Se a carne é fraca, como viver a vida cristã?
É comum usarmos a frase “A carne é fraca” para justificar nossas quedas, geralmente no âmbito sexual. Mas vamos dar uma olhadinha no contexto: “E, levando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se muito. Então lhes disse: A minha alma está cheia de tristeza até a morte; ficai aqui, e velai comigo. E, indo um pouco mais para diante, prostrou-se sobre o seu rosto, orando e dizendo: Meu Pai, se é possível, passe de mim este cálice; todavia, não seja como eu quero, mas como tu queres. E, voltando para os seus discípulos, achou-os adormecidos; e disse a Pedro: Então nem uma hora pudeste velar comigo? Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; na verdade, o espírito está pronto, mas a carne é fraca“ (Mt 23:37-41).
Existe uma diferença enorme entre o episódio onde o Senhor Jesus fez o comentário para seus discípulos e a realidade vivida hoje por um verdadeiro salvo por Cristo. Primeiro, o contexto não era de estarem os discípulos sujeitos a alguma tentação da carne, sedutora demais para eles resistirem. Nada mais longe desta ideia. O Senhor havia apenas pedido que eles vigiassem e orassem, visto que a hora de Jesus ser preso e entregue à morte se aproximava. Eles bem que queriam vigiar e orar, mas a fraqueza do corpo físico os levou a dormir. A carne ali estava fraca de cansaço, não de ser incapaz de resistir a alguma tentação externa.
Se existe uma lição a ser aprendida da passagem é que o homem em seu estado natural é incapaz de cumprir a vontade de Deus porque a carne é fraca, o pano é velho para remendo novo e o odre é ressecado demais para conter vinho novo. Além disso o homem é da terra e o Senhor do céu, o que torna um e outro incompatíveis por natureza.
Portanto, nenhum verdadeiro cristão hoje, nascido de novo e habitado pelo Espírito Santo, pode usar o argumento “a carne é fraca” como desculpa por ter caído em uma tentação. Ele pode até admitir que seu “velho homem”, a “carne”, não pode agradar a Deus, mas este é outro assunto. Veja a condição dos discípulos do Senhor antes da cruz: a carne ainda não havia sido completamente exposta e julgada (isso ocorreu na cruz, quando Deus colocou um fim no homem em seu estado natural).
Além disso, o Espírito Santo, que é o poder para o crente andar segundo a vontade de Deus, ainda não tinha descido para habitar no homem. Os discípulos do Senhor, sem dúvida, eram nascidos de novo, isto é, tinham em si a vida divina, sem a qual nem sequer poderiam estar interessados nas coisas do céu (exceto Judas, que tinha sua própria agenda). Mas a nova vida nada pode fazer em um corpo de carne fraca por natureza.
É só pelo Espírito Santo que o homem está capacitado (no sentido de energizado por poder) para agir segundo a vontade de Deus. No Antigo Testamento (e em ocasiões especiais nos evangelhos) o Espírito Santo “energizou” os servos de Deus, mas depois de Pentecostes (Atos 2) o Espírito Santo de Deus passou a habitar em cada crente individualmente. Mas se os discípulos não tinham esse poder, por que o Senhor ordenou que orassem para não caírem em tentação? O que ele exigia deles era dependência e não confiança naquilo que eram e tinham, isto é, no velho homem. Pedro era um que sempre confiava em sua própria capacidade e vimos no que deu. Depender de Deus era de que precisavam e isto não mudou, apesar de hoje sermos muito mais privilegiados, como crentes em Cristo, por estarmos também capacitados pelo poder do Espírito. Veja que não é na força que o crente vence as tentações, mas na fraqueza:
(2 Co 12:9-10) “E disse-me: A minha graça te basta, porque o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza. De boa vontade, pois, me gloriarei nas minhas fraquezas , para que em mim habite o poder de Cristo. Por isso sinto prazer nas fraquezas , nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias por amor de Cristo. Porque quando estou fraco então sou forte“.
Hoje as pessoas costumam dizer: “A carne é fraca, por isso não consigo resistir”, mas Paulo teria dito “Que bom que a carne é fraca, assim não preciso me apoiar nela para resistir, mas em Cristo”.