Seria a Igreja o Reino Milenial de Cristo hoje?

Deus prometeu estabelecer Cristo no trono de Davi, onde Ele reinaria sobre todas as nações em Seu reino (2 Samuel 7:13-18; Jeremias 33:15-17; Salmos 110:1; Lucas 1:30-33). Considerando que hoje Cristo está sentado no trono de Deus (Atos 2:30-36; Hebreus 10:12-13) os teólogos do Pacto concluem que Ele estaria atualmente reinando em Seu reino. Por isso acreditam que nós estaríamos no período que os dispensacionalistas chamam de “Milênio” nos dias de hoje — com a diferença de sua duração ser de muito mais que mil anos. Eles insistem que esse reino não é visível e nem literal, por causa do que o Senhor disse: “O reino de Deus não vem com aparência exterior. Nem dirão: Ei-lo aqui, ou: Ei-lo ali; porque eis que o reino de Deus está entre vós.” (Lucas 17:20-21). Apesar de Apocalipse 20:4 dizer que “viveram, e reinaram com Cristo durante mil anos” eles interpretam esses mil anos no sentido alegórico.

Este é mais um caso de “non-sequitor”. Ele mistura verdade e erro, levando a conclusões equivocadas. É verdade que hoje Cristo está sentado no trono de Deus, e é verdade que Ele já “recebeu” Seu reino (Lucas 19:12, 15), e também que os cristãos estão nesse reino agora (Colossenses 1:13). Todavia, os teólogos do Pacto erram por não enxergarem que o reino possui duas fases. O Senhor ensinou que, uma vez que fosse rejeitado, o reino passaria primeiro para uma fase mística, antes que ocorresse uma manifestação pública dele (Mateus 13:10-17; 37-43). Na mesma passagem em que o Senhor ensinou que o reino não viria naquela época “com aparência exterior”, Ele também ensinou que haveria um tempo quando o reino do “filho do Homem” seria “revelado” em “Seu dia” do modo como os judeus esperavam por ele nas profecias do Antigo Testamento (Lucas 17:22-37; Daniel 7:13-14). Hoje o reino se encontra em sua fase mística, mas quando Cristo se manifestar em poder e juízo ele estará em seu estado manifesto, e todos o verão, pois então será algo literal. Estas duas fases podem ser identificadas pela letra “M”.

• O reino em mistério (Mateus 13:11).

• O reino em manifestação (1 João 3:2).

As fases podem ser também identificadas pela letra “P”.

• O reino em paciência (Apocalipse 1:9).

• O reino em poder (Marcos 9:1).

Portanto, existe uma fase presente e uma fase futura do reino dos céus. Das trinta e três vezes que a expressão “reino dos céus” é usada nas Escrituras, vinte e quatro se referem ao reino em sua fase mística presente; as outras nove tem a ver com o reino e sua manifestação pública e futura. Como foi observado nos esboços dispensacionais em Mateus, a manifestação pública do reino, prometida pelos profetas do Antigo Testamento, está presentemente em suspenso e não será estabelecida até um dia futuro (isto é, no Milênio).

Cada uma dessas fases do reino dos céus tem seu ponto de partida. A parábola em Lucas 19:11-12 indica isso. A fase do mistério começou quando o Senhor Jesus Cristo ascendeu aos céus depois de Sua morte e ressurreição. É o que indica a parábola em Lucas 19:11-12. Ele é visto no “homem nobre” (o próprio Senhor) viajando para um “país distante” (o céu) e recebendo “um reino” (Atos 1:9-11; Salmos 110:1). Mais tarde o homem nobre voltou para a prestação de contas de seus servos, aos quais haviam sido confiadas certas responsabilidades, e recompensou aqueles que foram fiéis. Isso acontecerá no Arrebatamento. O servo que demonstrou não ter fé — e provou isso escondendo sua “mina” na terra — foi julgado (Lucas 19:20-27). Isso acontecerá àqueles no reino que não tiverem fé por ocasião da Manifestação de Cristo, quando os anjos sairão para arrancar esses de entre os justos (Mateus 13:38-42; 24:37-41). Assim, o ponto de partida do reino em sua forma manifestada em poder e glória (conforme é apresentado no Antigo Testamento) ocorrerá na Manifestação de Cristo (Daniel 2:35; 7:13-14; Apocalipse 11:15).

O reino atualmente possui um caráter de mistério por não parecer que existe um reino manifesto. Pelo que se pode ver exteriormente nada indica que Deus esteja agindo neste mundo. O reino existe no presente momento em uma forma mística ou misteriosa, pois:

• Ele não possui um Rei visível.

• Ele não possui uma sede geográfica na terra.

• Ele não possui quaisquer fronteiras nacionais.

• A maioria dos que professam fazer parte dele não reconhecem a autoridade do Rei e vivem como se não existisse um Rei.

