Posso evangelizar com folhetos?
Alguns cristãos acreditam que só devemos evangelizar da maneira como os primeiros cristãos evangelizavam, isto é, pregando em ruas, praças, salões ou residências. Isso excluiria meios modernos, como distribuição de folhetos e muito menos mensagens em mídias eletrônicas. Obviamente não vemos uma evangelização por folhetos nos tempos bíblicos porque o papel talvez não fosse conhecido na Palestina do primeiro século, apesar de já ter surgido no Oriente onde foi inventado. Nos tempos bíblicos os textos eram escritos manualmente em placas de argila, tábuas de madeira, placas de metal, peles de animais e papiros, uma espécie de papel rudimentar. A imprensa viria bem depois (apesar de ter sido inventada no Oriente antes de Gutemberg).
Se hoje nos limitássemos a utilizar os meios (mídias) do Antigo e Novo Testamento nossas Bíblias viriam em rolos de peles, pois onde você lê "livro" na Bíblia o original significa "rolo". A importância da evangelização não está na mídia utilizada, mas na mensagem. Hoje evangelizamos usando multimídia, além do papel, mas já ouvi argumentos de irmãos contrários à utilização da Internet por ser um meio que reúne muita perversão. O mesmo pode ser dito da mídia papel e do livro. Entre em uma biblioteca e você encontrará uma Bíblia ao lado de um livro de doutrina pagã ou um romance erótico. Do mesmo modo a Web é também uma vasta livraria e, porque o mundo jaz no maligno, até mesmo a pura e santa Palavra de Deus será encontrada nas mesmas mídias (ou meios, como papel, etc.) utilizadas pelo inimigo de nossas almas.
A maravilha do folheto evangelístico, que hoje também pode ser produzido na forma de mensagens breves em mídia eletrônica além de áudio ou vídeo, está na rapidez como ele coloca um pecador diante da Palavra de Deus. Hc 2:2 diz: "Então o Senhor me respondeu, e disse: Escreve a visão e torna bem legível sobre tábuas, para que a possa ler quem passa correndo". Originalmente essas tábuas ou "tabletes" talvez fossem de madeira ou argila, mas o foco estava na facilidade como podiam transmitir a mensagem. Assim é o folheto evangelístico e a própria Bíblia que hoje pode ser encontrada em forma de "tablete" nas mãos de cada pessoa que possua um smartphone ou tablet.
Mas, voltando especificamente à mídia papel, o que fazer quando a evangelização usando folhetos impressos é proibida? Na verdade, é preciso diferenciar as coisas. Há lugares onde a evangelização é proibida, independente do meio utilizado, como acontece em alguns países islâmicos. Mas há lugares, inclusive no Brasil, onde a panfletagem é proibida, independente se tenha cunho evangelístico ou comercial para a venda de produtos, imóveis, serviços etc. Somos ensinados a obedecer as autoridades, por isso é preciso sabedoria e cuidado no modo como evangelizamos para não transgredirmos alguma lei, não contra a evangelização, mas contra o meio utilizado.
Se eu estiver em um lugar onde exista uma lei dizendo ser proibido evangelizar de camisa preta, terei o cuidado de usar uma camisa branca. Estarei evangelizando sem desrespeitar a lei. Mas se a lei disser que é proibido evangelizar de qualquer maneira, então serei obrigado a transgredir esse mandamento de homens para me ater ao mandamento de Deus, que diz: "Pregues a palavra, instes a tempo e fora de tempo" (2 Tm 4:2). Pedro, que fora preso por pregar o evangelho, deixou claro que não iria parar de evangelizar, dizendo às autoridades: "Mais importa obedecer a Deus do que aos homens” (Atos 5:29).
Mas o cristão sábio procurará andar neste mundo sem causar escândalo “Portai-vos de modo que não deis escândalo nem aos judeus, nem aos gregos, nem à igreja de Deus... Não dando nós escândalo em coisa alguma, para que o nosso ministério não seja censurado" (1 Co 10:32; 2 Co 6:3), fazendo a obra tendo sempre em mente a admoestação do Senhor: "Eis que vos envio como ovelhas ao meio de lobos; portanto, sede prudentes como as serpentes e inofensivos como as pombas” (Mt 10:16).
