Em 1948 cumpriu-se a profecia da volta de Israel?
Você disse que discorda de algo que escrevi, quando mencionei que as profecias que falam da volta de Israel à sua terra ainda não se cumpriram. A verdade é que a “volta” que a história registra em 1948, e que você acredita como sendo o cumprimento profético, não é a mesma que a Bíblia menciona nas várias profecias. Sim, a profecia bíblica mostra que Israel deveria voltar à sua terra depois de séculos de exílio, mas o que aconteceu em 1948 não é a mesma coisa. A volta da qual as profecias falam ainda está para se realizar, e quando isso acontecer será um Israel convertido a Deus e reconhecendo seu Messias que voltará a habitar na terra prometida, logo antes da inauguração do reino milenial de Cristo. Vamos examinar as principais passagens usadas por pessoas que tentam “provar” que a profecia bíblica se realizou.
(Am 9:14-15) “E trarei do cativeiro meu povo Israel, e eles reedificarão as cidades assoladas, e nelas habitarão, e plantarão vinhas, e beberão o seu vinho, e farão pomares, e lhes comerão o fruto. E plantá-los-ei na sua terra, e não serão mais arrancados da sua terra que lhes dei, diz o Senhor teu Deus”.
Não é preciso analisar muito o contexto para perceber que o que vemos em Israel hoje não é o cumprimento da profecia. Os versículos anteriores dizem:
“Porque eis que darei ordem, e sacudirei a casa de Israel entre todas as nações, assim como se sacode grão no crivo, sem que caia na terra um só grão. Todos os pecadores do meu povo morrerão à espada, os que dizem: Não nos alcançará nem nos encontrará o mal. Naquele dia tornarei a levantar o tabernáculo caído de Davi, e repararei as suas brechas, e tornarei a levantar as suas ruínas, e o edificarei como nos dias da antiguidade” ( Am 9:9-11).
Repare na frase: “Todos os pecadores do meu povo morrerão à espada”. A Palavra de Deus está se referindo aos que pertencem ao povo de Deus, porém são rebeldes, ou seja, exatamente o povo que retornou a terra em 1948 e lá permanece até hoje. Um povo rebelde e ainda culpado de ter rejeitado e crucificado seu Messias, e não o que é descrito na profecia, que fala de um tempo quando o Senhor voltará para estabelecer o seu reino de mil anos.
Aí sim o verdadeiro Israel, o remanescente de judeus fiéis que se converterá após o arrebatamento da Igreja, será estabelecido em sua terra para nunca mais sair. Aí sim reedificarão as cidades assoladas, habitarão nelas, plantarão vinhas e “não serão mais arrancados da sua terra que lhes dei” , diz a profecia. Um conhecimento amplo da profecia revela que a terra de Israel será ainda assolada por guerras e finalmente pelo Rei do Norte que a devastará, antes de ser destruído pelo Senhor. É essa terra devastada que será reconstruída no final.
Outra profecia muito usada como “prova” de que Israel já voltou segundo o previsto na Bíblia é o capítulo 37 de Ezequiel, que fala do vale cheio de ossos secos que voltam à vida. O versículo 11 deixa claro não se tratar do que existe hoje: “Então me disse: Filho do homem, estes ossos são toda a casa de Israel“ (Ez 37:11). O povo que hoje habita a palestina é formado pelas tribos de Judá e Benjamim, enquanto as dez tribos estão dispersas. A divisão ocorrida nos dias de Jeroboão ainda permanece e no Antigo Testamento Deus faz distinção entre “Israel” (as dez tribos) e “Judá” (Judá e Benjamim, que permaneceram em Jerusalém). O capítulo 37 fala de “toda a casa de Israel” e certamente não é o povo completo que vemos hoje na Palestina.