Independente destas particularidades, a fé enxerga o Rei (o Senhor Jesus Cristo) em Seu trono hoje em Seu reino. Como bons súditos em um reino, a fé leva o crente a viver em conformidade com os princípios de Sua Palavra — conforme é dada no Sermão da Montanha (Mateus 5-7) — até que o reino passe à sua fase manifesta. Deve ser observado que ainda não é feita referência ao Senhor como estando em Seu trono em sua fase de manifestação pública (Apocalipse 3:21); Ele está no momento presente assentado no trono de Seu Pai (Salmos 110:1; Hebreus 10:12).

Tanto os teólogos do Pacto como os Dispensacionalistas concordam neste atual aspecto místico do reino, mas os teólogos do Pacto não enxergam o que se segue a isso. Todavia, crer que não haverá um reino literal de mil anos ainda futuro cria mais problemas e questões do que os teólogos do Pacto gostariam de ter para lidar. Como já mencionado, tal ideia desafia a lógica quando consideramos que muitas das interpretações da Teologia do Pacto são obtidas por meio de conclusões lógicas. Por exemplo, se já estivermos no reino (milenial) agora, como interpretar espiritualmente as muitas descrições do reino nas Escrituras sem cair em algo por demais fantasioso — e até risível? Não importa a maneira que alguém decida interpretar essas descrições do reino de Cristo — alegórica ou espiritualmente — elas não fazem qualquer sentido. Seria difícil convencer alguém de que isso seja realmente verdade. Este é um aspecto da Teologia do Pacto que seus teólogos preferem não tocar, pois suas interpretações “espiritualizadas” beiram o ridículo.

Os teólogos do Pacto também fazem uso de Gálatas 4:4-5, juntamente com Efésios 1:10, para dar suporte à ideia de que a Igreja está presentemente no reino público de Cristo (isto é, o Milênio). Gálatas 4 fala da vinda do Senhor Jesus (Seu primeiro advento) na “plenitude do tempo” (Gálatas 4:4 ARA) e Efésios 1 fala de todas as coisas estando sujeitas a Ele em Seu reino na “dispensação da plenitude dos tempos”. Ao juntarem as duas expressões os teólogos do Pacto vêm com a ideia de que o reino de Cristo começou quando Ele veio ao mundo em Seu primeiro advento. Portanto, esse reino estaria seguindo seu curso desde então — o que significaria estarmos nesse reino agora.

Todavia, a “plenitude do tempo” (Gálatas 4:4 ARA) no singular e a “plenitude dos tempos” no plural são duas expressões diferentes que se referem a duas coisas diferentes. Dizer que o reino de Cristo começou quando Ele nasceu neste mundo não faz sentido. De que maneira aquele bebê na manjedoura de Belém teria estabelecido publicamente Seu reino sobre todo o mundo do modo como Efésios 1:10 apresenta? Efésios 1:10 diz que Cristo irá “fazer convergir” todas as coisas nos céus e na terra. Ele irá reconciliar moral e espiritualmente céus e terra sob Sua administração (Colossenses 1:20). Isso não aconteceu nem quando o Senhor nasceu neste mundo e nem agora! Os céus e a terra não estão reconciliados de maneira nenhuma. A terra hoje se encontra em feroz rebelião contra os céus e contra Aquele assentado ali (Salmos 2:1-3). “A dispensação da plenitude dos tempos” (Efésios 1:10) obviamente se refere a uma administração futura de Cristo que ainda não foi estabelecida.

Os teólogos do Pacto costumam negar a verdade do mistério que esteve escondido nos tempos do Antigo Testamento.

Atos 26:22 — “Mas, alcançando socorro de Deus, permaneço até ao dia de hoje, dando testemunho, tanto a pequenos como a grandes, nada dizendo, senão o que os profetas e Moisés disseram haver de acontecer”.

Aqui Paulo diz que sua pregação consistia em nada dizer senão aquilo que os profetas e Moisés haviam escrito. Para os teólogos do Pacto esta afirmação prova que Paulo não ensinava uma nova doutrina, como a que os Dispensacionalistas dizem que ele ensinou concernente ao Mistério.

Ora, se o que os teólogos do Pacto estiverem dizendo for verdade, então as Escrituras se contradizem, pois Paulo afirma claramente em Romanos 16:25, Efésios 3:5 e Colossenses 1:26 que a verdade contida no Mistério era algo que não havia sido revelado no Antigo Testamento. Considerando que as Escrituras não se contradizem, a afirmação que Paulo fez a respeito do rei Agripa deveria significar alguma outra coisa. Um olhar atento da passagem mostra que ele estava se referindo ao seu primeiro ministério de testemunhar e pregar o evangelho (Atos 20:24-25; Romanos 16:25a; Efésios 3:8; Colossenses 1:23). Ele não estava falando de seu segundo ministério que envolvia revelar a verdade do Mistério (Atos 20:27; Romanos 16:25; Efésios 3:9-10; Colossenses 1:24-27).

