O que você diz ser? Cristão? Protestante? Evangélico?

Sua dúvida às vezes também é a minha: O que dizer às pessoas quando perguntam qual é “minha religião”? Obviamente não posso dizer que sou batista, presbiteriano ou católico, já que não pertenço a qualquer denominação. Também não tem nada a ver eu me identificar como “calvinista” ou “arminianista”, pois não sou nem de Calvino, nem de Armínio, nem “...de Paulo... de Apolo... de Cefas”. Então o que eu digo que sou quando alguém me pergunta?

Isso depende muito. Um irmão que viajava visitando algumas assembleias de irmãos, distribuindo literatura e pregando o evangelho teve um problemão ao atravessar a fronteira do Canadá para entrar nos Estados Unidos (ele é naturalizado Canadense). Quando perguntado o que iria fazer nos Estados Unidos, ele ficou tentando explicar para o guarda que iria fazer uma espécie de trabalho missionário, mas não era missionário no sentido profissional da coisa e nem tinha um visto profissional, mas de turista, e que reunia numa igreja que não era igreja no sentido que o guarda entendia...

Ora, se até cristãos dificilmente conseguem enxergar além dos costumes que a cristandade impôs durante dois mil anos, o que dizer de um desconfiado guarda de fronteira? Por pouco ele não foi preso (um irmão brasileiro estava com ele e me contou) porque parecia mais que estava tentando enrolar o guarda e escondendo o real objetivo de sua viagem.

Então o jeito é sermos simples como as pombas e astutos como a serpente. Se estou no elevador domingo de manhã e alguém me pergunta aonde vou, eu respondo que vou à igreja. Não tenho a pretensão de achar que uma viagem de elevador seja tempo suficiente para explicar que vou a uma reunião de irmãos congregados ao nome do Senhor, que é uma assembleia ou igreja, em um salão que não é uma igreja e nem um templo, mas cujas pessoas estão ali congregadas ao nome de Jesus expressando a verdade de que há um só corpo, etc... Se tentar fazer isso as pessoas dos outros andares vão começar a bater na porta do elevador.

Se vou preencher algum formulário, posso tanto assinalar “evangélico” como “outros” no item “religião”. Em algumas situações é melhor se identificar como “evangélico” ou “protestante” para se distinguir de “católico”, embora tecnicamente eu não me considere evangélico ou protestante, pois evangélico pressupõe pertencer a uma denominação protestante. Além disso, dependendo da situação, quando você diz ser “evangélico” o outro imediatamente o associa àqueles vendedores de cura e prosperidade da TV.

Na maioria das vezes, quando a pessoa pergunta o que sou, digo que sou cristão convertido a Jesus em 1978 ou há trinta e poucos anos. Isso mostra que, seja lá o que o outro vai pensar, é Jesus meu foco. Levar a conversa para o nome de Jesus pode ajudar também a pegar o gancho do evangelho ou de outras verdades relacionadas à Pessoa do Salvador.

Em alguns momentos posso dizer que sou convertido a Jesus de uma maneira que deixe bem claro que não tenho quase nada a ver com meu interlocutor e suas ideias, em outros momentos posso até fazer o contrário, se o que desejo é encontrar algo em comum para podermos entabular uma conversa.

Neste sentido eu me lembro do Senhor à beira do poço em João4, quando traz o assunto “água” à tona, pois era essa a preocupação da mulher. Ou do apóstolo Paulo em Atos 17:23, quando dentre dezenas de ídolos gregos consegue encontrar algo de positivo (o “Deus desconhecido”) e a partir daí começar a pregar.

Por exemplo, se encontro um católico que se apresenta com um brilho no olhar como alguém que verdadeiramente crê em Jesus, posso dizer que “eu também me converti a Cristo há uns 30 anos”. Isso permite que eu continue a conversa e tenha a oportunidade de trazer alguma informação nova a ele sobre a segurança da salvação, por exemplo. A grande maioria dos católicos e também dos protestantes acredita que pode perder a salvação. Quando não acham que o recebimento seja por mérito, ao menos consideram que o mérito seja a causa de sua conservação.

Daí ser importante detectar o que realmente quero com aquela conversa. Se vejo uma alma aflita em busca de salvação, não vou ficar falando do corpo de Cristo, de como se congregar etc. Se vejo que a pessoa já é convertida, porém não tem a certeza ou a segurança de sua salvação eterna, também não há por que falar de outra coisa que não seja a eficácia eterna do sangue de Jesus.

Devo sempre perguntar a mim mesmo como posso ajudar aquela pessoa naquele momento, seja ela incrédula ou irmã na fé, e não adotar uma posição de fariseu que olha para todo mundo como se fossem publicanos. Devo sempre lembrar que não é o quanto uma pessoa conhece da Bíblia que importa, mas o quanto de comunhão ela tem com o Senhor. Pode ter certeza de que encontro muita gente que conhece menos da Bíblia e mais do Autor do que eu.

Existe uma linha tênue nisso tudo, pois, ao mesmo tempo em que devemos estar solícitos e abertos às pessoas para atraí-las a Cristo ou ajudá-las a entender melhor a Palavra de Deus, por outro, pode ser preciso levantar um muro alto para ela perceber que estamos em terrenos completamente diferentes, ou a pessoa pode achar que estamos falando da mesma coisa.

Lembro-me de ter visto um irmão em Cristo conversando com um rapaz desconhecido sobre a igreja, o lugar de adoração, etc. e tal. Os dois pareciam estar concordes e conversando em terreno comum, pois o outro também dizia concordar com tudo aquilo.

Alguma coisa fez soar um alarme em mim e me intrometi na conversa. Interrompi os dois e perguntei à queima-roupa: “Você crê que Jesus é Deus vindo em carne?”. Sua resposta foi não. O irmão que conversava com ele estava perdendo tempo falando de um assunto que não tinha qualquer significado ou importância para alguém que negava uma verdade fundamental: a divindade de Cristo (não me lembro se o rapaz era Mórmon ou Testemunha de Jeová).

Para resumir: Não existe uma regra de como o cristão deve se identificar. O importante é estar aberto à direção do Senhor em cada caso e principalmente evitar qualquer tipo de identificação que o coloque em posição de vanglória ou soberba em relação ao outro.

Lembre-se de que vivemos tempos difíceis e não falta muito para o próprio Deus chamar de “meretriz” aquela que deveria ter sido conhecida neste mundo como “noiva”. O modo como me apresento e as pessoas com as quais me associam poderá criar a impressão nos outros, se eu sou realmente alguém que crê em Jesus como Salvador, ou apenas mais um levado pela corrente da religião cristã institucionalizada que se prostitui com os reis deste mundo.

“ ... a grande Babilônia e se tornou morada de demônios, e abrigo de todo espírito imundo, e refúgio de toda ave imunda e aborrecível! Porque todas as nações beberam do vinho da ira da sua prostituição. Os reis da terra se prostituíram com ela. E os mercadores da terra se enriqueceram com a abundância de suas delícias. E ouvi outra voz do céu, que dizia: Sai dela, povo meu” (Ap 18:2-4).