Os discípulos receberam o Espírito Santo em João 20?
Considerando que é comum dizer que o Espírito Santo só foi dado no capítulo 2 de Atos, por ocasião da formação da igreja, sua dúvida é por que Jesus diz aos discípulos “Recebei o Espírito Santo” ao soprar sobre eles em João 20. Nunca devemos tomar uma passagem isoladamente ou cairemos no erro. Sabemos que o Espírito Santo não é uma mera influência ou poder, embora ele influencie o crente e o revista de poder. O Espírito Santo é uma Pessoa da Trindade, tão real e distinto quanto o Pai e o Filho. Enquanto estava aqui, o Filho fazia companhia aos discípulos. Após a ressurreição seria a vez de o Espírito Santo consolá-los.
(Jo 14:16) “E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre” (aqui ele diz “outro” Consolador porque naquele momento o Consolador era o próprio Jesus).
Quando o Espírito Santo viesse transmitiria aos apóstolos as coisas que Jesus ficou de dizer a eles, porém não disse porque não poderiam suportar (ou entender) por ainda não estarem capacitados pela habitação do Espírito em si mesmos para terem entendimento espiritual.
(Jo 16:12-14) “Ainda tenho muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora. Mas, quando vier aquele Espírito de verdade, ele vos guiará em toda a verdade; porque não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará o que há de vir. Ele me glorificará, porque há de receber do que é meu, e vo-lo há de anunciar”.
Aqueles que acham que a Bíblia é apenas uma coletânea de verdades, e não a Palavra de Deus, a revelação do Espírito de Deus ao homem que foi completada pelo ministério dos apóstolos e profetas do Novo Testamento nos evangelhos, Atos epístolas e Apocalipse, não conseguem evitar passagens como a que Paulo diz em 1 Coríntios 14:37.
“Se alguém cuida ser profeta, ou espiritual, reconheça que as coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor”.
Ou o que Pedro diz em sua epístola, ora prometendo continuar “falando” à igreja, ora colocando as cartas de Paulo no mesmo nível das Escrituras inspiradas do Antigo Testamento.
(2 Pe 1:14-15) “Sabendo que brevemente hei de deixar este meu tabernáculo, como também nosso Senhor Jesus Cristo já mo tem revelado. Mas também eu procurarei em toda a ocasião que depois da minha morte tenhais lembrança destas coisas”. (Obviamente por meio de suas epístolas).
(2 Pe 3:15-16) “E tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor; como também o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada; Falando disto, como em todas as suas epístolas, entre as quais há pontos difíceis de entender, que os indoutos e inconstantes torcem, e igualmente as outras escrituras, para sua própria perdição”.
Portanto, hoje, quando alguém ministra o faz fundamentado na Palavra de Deus que temos completa, usando do dom que recebeu e dirigido pelo Espírito Santo que habita em si.
(1 Pe 4:10-11) “Cada um administre aos outros o dom como o recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus. Se alguém falar, fale segundo as palavras de Deus; se alguém administrar, administre segundo o poder que Deus dá; para que em tudo Deus seja glorificado por Jesus Cristo, a quem pertence a glória e poder para todo o sempre”.
Voltando agora à sua dúvida específica, sabemos que o Espírito Santo foi dado no dia de Pentecostes e que ali o Espírito desceu para habitar nos crentes individualmente e na igreja coletivamente.
(Atos 2:1-4) “E, cumprindo-se o dia de Pentecostes, estavam todos concordemente no mesmo lugar; E de repente veio do céu um som, como de um vento veemente e impetuoso, e encheu toda a casa em que estavam assentados. E foram vistas por eles línguas repartidas, como que de fogo, as quais pousaram sobre cada um deles. E todos foram cheios do Espírito Santo”.
(1 Co 3:16) “Não sabeis vós que sois o templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós?”. (Veja o pronome no plural, porque aqui fala da habitação do Espírito na igreja coletivamente).
(1 Co 6:19) “Ou não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos?” (Aqui é a habitação individual do Espírito em cada crente).
(Ef 2:22) “No qual também vós juntamente sois edificados para morada de Deus em Espírito”. (Aqui mais uma vez no sentido coletivo).
Sabemos também que todos os salvos depois daquela data fazem parte do corpo de Cristo e foram batizados com o Espírito Santo lá atrás, naquele dia, mesmo que não estivessem presentes àquela “inauguração” e tivessem se convertido muito depois.
(1 Co 12:13) “Pois todos nós fomos batizados em um Espírito, [Isto aconteceu no dia de Pentecostes] formando um corpo, quer judeus, quer gregos, quer servos, quer livres, e todos temos bebido de um Espírito”.
Jesus também deixou claro que eles precisariam permanecer em Jerusalém após a sua ressurreição e ascensão, porque só então receberiam a promessa da vinda do Espírito Santo.
(Lc 24:49) “E eis que sobre vós envio a promessa de meu Pai; ficai, porém, na cidade de Jerusalém, até que do alto sejais revestidos de poder”. (Aqui ele fala da capacitação que o recebimento do Espírito lhes daria, e é do alto que viria).
(Atos 1:4-5) “E, estando com eles, determinou-lhes que não se ausentassem de Jerusalém, mas que esperassem a promessa do Pai, que (disse ele) de mim ouvistes. Porque, na verdade, João batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo, não muito depois destes dias”.
Tendo esta verdade muito bem estabelecida, isto é, de que o Espírito só desceria ao mundo no dia de Pentecostes para habitar na igreja, coletivamente, e no salvo, individualmente, o que significaria a passagem em que Jesus assopra sobre os discípulos o Espírito Santo? Mais uma vez faremos bem em ler o contexto todo.
