Devo dar esmolas?
Sua dúvida é a de muitos: quando alguém pede esmolas, o cristão deve dá-las liberalmente ou não? A resposta mais fácil seria simplesmente citar Mateus 5:42: “Dá a quem te pedir, e não te desvies daquele que quiser que lhe emprestes”. Também o Sl 41:1 “Bem-aventurado é aquele que atende ao pobre”. Há muitas outras passagens que mostram que a forma correta de um cristão agir é ajudando o pobre:
(Pv 21:13) “O que tapa o seu ouvido ao clamor do pobre, ele mesmo também clamará e não será ouvido”.
(Pv 28:27) “O que dá ao pobre não terá necessidade, mas o que esconde os seus olhos terá muitas maldições”.
(1 João 3:17-18) “Quem, pois, tiver bens do mundo, e, vendo o seu irmão necessitado, lhe cerrar as suas entranhas, como estará nele o amor de Deus? Meus filhinhos, não amemos de palavra, nem de língua, mas por obra e em verdade”.
Podemos também aprender o mesmo princípio de ajuda ao necessitado na passagem que se refere particularmente aos gentios que ajudarão os “pequeninos irmãos” do Senhor na Grande Tribulação. Jesus aponta que aquela caridade teria o mesmo efeito de ter sido feita a ele próprio, uma identificação do Senhor com os seus que também pode ser vista no que ele diz a Saulo quando perseguia os cristãos:
(Mt 25:34-40) “Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo; Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; era estrangeiro, e hospedastes-me; Estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me; estive na prisão, e fostes ver-me. Então os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer? ou com sede, e te demos de beber? E quando te vimos estrangeiro, e te hospedamos? ou nu, e te vestimos? E quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos ver-te? E, respondendo o Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes”.
(Atos 22:7-8) “Então, caí por terra, ouvindo uma voz que me dizia: Saulo, Saulo, por que me persegues? Perguntei: quem és tu, Senhor? Ao que me respondeu: Eu sou Jesus, o Nazareno, a quem tu persegues”.
A ordem de ajudar o pobre toma uma dimensão ainda mais séria quando lemos as passagens abaixo:
(Jo 14:15) “Se me amais, guardai os meus mandamentos”.
(1 João 2:4) “Aquele que diz: Eu conheço-o, e não guarda os seus mandamentos, é mentiroso, e nele não está a verdade. Mas qualquer que guarda a sua palavra, o amor de Deus está nele verdadeiramente aperfeiçoado; nisto conhecemos que estamos nele. Aquele que diz que está nele, também deve andar como ele andou”.
Mas sua dúvida também incluía a questão de prioridade: a quem ajudar primeiro? Em Gálatas temos um versículo que nos fala da prioridade para com os familiares e os da “família da fé”, neste caso os irmãos:
(1Tm 5:8) “Mas, se alguém não tem cuidado dos seus, e principalmente dos da sua família, negou a fé, e é pior do que o infiel”.
(Gl 6:10) “Por isso, enquanto tivermos oportunidade, façamos o bem a todos, mas principalmente aos da família da fé”.
Em outra passagem, quando os discípulos acharam um desperdício gastar dinheiro para honrar o Senhor, ele surpreendentemente mostrou que ele tem prioridade:
(Mt 26:8-11) “E os seus discípulos, vendo isto, indignaram-se, dizendo: Por que é este desperdício? Pois este unguento podia vender-se por grande preço, e dar-se o dinheiro aos pobres. Jesus, porém, conhecendo isto, disse-lhes: Por que afligis esta mulher? Pois praticou uma boa ação para comigo. Porquanto sempre tendes convosco os pobres, mas a mim não me haveis de ter sempre”.
Como sabemos que uma atitude de liberalidade poderia nos tornar presa fácil de espoliadores, e também que seria impossível acabar com a pobreza do mundo dando esmolas, precisamos recorrer a outras passagens para definir prioridades na hora de dar ao necessitado aquilo que Deus nos deu.
Não podemos jamais nos esquecer de que somos meros mordomos, a quem o Senhor confia bens que devem ser usados, não apenas para nossas necessidades, mas também para sermos instrumentos nas mãos de Deus. Por isso, creio que a questão deve também levar em conta o que a Palavra diz de como administrarmos o que o Senhor coloca em nossas mãos.
Por exemplo, se alguém vem pedindo para eu ser fiador de algum aluguel ou negócio, se eu me limitar a seguir o que diz Mateus 5 (“Dá a quem te pedir, e não te desvies daquele que quiser que lhe emprestes”), posso ser surpreendido por dissabores que Deus, em sua Palavra, já havia previsto:
(Pv 6:1) “Filho meu, se ficaste por fiador do teu companheiro, se deste a tua mão ao estranho, e te deixaste enredar pelas próprias palavras; e te prendeste nas palavras da tua boca; faze pois isto agora, filho meu, e livra-te, já que caíste nas mãos do teu companheiro: vai, humilha-te, e importuna o teu companheiro. Não dês sono aos teus olhos, nem deixes adormecer as tuas pálpebras. Livra-te, como a gazela da mão do caçador, e como a ave da mão do passarinheiro”.
Portanto, devemos ajudar o pobre e dar a quem pede, mas sem deixarmos de considerar passagens como esta, principalmente porque o Senhor também nos alerta que estamos em um ambiente hostil, repleto de pessoas que irão querer nos enganar.
