A comissão aos apóstolos não era para a igreja?

Quanto a sua dúvida sobre Lucas 9 e 10, aquela comissão foi dada particularmente aos apóstolos e não à igreja que na época nem existia. Em Mateus 16:18 Jesus diz “edificarei a minha igreja” mostrando que ela estava ainda no futuro, o que só foi realizado em Atos 2. Portanto nos evangelhos temos discípulos judeus, vivendo dentro do judaísmo, e sendo comissionados por seu Messias para convidarem as pessoas a participarem do seu Reino. Os milagres e maravilhas eram as credenciais que eles apresentavam para mostrar como seria o reino do Messias na terra.

(Lc 9:1-2) “E, convocando os seus doze discípulos, deu-lhes virtude e poder sobre todos os demônios, para curarem enfermidades. E enviou-os a pregar o reino de Deus, e a curar os enfermos”.

(Lc 10:19) “Eis que vos dou poder para pisar serpentes e escorpiões, e toda a força do inimigo, e nada vos fará dano algum”.

Os discípulos foram enviados para pregar o reino de Deus, que é o que conhecemos como o evangelho do reino e não o evangelho da graça de Deus que hoje pregamos. Esse evangelho era o mesmo que Jesus e João Batista pregavam e tinha a ver com a posição de rebeldia e desobediência que Israel havia adotado diante de Deus e de sua Lei. “Arrependei-vos, porque é chegado o reino dos céus” (Mt 4:17).

Assim como fez Jesus em seus dias na terra, os discípulos se dirigiam exclusivamente aos judeus, pois assim também era o ministério do Senhor neste mundo.

(Mt 10:6) “Mas ide antes às ovelhas perdidas da casa de Israel”.

(Mt 15:24) “E ele, respondendo, disse: Eu não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel”.

Foi somente depois de Jesus ter vindo para os seus (os judeus), e os seus não o receberem, que as boas novas da salvação passaram a ser proclamadas a todos e então o Espírito Santo veio habitar no mundo.

(Jo 1:11-12) “Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que creem no seu nome;”.

Uma grande dificuldade que a maioria das pessoas tem para entender a Bíblia ocorre por considerarem que tudo o que Jesus e seus discípulos disseram e fizeram nos quatro evangelhos tinha a ver com todas as épocas. Por isso costumamos ouvir argumentos do tipo “Veja, Jesus está mandando dar o dízimo” ou “Os discípulos adoravam em um templo de pedras” ou “Eles precisavam obedecer ao sacerdote”, etc.

Mas é importante entender que no período dos evangelhos temos o judaísmo, não o cristianismo. Nos evangelhos você encontra uma ordem sacerdotal, um templo de pedras, um altar, dízimos, levitas, sacrifícios de animais, etc. Nada disso faz sentido hoje na igreja. Cristo aparece nos evangelhos como o Messias esperado por Israel, e só depois de rejeitado é que ele passaria a ser o Salvador do mundo. Não é possível entender o Antigo Testamento sem os Evangelhos e não é possível entender os Evangelhos sem as Epístolas.

Se no Antigo Testamento encontramos Deus tratando com um povo terreno (Israel) ao qual deu uma Lei com mais de trezentas ordenanças, nos evangelhos vemos o Messias avisando da chegada do seu reino e convidando as pessoas a participarem dele. Ser participante do reino não era sinônimo de ser salvo, pois no reino vemos joio (falsos) e trigo (verdadeiros). Agora, na atual dispensação, temos a Igreja, que não é Israel e cuja expectativa é habitar no céu para reinar com Cristo sobre a terra, e não para viver na terra sob o reinado de Cristo.

Mas não teríamos chegado aonde chegamos se Cristo não morresse, ressuscitasse, fosse glorificado e tivesse enviado o Espírito Santo. O próprio Espírito Santo não habitava nos discípulos nos Evangelhos do modo como depois viria a habitar na Igreja e nos crentes individualmente, pois isto dependia de Cristo ser glorificado.

(Hb 5:8-9) “Ainda que era Filho, aprendeu a obediência, por aquilo que padeceu. E, sendo ele consumado, veio a ser a causa da eterna salvação para todos os que lhe obedecem”.

(Mc 8:31) “E começou a ensinar-lhes que importava que o Filho do homem padecesse muito, e que fosse rejeitado pelos anciãos e príncipes dos sacerdotes, e pelos escribas, e que fosse morto, mas que depois de três dias ressuscitaria”.

(Jo 7:39) “E isto disse ele do Espírito que haviam de receber os que nele cressem; porque o Espírito Santo ainda não fora dado, por ainda Jesus não ter sido glorificado”.