Como saber o que se aplica à Igreja?

Tudo o que está na Bíblia é para nós, porém nem tudo se aplica hoje na prática, embora possa se aplicar moralmente. Por exemplo, sabemos que o Antigo Testamento eram sombras das coisas que viriam. Tudo no Antigo Testamento aponta para Cristo, portanto quando lemos devemos procurar onde está Cristo ali, seja em profecias diretas ou em sombras ou símbolos. Por isso nunca podemos criar doutrinas baseadas nas sombras do Antigo Testamento, mas apenas no que está nas epístolas.

(Cl 2:16-17) “Portanto, ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa dos dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados, Que são sombras das coisas futuras, mas o corpo é de Cristo”.

(Hb 8:5) “Os quais servem de exemplo e sombra das coisas celestiais...”

(Hb 10:1) “Porque tendo a lei a sombra dos bens futuros, e não a imagem exata das coisas...”. (1 Co 10:6) “E estas coisas foram-nos feitas em figura, para que não cobicemos as coisas más, como eles cobiçaram”.

(Hb 9:24) “Porque Cristo não entrou num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro...”.

Quando vamos para os evangelhos, vemos um tempo de transição, portanto é fácil entender que a prática de muitas coisas ali está relacionada a Israel. O Senhor mandava uma pessoa curada ir sacrificar no Templo, e não fazemos isto hoje. Porém é nos evangelhos que conhecemos o Senhor em sua relação com o seu povo (seja ele Israel ou Igreja), porque ele continua tratando conosco no mesmo caráter em que veio: o bom Pastor, por exemplo.

Além disso, nos Evangelhos o Senhor trata a Igreja como uma coisa ainda futura, e mais tarde Paulo vai ensinar que ela era um mistério ou segredo que Deus manteve escondido ao longo dos séculos, até mesmo dos profetas do Antigo Testamento.

(Mt 16:18) “...edificarei a minha igreja”. (verbo estava no futuro).

(Ef 3:3-6) “Como me foi este mistério manifestado pela revelação, como antes um pouco vos escrevi; Por isso, quando ledes, podeis perceber a minha compreensão do mistério de Cristo, O qual noutros séculos não foi manifestado aos filhos dos homens, como agora tem sido revelado pelo Espírito aos seus santos apóstolos e profetas [só lembrando que aqui são profetas da igreja]; A saber, que os gentios são coerdeiros, e de um mesmo corpo, e participantes da promessa em Cristo pelo evangelho”.

Atos são os Atos dos apóstolos, portanto não é uma doutrina especificamente estabelecida. Ali vamos encontrar coisas erradas praticadas pelos apóstolos, e outras coisas que podem nos servir de exemplo para praticarmos. Mas a doutrina mesmo nós temos nas epístolas, e é por isso que é chamada de doutrina dos apóstolos.

(Atos 2:42) “E perseveravam na doutrina dos apóstolos, e na comunhão, e no partir do pão, e nas orações”.

O Apocalipse é o fechamento de tudo, mas em sua maior parte as profecias ali têm Israel como protagonista, e não a Igreja. O caráter do Senhor naquele livro é o de Juiz, um caráter com o qual ele jamais tratará conosco. Por isso João se espanta no capítulo 1 quando vê o Senhor naquela imagem tão amedrontadora. Ele não conhecia esse Senhor Juiz, e felizmente os salvos jamais terão de se encontrar com ele nesse caráter.

(Jo 5:24) “Em verdade, em verdade vos digo que quem ouve a minha palavra, e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna e não entra em juízo, mas já passou da morte para a vida”.

Não existe exatamente uma chave para entender o que é para a Igreja e o que é para Israel, mas lendo as epístolas podemos eliminar muita coisa do Antigo Testamento e também dos evangelhos. Quando digo “eliminar”, talvez fosse melhor dizer “reposicionar”. Isto é, coisas que no Antigo Testamento eram regras de conduta (por exemplo, apedrejar alguém), para nós devem ser aplicadas no sentido moral, porque no Novo Testamento aprendemos a amar até nossos inimigos.

Algo dos Evangelhos, como a oração do Pai Nosso, que coloca o perdão condicionado a perdoarmos antes nosso ofensor, também deixa de fazer sentido prático quando lemos em Colossenses 3. Veja o contraste na ordem das coisas:

(Mc 11:25-26) “...(1) perdoai... para que vosso Pai, que está nos céus, (2) vos perdoe”.

(Cl 3:13) “...assim como (1) Cristo vos perdoou, assim (2) fazei vós também”.

É claro que toda a leitura da Bíblia deve ser em espírito de dependência de Deus, porque não há entendimento da Palavra que não seja através do Espírito Santo de Deus. E devemos ter sempre em mente a pergunta: esta interpretação resulta em glória para Cristo ou para o homem? Cristo é o fim e o objetivo da Bíblia.

Portanto, quando alguém lê, por exemplo, a história de Davi contra Golias e tenta usá-la como exemplo de força de vontade para o homem vencer obstáculos, está simplesmente dando sua versão humana da história, e não a versão de Deus, que tem Davi como figura do fraco e improvável vencedor, Jesus, que venceu o gigante Satanás e a morte com seu sacrifício na cruz.