CAPITULO 3
Começamos agora a Sua verdadeira história. João Batista vem, segundo a profecia de Isaías (capítulo 40), para preparar o caminho do Senhor ante a Sua face, proclamando que era chegado o reino dos céus e convidando o povo ao arrependimento. O ministério de João para Israel é caracterizado neste Evangelho por três coisas: Primeira, o Senhor, o próprio Jeová vinha. O Espírito Santo (na citação que faz de Isaias 40:3) deixa de lado as palavras «a nosso Deus», no final do verso, porque Jesus vinha como homem em humilhação, embora sendo reconhecido como o Eterno—e Israel já não tinha o direito de dizer «nosso»; Segunda, o reino dos céus (1) estava próximo — a nova dispensação, que devia substituir a outra que, propriamente falando, pertencia ao Sinai, onde o Eterno Deus tinha falado sobre a Terra. Nesta nova dispensação, «os céus reinarão».
(1) Encontramos essa expressão somente no Evangelho segundo S.
Mateus, ligada às dispensações e caminhos de Deus acerca dos Judeus. «O reino de Deus» é o termo genérico; «o reino dos céus» e o reino de Deus, mas o reino de Deus tomando particularmente o caráter de governo celeste. Encontrá-lo-emos mais à frente, dividido em reino de nosso Pai t reino do Filho do homem.
Eles serão a sede da autoridade de Deus no Seu Cristo, e caracterizálo-ão; Terceira, o povo, como tal, em vez de ser abençoado no seu estado de espírito atual, ó chamado ao arrependimento em vista da aproximação desse reino. Por conseguinte João dirige-se para o deserto, afastando-se dos Judeus com os quais ele não pedia associar-se, porque vinha no caminho da Justiça (capítulo 21:32). Alimenta-se do que o deserto lhe dá (até mesmo as suas vestes proféticas dão testemunho da posição que ele tinha tomado da parte de Deus), e ele próprio c cheio do Espírito Santo.
Por consequência João era profeta, pois vinha da parte de Deus, dirigindo-se ao Seu povo para o chamar ao arrependimento, e para lhe anunciar a bênção de Deus segundo as promessas de Jeová seu Deus.
Mas João era mais do que um profeta, porque apresentava como coisa imediata a introdução de uma nova dispensação, há longo tempo esperada, e o advento do Senhor em Pessoa. Ao mesmo tempo, embora viesse para Israel, João não reconhecia o povo; porque este devia ser julgado, a eira do Senhor Deus devia ser limpa, as árvores que não davam bons frutos deviam ser cortadas. Seria apenas um Remanescente que o Eterno Deus colocaria na nova posição no reino que anunciava sem ainda ser revelado de que modo esse reino ia ser estabelecido. João proclamava o julgamento do povo. Que fato de incomensurável grandeza ora a presença do Eterno Deus no meio do Seu povo, na Pessoa d’Aquele que, embora devendo ser o cumprimento de todas as promessas, era, necessariamente, embora rejeitado, o Juiz de todo o mal que existia no meio do Seu povo! Quanto mais damos a estas passagens a sua verdadeira aplicação, isto é, quanto mais as aplicamos a Israel, tanto mais apreendemos a sua verdadeira força (1).
(1) É preciso lembrar que, além das promessas especiais feiras a Israel e a sua chamada como povo de Deus sobre a Terra, esse povo representava Justamente o homem considerado na sua responsabilidade para com. Deus sob a cultura mais perfeita que Deus pudesse dar-lhe. Até ao dilúvio, havia um testemunho, mas não havia dispensações ou instituições de Deus. Depois, no mundo novo, vemos um governo humano, uma chamada e promessas em Abraão, a lei, o Messias, Deus vindo em graça; Deus podia fazer tudo, e fê-lo com perfeita paciência, mas em vão, quanto ao encontrar algum bem na carne. Agora Israel, tem sido posto de lado como estando na carne, estando esta julgada e a figueira amaldiçoada como estéril, o Homem de Deus, o último Adão, Aquele em quem está a bênção pela redenção, é manifestado do mundo. Nos três primeiros Evangelhos, como vimos, Cristo é apresentado ao homem para que ele O receba; em João, o homem e Israel são postos de lado, e são introduzidos os soberanos caminhos de Deus em graça e em ressurreição.