(Jo 20:19-23) “Chegada, pois, a tarde daquele dia, o primeiro da semana, [que depois seria chamado de “dia do Senhor” quando os discípulos celebrariam a ceia do Senhor] e cerradas as portas onde os discípulos, com medo dos judeus, se tinham ajuntado, chegou Jesus, e pôs-se no meio, e disse-lhes: Paz seja convosco. E, dizendo isto, mostrou-lhes as suas mãos e o lado [recordação de sua morte]. De sorte que os discípulos se alegraram, vendo o Senhor [o privilégio dos cristãos congregados ao seu nome]. Disse-lhes, pois, Jesus outra vez: Paz seja convosco; assim como o Pai me enviou, também eu vos envio a vós [comissionamento dos cristãos genericamente - são aqui chamados de discípulos - e não como na comissão dada em Marcos 16 que tinha um caráter mais apostólico e também profético, já que será obedecida também pelo remanescente judeu fiel após o arrebatamento da igreja]. E, havendo dito isto, assoprou sobre eles e disse-lhes: Recebei [o] Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados lhes são perdoados; e àqueles a quem os retiverdes lhes são retidos”.
Aqui encontramos todos os elementos prometidos à igreja ou assembleia, antes mesmo de ela existir. Veja que Jesus se coloca no meio deles, como ocorreria depois, quando “dois ou três” estivessem congregados pelo Espírito ao seu Nome. A sua presença no meio seria o que caracterizaria a igreja congregada e dotada de sua autoridade para julgar e decidir, como é mencionado aqui o poder para perdoarem pecados no sentido administrativo (como faz um júri humano) também mencionado em Mateus 18:20 e mais tarde executado em 2 Coríntios2, provavelmente referindo-se ao caso do homem que foi colocado fora de comunhão em 1 Coríntios 5 por pecado moral.
(2 Co 2:5-11) “Porque, se alguém me contristou, não me contristou a mim senão em parte, para vos não sobrecarregar a vós todos. Basta-lhe ao tal esta repreensão feita por muitos. De maneira que pelo contrário deveis antes perdoar-lhe e consolá-lo, para que o tal não seja de modo algum devorado de demasiada tristeza. Por isso vos rogo que confirmeis para com ele o vosso amor. E para isso vos escrevi também, para por esta prova saber se sois obedientes em tudo. E a quem perdoardes alguma coisa, também eu; porque, o que eu também perdoei, se é que tenho perdoado, por amor de vós o fiz na presença de Cristo; para que não sejamos vencidos por Satanás; Porque não ignoramos os seus ardis”.
Da passagem aprendemos que a presença de Jesus + o poder do Espírito Santo = capacidade ou poder de julgar. Era esta capacitação que eles estavam recebendo quando lhes foi soprado Espírito (atente para o fato de no original faltar o pronome “o” na frase, devendo ser lido “Recebei Espírito Santo”. Eles recebiam ali capacitação para serem enviados, como Jesus os enviava, numa alusão a Adão, que tendo vindo da terra, precisou receber de Deus o sopro da vida para ser alma vivente (Gn 2:7). O Senhor, o último Adão, é espírito vivificante (1 Co 15:45) e é neste caráter que os discípulos recebem poder, mesmo não tendo sido ainda habitados pelo Espírito.
A própria vida do Cristo ressuscitado é aqui na energia do Espírito, pois apesar de ter sido morto, ele foi vivificado pelo Espírito.
(1 Pe 3:18) “Porque também Cristo padeceu uma vez pelos pecados, o justo pelos injustos, para levar-nos a Deus; mortificado, na verdade, na carne, mas vivificado pelo Espírito;”.
Portanto a passagem toda é uma prévia ou “maquete” de como seria a igreja assim que o Espírito efetivamente viesse habitar nela coletivamente e no crente individualmente. F. B. Hole comenta esta passagem:
“Como eles poderiam ser enviados ao mundo, para representá-lo do modo como ele havia sido enviado do Pai, exceto se possuíssem sua vida ressurreta? A vida natural que receberam de Adão não dava a eles qualquer competência para tal missão. Eles não tiveram poder enquanto o Espírito Santo não foi derramado abundantemente em Pentecostes, mas agora eles tinham a vida e a natureza que tornava a missão possível. Não lemos desta ação nos outros evangelhos, mas lemos em Lucas 24:1-53, “... Então abriu-lhes o entendimento para compreenderem as Escrituras” (vers. 45). Aquela abertura de seus entendimentos foi, conforme cremos, o resultado do assoprar de Sua vida em ressurreição”.
“Todavia no Evangelho de João existem as duas coisas que estão conectadas a isto: primeiro o assoprar lhes deu capacidade para testemunharem no mundo como tendo sido enviados por ele; e, segundo, para serem dotados de poderes administrativos no sentido de perdoar ou reter pecados, não eternamente, é claro, mas governamentalmente. No evangelho de Mateus vemos que o Senhor, antes de sua morte e ressurreição, indicou que tais poderes seriam conferidos a Pedro (Mt 16:19) e aos apóstolos como um todo (Mt 18:18), em cada ocasião fazendo alusão ao futuro. Aqui o poder é efetivamente conferido. A princípio, não há dúvida, o poder foi apostólico, e vemos Pedro fazendo uso desse poder em Atos 5:1-11, e o Espírito Santo ratificando sua decisão de maneira inequívoca. Mas em 1 Coríntios 5:3-5, 12 e 13 temos Paulo exercendo esse poder e convocando a igreja a agir juntamente com ele na exclusão do malfeitor. Em 2 Coríntios 2:4-8 nós o encontramos convocando a igreja a reverter a ação já que o malfeitor havia se arrependido. Então eles deviam tirar ou perdoar o pecado; e o versículo de João20:10 é muito instrutivo neste sentido”. - F. B. Hole - “John” - New Testament Commentary.