Como saber que a Bíblia não foi alterada?

Quando você conhece realmente a Deus, depois de ter sido salvo por Cristo, e sabe o quanto custou entregar seu Filho para morrer e salvar criaturas perdidas, você descansa na certeza de que Deus é fiel. E um dos aspectos dessa certeza é que “Todo aquele que nele crer não será confundido”(Rm 10:11). Portanto o próprio Deus não iria permitir que ficássemos sem um norte, sem uma escritura fiel o suficiente para o conhecermos. As teorias conspiratórias mais esdrúxulas surgem quando se exclui a Deus da equação, achando que a preservação da Verdade é tarefa de homens.

Existem muitos exemplos disso nas próprias Escrituras, mas vou me ater a apenas um capítulo — Jeremias 36 — que aconselho você a ler inteiro. O capítulo fala de um rei ímpio, “Jeoiaquim, filho de Josias, rei de Judá”, e de sua tentativa de destruir a Palavra de Deus entregue por intermédio do profeta Jeremias. Deus ordenara que Jeremias pegasse “_o rolo de um livro”_e escrevesse nele “_todas as palavras”_que Deus falaria “_de Israel, e de Judá, e de todas as nações... desde os dias de Josias até ao dia de hoje”._Deus explica a razão dessa ordem: “Porventura ouvirão os da casa de Judá todo o mal que eu intento fazer-lhes, para que cada qual se converta do seu mau caminho, e eu perdoe a sua maldade e o seu pecado”(Jr 36:3).

A intenção de Deus é sempre a melhor — “que cada qual se converta do seu mau caminho, e eu perdoe a sua maldade e o seu pecado”. Mas o homem nem sempre é receptivo ao desejo de Deus de perdoar por uma razão bem simples: aceitar o perdão de Deus implica antes reconhecer que eu e você somos pecadores por natureza e merecedores de um justo juízo. Mais de uma vez Deus revela a Jeremias seu propósito de compaixão, misericórdia e perdão para com aquele povo tão desobediente.

Então Jeremias chamou a Baruque, filho de Nerias; e escreveu Baruque da boca de Jeremias no rolo de um livro todas as palavras do Senhor, que ele lhe tinha falado. E Jeremias deu ordem a Baruque, dizendo: Eu estou encarcerado; não posso entrar na casa do Senhor. Entra, pois, tu, e pelo rolo que escreveste da minha boca, lê as palavras do Senhor aos ouvidos do povo, na casa do Senhor, no dia de jejum; e também, aos ouvidos de todos os de Judá, que vêm das suas cidades, as lerás. Pode ser que caia a sua súplica diante do Senhor, e se converta cada um do seu mau caminho; porque grande é a ira e o furor que o Senhor tem expressado contra este povo” (Jr 36:4-7).

Baruque, o escriba, atende ao pedido de Jeremias e escreve tudo o que Deus estava revelando ao profeta. Em seguida Baruque lê aquelas palavras na casa do Senhor, o Templo, “aos ouvidos de todo o povo”. O texto dá ainda conta de todos os príncipes dos judeus que estavam presentes àquela leitura, indicando nome e “sobrenome” de cada um. Digo “sobrenome” entre aspas porque ainda não existiam os sobrenomes que existem hoje, portanto cada um era identificado como “Fulano, filho de Sicrano” para não deixar dúvidas quanto à identidade das testemunhas presentes ali.

Deus sempre deu grande importância a testemunhas. Os evangelhos foram escritos por discípulos inspirados, mas também cercados de testemunhas que podiam muito bem atestar tudo o que tinha sido escrito ali. Muitas das testemunhas dos fatos estavam ainda vivas quando os evangelhos foram escritos, podendo atestar que as coisas realmente tinham sido assim. O livro de Atos segue o mesmo princípio. Pedro, em seu discurso a Cornélio e seus companheiros, diz:

E nós somos testemunhas de todas as coisas que fez, tanto na terra da Judeia como em Jerusalém; ao qual mataram, pendurando-o num madeiro. A este ressuscitou Deus ao terceiro dia, e fez que se manifestasse, não a todo o povo, mas às testemunhas que Deus antes ordenara; a nós, que comemos e bebemos juntamente com ele, depois que ressuscitou dentre os mortos. E nos mandou pregar ao povo, e testificar que ele é o que por Deus foi constituído juiz dos vivos e dos mortos. A este dão testemunho todos os profetas, de que todos os que nele creem receberão o perdão dos pecados pelo seu nome” (At 10:39).

Em 1 Coríntios 15 Paulo fala das mais de quinhentas testemunhas que podiam afirmar ter visto o Senhor Jesus ressuscitado, e João em sua carta escreve: “O que era desde o princípio, o que ouvimos, o que vimos com os nossos olhos, o que temos contemplado, e as nossas mãos tocaram da Palavra da vida(Porque a vida foi manifestada, e nós a vimos, e testificamos dela, e vos anunciamos a vida eterna, que estava com o Pai, e nos foi manifestada); o que vimos e ouvimos, isso vos anunciamos, para que também tenhais comunhão conosco; e a nossa comunhão é com o Pai, e com seu Filho Jesus Cristo. Estas coisas vos escrevemos, para que o vosso gozo se cumpra” (1 Jo 1:1-4).

