O ladrão de João 10 é o diabo?
Sua pergunta é se o ladrão de João 10:1 seria o diabo. Na realidade o ladrão não é o diabo, pois o diabo não precisa roubar as almas. Ele já é dono daquelas que permanecem na incredulidade. Por isso a vinda de Cristo foi também para o “mais valente do que” o diabo espoliar seus bens.
“Quando o valente guarda, armado, a sua casa, em segurança está tudo quanto tem; mas, sobrevindo outro mais valente do que ele, e vencendo-o, tira-lhe toda a sua armadura em que confiava, e reparte os seus despojos” (Lucas 11:21-22).
Isso Jesus fez ainda em vida, enquanto andava aqui libertando os enfermos e possessos, mas ele não parou aí. Para aniquilar o diabo, foi até a cruz e ali morreu, colocando um ponto final ao domínio do inimigo sobre o homem.
“E, visto como os filhos participam da carne e do sangue, também ele participou das mesmas coisas, para que pela morte aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabo; e livrasse todos os que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à servidão” (Hebreus 2:14-15).
A Palavra de Deus também nos exorta quanto ao modo que devemos tratar as pessoas que resistem à verdade para que Deus nos use a fim de libertar os que continuam presos nos laços do diabo:
“Instruindo com mansidão os que resistem, a ver se porventura Deus lhes dará arrependimento para conhecerem a verdade, e tornarem a despertar, desprendendo-se dos laços do diabo, em que à vontade dele estão presos” (2 Timóteo 2:25).
Indo agora para a passagem do evangelho de João 10, encontramos ali diferentes personagens e situações.
“Aquele que não entra pela porta no curral das ovelhas, mas sobe por outra parte, é ladrão e salteador. Aquele, porém, que entra pela porta é o pastor das ovelhas. A este o porteiro abre, e as ovelhas ouvem a sua voz, e chama pelo nome às suas ovelhas, e as traz para fora. E, quando tira para fora as suas ovelhas, vai adiante delas, e as ovelhas o seguem, porque conhecem a sua voz. Mas de modo nenhum seguirão o estranho, antes fugirão dele, porque não conhecem a voz dos estranhos... Todos quantos vieram antes de mim são ladrões e salteadores; mas as ovelhas não os ouviram. Eu sou a porta; se alguém entrar por mim, salvar-se-á, e entrará, e sairá, e achará pastagens... O ladrão não vem senão a roubar, a matar, e a destruir; eu vim para que tenham vida, e a tenham com abundância. Eu sou o bom Pastor; o bom Pastor dá a sua vida pelas ovelhas. Mas o mercenário, e o que não é pastor, de quem não são as ovelhas, vê vir o lobo, e deixa as ovelhas, e foge; e o lobo as arrebata e dispersa as ovelhas.... Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também me convém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor” (João 10:1-16).
Para entender este capítulo é importante ler o anterior também, porque eles fazem parte de um único discurso dirigido aos judeus. O rebanho aqui nesta parábola é Israel, não a Igreja. O curral ou aprisco das ovelhas é a Lei, que é chamada aqui de “aio” ou “tutor”, como um professor particular que uma família rica contrata para educar seus filhos. O papel da Lei fica muito claro lendo esta passagem:
“Mas, antes que a fé viesse, estávamos guardados debaixo da lei, e encerrados [como dentro de um curral] para aquela fé que se havia de manifestar. De maneira que a lei nos serviu de aio [tutor], para nos conduzir a Cristo, para que pela fé fôssemos justificados. Mas, depois que veio a fé, já não estamos debaixo de aio” (Gálatas 3:23-25).
Esse curral possui uma porta pela qual só pode passar quem tiver as credenciais necessárias. Os profetas do Antigo Testamento deixaram claras estas credenciais nas dezenas de profecias que falam da vinda do Messias. Apenas um que cumprisse todas elas seria o Ungido ou Escolhido credenciado para entrar no curral, e foi o que Jesus fez. Não faltaram ladrões e salteadores, que são os que não entram pela porta, porque não estão autorizados, mas por outro lugar. Estes são os falsos profetas que tentaram se apoderar do povo de Israel. Um exemplo disso eram os fariseus.
O porteiro provavelmente represente a terceira Pessoa da Trindade, o Espírito Santo, que juntamente com o Pai colocou seu selo no ministério do verdadeiro Pastor, Jesus, quando este foi batizado no batismo de João Batista. Os estranhos podem ser também pessoas como os fariseus, que queriam se aproveitar das ovelhas.
Mas o melhor da passagem é o que Pastor faz ao entrar no curral pela porta. Ele não passa a incrementar o curral, pintá-lo, trocar o piso. Não! Ele veio para tirar suas ovelhas do curral. Não veio destruir ou abolir o curral, mas simplesmente esvaziá-lo de ovelhas. No Antigo Testamento Deus tratou com um povo de maneira nacional. Aqui vemos ele chamando não o rebanho inteiro para fora do curral, mas cada ovelha, uma a uma. “As ovelhas ouvem a sua voz, e chama pelo nome às suas ovelhas, e as traz para fora” (João 10:3). Essas ovelhas que ele chama e saem são nascidas de Deus, como ensina João 3.
Repare que Jesus disse isso ainda antes de passar pela morte, porque essa obra de tirar as ovelhas do curral não dependia de ele morrer na cruz, mas simplesmente de chamar as ovelhas e elas escutarem sua voz. Depois de chamá-las elas o seguem e as leva para pastagens que ficam fora do curral. Não existem cercas ali, como no confinamento de um curral, e o comportamento das ovelhas agora é outro. Se antes elas eram mantidas dentro de certo comportamento pela imposição da Lei e dos mandamentos, agora não é um cercado que as reúne, mas a atração do Pastor. Elas não mais são conservadas um só rebanho porque estão dentro da Lei, mas porque têm o Pastor como seu centro.
Jesus ainda menciona ter outras ovelhas que não faziam parte desse aprisco que era Israel, e é aí que nós gentios também entramos. “Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também me convém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor” (João 10:16). Um pouco ante ele fala de outra personagem, “o mercenário”. Mercenário é um soldado que vai à guerra em troca de salário, e não por convicção. Aqui o mercenário não é como o ladrão ou salteador, mas alguém que se coloca na função de cuidador do rebanho, porém visando lucro. Ele não é o verdadeiro Pastor, porque assim que vem o lobo o mercenário foge, e é no “lobo” que podemos enxergar uma figura do diabo.
Embora a parábola tenha sido dita com respeito a Israel, hoje nós cristãos podemos desfrutar dessa bendita posição como aqueles que se encontram fora do curral ou aprisco de Israel, atraídos por Cristo e tendo somente a ele como nosso centro. Norman Berry, em seu comentário “Chapter-a-Day” coloca desta maneira:
“As 'outras ovelhas' somos nós, gentios. Alguns escutaram o Pastor. Repare que há um só rebanho. Ele é o Pastor. Nós permanecemos próximos a ele porque ele atrai nossos corações. Não existe uma cerca ao nosso redor, não existe uma lei, mas ele é o Centro de atração.”