós”.
(2 Cr 6:36) “Quando pecarem contra ti (pois não há homem que não peque) ...”.
(Ec 7:20) “Na verdade que não há homem justo sobre a terra, que faça o bem, e nunca peque”.