Sem dúvida, o arrependimento é uma necessidade eterna para toda a alma que se aproxima de Deus; mas em que luz esta verdade não é colocada, quando vemos a intervenção do próprio Senhor chamando o Seu povo ao arrependimento, pendo de lado — perante a sua recusa — todo o sistema das suas relações Consigo e estabelecendo uma nova dispensação — um reino que pertence somente àqueles que O escutam — e fazendo cair, por fim, o Seu Juízo sobre o Seu povo e sobre a cidade que havia por tão longo tempo amado! «Ah! se tu conhecesses também, ao menos neste dia, o que à tua paz pertence! Mas agora isto está encoberto aos teus olhos» (Lucas 19:42).
Esta verdade dá lugar à apresentação de outra verdade muito mais importante, anunciada aqui em relação com os direitos soberanos de Deus, não em vez das suas consequências, mas contendo em si todas essas consequências.
O povo ia de toda a parte, e, como vemos noutra passagem, especialmente os desprezados e os ímpios, para serem batizados, confessando os seus pecados. Mas os que, aos seus próprios olhos, ocupavam o lugar de principais entre o povo, eram, aos olhos do profeta, que amava o povo segundo o pensamento de Deus, os objetos do Juízo anunciado.
A ira permanecia sobre eles. Quem havia induzido estes escarnecedores a fugirem dela? Humilhem-se como os outros; tomem o seu lugar e mostrem a mudança dos seus corações. Vangloriarem-se dos privilégios da sua nação, ou de seus antepassados, de nada servia perante Deus. Deus exigia o que a Sua própria natureza, a Sua Verdade, requeria.
Além disso, Deus era soberano; «Mesmo destas pedras, Deus pode suscitar filhos a Abraão». É isto o que a Sua graça soberana tem feito por Cristo com respeito aos Gentios.
A realidade era necessária. O machado estava posto à raiz das árvores; as que não produzissem bons frutos seriam cortadas (versos 7-10).
Eis o grande princípio moral que o Juízo ia exercer em força. A pancada ainda não havia sido dada, mas o machado estava já posto à raiz das árvores. João tinha vindo para levar os que aceitassem o seu testemunho a uma nova posição, ou ao menos a um novo estado para o qual eram preparados por esse testemunho. Aqueles que se arrependiam, ele os distinguia dos outros pelo batismo. Mas Aquele que vinha depois de João — Aquele cujas sandálias João não era digno de levar — limparia completamente a Sua eira e separaria os que eram verdadeira e moralmente Seus, do Seu povo Israel (esta era a Sua eira), e executaria o Juízo sobre os restantes. Por sua parte, João abria primeiramente a porta para o arrependimento; o Juízo viria depois.
O Juízo não era a única obra que pertencia a Jesus. No entanto duas coisas Lhe são atribuídas neste testemunho de João: Batiza com fogo — é o Juízo proclamado no verso 12, o qual consome todo o mal; mas batiza também com o Espírito Santo — o Espírito que, dado e atuando em energia divina no homem, vivificado, redimido, purificado no sangue de Cristo, o tira da influência de todos os atos da carne, e o coloca em relação e comunhão com tudo o que é revelado da pane de Deus, com a glória em que Ele põe as Suas criaturas na vida que transmite, destruindo moralmente em nós o poder de tudo o que é contrário ao gozo destes privilégios.
Note-se que o único e bom fruto reconhecido por João, como meio de escapar, é a confissão sincera, pela graça de Deus, de todos os pecados. Só aqueles que fizerem esta confissão escaparão ao machado.
As únicas árvores realmente boas eram aquelas que se confessavam más.
Alas que momento solene este para o amado povo de Deus! Que extraordinário acontecimento era a presença de Jeová no meio da nação com a qual estava em relação! ...
