Um cristão pode participar de greves?
Sua dúvida é se é pecado fazer greve ou participar de um movimento reivindicatório. A Palavra de Deus nos ensina a obedecermos às autoridades e as leis do país, desde que estas não entrem em conflito direto com a Palavra de Deus. Também diz que os servos (empregados) devem obedecer em tudo a seus senhores (patrões).
(Ef 6:5-8) “Vós, servos, obedecei a vossos senhores segundo a carne, com temor e tremor, na sinceridade de vosso coração, como a Cristo ; Não servindo à vista, como para agradar aos homens, mas como servos de Cristo , fazendo de coração a vontade de Deus ; Servindo de boa vontade como ao Senhor, e não como aos homens. Sabendo que cada um receberá do Senhor todo o bem que fizer, seja servo, seja livre”.
A relação senhor-servo nos tempos bíblicos era parecida a uma relação patrão-empregado nos tempos modernos. Muitos confundem a palavra “servo” ou “escravo” na Bíblia com a escravidão que existiu no Brasil colonial, mas são coisas completamente distintas. Um escravo ou servo dos tempos bíblicos podia comprar sua própria liberdade, e também podia ocupar cargos importantes. O tratamento que o Centurião de Lucas 7 dá ao seu servo mostra que era uma classe importante na sociedade da época. Portanto podemos muito bem aplicar a passagem de Efésios6 para os trabalhadores de hoje, e elas falam de servir como servindo a Cristo, e não a homens.
(1 Co 7:20-24) “Cada um fique na vocação em que foi chamado. Foste chamado sendo servo? Não te dê cuidado; e, se ainda podes ser livre, aproveita a ocasião. Porque o que é chamado pelo Senhor, sendo servo, é liberto do Senhor; e da mesma maneira também o que é chamado sendo livre, servo é de Cristo. Fostes comprados por bom preço; não vos façais servos dos homens. Irmãos, cada um fique diante de Deus no estado em que foi chamado”.
Quando um cristão entra em uma relação de trabalho ele deve ter em mente que as condições que aceitar na contratação devem ser as que deve manter. É claro que existem dissídios, aumentos de salários e promoções ao longo da carreira, mas é importante que ele não tente se valer de seus direitos para prejudicar a empresa, mesmo que possa fazê-lo dentro da lei.
Dou um exemplo: uma vez trabalhei em uma empresa e na contratação avisaram que eu não receberia horas extras por causa da natureza do cargo (que exigia viagens constantes e eventuais fins de semana fora de casa). Mas que para compensar isso eu não teria horários rígidos de entrada e saída e ainda poderia compensar as horas trabalhadas a mais tirando um tempo livre sempre que precisasse. Alguns colegas, que igualmente concordaram com essas condições verbais, guardaram passagens e recibos de hotéis e processaram a empresa depois que saíram e ganharam uma indenização. Agiram dentro da legalidade? Sim. Foram honestos? Não.
Mas, voltando ao assunto da greve, se um trabalhador não está satisfeito com seu emprego ele tem a liberdade de procurar outro. Não é obrigado a ficar. Se não existe a certeza de encontrar outro trabalho e o trabalho atual estiver pagando abaixo de suas necessidades, deve orar para o Senhor prover uma coisa ou outra: um novo emprego ou um melhor salário. Ele deve sempre trabalhar como quem serve a Deus, portanto acima de seu patrão ou chefe está o Senhor. Eu pergunto: como ele faria se fosse um profissional autônomo? Rebelar-se-ia ou faria greve contra quem?
A admoestação da Palavra aos patrões é que igualmente tratem seus empregados como tratariam o Senhor. É o que significa o “fazei o mesmo para com eles” de Efésios6:9: “E vós, senhores, fazei o mesmo para com eles, deixando as ameaças, sabendo também que o Senhor deles e vosso está no céu, e que para com ele não há acepção de pessoas”. Certamente existem muitas injustiças praticadas por patrões e empresas, e isso já estava previsto na Palavra.