Basta ver os últimos versículos do capítulo, que falam de Deus fazer de todas as tribos “uma nação na terra” , congregada “de todas as partes” , fazendo com que “um rei será rei de todos eles, e nunca mais serão duas nações, nunca mais para o futuro se dividirão em dois reinos”. Acaso é isto o que se vê em Israel hoje, com seu povo rebelde e alheio ao Messias? Como alguém poderia tentar identificar o povo que ali está com aquele do qual a profecia fala: “E meu servo Davi será rei sobre eles, e todos eles terão um só pastor, e andarão nos meus juízos e guardarão os meus estatutos, e os observarão“. Ora, os judeus que hoje vivem na Palestina condenaram o verdadeiro Davi à morte e ainda não se arrependeram disso! E o capítulo termina: “E os gentios saberão que eu sou o Senhor que santifico a Israel, quando estiver meu santuário no meio deles para sempre“. Tudo o que hoje existe no local não é o santuário ou Templo de Deus, mas uma mesquita muçulmana.
Outra profecia que se tenta aplicar ao retorno de Israel a terra em 1948 é Isaías 66: “Antes que estivesse de parto, deu à luz; antes que lhe viessem as dores, deu à luz um menino. Quem jamais ouviu tal coisa? Quem viu coisas semelhantes? Poder-se-ia fazer nascer uma terra num só dia? Nasceria uma nação de uma só vez? Mas Sião esteve de parto e já deu à luz seus filhos” (Is 66:7-8).
Por ter sido o atual estado de Israel fundado por decreto, ou seja, em um dia, tenta-se aplicar esta profecia ao ocorrido em 1948, mas basta ler o restante do capítulo para perceber que a profecia está falando do estabelecimento de Judá em obediência e santificação em sua terra depois da grande tribulação, quando Cristo voltar para estabelecer o seu reino. Então as outras tribos também serão juntadas a Judá e Benjamim para que todo o povo esteja completo. O estabelecimento de Israel em sua terra será uma obra de Deus, não das Nações Unidas, e será algo definitivo. Como poderia o povo que agora vive na Palestina achar que foi colocado ali pela mão do Messias que eles próprios rejeitaram? Pergunte a qualquer judeu se ele acredita que foi Jesus quem os levou de volta a terra e você saberá a resposta.
Outra passagem usada como argumento de que a volta de Israel a terra em 1948 foi profética é Jeremias 16: “Portanto, eis que dias vêm, diz o Senhor, em que nunca mais se dirá: Vive o Senhor, que fez subir os filhos de Israel da terra do Egito. Mas: Vive o Senhor, que fez subir os filhos de Israel da terra do norte, e de todas as terras para onde os tinha lançado; porque eu os farei voltar à sua terra, a qual dei a seus pais” (Jr 16:14-15).
Fica fácil entender este capítulo se lermos o capítulo posterior que fala do espírito daqueles que herdarão a terra, em contraste com os que Deus rejeitará. “Se vós diligentemente me ouvirdes, diz o Senhor , não introduzindo cargas pelas portas desta cidade no dia de sábado, e santificardes o dia de sábado, não fazendo nele obra alguma, Então entrarão pelas portas desta cidade reis e príncipes, que se assentem sobre o trono de Davi, andando em carros e em cavalos; e eles e seus príncipes, os homens de Judá, e os moradores de Jerusalém; e esta cidade será habitada para sempre” (Jr 17:24-25). Acaso é esta a disposição de coração daqueles que habitam o atual estado de Israel? Longe disso. Em suas bocas ainda ecoa a frase de Lucas 19:14 “Não queremos que este reine sobre nós” e a sentença que eles próprios proferiram contra si mesmos quando crucificaram a Cristo: “O seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos” (Mt 27:25).
Mais uma profecia que se tenta provar já ter se cumprindo com a fundação do estado de Israel em 1948 é Ez 34:11-15: “Porque assim diz o Senhor DEUS: Eis que eu, eu mesmo, procurarei pelas minhas ovelhas, e as buscarei. Como o pastor busca o seu rebanho, no dia em que está no meio das suas ovelhas dispersas, assim buscarei as minhas ovelhas; e livrá-las-ei de todos os lugares por onde andam espalhadas, no dia nublado e de escuridão. E tirá-las-ei dos povos, e as congregarei dos países, e as trarei à sua própria terra, e as apascentarei nos montes de Israel, junto aos rios, e em todas as habitações da terra. Em bons pastos as apascentarei, e nos altos montes de Israel será o seu aprisco; ali se deitarão num bom redil, e pastarão em pastos gordos nos montes de Israel. Eu mesmo apascentarei as minhas ovelhas, e eu as farei repousar, diz o Senhor DEUS”.
