O que você acha da mensagem de David Platt?

David Platt ganhou publicidade graças ao seu livro “Radical” lançado nos EUA, que tenta despertar os cristãos para agirem como instrumentos contra a fome, a pobreza e as injustiças sociais. Até aí tudo bem, embora ele carregue nas cores da antiga “Teologia da Libertação” em voga no catolicismo latino-americano nas décadas de 70 e 80.

Por ser protestante fundamentalista e seguidor da Teologia da Substituição, que acredita que a Igreja substituiu Israel e é agora a destinatária das promessas do Antigo Testamento, ele não entende a diferença entre o reino e a salvação. O reino contém uma mistura de salvos e perdidos. Quando Jesus fala que ninguém entrará no reino está se referindo às condições para participar de seu reino terrenal, em especial ao dia em que este for estabelecido na terra.

(Mt 19:23) “Disse então Jesus aos seus discípulos: Em verdade vos digo que é difícil entrar um rico no reino dos céus”.

(Mt 19:24) “E, outra vez vos digo que é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus”.

(Mc 10:24) “E os discípulos se admiraram destas suas palavras; mas Jesus, tornando a falar, disse-lhes: Filhos, quão difícil é, para os que confiam nas riquezas, entrar no reino de Deus!”.

(Jo 3:5) “Jesus respondeu: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus”.

Porém o reino na sua atual forma, em que o Rei foi rejeitado e voltou para o céu, tem joio e trigo misturados; é grande árvore com aves (agentes do maligno) em seus ramos; é massa com fermento; é rede com peixes bons e ruins, etc. Existe também uma diferença entre reino de Deus e reino dos céus (que aparece em Mateus).

É evidente que o que ele diz sobre a semente que produz fruto quando cai em bom solo é uma responsabilidade de todo cristão. “Porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas” (Ef 2:10). O problema é que David Platt quer forçar um caminho inverso fazendo as pessoas darem fruto para provarem que são nascidas de novo.

Não há como fazer um morto andar se antes ele não tiver vida. O fruto é uma consequência natural da árvore que está viva. Se um cristão não mostra qualquer fruto aos olhos dos homens isto não significa que ele não tenha fruto para Deus. “O Senhor conhece os que são seus” (2Tm 2). A nós resta apenas ver o exterior, que nos ajuda a perceber se um vaso é para honra ou desonra, mas não ao ponto de determinarmos de maneira cabal a genuinidade de sua salvação, pois isto compete a Deus.

Alguém que um dia professou crer e depois passa a confessar o contrário pode nunca ter sido salvo, mas apenas adotou alguns costumes cristãos. Mas pode ser também que seja um verdadeiro filho de Deus passando por um momento de negação e rebeldia. Lá no fundo ele sabe muito bem que Deus existe e que essa sua teimosia em andar errado é pecado. Deus irá tratar com ele em disciplina ou até tirá-lo do mundo se ele não servir mais como um testemunho.

David Platt prega um evangelho misturado com obras ao insistir em sua mensagem de reformas sociais. Querer que as pessoas ajudem os pobres como forma de ter a certeza de sua salvação não é o evangelho. Ainda que ele tenha a boa intenção de estar insistindo para que os verdadeiros salvos tenham obras como consequência da salvação, um incrédulo irá pegar a mensagem pelo avesso e procurar cada dia fazer mais caridade por achar que é o caminho da salvação, ou pelo menos de torná-la evidente. Se boas obras fossem evidência da salvação, os adeptos do espiritismo estariam “mais salvos” do que alguém que crê em Cristo e não tem o que mostrar.

A questão é que um limoeiro vai continuar dando limões se não for transformado em laranjeira. David Platt está pregando para odres velhos se encherem de vinho novo e isso não é por aí. As obras que Deus busca são aquelas avaliadas segundo os critérios divinos, não humanos. Quando os discípulos perguntaram das “obras” no plural Jesus respondeu da “obra” no singular, pois é desta que provêm todas as outras. Qualquer boa obra que não seja fruto do Espírito de Deus atuando na pessoa não passa de feno e palha e será queimada no Tribunal de Cristo, no dia em que as obras (e não a pessoa) dos salvos serão julgadas.

(Jo 6:28-29) “Disseram-lhe, pois: Que faremos para executarmos as obras de Deus? Jesus respondeu, e disse-lhes: A obra de Deus é esta: Que creiais naquele que ele enviou“.

