O pastor de minha igreja adota o título de Profeta. Isso é correto?

Depois de ler algo que escrevi onde expliquei que os dons de apóstolo e profeta só existiram no início da igreja, você ficou com dúvidas sobre o “pastor” da igreja que frequenta. Você disse que ele diz ser “profeta”, e você acredita que ele esteja dizendo isso no sentido de falar da Palavra de Deus. Sua dúvida é: Seria correto alguém hoje se intitular “Profeta”?

Em Efésios diz que Cristo, depois que subiu às alturas, “deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores, querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo” (Ef 4:11-12). Os dons de apóstolo e profeta realmente cessaram com a morte dos mesmos apóstolos e profetas do Novo Testamento e, portanto, não existem mais. Restam evangelistas, pastores e doutores.

Portanto não existe mais a profecia no sentido dado aos profetas do início, que era de revelarem a Palavra numa época onde ninguém podia dizer “Vamos abrir nossa Bíblia em..”. Eles não iam às reuniões da igreja com um livro nas mãos como fazemos hoje, mas a Palavra era revelada de primeira mão pelos apóstolos e profetas.

Hoje qualquer cristão quando fala da Palavra de Deus que já foi revelada e escrita, está profetizando no sentido de estar proferindo a Palavra de Deus. Então neste sentido sim, a carta aos Coríntios ensina que nas reuniões da igreja “falem dois ou três profetas, e os outros julguem... Porque todos podereis profetizar, uns depois dos outros; para que todos aprendam, e todos sejam consolados. E os espíritos dos profetas estão sujeitos aos profetas” (1 Co 14:29-32).

Mas isso é muito diferente de alguém usar “Profeta” como título ou função, o que seria uma grande pretensão principalmente quando diz que “todos podereis profetizar”. Deverão todos então usarem um crachá com o título “Profeta”? É claro que não. Isso é coisa mundana, tipo gente que gosta de ser chamado de “Doutor”. Você teria coragem de andar com um crachá escrito “Profeta” ou “Apóstolo”, ou qualquer título eclesiástico para se sobressair em relação aos seus irmãos? “Reverendo”, por exemplo, que é o mesmo que dizer: “Ei, vocês, sou Reverendo, sou digno de ser reverenciado!”.

Jesus criticou duramente os clérigos judeus e deixou bem claro que essa distinção entre clérigos e leigos não deveria existir entre seus discípulos, os quais seriam todos chamados simplesmente de “irmãos”. “E fazem todas as obras a fim de serem vistos pelos homens; pois trazem largos filactérios, e alargam as franjas das suas vestes, e amam os primeiros lugares nas ceias e as primeiras cadeiras nas sinagogas, e as saudações nas praças, e o serem chamados pelos homens; Rabi, Rabi. Vós, porém, não queirais ser chamados Rabi, porque um só é o vosso Mestre, a saber, o Cristo, e todos vós sois irmãos” (Mt 23:5-8).

Não se engane: a carne — e principalmente a carne religiosa — sempre irá querer ser alguém e principalmente alguém mais distinto e elevado que os demais irmãos. Por isso a religião cristã emprestou do judaísmo a noção da divisão da congregação entre “clero” e “leigos”. Os monges da Idade Média não tinham alguém em posição elevada entre eles, pois isso iria contra a própria filosofia de igualdade em que viviam nos mosteiros. Eles diziam que eram todos iguais entre si, por isso ninguém levava um título que o diferenciasse de seus irmãos. Como o ser humano sempre arranja um jeitinho, eles acabaram adotando para quem se sobressaía entre eles a expressão “O mais igual dentre os iguais”.