(Mt 10:16) “Eis que vos envio como ovelhas ao meio de lobos; portanto, sede prudentes como as serpentes e inofensivos como as pombas”.
Esta passagem ganha um significado ainda maior quando vemos hoje a cristandade em ruínas e muitos lobos vestidos em pele de cordeiro enganando os incautos com seus pedidos de dinheiro nos templos, na rádio e na TV. Há ainda um sem número de ONGS prometendo salvar crianças, curar doentes ou levar o evangelho aos povos não alcançados. Poucos sabem que em muitas delas a parcela que efetivamente chega até o necessitado é pequena, comparada aos custos administrativos e, principalmente, despesas para levantar fundos.
Dou um exemplo: um primo fazia parte de uma organização social e decidiu deixá-la quando fizeram um jantar beneficente para comprar uma cadeira de rodas. A arrecadação foi grande, o jantar foi um sucesso, e um paraplégico foi apresentado no palco do evento recebendo a cadeira sob o aplauso dos que ajudaram a comprá-la. Por que meu primo saiu? Porque o custo promocional -- leia-se o custo do jantar -- consumiu quase tudo. O que pagou a cadeira foi um resíduo. Se as mesmas pessoas quisessem contribuir para comprar cadeiras de rodas, sem interesse no jantar e evento social, a quantia teria dado rodas a vários paraplégicos, ao invés de apenas um. Portanto, antes de contribuir para qualquer instituição, procure saber qual a parcela que efetivamente chegará às mãos do necessitado. Em alguns casos é melhor fazer a contribuição diretamente a quem necessita.
Deus também tem uma palavra de alerta para o preguiçoso, que pode ser o caso daquele que se apresenta como pobre e mendigo, mas goza de perfeita saúde e condições para ganhar o seu pão:
(Pv 6:6-11) “Vai ter com a formiga, ó preguiçoso; olha para os seus caminhos, e sê sábio. Pois ela, não tendo chefe, nem guarda, nem dominador, Prepara no verão o seu pão; na sega ajunta o seu mantimento. O preguiçoso, até quando ficarás deitado? Quando te levantarás do teu sono? Um pouco a dormir, um pouco a tosquenejar; um pouco a repousar de braços cruzados; Assim sobrevirá a tua pobreza como o meliante, e a tua necessidade como um homem armado”.
(2Ts 3:10) “Porque, quando ainda estávamos convosco, vos mandamos isto, que, se alguém não quiser trabalhar, não coma também”.
Juntando tudo, o cristão deve sim dar ao pobre, mas também não deve ser ingênuo fechando os olhos para o modo como dá aos pobres, pois o que pede pode não ser pobre, pode estar em condições de trabalhar sem querer fazê-lo, ou pode não estar na condição de prioridade em que se encontram os familiares e os irmãos de quem irá contribuir.
O cristão tem o Espírito Santo para guiá-lo no momento em que alguém pede uma ajuda, portanto é do Espírito que deve buscar por discernimento antes de agir. Dar uma esmola a alguém com sinais de dependência química não irá ajudá-lo. Pessoas fortes e saudáveis dificilmente podem ser consideradas “pobres” em épocas em que a economia está pujante e sobram vagas de trabalho. Doar para uma instituição sem conhecer a idoneidade dos que a mantém e a parcela efetiva que chegará às mãos do necessitado também não é uma atitude correta na hora de dispor dos recursos que o Senhor coloca em nossas mãos.
São muitos os impostores que nos abordam, e eu já fui na conversa de alguns deles. Lembro-me de um que ligou dizendo que ia se suicidar e corri ao encontro dele na rodoviária da cidade para tentar fazê-lo mudar de ideia. Depois de muito choro desesperado, e de ouvir de mim o evangelho, ele disse estar disposto a tentar uma nova vida, mas para isso precisava de dinheiro para voltar à sua cidade em outro estado.
Depois descobri que ele aplicou o mesmo golpe em igrejas e cristãos incautos como eu. Como descobri? Acredita que ele tentou aplicar o mesmo golpe em mim uma segunda vez?! O cara devia ao menos controlar melhor sua agenda de “visitas aos clientes” para não fazer visitas duplicadas. Por este e outros casos nos quais fui inocentemente ludibriado, sou cauteloso na hora de atender a um pedido.
Mesmo assim, é melhor errar por ingenuidade do que por omissão, lembrando sempre de fazer do ato de ajudar, não algo feito a homens, mas ao Senhor. Se o homem quiser nos enganar com suas artimanhas, ele terá de prestar contas disso a Deus. Posso me sentir decepcionado e frustrado ao descobrir que ajudei um enganador ou estelionatário, mas se minha intenção foi fazer aquilo para o Senhor, que importa?
(2 Co 9:6-7) “E digo isto: Que o que semeia pouco, pouco também ceifará; e o que semeia em abundância, em abundância ceifará. Cada um contribua segundo propôs no seu coração; não com tristeza, ou por necessidade; porque Deus ama ao que dá com alegria”.
(Cl 3:23-24) “E tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como ao Senhor, e não aos homens, Sabendo que recebereis do Senhor o galardão da herança, porque a Cristo, o Senhor, servis”.