Você diz que se pensarmos assim então precisaríamos admitir que o apóstolo João não acreditasse na salvação pela graça, pois escreveu:

“Aquele que não ama não conhece a Deus; porque Deus é amor... Nisto conhecemos que amamos os filhos de Deus, quando amamos a Deus e guardamos os seus mandamentos... Aquele que diz: Eu conheço-o, e não guarda os seus mandamentos, é mentiroso, e nele não está a verdade... Nós o amamos a ele porque ele nos amou primeiro... Se alguém diz: Eu amo a Deus, e odeia a seu irmão, é mentiroso. Pois quem não ama a seu irmão, ao qual viu, como pode amar a Deus, a quem não viu?... Nisto são manifestos os filhos de Deus, e os filhos do diabo. Qualquer que não pratica a justiça, e não ama a seu irmão, não é de Deus... Porque esta é a mensagem que ouvistes desde o princípio: que nos amemos uns aos outros”. (1 João 4:8; 5:2; 2:4; 4:9-20; 3:10-11).

É impossível entender o que dizem as epístolas de João sem entender o novo nascimento e a nova vida em Cristo. João está falando da nova natureza e em como ela deve ser patente em nossa vida, isto é, exteriorizada em nosso andar diário, e não de uma melhoria ou aperfeiçoamento da velha natureza. A nova natureza não está apenas capacitada a viver assim, mas ela também não peca!

(1 João 5:18) “Sabemos que todo aquele QUE É NASCIDO DE DEUS não peca ; mas o que de Deus é gerado conserva-se a si mesmo, e o maligno não lhe toca”.

A tese de David Platt chega a ser ingênua, quando não hipócrita, se levarmos em conta o fato de ele ser pastor de uma mega-igreja nos Estados Unidos. A ideia de dar tudo para os pobres é muito bonita em tese, mas na prática devemos agir com sabedoria. Distribua todos os seus bens com os pobres e em um mês estarão todos pobres de novo. Ele é jovem, inexperiente e recebeu de mão beijada o cargo que ocupa e até mesmo critica. Sim, ele fala mal da opulência da própria organização onde é empregado, mas obviamente não sai dela.

O argumento de que em Atos os cristãos vendiam tudo o que tinham e dividiam entre todos não procede e mostra um desconhecimento total do fato de o livro de Atos não ser um livro de doutrina, mas uma narrativa de uma época de transição entre o judaísmo e o cristianismo. Em Atos dos Apóstolos vemos exatamente isto, os Atos e às vezes Atos errados também.

Analisando especificamente o ato de vender tudo e distribuir, primeiro vemos que era entre os irmãos que eles faziam isso, e não com o mundo pagão em geral. Segundo, aquilo era uma ação espontânea e não uma ordenança ou obrigação, e acontecia em um momento em que a igreja vivia seu primeiro amor e desfrutava do poder de Deus agindo sem os impedimentos que hoje temos. Quais? O fato dos cristãos estarem divididos em milhares de seitas e o mal ter se infiltrado em seu meio. Hoje qualquer um se diz “irmão”, até o pregador da TV que só sabe pedir dinheiro. Você daria tudo a ele?

Um olhar cuidadoso verá que, mesmo no livro de Atos as condições iam mudando e se adaptando conforme o mal começava a se introduzir na igreja. Eles começam vivendo em comunidade, tendo tudo em comum e vendendo e distribuindo entre si seus bens:

(Atos 2:44-45) “E todos os que criam estavam juntos, e tinham tudo em comum. E vendiam suas propriedades e bens, e repartiam com todos, segundo cada um havia de mister”.

Então vemos em Atos 4 que já não dividiam mais entre si, mas passaram a trazer aos apóstolos, para estes fazerem a distribuição. Lembrando mais uma vez que tudo acontecia dentro do círculo dos irmãos, e não era uma campanha para dividir tudo com todos os pobres dentre os pagãos. Entregue seus bens aos pobres necessitados do Taleban no Afeganistão e eles venderão tudo para comprar armas.

(Atos 4:32-35) “E era um o coração e a alma da multidão dos que criam, e ninguém dizia que coisa alguma do que possuía era sua própria, mas todas as coisas lhes eram comuns... Não havia, pois, entre eles necessitado algum; porque todos os que possuíam herdades ou casas, vendendo-as, traziam o preço do que fora vendido, e o depositavam aos pés dos apóstolos. E repartia-se a cada um, segundo a necessidade que cada um tinha”.