Note-se que João Batista não apresenta aqui o Messias como o Salvador que vem em graça, mas sim como o Chefe do reino, como Jeová, que executaria o Seu Juízo, se o povo se não arrependesse.
Veremos a seguir a posição que Jesus toma, em graça.
No verso 13 o próprio Senhor Jesus, que até agora tem sido apresentado como o Messias e mesmo como Jeová, vem a João para ser batizado com o batismo de arrependimento.
Lembramos que aceitar este batismo era o único bom fruto que um Judeu, no seu estado, podia produzir.
O ato em si provava ser o fruto de uma obra de Deus — da ação eficaz do Espírito Santo. Aquele que se arrepende confessa que tem andado até agora longe de Deus; de modo que se trata de um fato novo, fruto da Palavra de Deus e obra em si, o sinal de uma nova vida, da vida do Espírito na sua alma. O próprio fato da missão de João não dava outro fruto, nenhuma prova admissível de vida de Deus num Judeu, a não ser a confissão. O que não quer dizer que não havia ninguém em quem o Espirito Santo não tivesse agido vitalmente; mas, o estado espiritual do povo e segundo a chamada de Deus por intermédio do Seu servo, essa era a prova desta vida — o retorno do coração para Deus. Estes formavam o verdadeiro Remanescente do povo, os que Deus reconhecia como tais; e era deste modo que eram separados da grande massa que amadurecia para o Juízo. Estes eram os verdadeiros santos, os excelentes da Terra; embora o único lugar para tais homens fosse a humilhação do arrependimento. Era por ali que tinham de começar.
Quando Deus traz a misericórdia e a Justiça, aproveitam-se com gratidão da misericórdia, reconhecendo-a como seu único recurso, e curvam o seu coração ante a Justiça, como justa consequência do estado espiritual do povo de Deus, mas aplicando a si próprios.
Ora Jesus apresenta-Se no meio daqueles que tomam esta posição (verso 13). Embora seja verdadeiramente o Senhor, o Eterno Deus, o justo Juiz do Seu povo, Aquele que devia limpar a Sua eira, Ele toma o Seu lugar entre o Remanescente fiel que se humilha perante esse julgamento.
Toma o lugar do mais humilde do Seu povo perante Deus.
No Salmo 16:1-3, poderemos ler: “Guarda-me, ó Deus, porque em ti confio. Digo ao Senhor: Tu és o meu Senhor; não tenho outro bem além de ti. Quanto aos santos que há na Terra, são eles os ilustres nos quais tenho todo o meu prazer.” Perfeito testemunho de graça! O Salvador identifica-Se, segundo esta graça, com o primeiro movimento do Espírito nos corações do Seu povo, humilhando-Se a Si mesmo, não só na condescendência da Sua graça para com eles, mas tomando o Seu lugar como se fora um deles na sua verdadeira posição perante Deus; não meramente para confortar os seus corações por tal bondade, mas a fim de simpatizar com todas as suas dores e dificuldades; a fim de ser o padrão, a origem e a perfeita expressão de todos os sentimentos que convinham à posição deles.
Com um Israel impenitente e ímpio Ele não podia associar-Se, mas com o primeiro efeito vivo da Palavra e do Espírito de Deus nos pobres do rebanho, pedia fazê-lo em graça. E Ele faz o mesmo agora.
Encontramos a Cristo desde o primeiro passo, o que é, realmente, de Deus.
Mas, além disso, Ele vem para por aqueles que estavam em relação com Deus, segundo o favor que se aplicava numa perfeição tal como a Sua, e sobre o amor que, manda a causa do Seu povo, satisfazia o coração do Senhor, e, havendo glorificado perfeitamente a Deus em tudo o que Ele o, O tornou capaz de Se satisfazer em bondade. Sem dúvida, para que isso tivesse lugar, o Senhor teve de dar a Sua vida, porque o estado espiritual dos Judeus, bem como o de todo os homens, requeria esse sacrifício, para que tanto uns como os outros pudessem estar em relação com o Deus de Verdade. Mas até mesmo nisto o amor de Jesus não falhou. Todavia, aqui o Senhor condu-los ao gozo da benção expressa em Sua própria Pessoa, a qual devia ser solidamente fundada no sacrifício — benção que eles têm de alcançar por meio do caminho do arrependimento, no qual entraram pelo batismo de João; o batismo que Jesus recebeu com eles, para que pudessem prosseguir juntos para a posse de iodas as excelentes coisas que Deus preparou para aqueles que O amam.
