Para ser salvo preciso dar tudo aos pobres?
Depois de entender que o Reino de Deus e a vida eterna são coisas distintas, você ficou em dúvida na passagem de Marcos 10:17, onde o jovem rico pergunta sobre vida eterna e Jesus, depois de responder ao jovem que prefere não segui-lo, comenta como é difícil um rico entrar no Reino de Deus.
(Mc 10:17) “E, pondo-se Jesus a caminho, correu um homem ao seu encontro e, ajoelhando-se, perguntou-lhe: Bom Mestre, que farei para herdar a vida eterna ? Respondeu-lhe Jesus: Por que me chamas bom? Ninguém é bom senão um, que é Deus. Sabes os mandamentos: Não matarás, não adulterarás, não furtarás, não dirás falso testemunho, não defraudarás ninguém, honra a teu pai e tua mãe. Então, ele respondeu: Mestre, tudo isso tenho observado desde a minha juventude. E Jesus, fitando-o, o amou e disse: Só uma coisa te falta: Vai, vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu; então, vem e segue-me. Ele, porém, contrariado com esta palavra, retirou-se triste, porque era dono de muitas propriedades. Então, Jesus, olhando ao redor, disse aos seus discípulos: Quão dificilmente entrarão no reino de Deus os que têm riquezas!“.
Quando o jovem pergunta a Jesus o que precisa fazer para receber a vida eterna, é importante entender que ele não está falando da mesma vida eterna que hoje o crente em Cristo possui. As esperanças de um judeu estavam conectadas à vida neste mundo e era o que a Lei prometia. Se um judeu guardasse a lei ele teria saúde, prosperidade e vida longa, além de contar com o favor de Deus no fim de seus dias aqui.
Portanto, a noção de “vida eterna” para um judeu era diferente da que é ensinada para o cristão. As promessas de vida no Antigo Testamento tinham o significado de uma vida que não termina, mas não é o mesmo que temos em Cristo: a própria vida que vem de Deus, que não tem começo e nem fim. A perspectiva de vida eterna para um judeu era viver para sempre no reino terrenal de Cristo, comendo e bebendo com fartura, para o que ele deveria guardar a lei.
(Lv 18:5) “Portanto, os meus estatutos e os meus juízos guardareis; os quais, observando-os o homem, viverá por eles“.
(Sl 22:25-31) “O meu louvor será de ti na grande congregação; pagarei os meus votos perante os que o temem. Os mansos comerão e se fartarão ; louvarão ao Senhor os que o buscam; o vosso coração viverá eternamente. Todos os limites da terra se lembrarão, e se converterão ao Senhor; e todas as famílias das nações adorarão perante a tua face. Porque o reino é do Senhor, e ele domina entre as nações.... Uma semente [descendência] o servirá; será declarada ao Senhor a cada geração. Chegarão e anunciarão a sua justiça ao povo que nascer, porquanto ele o fez”.
Quando vamos à doutrina que é dada à igreja, vemos uma noção totalmente diferente de vida, que não tem nada a ver com a vida na terra. A vida eterna está em Cristo, não em algo que façamos em obediência a Deus , e não tem nada a ver com vida perene aqui como era prometido aos israelitas. Para o cristão a vida eterna é agora uma possessão, porém no sentido de uma esperança ou certeza, mas é na ressurreição que efetivamente deverá desfrutar dessa vida.
(Jo 17:1-3) “Tendo Jesus falado estas coisas, levantou os olhos ao céu e disse: Pai, é chegada a hora; glorifica a teu Filho, para que o Filho te glorifique a ti, assim como lhe conferiste autoridade sobre toda a carne, a fim de que ele conceda a vida eterna a todos os que lhe deste. E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste“.
(1 João 5:11-13-20) “E o testemunho é este: que Deus nos deu a vida eterna; e esta vida está no seu Filho. Aquele que tem o Filho tem a vida; aquele que não tem o Filho de Deus não tem a vida. Estas coisas vos escrevi, a fim de saberdes que tendes a vida eterna, a vós outros que credes em o nome do Filho de Deus. Também sabemos que o Filho de Deus é vindo e nos tem dado entendimento para reconhecermos o verdadeiro; e estamos no verdadeiro, em seu Filho, Jesus Cristo. Este é o verdadeiro Deus e a vida eterna“.
Ainda que a promessa dada aos judeus fosse de que aqueles que guardassem a Lei viveriam, é importante entender que ninguém era capaz de guardar a Lei, porque ela tinha sido dada para que o pecado tomasse vulto aos olhos dos homens e de Deus. A Lei é a placa de contramão; ela não coloca você na direção certa, apenas aponta que você está na direção errada e será multado por isso. O que Jesus faz aqui é testar o coração desse homem, que achava estar cumprindo a Lei. Da lista de mandamentos que o Senhor menciona o jovem diz ter cumprido todos.
(Mc 10:19-20) “Tu sabes os mandamentos: Não adulterarás; não matarás; não furtarás; não dirás falso testemunho; não defraudarás alguém; honra a teu pai e a tua mãe. Ele, porém, respondendo, lhe disse: Mestre, tudo isso guardei desde a minha mocidade“.
Destes mandamentos, cinco são negativos ( “Não farás isso e aquilo...” ) e um é positivo ( “Honra a teu pai e a tua mãe”). Então o Senhor coloca outro mandamento positivo, um que exigia ação do jovem e que, segundo aprendemos de outras passagens, resumia todos os mandamentos da Lei:
“E um deles, doutor da lei, interrogou-o para o experimentar, dizendo: Mestre, qual é o grande mandamento na lei? E Jesus disse-lhe: Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu pensamento. Este é o primeiro e grande mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a lei e os profetas“. ( Mateus 22:35-40).
Como saber se aquele jovem rico amava realmente o próximo como a si mesmo? Provando-o para ver se ele seria capaz de abrir mão exatamente daquilo que era mais importante para ele (e Jesus sabia o que era, pois conhece bem nosso coração).
(Mc 10:21-23) “E Jesus, olhando para ele, o amou e lhe disse: Falta-te uma coisa: vai, vende tudo quanto tens, e dá-o aos pobres , e terás um tesouro no céu; e vem, toma a cruz, e segue-me. Mas ele, pesaroso desta palavra, retirou-se triste; porque possuía muitas propriedades. Então Jesus, olhando em redor, disse aos seus discípulos: Quão dificilmente entrarão no reino de Deus os que têm riquezas!”.
Jesus não estava com isso mostrando que a salvação só se obtém abrindo mão de todas as posses terrenas, mas sim que é impossível que alguém cumpra todos os mandamentos e preceitos da Lei de Deus. Apenas quando alguém reconhece isso é que irá crer em Jesus, ciente de que em si mesmo não encontra justiça necessária para ser justificado por Deus. A salvação é pela fé, e não pelo que fazemos ou deixamos de fazer. Mas se alguém ama mais a sua vida ou os seus bens do que a Deus, certamente o Senhor irá trabalhar nesse coração, pois qualquer coisa que coloquemos acima de Deus é idolatria.