Já no capítulo seguinte vemos o mal agindo e Ananias e Safira fazendo o que obviamente acontece em todo o coração humano: querer parecer mais do que é ou que faz mais do que realmente fez. Acaso não foi assim que terminaram as boas intenções de algumas organizações beneficentes mais antigas? Há muitas que hoje promovem jantares para homenagear os que contribuem, e às vezes esses eventos custam mais caro do que aquilo que vai efetivamente chegar nas mãos dos necessitados. Muitas ONGs gastam mais dinheiro com funções administrativas e de propaganda do que com os necessitados.

Mas vamos ver o que ocorre após do conhecido episódio de Ananias e Safira, que foi resolvido de forma radical com a morte dos que mentiram ao Espírito Santo. Em um período de grande poder no início da igreja, com os apóstolos fazendo sinais e milagres, havia também uma grande responsabilidade e uma grande perda quando esta falhasse. Não é à toa que os de fora já estavam relutantes em querer fazer parte daquela comunidade onde as consequências da mentira e dissimulação eram tratadas de maneira tão severa: com a morte dos mentirosos. Já pensou se a igreja hoje vivesse nesse mesmo poder?

(Atos 5:11-13) “E houve um grande temor em toda a igreja, e em todos os que ouviram estas coisas. E muitos sinais e prodígios eram feitos entre o povo pelas mãos dos apóstolos.... Dos outros, porém, ninguém ousava ajuntar-se a eles; mas o povo tinha-os em grande estima”.

A passagem seguinte deixa muito claro que tudo aquilo era um processo: primeiro eles dividam tudo entre si mesmos, depois passaram a entregar aos apóstolos para que estes determinassem como dividir, e agora vemos que homens são designados especialmente para a tarefa, deixando assim os apóstolos livres para se dedicarem à Palavra. Isto porque eles já não estavam na mesma disposição do princípio e já agiam de forma egoísta.

O belo da passagem é que todos os que faziam parte da igreja eram judeus ou prosélitos convertidos a Cristo, mas alguns eram judeus helenistas, isto é, vindos de uma cultura grega. Estes estavam sendo prejudicados na distribuição dos recursos e se você reparar nos sete homens que foram escolhidos para cuidarem da tarefa, todos eles têm nomes gregos: Estevão, Filipe, Prócoro, Nicanor, Timão, Parmenas e Nicolau. Mesmo em situações de falha do homem, Deus age em graça.

(Atos 6:1) “Ora, naqueles dias, crescendo o número dos discípulos, houve uma murmuração dos gregos contra os hebreus, porque as suas viúvas eram desprezadas no ministério cotidiano. E os doze, convocando a multidão dos discípulos, disseram: Não é razoável que nós deixemos a palavra de Deus e sirvamos às mesas. Escolhei, pois, irmãos, dentre vós, sete homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria, aos quais constituamos sobre este importante negócio. Mas nós perseveraremos na oração e no ministério da palavra”.

Acho que nem preciso dizer que isso deixa claro que ocorria um processo. Hoje, quando não temos mais apóstolos e nem as condições de poder e unidade que havia no princípio, não podemos ser ingênuos achando ser possível repetir o modo de vida da igreja primitiva.

Fazer o bem e administrar para os mais necessitados é algo que a gente faz individualmente em nosso exercício com o Senhor, e não algo que devemos impor sobre as pessoas. Você alega que David Platt prega uma mensagem radical como a que Jesus pregava, mas é preciso lembrar que nos evangelhos é o Reino que está sendo tratado, e quando o Reino for instalado na terra será radical ao ponto de ser penalizado com a morte aqueles que pecarem. Jesus então será o Rei e julgará com cetro de justiça.

Nós hoje somos membros do corpo de Cristo, somos igreja, a noiva do Cordeiro, que irá reinar com Cristo sobre Israel (este sim, estará no milênio na terra, a igreja não). Você alega também que o modo de vida de Paulo era radical, quando escrevia suas cartas da prisão, e não sentado confortavelmente na sala de uma mansão. Mas a questão é: será que as cartas que Paulo escrevia tinham o mesmo teor da pregação de David Platt? Seria fazer caridade, vender tudo e dar aos pobres, a mensagem principal de Paulo?