João, compreendendo a dignidade e a excelência da Pessoa d'Aquele que vinha ao seu encontro, opõe-se ao desejo do Senhor. O Espírito Santo revela deste modo o verdadeiro caráter da ação do Senhor.
Quanto ao Senhor, era a Justiça que ali O trazia, e não a questão do pecado — Justiça que Ele cumpria em amor. Cumpria, assim como João Batista, o que convinha ao lugar que Lhe era destinado por Deus.
Com que condescendência Ele se identifica ao mesmo tempo com João, dizendo: «Assim nos convém».
É o servo humilde e obediente. E foi sempre desse modo que Ele se conduziu sobre a Terra. Além disso, quanto à Sua posição, a graça levou Jesus aonde o pecado nos havia conduzido; ele entrou pela porta que o Senhor tinha aberto para as Suas ovelhas. Confessando o pecado tal como ele é, comparecendo perante Deus na confissão do nosso pecado, encontramo-nos na companhia de Jesus (1).
(1) Dá-se o mesmo com o sentimento do nosso nada. Ele humilhou-Se a Si próprio, e, na consciência do nosso nada encontramo-nos cora Ele é ao mesmo tempo, somos cheios da Sua plenitude. Mesmo quando caímos, não é depois de termos sido levados a nos conhecermos tal como somos, que nós vemos Jesus voltar a erguernos.
Na realidade, trata-se do fruto do Espírito Santo em nós. Era o caso dos pobres pecadores que iam ter com João. Foi assim que Jesus tomou o Seu lugar em Justiça e em obediência entre os homens e mais propriamente entre os Judeus penitentes.
É nesta posição de homem — justo, obediente, cumprindo na Terra, em perfeita humildade, a obra pela qual Se havia oferecido a Si mesmo em graça, segundo o Salmo 40, entregando-Se para o cumprimento de toda a vontade de Deus em absoluta renúncia— que Deus Seu Pai O reconheceu plenamente e O selou, declarando que Ele era na Terra o Seu Filho amado.
Sendo batizado — prova notável do lugar que havia tomado com o Seu Povo — os céus abrem-se, e vê o Espirito Santo descer sobre Si com uma pomba; e eis uma voz do Céu que dizia: «Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo» (versos 16-17).
Mas estas circunstâncias requerem a nossa atenção.
Nunca os Céus se abriram sobre a Terra, nem para qualquer homem na Terra, antes da vinda do Filho amado (1).
(1) No princípio do Livro de Ezequiel (1:1) é-nos dito que os céus se abriram, mas tratava-se apenas de uma visão, como o próprio profeta nos explica. Neste caso era a manifestação de Deus em Juízo.
Deus tinha, certamente, em bondade e paciência, abençoado, de maneira providencial, todas as suas criaturas; tinha abençoado também o Seu povo, segundo as regras do Seu governo terrestre.
Além disso havia os eleitos, que Ele guardava em fidelidade. No entanto, e até esse momento, os céus não tinham sido abertos! Deus tinha enviado um testemunho em ligação com o Seu governo na Terra; mas não havia nela um objeto sobre o qual os olhos de Deus pudessem descansar com complacência, até que Jesus, imaculado e obediente, Seu Filho amado, aqui chegou. Mas o que se torna precioso para nós é o fato de que, quando o Senhor toma o Seu lugar publicamente em graça, lugar de humilhação com Israel — quer dizer, com o crente fiel, apresentando-Se assim perante Deus, para cumprir a Sua vontade — os Céus se abrem sobre um objeto digno da sua atenção. Sem dúvida, Ele era sempre digno de adoração, mesmo antes que o mundo existisse; mas agora havia tomado esse lugar nos desígnios de Deus como homem, e os céus abriram-se a Jesus, o objeto de toca a afeição de Deus na Terra. O Espírito Santo desce sobre Ele em forma visível. E Ele, homem na Terra, um homem que toma o Seu lugar com os humildes do povo penitente, é reconhecido como sendo o Filho de Deus. Não é apenas ungido de Deus, mas, como homem, está ciente da descida do Espírito Santo sobre Si -o selo que o Pai põe sobre Si.
