Cristo devolverá o reino ao Pai?

Você ficou com dúvidas sobre o que escrevi no texto “O que significa o reino dos céus”, particularmente quando escrevo que “Quando o Reino do Filho do Homem terminar, o Filho do Homem entregará o Reino a seu Pai (1 Co 15:24), fazendo com que o Reino seja o Reino do Pai para toda a eternidade”.

Sua dúvida surgiu por que em Efésios 1:10 encontramos: "para a dispensação da plenitude dos tempos, de fazer convergir em Cristo todas as coisas, tanto as que estão nos céus como as que estão na terra”. Se todas as coisas convergirão em Cristo na "dispensação da plenitude dos tempos”, como poderia ele devolver o reino ao Pai e esse reino passar a ser o "reino do Pai”.

Não me lembro de quando escrevi isso e provavelmente foi há muito tempo, e nem ao menos sei se foi algo original meu ou se traduzi de alguma coisa que estava lendo. É comum às vezes, ao responder um e-mail, eu introduzir trechos de leituras que ajudem a esclarecer a pessoa que me escreveu, sem me preocupar muito em anotar ou citar a fonte. Afinal, o que você encontra no “O que respondi...” são minhas correspondências, e não respondo e-mails com a mesma preocupação que teria um jornalista ou pesquisador ao escrever um artigo.

Voltando à sua dúvida, pesquisei alguma coisa que talvez ajude a responder. São comentários do século 19 feitos por J. N. Darby sobre o capítulo 15 de 1 Coríntios. Encontrei alguns livros de Darby traduzidos, mas não o comentário de 1 Coríntios, que é onde ele fala do assunto. Vou traduzir a seguir os trechos do comentário de Darby onde ele fala do assunto de nossa conversa. É importante lembrar que Darby escreve em um estilo nem sempre fácil de digerir, por causa do volume de informação que ele supõe que o leitor já tenha ao ler suas linhas.

"... Quando ele tiver colocado todos os seus inimigos debaixo de seus pés, e tiver devolvido o reino ao seu Pai (pois o reino nunca foi tirado dele, e nem dado a outro, como acontece com os reinos humanos), então o próprio Filho se sujeitará àquele que colocou todas as coisas sob seu controle, a fim de que Deus possa ser tudo em todos...”

"... Quando o Cristo Homem, o Filho de Deus, tiver consumado de fato essa subjugação, ele entregará de volta a Deus o poder universal que lhe foi confiado, e cessará o reino de intermediação, o qual ele esteve em suas mãos como Homem. Ele estará novamente em sujeição, como esteve em seus dias na terra. Ele não deixará de ser um com o Pai, do mesmo modo como o foi enquanto vivia em humilhação na terra e dizia, ao mesmo tempo, ‘antes que Abraão fosse, EU SOU’. Mas o governo de intermediação do homem cessará — será absorvido na supremacia de Deus, ao qual já não haverá oposição. Cristo assumirá seu lugar eterno, um homem, a cabeça de toda a família redimida, sendo ao mesmo tempo Deus bendito para sempre, um com o Pai. No Salmo 2 vemos o Filho de Deus, como tendo nascido na terra, apesar de Rei em Sião, ser rejeitado ao se apresentar na terra; no Salmo 8 vemos o resultado de sua rejeição, sendo exaltado como Filho do homem e cabeça de tudo o que Deus criou. Então nós o encontramos aqui [Neste capítulo] entregando a autoridade que lhe foi confiada, e reassumindo a posição normal de humanidade, a saber, aquela de sujeição àquele que colocou todas as coisas sob os seus pés; mas em meio a tudo isso, ele nunca mudou sua natureza divina, e nem tampouco sua natureza humana — exceto no aspecto da troca da humilhação pela glória. Mas Deus neste capítulo é agora tudo em todos, e o governo especial do homem na Pessoa de Jesus — um governo ao qual a assembleia está associada (veja Efésios 1:20-23, que é uma citação do mesmo Salmo) — está inserida na imutável supremacia de Deus, a relação final e normal de Deus com suas criaturas. Vemos que o Cordeiro é omitido no que é dito em Apocalipse 21:18, que fala do mesmo período...”

"... Encontramos assim nesta passagem a ressurreição pelo homem — havendo a morte entrado na Criação pelo homem; o relacionamento dos santos com Jesus, a fonte de todo o poder de vida, a consequência disso sendo a sua ressurreição, e também dos seus em sua vinda; o poder sobre todas as coisas entregue a Cristo, o homem ressuscitado; depois de tudo o reino sendo devolvido a Deus Pai, o tabernáculo de Deus com os homens, e o homem Cristo, o segundo Adão, eternamente homem e sujeito ao Supremo — esta última verdade algo de valor infinito para nós (a ressurreição dos ímpios, embora supostamente incluída na ressurreição que é introduzida por Cristo, não é o assunto direto do capítulo)...”

Também dos comentários de William MacDonald em “Believer’s Bible Commentary” traduzo o seguinte:

"Deus fez de Cristo legislador, administrador de todos os seus planos e conselhos. Toda a autoridade e poder são colocados em suas mãos. Haverá um tempo quando ele dará conta da administração que lhe foi confiada. Depois de ter trazido todas as coisas sob sua sujeição, ele entregará o reino de volta ao Pai. A criação será levada de volta a Deus em perfeitas condições. Havendo cumprido a obra de redenção e restauração para a qual ele se tornou homem, ele irá permanecer no lugar de subordinação que assumiu na sua encarnação. Se ele deixasse de ser homem depois de ter passado por tudo aquilo que Deus propôs para ele e lhe designou, o próprio vínculo de ligação do homem com Deus seria desfeito”.