David Platt prega um evangelho conhecido como “Salvação por Senhorio”, insistindo na caridade. No fundo é muito parecido com a “Teologia da Libertação” que a Igreja Católica patrocinava nos anos 70 e 80. Seu livro “Radical” é basicamente um resumo do que Tim Keller apresenta em seu livro “Ministries of Mercy”, que inclusive tem um capítulo chamado “Radical Ministries” e é todo voltado ao estabelecimento do Reino de Cristo no mundo mediante o esforço dos cristãos, individualmente, e da Igreja como uma instituição beneficente.

Quem já ouviu falar de “Teologia do Domínio” percebe aonde essas ideias levam. Em um de seus sermões David Platt diz:

“Deus mede a integridade de nossa fé por nossa preocupação para com os pobres... Se não existe preocupação com os pobres, não existe integridade de fé; as duas coisas andam juntas... Se você não alimenta o faminto e não veste o despido você vai para o inferno”.

Na página 29 de seu livro “Radical” ele diz que Deus odeia pecadores, o que não é verdade. Deus odeia o pecado, mas ama o pecador. Na página 37 o autor declara que “...este evangelho evoca uma rendição incondicional de tudo o que somos e de tudo o que temos a tudo o que Ele é”. Na página 39: “Jesus já não é mais alguém que devemos aceitar ou convidar para entrar (em nosso coração), mas alguém que é infinitamente digno de nossa imediata e total rendição... Pela primeira vez nós queremos Deus. Vemos nossa necessidade por ele, e o amamos. Buscamos por ele, e o encontramos, e descobrimos que ele é realmente a grande recompensa de nossa salvação. Entendemos que somos salvos não apenas para sermos perdoados de nossos pecados ou para termos a certeza da eternidade no céu, mas somos salvos para conhecer a Deus. Por isso ansiamos por ele. Nós o queremos tanto que abandonamos tudo para experimentarmos dele. Esta é a única resposta válida à revelação de Deus no evangelho”.

O erro é sutil, mas está aí. Tudo gira em torno de nós, nós, nós... No entanto a Palavra de Deus é clara em mostrar que somos salvos por graça, por meio da fé, e que isso não vem de nós, mas é dom de Deus, não das nossas obras para não nos gloriarmos nelas (Ef 2:8-9). Ao carcereiro que buscava salvação Paulo apenas convidou-o a crer no Senhor Jesus. Ao contrário do que diz David Platt, nós precisamos sim aceitar a Jesus, crer nele e pedir que ele faça em nós a sua obra.

Nas páginas 70-71 ele escreve: “A mensagem do cristianismo bíblico não é ‘Deus me ama e ponto final’, como se nós fossemos o objeto de nossa própria fé. A mensagem do cristianismo bíblico é ‘Deus me ama para que eu possa torná-lo conhecido entre as nações, tornar conhecido seus caminhos, sua salvação, sua glória, sua grandeza’. ‘Deus nos ama para o próprio bem dele no mundo’ e ‘Deus nos cria, nos abençoa e salva cada um de nós para um objetivo radical e global’“.

Pelo que ele diz não somos salvos porque éramos pecadores necessitados de salvação, e nem mesmo para o objetivo supremo que Jesus explicou à mulher samaritana, de sermos feitos adoradores de Deus, pois são adoradores que Deus busca. Na concepção de David Platt somos salvos para sermos agentes de Deus na melhoria do mundo. É como se Deus precisasse de funcionários para sua ONG poder funcionar.

Na página 193 ele diz: “Repare que eu não disse meramente para ‘dar’; eu disse para ‘sacrificar’“. O exemplo que ele dá é o de alguém vendendo sua casa para ir morar em uma mais barata e dando o dinheiro da diferença para a obra missionária. Isto saindo da boca de alguém no púlpito de uma mega-igreja extremamente high-tech e luxuosa não é muito diferente do Papa falando da opção pelos pobres sentado em um trono de ouro e calçando sapatos de cromo alemão.

O que a Bíblia diz sobre o ato de dar? (2 Co 9:7) “Cada um contribua segundo propôs no seu coração; não com tristeza, NEM POR CONSTRANGIMENTO ; porque Deus ama ao que dá com alegria”.

A “Salvação pelo Senhorio” que David Platt prega pode ser resumida assim: Se Jesus não é Senhor sobre sua vida e seus bens, então ele não é seu Salvador e você não está salvo. Obviamente ele confunde salvação com santificação prática e ainda tira da pessoa qualquer certeza da salvação eterna. Como posso eu saber se já entreguei tudo para os pobres, se já estou 100% sob o senhorio de Cristo? E aquelas moedinhas que esqueci no bolso da calça que está no armário?