Seria muita ingenuidade achar que o Senhor rejeitado e morto traria o seu rebanho disperso em rebelião e os colocaria ainda rebeldes na terra prometida e os apascentaria “em bons pastos... num bom redil... em pastos gordos nos montes de Israel” sem antes castigá-los e peneirar dentre eles o vil. Quer dizer que o Senhor, o bom Pastor, está apascentando Israel hoje e eles nem sequer sabem disso? A continuação diz que “suscitarei sobre elas um só pastor, e ele as apascentará; o meu servo Davi é que as apascentará; ele lhes servirá de pastor” vers. 23. Esse “um só pastor” é Jesus, o Messias, que permanece hoje rejeitado e até hostilizado pelos judeus (pergunte a um judeu quem ele acha que é Jesus e ele lhe dirá que é o filho bastardo de Maria com um soldado romano). A continuação da profecia traz coisas como “E farei com elas uma aliança de paz, e acabarei com as feras da terra” , o que é uma clara alusão ao reino milenial de Cristo na terra, e não à condição de instabilidade em que os judeus hoje se encontram, protegidos pelo dinheiro que guardam nos bancos norte-americanos e pelas armas e proteção que esse país lhes oferece.
Outra profecia: (Jr 31:10) “Ouvi a palavra do Senhor, ó nações, e anunciai-a nas ilhas longínquas, e dizei: Aquele que espalhou a Israel o congregará e o guardará, como o pastor ao seu rebanho”. Mais uma vez aqui é da volta de Cristo para reinar que está falando, e não da fundação do estado de Israel em 1948. Basta ver a sequência que descreve todas as benesses do reino milenial de Cristo e de um povo em submissão ao seu Messias, o que hoje não é o caso.
Alguns gostam de aplicar Levítico 26 como prova da realização da profecia, em virtude da extrema habilidade do moderno Israel em suas guerras, muitas vezes subjugando seus inimigos mesmo estando em uma aparente condição de inferioridade. Eu não chamaria de “condição de inferioridade” um país que anda sempre com um guarda-costas do tamanho de um guarda-roupa como é os Estados Unidos, além de ter o maior acervo de mentes brilhantes da história. Não devemos nos esquecer de que o ateu Einstein era judeu. Uma coisa que os judeus aprenderam com dois mil anos de exílio foi onde investir seus esforços: coisas fáceis de levar na hora da perseguição. Por isso você encontra tantos judeus intelectualmente superiores em ciências e artes, pois eles tradicionalmente investem em conhecimento. Na impossibilidade de se fugir de um país de mãos vazias, nada melhor para se levar na bagagem para recomeçar do que o cérebro. Do ponto de vista material os judeus sempre foram grandes investidores em diamantes, uma riqueza de alto valor, porém pequeno peso e volume, fácil de carregar.
Mas vamos à profecia de Levítico 26 que muitos dizem ter se concretizado nas guerras travadas por Israel para conquistar territórios depois de 1948: “E perseguireis os vossos inimigos, e cairão à espada diante de vós. Cinco de vós perseguirão a um cento deles, e cem de vós perseguirão a dez mil; e os vossos inimigos cairão à espada diante de vós” (Lv 26:7-8). O que os que usam esta passagem não percebem é que antes Deus estabelece as condições para Israel ter toda essa destreza na batalha, vinda de Deus e não de suas habilidades naturais: “Se andardes nos meus estatutos, e guardardes os meus mandamentos, e os cumprirdes , Então eu vos darei as chuvas a seu tempo; e a terra dará a sua colheita, e a árvore do campo dará o seu fruto; E a debulha se vos chegará à vindima, e a vindima se chegará à sementeira; e comereis o vosso pão a fartar, e habitareis seguros na vossa terra. Também darei paz na terra, e dormireis seguros, e não haverá quem vos espante; e farei cessar os animais nocivos da terra, e pela vossa terra não passará espada“ (Lv 26:3-6).
O leitor sincero logo perceberá que “cinco de vós perseguirão a um cento deles” é algo sobrenatural e decorre da obediência aos mandamentos de Deus, o que não é absolutamente o caso dos judeus atuais. A passagem também deixa claro que está falando do período que precede imediatamente o estabelecimento do reino milenial de Cristo, quando Deus fará cessar os animais nocivos da terra e esta nunca mais será atacada.