Infelizmente alguns gostam de ser perseguidos porque isso faz com que se sintam mártires, e costumam citar: "Todos os que piamente querem viver em Cristo Jesus padecerão perseguições” (2 Tm 3:12). Pessoas assim acham que quando não estão sendo perseguidos é porque não estão fazendo a obra de Deus. No caso da evangelização por folhetos em lugares onde a panfletagem é proibida devemos nos lembrar da passagem: "Que nenhum de vós padeça como homicida, ou ladrão, ou malfeitor, ou como o que se entremete em negócios alheios; Mas, se padece como cristão, não se envergonhe, antes glorifique a Deus nesta parte” (1 Pe 4:15-16). Assim, se algum cristão for advertido, multado ou preso por distribuir folhetos em local proibido é bom perguntar a si mesmo se está sofrendo perseguição por sua fé ou por ter violado a lei.
Em algumas denominações religiosas existe uma pressão grande pela evangelização e às vezes o objetivo nem é a conversão de pecadores a Cristo, mas o aumento do faturamento da "igreja". Seus membros são coagidos a evangelizar às vezes com ameaças de perda da salvação ou de maldição. É muito usado o versículo de Ezequiel 3:18 que fala de Deus cobrando do profeta o sangue do ímpio que morrer sem ter sido avisado de sua impiedade. Se observar o contexto verá que tudo ali tem a ver com o profeta Ezequiel, a quem foi dada aquela ordem relacionada a uma missão específica para a qual Deus o enviava como atalaia para Israel. Quem achar que o contexto não é importante e que a passagem vale para qualquer um então sugiro que saia na rua, procure uma prostituta e case-se com ela, porque foi isso que Deus ordenou que o profeta Oseias fizesse: "Vai, toma uma mulher de prostituições" (Os 1:2).
Eu já distribuí muitos folhetos nas ruas, mas sem ser mandado por ninguém que não fosse o desejo colocado por Deus em meu coração. É errado ordenar que alguém saia por aí pregando o evangelho se essa pessoa ainda não teve um exercício com Deus a respeito disso e nem está sendo dirigida por ele. Eu utilizo a Internet para evangelizar, mas seria errado eu exigir de outros a mesma coisa. Se faço isso é porque senti como sendo algo que o meu Senhor queria que eu fizesse, e se meu irmão não faz do mesmo modo é porque deve ter um exercício diferente com seu Senhor. Acredito que no céu ficaremos surpresos quando descobrirmos que irmãos e irmãs que raramente eram vistos estavam engajados muito mais na conversão de almas do que muitos que moram nos púlpitos.
Podemos até ter desejo de fazer algo, mas devemos ser dirigidos pelo Senhor, e não por um irmão ou uma organização. Se você acha que não existe "contraindicação" em pregar o evangelho, então ficará surpreso com esta passagem: "E, passando pela Frígia e pela província da Galácia, foram impedidos pelo Espírito Santo de anunciar a palavra na Ásia” (Atos 16:6). Um cristão que faz algo que não seja sob a direção do Espírito Santo estará fazendo isso na carne. Cada um deve ter o seu próprio exercício para com Deus de como evangelizar, e querer se intrometer no modo como o Senhor deseja usar um irmão não me parece aconselhável, principalmente quando me lembro do que o Senhor disse a Pedro:
"E Pedro, voltando-se, viu que o seguia aquele discípulo a quem Jesus amava... disse a Jesus: Senhor, e deste que será? Disse-lhe Jesus: Se eu quero que ele fique até que eu venha, que te importa a ti? Segue-me tu” (Jo 21:20-22).