Se acompanharmos o que Paulo disse a Agripa, veremos que ele estava se referindo apenas ao seu ministério do evangelho. Ele qualificava sua observação, ao dizer “que o Cristo devia padecer, e sendo o primeiro da ressurreição dentre os mortos, devia anunciar a luz a este povo e aos gentios.” (Atos 26:23). Essas coisas concernentes ao Messias de Israel tinham sido com toda certeza declaradas na Lei e nos Profetas, e eram as que Paulo proclamava “a toda criatura que há debaixo do céu” (Colossenses 1:23). Nesse ministério evangélico ele não se desviou de pregar somente aquelas coisas, “nada dizendo, senão o que os profetas e Moisés disseram haver de acontecer” (Atos 26:22). Por outro lado, seu ministério de ensino, no qual o Mistério é descortinado, foi dirigido apenas a crentes (Atos 20:27; Colossenses 1:25). São coisas como ‘segredos de família’, que Paulo não proclamou a incrédulos como Agripa (Mateus 7:6), e por isso ele não fez referência àquela linha de ensino em seu testemunho diante do rei.

Efésios 3:4-5 — “... o mistério de Cristo, o qual noutros séculos não foi manifestado aos filhos dos homens, como agora tem sido revelado pelo Espírito aos seus santos apóstolos e profetas”.

Os teólogos do Pacto colocam seu foco nas palavras “como agora tem sido” desta passagem, e insistem que a verdade do Mistério era conhecida nas outras épocas, mas não “como agora tem sido”. Eles acham que aquelas coisas teriam sido reveladas nos tempos do Antigo Testamento, mas simplesmente não teriam sido entendidas por aqueles que viveram então (1 Pedro 1:9-12).

Todavia, esta interpretação do versículo 5 contradiz o resto do contexto, que segue dizendo que a verdade do Mistério estava oculta “desde os séculos” ou princípio do mundo (Efésios 3:9). Portanto, ela não era conhecida dos santos do Antigo Testamento. Se os santos do Antigo Testamento a conhecessem — mesmo que fosse apenas um pouco — ela não estaria oculta, e esse silêncio concernente ao Mistério, do qual Romanos 16:25 fala, não teria existido.

O erro vem de um simples equívoco na interpretação das sutilezas da linguagem. Paulo estava usando a frase “como agora tem sido” com a finalidade de comparar duas coisas — a ausência do conhecimento concernente ao Mistério da parte daqueles vivendo “noutros séculos” e aquilo que “agora tem sido revelado” por intermédio dos apóstolos e profetas do Cristianismo. Costumamos igualmente utilizar a palavra “como” com o mesmo objetivo quando comparamos coisas. Podemos falar de uma coisa como oposta a outra coisa. Isto não significa que as coisas que estamos comparando sejam iguais, mas sim que são opostas. As palavras “como agora tem sido” poderiam ser interpretadas de uma ou outra maneira, mas à luz de passagens como Romanos 16:25, Efésios 3:9 e Colossenses 1:26 — que declaram que a verdade do Mistério estava escondida — a única maneira lógica de isso ser interpretado é no sentido de um contraste. Portanto é um erro achar que Paulo quis dizer que os santos de outras épocas tivessem uma revelação parcial das coisas que estavam escondidas no Mistério.

Romanos 16:25-26 — “Ora, àquele que é poderoso para vos confirmar segundo o meu evangelho e a pregação de Jesus Cristo, conforme a revelação do mistério que desde tempos eternos esteve oculto, Mas que se manifestou agora, e se notificou pelas Escrituras dos profetas, segundo o mandamento do Deus eterno, a todas as nações para obediência da fé”.

Os teólogos do Pacto apontam para a declaração “pelas Escrituras dos profetas” para mostrar que as coisas reveladas no Mistério encontram-se nas Escrituras do Antigo Testamento. Eles acreditam que os “profetas” aos quais Paulo se referia eram os profetas do Antigo Testamento.

Todavia não seria possível Paulo estar se referindo aos profetas do Antigo Testamento ali, pois ele tinha acabado de dizer no versículo 25 que essa linha de verdade havia sido mantida oculta (ou “silenciosa” na versão JND) daqueles da época do Antigo Testamento. Por isso ele só poderia estar se referindo aos escritos proféticos que teriam sido produzidos em algum momento após o Antigo Testamento ter sido completado. Estas seriam as Escrituras proféticas do Novo Testamento que estavam para ser escritas. A passagem poderia ser mais bem traduzida como “por proféticas Escrituras” ao invés de “pelas proféticas Escrituras”, que aponta para o fato de que estes escritos não devem ser confundidos com as escrituras proféticas do Antigo Testamento. Infelizmente confundi-las é exatamente o que os teólogos do Pacto têm feito.