Outra prova de que as Escrituras que temos hoje é íntegra em todos os seus aspectos é, na verdade, uma prova dupla. Primeiro temos o Antigo Testamento, que em grande parte deprecia o povo de Israel jogando sua reputação no fundo do poço. Se alguém falasse hoje de um judeu do jeito que os profetas do Antigo Testamento falaram seria considerado politicamente incorreto e seria processado por difamação.

O mesmo pode ser dito dos textos do Novo Testamento. Ali o Espírito Santo faz uma radiografia dos discípulos — dentre eles alguns autores dos textos inspirados — e dos outros irmãos, revelando suas falhas e enganos. Se fosse uma obra humana certamente teria antes passado por um censor para eliminar tudo que pudesse macular a reputação dos discípulos. Mas o que vemos ali é a realidade nua e crua, desde Pedro negando o Senhor, até os discípulos amedrontados no barco que parecia afundar, ou permanecendo a uma distância segura da cruz. Nem Paulo escapa, pois no livro de Atos nós o vemos agindo na sua própria vontade e deliberadamente de forma contrária à direção do Espírito de Deus, apesar dos avisos dos irmãos e do profeta inspirado, Ágabo (Atos 21).

Voltando ao capítulo 36 de Jeremias vemos que o rei é informado do rolo do livro onde a Palavra de Deus revelada a Jeremias havia sido escrita “com tinta” (Jr 36:18), um detalhe que o Espírito Santo quis acrescentar para mostrar que não devia ser apagada. O rei ordena que o rolo seja trazido à sua presença e, depois de ter lido “três ou quatro folhas, cortou-as com um canivete de escrivão, e lançou-as no fogo que havia no braseiro, até que todo o rolo se consumiu no fogo que estava sobre o braseiro. E não temeram, nem rasgaram as suas vestes, nem o rei, nem nenhum dos seus servos que ouviram todas aquelas palavras. E, posto que Elnatã, e Delaías, e Gemarias tivessem rogado ao rei que não queimasse o rolo, ele não lhes deu ouvidos. Antes deu ordem o rei a Jerameel, filho de Hamaleque, e a Seraías, filho de Azriel, e a Selemias, filho de Abdeel, que prendessem a Baruque, o escrivão, e a Jeremias, o profeta; mas o Senhor os escondera” (Jr 36:23-26).

Além do profeta, que recebeu a Palavra diretamente da boca de Deus, havia o escriba Baruque, uma multidão de testemunhas e até mesmo aqueles, na corte do rei, que tentaram dissuadir o rei de seu intento a fim de proteger o livro e evitar que Jeoiaquim o queimasse. Deus sempre teve e terá pessoas assim dedicadas na guarda dos seus oráculos, independente de quanto o inimigo queira destruí-los. Além disso, Deus tinha escondido o escriba Baruque e o profeta Jeremias, porque a história não acabava ali naquele braseiro em que o rolo da Palavra de Deus havia sido transformado em cinzas. Repare bem que foi Deus quem os escondeu.

Então veio a Jeremias a palavra do Senhor, depois que o rei queimara o rolo, com as palavras que Baruque escrevera da boca de Jeremias, dizendo: Toma ainda outro rolo, e escreve nele todas aquelas palavras que estavam no primeiro rolo, que queimou Jeoiaquim, rei de Judá... Tomou, pois, Jeremias outro rolo, e deu-o a Baruque, filho de Nerias, o escrivão, o qual escreveu nele, da boca de Jeremias, todas as palavras do livro que Jeoiaquim, rei de Judá, tinha queimado no fogo; e ainda se lhes acrescentaram muitas palavras semelhantes” (Jr 36:27-28,32). Assim aquela profecia não foi apenas preservada pela mão de Deus que guardou o escriba e o profeta para repetirem a tarefa, mas foi ainda acrescida de “muitas palavras semelhantes”.

Portanto, pode ficar sossegado que Deus não dorme em serviço. Ele é o maior interessado em preservar sua Palavra para que ela chegue às nossas mãos séculos depois de ter sido revelada aos apóstolos e profetas. Os homens podem criar versões espúrias, traduções incorretas, e até literalmente queimar milhões de Bíblias como sempre foi feito nos países comunistas, budistas e islamitas. Por trás de tudo isso Deus estará rindo da ingenuidade humana de achar que podem se opor ao Criador de todas as coisas.

Por que se amotinam os gentios, e os povos imaginam coisas vãs? Os reis da terra se levantam e os governos consultam juntamente contra o Senhor e contra o seu ungido, dizendo: Rompamos as suas ataduras, e sacudamos de nós as suas cordas. Aquele que habita nos céus se rirá; o Senhor zombará deles” (Sl 2:1-4).

Quando entendemos essas coisas reagimos como Jó, no fim de sua provação e depois de ter falado sem compreender realmente quem era o Deus a quem ele servia:

Então respondeu Jó ao Senhor, dizendo: Bem sei eu que tudo podes, e que nenhum dos teus propósitos pode ser impedido. Quem é este, que sem conhecimento encobre o conselho? Por isso relatei o que não entendia; coisas que para mim eram inescrutáveis, e que eu não entendia. Escuta-me, pois, e eu falarei; eu te perguntarei, e tu me ensinarás. Com o ouvir dos meus ouvidos ouvi, mas agora te veem os meus olhos. Por isso me abomino e me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42:1-6).