Hoje em minha cidade é proibido distribuir folhetos nas ruas ou fazer panfletagem, seja de mensagens do evangelho, seja de propaganda comercial. Uma vez a Editora Verdades Vivas foi notificada porque alguém tinha comprado e distribuído folhetos no centro da cidade e a calçada ficou cheia de folhetos recusados. Para evitar a multa foi preciso explicar para a prefeitura que a distribuição não era da editora, mas de pessoas que compravam o material. No próprio folheto estava claro que o material não era para ser usado de forma a sujar as calçadas.
Em nosso país ainda não existe proibição à evangelização, mas existe proibição conta panfletagem em algumas cidades e também em lugares como aeroportos, escolas e shopping centers, independentemente de ser evangelho ou propaganda. Não acredito ser correto transgredir a lei para entregar folhetos nesses lugares, mas não sou eu quem vai impedir alguém de fazer isso, pois essa é uma questão entre aquele que distribui e seu Senhor. Mas sempre é possível cumprir a lei (evitando a panfletagem) e mesmo assim evangelizar as pessoas nesses lugares. Ao invés de espalhar folhetos para todo lado, pode ser bem mais eficaz levar alguns no bolso para dar a alguém com quem temos contato direto, como a balconista, o frentista do posto de gasolina, a pessoa sentada ao lado no ônibus etc. Em casos assim é possível valorizar o folheto dizendo coisas como "Tenho um presente para você" ou "Esta mensagem aqui me ajudou muito e poderá ajudar você também".
Às vezes deixo um folheto dentro da revista de bordo do avião ou "esquecido" junto com as revistas em algum consultório. A leitura tem mais valor se a pessoa ficar curiosa por saber o que é aquilo. Eu me lembro de estar na rodoviária de São Paulo e um senhor ao meu lado visivelmente querendo me entregar um folheto (tinha um maço em sua mão), mas todo tímido. Eu, da minha parte, ainda era incrédulo e estava louco de curiosidade para ler o que ele tinha na mão, mas pelo jeito ele não teve coragem. Aí ele se levantou e "esqueceu" um folheto no banco, o qual evidentemente acabei lendo. Não me converti por efeito direto daquele folheto, mas algum tempo depois e hoje consigo lembrar de várias situações semelhantes e posso ver que faziam parte do processo de afunilamento no qual Deus estava me colocando até me levar a Cristo.
A pregação oral do evangelho, em ruas, praças, escolas, salões etc., é sempre bastante eficaz. Já fiz evangelização em ruas, porém essa atividade tem ficado cada vez mais difícil por causa dos escândalos causados por pregadores de certas denominações que mais parecem querer mandar todo mundo para o inferno do que apresentar o céu às pessoas. Mas se alguém sentir-se chamado pelo Senhor para pregar a céu aberto é importante fazê-lo. Muitas pessoas se convertem ao ouvirem o evangelho assim e, mais uma vez, cada um deve dar contas ao seu Senhor e não a homens.
Quando trabalhava no centro de São Paulo costumava gastar parte de meu horário de almoço para ouvir um pregador no calçadão perto do Teatro Municipal. Ao contrário daqueles que costumamos ver por aí, que ficam dando socos na Bíblia e fazendo voz de monstro para assustar os transeuntes, esse falava do evangelho com uma paixão e um brilho no olhar que realmente cativava as pessoas. Falava do amor, da salvação, do perdão, da obra de Cristo. Conversei com ele algumas vezes e me contou que havia se convertido lendo uma Bíblia que um Testemunha de Jeová deixara em seu carro. Mesmo lendo aquela Bíblia com seu texto adulterado pela Sociedade Torre de Vigia, que nega a divindade de Cristo, acabou crendo em Jesus, Deus e Homem.
Ele não era um pregador "profissional" ou mandado por alguma "igreja", mas tinha o dom e aproveitava seu horário de almoço para pregar. Curiosamente ele estava sendo processado pelo presidente de uma farmacêutica multinacional cuja sede ficava por ali e não aguentava mais ouvir o evangelho cujo som era canalizado até o último andar de seu edifício. Entrou com uma ação alegando que ele usava amplificador de som sem autorização da prefeitura, mas ele recorreu provando que tudo o que possuía era uma voz potente.