(Tg 5:1-6) “Eia, pois, agora vós, ricos, chorai e pranteai, por vossas misérias, que sobre vós hão de vir. As vossas riquezas estão apodrecidas, e as vossas vestes estão comidas de traça. O vosso ouro e a vossa prata se enferrujaram; e a sua ferrugem dará testemunho contra vós, e comerá como fogo a vossa carne. Entesourastes para os últimos dias. Eis que o jornal dos trabalhadores que ceifaram as vossas terras, e que por vós foi diminuído, clama; e os clamores dos que ceifaram entraram nos ouvidos do Senhor dos exércitos. Deliciosamente vivestes sobre a terra, e vos deleitastes; cevastes os vossos corações, como num dia de matança. Condenastes e matastes o justo; ele não vos resistiu”.
Na continuação da passagem que fala das injustiças que são cometidas pelos ricos e patrões, na qual é mostrada a punição que estes receberão, também é mostrado como os cristãos devem reagir a isso: com paciência, aguardando no Senhor, olhando para o que está além das dificuldades terrenas, ou seja, para a vinda do Senhor, e principalmente confiando que ele é misericordioso e piedoso.
(Tg 5:7-11) “Sede pois, irmãos, pacientes até à vinda do Senhor. Eis que o lavrador espera o precioso fruto da terra, aguardando-o com paciência, até que receba a chuva temporã e seródia. Sede vós também pacientes , fortalecei os vossos corações; porque já a vinda do Senhor está próxima. Irmãos, não vos queixeis uns contra os outros , para que não sejais condenados. Eis que o juiz está à porta. Meus irmãos, tomai por exemplo de aflição e paciência os profetas que falaram em nome do Senhor. Eis que temos por bem-aventurados os que sofreram. Ouvistes qual foi a paciência de Jó , e vistes o fim que o Senhor lhe deu; porque o Senhor é muito misericordioso e piedoso“.
A resposta que João Batista dá aos soldados que vão até ele pode também servir para o cristão em sua relação de trabalho: (Lc 3:14) “E uns soldados o interrogaram também, dizendo: E nós que faremos? E ele lhes disse: A ninguém trateis mal nem defraudeis, e contentai-vos com o vosso soldo“.
Muitas vezes o desejo de melhores salários é apenas para aumentar o padrão de vida e não necessariamente de suprimento das necessidades. O “homem de Deus” deve estar atento a isso pois a Palavra nos exorta de maneira clara sobre a meta que alguns colocam em seu coração de enriquecer.
(1Tm 6:6-11) “Mas é grande ganho a piedade com contentamento. Porque nada trouxemos para este mundo, e manifesto é que nada podemos levar dele. Tendo, porém, sustento, e com que nos cobrirmos, estejamos com isso contentes. Mas os que querem ser ricos caem em tentação, e em laço, e em muitas concupiscências loucas e nocivas , que submergem os homens na perdição e ruína. Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores. Mas tu, ó homem de Deus, foge destas coisas, e segue a justiça, a piedade, a fé, o amor, a paciência , a mansidão”.
Eu sei que às vezes não é tão simples o cristão desejar trabalhar quando a empresa inteira está em greve. Se o seu desejo de trabalhar causar contenda e constrangimento, então é melhor que ele fique em casa. Já passei por situações de greve numa empresa onde trabalhei e quando não encontrava oposição física a entrar, eu entrava sem dar confiança ao que as pessoas poderiam pensar. Mas quando havia piquete na entrada, agindo de forma violenta contra os que se dispunham a trabalhar, eu simplesmente dava meia volta e voltava para casa. Não ficava ali engrossando a manifestação, mesmo que fosse contrário a ela.
Resumindo tudo: ore, ore e ore. E não participe de nada que seja contrário à Palavra de Deus (e a Palavra é clara quanto à sujeição do empregado ao seu patrão como quem trabalha para o Senhor). Uma boa maneira de trabalhar e enfrentar situações assim é mudar o modo de pensar e passar a enxergar seu trabalho como faria um profissional autônomo, enxergando a empresa que o contratou como seu cliente.