E aqui não se trata, evidentemente, da Sua natureza divina no caráter de Filho eterno do Pai. O selo não estaria em conformidade com esse caráter; e, quanto á Sua Pessoa, esse selo é-Lhe manifestado, com o conhecimento que dele tinha, na idade de doze anos, no Evangelho segundo S. Lucas.
Mas, embora sendo o Filho eterno, é também homem.
Filho de Deus na Terra. É selado com o Espírito Santo como homem! Como homem tem assim consciência da presença do Espírito Santo em Si. Esta presença está em relação com o caráter de humildade, mansidão e obediência em que o Senhor Jesus apareceu na Terra. É «como pomba» que o Espírito Santo desce sobre Ele; precisamente como foi na forma de Línguas de fogo que Ele desceu sobre as cabeças dos discípulos para seu testemunho em poder neste mundo, segundo a graça que se dirigia a todos, e a cada um na sua própria Língua.
Jesus estabelece assim, em Sua própria posição, o lugar em que nos introduz por meio da redenção (João 20:17).
Porém, a glória da Sua Pessoa é sempre cuidadosamente ressalvada.
Não é apresentado um objeto a Jesus, como, por exemplo, a Saulo de Tarso, e, num caso ainda mais análogo, a Estêvão, o qual, cheio do Espírito Santo, vê os céus abertos, e, olhando bem para eles, vê o Filho do homem, e foi transformado na Sua imagem. Jesus veio e é em Si mesmo o objeto sobre o qual os céus se abrem; não tem objeto transformador, como no caso de Estêvão, ou no nosso caso em Espírito. O Céu olha para Jesus, o perfeito alvo de deleite, É a Sua relação com Seu Pai, já existente, que é selada (1).
Nem tampouco o Espirito criou o Seu caráter (exceto no que se refere à Sua natureza humana; neste sentido, Ele foi concebido no ventre da virgem Alaria pelo poder do Espírito Santo). Ele tinha-Se ligado com os pobres, na perfeição do 'Seu caráter, antes de ser selado com o Espírito Santo, e em seguida atua segundo a energia do poder do que havia recebido sem medida na Sua vida humana neste mundo. (Ver: Mateus 12:28; João 3:34; Atos dos Apóstolos 10:38).
Encontramos na Palavra de Deus quatro ocasiões memoráveis em que os céus se abrem. Cristo é o objeto de todas estas revelações e cada qual tem o seu caráter especial.
Aqui o Espírito Santo desce sobre Jesus e Ele é reconhecido o Filho de Deus (ver João 1:33-34). No final do mesmo capítulo Jesus declara-Se o Filho do homem. Os anjos de Deus sobem e descem sobre Ele. É, como Filho do homem, o objeto do seu ministério (2).
(1) Isto é também verdade a nosso respeito, quando estamos nessa relação por graça, (2) é grave erro dizer-se que Cristo é a escada. Cristo é, como o tinha sido Jacob, o objeto do serviço e do ministério dos anjos.
No final de Atos 7 abre-se uma cena inteiramente nova. Os Judeus rejeitam o último testemunho que Deus lhes envia. Estevão, por meio de quem é dado esse testemunho, é cheio do Espírito Santo, e os céus abrem-se lhe. O sistema terrestre foi definitivamente acabado pela rejeição do testemunho do Espírito Santo dado acerca da glória de Cristo elevado às alturas. Mas isto não é meramente um testemunho.
