O cristão não deve comer sangue?
Obviamente o que vou dizer não tem nada a ver com a proibição de transfusão de sangue feita pela religião denominada “Testemunhas de Jeová”, que é uma interpretação equivocada das passagens bíblicas. Sua dúvida é simplesmente a respeito de se alimentar de sangue de animais em nossas refeições.
Você escreveu: “ não há impedimento bíblico [para comer sangue], pois Jesus deixou bem claro que não devemos viver mais pela lei e sim pela sua graça, a única coisa que nos salva é ele e nada nos afasta dele” .
Embora não exista uma lei que o cristão deva seguir, a proibição de comer sangue é anterior à lei dada a Moisés, portanto dirigida a todos os seres humanos e não apenas aos israelitas.
Mais tarde, em Atos encontramos as instruções dadas pelos apóstolos aos gentios convertidos (no caso nós também o somos) para que não praticássemos idolatria e prostituição, e também que não comêssemos sangue e carne sacrificada aos ídolos. Evidentemente nada disso fará um crente perder a salvação, mas se ele ama seu Senhor irá querer agradá-lo nisto também.
(Atos 15:19-20, 29) “ Por isso julgo que não se deve perturbar aqueles, dentre os gentios, que se convertem a Deus. Mas escrever-lhes que se abstenham das contaminações dos ídolos, da prostituição, do que é sufocado e do sangue ... Que vos abstenhais das coisas sacrificadas aos ídolos, e do sangue, e da carne sufocada, e da prostituição , das quais coisas bem fazeis se vos guardardes”.
Basicamente as coisas que a Palavra diz para não fazermos são:
— Comer coisas sacrificadas aos ídolos: alimentos usados nos sacrifícios ou até mesmo a carne desses sacrifícios. Para nós gentios tal “proibição” (entre aspas mesmo) é mais para não sermos causa de tropeço a outros, como Paulo explica em 1 Coríntios 8 (e também em Romanos 14).
(1 Co 8:4-13) “ Quanto, pois, ao comer das coisas sacrificadas aos ídolos, sabemos que o ídolo nada é no mundo, e que não há outro Deus, senão um só.... Entretanto, nem em todos há esse conhecimento; pois alguns há que, acostumados até agora com o ídolo, comem como de coisas sacrificadas a um ídolo; e a sua consciência, sendo fraca, contamina-se. Não é, porém, a comida que nos há de recomendar a Deus; pois não somos piores se não comermos, nem melhores se comermos. Mas, vede que essa liberdade vossa não venha a ser motivo de tropeço para os fracos. Porque, se alguém te vir a ti, que tens ciência, reclinado à mesa em templo de ídolos, não será induzido, sendo a sua consciência fraca, a comer das coisas sacrificadas aos ídolos? Pela tua ciência, pois, perece aquele que é fraco, o teu irmão por quem Cristo morreu. Ora, pecando assim contra os irmãos, e ferindo-lhes a consciência quando fraca, pecais contra Cristo. Pelo que, se a comida fizer tropeçar a meu irmão, nunca mais comerei carne, para não servir de tropeço a meu irmão”.
— Prostituição ou impureza sexual: este problema, que era generalizado entre os gentios daquela época, volta a ter a mesma dimensão hoje em um mundo cada vez menos interessados nos valores cristãos. Quem estuda os costumes no império romano descobre que algumas coisas eram bem aceitas na sociedade da época: sexo fora do casamento, adultério, prostituição, pornografia (inclusive decorando as paredes das casas de família), homossexualismo, pedofilia (permitia-se aos homens casados terem meninos escravos para este fim), aborto e infanticídio (bebês indesejados eram simplesmente abandonados à beira das estradas para morrerem e serem comidos por cães). Lembre-se de que a sociedade que aceitava essas coisas não era nenhum grupo de bárbaros, mas o império mais desenvolvido que existiu até então, e que nos legou coisas como o direito romano e a privada com água encanada e descarga, esta só tendo sido “redescoberta” há 200 ou 300 anos.
(1Ts 4:3-5) “ Porque esta é a vontade de Deus, a saber, a vossa santificação: que vos abstenhais da prostituição, que cada um de vós saiba possuir o seu vaso em santidade e honra, não na paixão da concupiscência, como os gentios que não conhecem a Deus ” .
( Ef4:17-20) “ Portanto digo isto, e testifico no Senhor, para que não mais andeis como andam os gentios , na verdade da sua mente, entenebrecidos no entendimento, separados da vida de Deus pela ignorância que há neles, pela dureza do seu coração; os quais, tendo-se tornado insensíveis, entregaram-se à lascívia para cometerem com avidez toda sorte de impureza. Mas vós não aprendestes assim a Cristo ” .
— Comer animais sufocados ou estrangulados: isto se refere a animais mortos e não sangrados. Quem já viu um frango cozido ou assado depois de morto com o pescoço quebrado ou por asfixia e sem ser sangrado sabe que a carne tem a cor bem escura, por causa do sangue que permanece nela. Esta proibição é anterior à lei dada a Moisés, pois aparece em Gênesis 9:4 para o mundo pós-dilúvio. Portanto não é uma proibição que se limite a Israel, como são muitas que você encontra na lei mosaica.
— Comer sangue: pelas mesmas razões acima, trata-se de uma ordem dada antes da Lei, portanto valendo para todos os habitantes do planeta depois do dilúvio. Naquela ocasião Deus deu aos homens, até então vegetarianos, os animais como alimento, colocou nos animais o medo dos homens, proibiu comer carne com sangue (animais sufocados, chouriço, frango ao molho pardo feito com sangue etc.), instituiu o governo humano e a pena de morte. Estas coisas nunca foram revogadas por Deus, embora os homens tenham feito algumas delas de modo contrário ao que Ele ordenou.
(Gn 9:2-6) “ Terão medo e pavor de vós todo animal da terra, toda ave do céu, tudo o que se move sobre a terra e todos os peixes do mar ; nas vossas mãos são entregues. Tudo quanto se move e vive vos servirá de mantimento, bem como a erva verde; tudo vos tenho dado . A carne, porém, com sua vida, isto é, com seu sangue, não comereis . Certamente requererei o vosso sangue, o sangue das vossas vidas; de todo animal o requererei; como também do homem, sim, da mão do irmão de cada um requererei a vida do homem. Quem derramar sangue de homem, pelo homem terá o seu sangue derramado ; porque Deus fez o homem à sua imagem”.