Finalmente, outra passagem usada pelos simpatizantes da ideia da profecia ter se cumprido em 1948 é Deuteronômio 30:3-5, que fala da prosperidade de Israel. “Então o Senhor teu Deus te fará voltar do teu cativeiro, e se compadecerá de ti, e tornará a ajuntar-te dentre todas as nações entre as quais te espalhou o Senhor teu Deus. Ainda que os teus desterrados estejam na extremidade do céu, desde ali te ajuntará o Senhor teu Deus, e te tomará dali; E o Senhor teu Deus te trará à terra que teus pais possuíram, e a possuirás; e te fará bem, e te multiplicará mais do que a teus pais”.
Mais uma vez o leitor sincero e que sabe dividir bem a Palavra da verdade não se deixará levar pelo oba-oba dos livros de sensacionalismo profético e verá que a promessa é precedida de uma conversão real ao Senhor ( “e te converteres ao Senhor teu Deus, e deres ouvidos à sua voz” ) e sucedida dos mesmos alertas condicionais: “Quando deres ouvidos à voz do Senhor teu Deus... quando te converteres ao Senhor teu Deus com todo o teu coração e com toda a tua alma” (Dt 30:10). Acaso você considera aquele povo que hoje forma o estado de Israel convertido ao Senhor de todo o coração e de toda a alma?
Para finalizar quero dizer que durante anos acreditei nessas passagens como tendo sido cumpridas em 1948, e as utilizava para evangelizar, tentando por meio delas, provar às pessoas que a Bíblia estava se cumprindo. A intenção era boa, mas a aplicação bíblica era incorreta. Muito do descrédito que as pessoas esclarecidas têm hoje pela Bíblia é por os próprios cristãos a utilizarem sem sabedoria.
Quantas vezes você ouviu algum pregador dizer que o Papa tal ou tal era o anticristo? Li um livro no final da Guerra Fria no qual o autor jurava de pés juntos que o anticristo era Mikhail Gorbachev e que a marca de nascença que tinha na cabeça era a marca da besta. Outro tentava provar por A+B que o anticristo seria o Rei da Espanha, Juan Carlos, por causa de particularidades de sua biografia e principalmente por suas iniciais “J.C.” serem as mesmas de “Jesus Cristo”. O código de barras, que já foi a bola da vez na literatura evangélica como sendo a marca da besta foi substituído pelos chips de identificação. Autores de livros proféticos que citaram o código de barra correram para corrigir suas novas edições. Antes da onda do chip eu conheci um cristão que não comprava produtos que tivessem código de barras na embalagem. Há muito tempo não o vejo e espero que não tenha morrido de fome.
Todas essas tentativas de interpretação da profecia bíblica sem considerar o contexto e o cenário completo causam mais mal do que bem ao testemunho de Cristo no mundo. Como eu disse, também errei muito neste sentido, mas depois vim a perceber que as previsões sobre a fundação do estado de Israel em 1948 não se encaixavam quando a profecia era compreendida como um todo, e não por meio de versículos tirados do contexto. A população que hoje forma o estado de Israel será dizimada e restará dela apenas um terço que se converterá verdadeiramente a Deus (isto sim é profético e ainda irá acontecer): (Zc 13:8-9) “Em toda a terra, diz o Senhor, as duas partes dela serão exterminadas, e expirarão; mas a terceira parte restará nela. E farei passar esta terceira parte pelo fogo, e a purificarei, como se purifica a prata, e a provarei, como se prova o ouro. Ela invocará o meu nome, e eu a ouvirei; direi: É meu povo; e ela dirá: O Senhor é meu Deus”.
Se quiser compreender a profecia bíblica corretamente, comece por entender que o relógio profético parou após a morte e ressurreição de Cristo e antes da fundação da Igreja em Atos 2 (cumprindo-se ali Joel 2:16-17 em parte, mas não totalmente). Tudo o que se vê hoje não foi previsto pelos profetas do Antigo Testamento porque a atual dispensação da graça de Deus era um mistério que só seria revelado a Paulo séculos mais tarde. O relógio profético voltará a bater quando a Igreja for arrebatada, o que acontecerá com a concomitante saída do Espírito Santo da terra.