O crente é cheio do Espírito, o Céu abre-se para ele, a glória de Deus é-lhe revelada, e o Filho do homem aparece-lhe, de pé, à direita de Deus. Isto é uma coisa diferente dos céus se abrirem sobre Jesus, o objeto do deleite de Deus na Terra. Trata-se do Céu aberto ao próprio crente, tendo o seu objeto no Céu, depois de haver sido rejeitado na Terra. Vê, pelo Espírito Santo, a glória celestial de Deus, e Jesus, o Filho do homem, o objeto especial do seu testemunho, na glória de Dens. A diferença é tão notável quão interessante; e mostra, do modo mais notável, a verdadeira posição do crente na Terra e a alteração que a rejeição de Jesus pelo Seu povo terrestre produziu. Com a diferença que a Igreja, a união dos crentes em um corpo com o Senhor no Céu, não havia ainda sido revelada. Alais tarde (Apocalipse 19) o Céu abrese e o Senhor mesmo sai, o Rei dos reis e Senhor dos senhores. Vemos assim: Primeiro, Jesus, o Filho de Deus na Terra, objeto do deleite do Céu, selado com o Espírito Santo; Segundo, Jesus, o Filho do homem, objeto dos cuidados do Céu, sendo os anjos Seus servos; Terceiro, Jesus; nas alturas à direita de Deus, e o crente, cheio do Espírito Santo e sofrendo na Terra por amor do Seu nome, vendo a glória nas alturas, e o Filho do homem na glória; e, finalmente, Jesus, o Rei dos reis, e Senhor dos senhores, saindo do Céu para julgar e fazer guerra contra os escarnecedores que disputam a Sua autoridade e oprimem a Terra.
Mas recapitulemos, voltando ao fim do capítulo 3: O Pai reconhece a Jesus, o Homem obediente na Terra, que entra, como verdadeiro Pastor, pela porta, como Seu Filho amado em quem está todo o Seu deleite. O Céu é aberto sobre Jesus; Ele vê o Espírito Santo descendo sobre Si, a força infalível e suporte das perfeições da Sua vida humana; e recebe do Pai o testemunho da Sua relação entre Ele e os Seus. Nenhum objeto em que a Sua fé deve ser posta Lhe é apresentado como o é a nós. Ê a Sua relação com o Céu e Seu Pai que é selada. A Sua alma desfruta o gozo do fato com a descida do Espírito Santo e a voz de Seu Pai.
Esta passagem do Evangelho segundo S. Mateus requer, porém, um pouco mais de atenção. O bendito Senhor, ou antes, o que ocorreu com Ele, mostra-nos o lugar ou o modelo em que Ele põe os crentes, quer sejam Judeus ou Gentios: Claro, somos postos nesse lugar pela redenção. «Subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus» são as palavras benditas que pronunciou depois da Sua ressurreição.
Mas, para nós, o Céu está aberto; estamos selados com o Espírito Santo; o Pai reconhece-nos como filhos. Mas a dignidade divina da Pessoa de Cristo é sempre mantida no mundo em humilhação, como na transfiguração em glória. Moisés e Elias encontram-se na mesma glória, mas desaparecem quando a precipitação de Pedro, autorizado a falar, os queria pôr no mesmo nível. Quanto mais perto estamos de uma pessoa divina, tanto mais a adoramos e reconhecemos o que ela é.
Porém, encontra-se aqui outro fato muito notável. Pela primeira vez, quando Cristo toma este lugar entre os homens em humildade, a Trindade é plenamente revelada. Sem dúvida, o Filho e o Espírito Santo são mencionados no Antigo Testamento. Mas ali a unidade da Divindade é o ponto essencial revelado. Aqui é o Filho como Homem que é reconhecido. O Espírito Santo desce sobre Ele e o Pai dedara-O como Seu Filho. Que maravilhosa relação com o homem! Que lugar para o homem ocupar! Mediante a relação de Cristo com o homem, a Deidade é revelada na sua própria plenitude. A Sua humanidade apresenta-se em toda a sua plenitude, Mas Ele era realmente homem — o Homem em Quem os desígnios de Deus quanto ao homem deviam ser cumpridos.
Por esta razão, e uma vez que Ele realizou e mostrou o lugar em que o homem é posto perante Deus na Sua própria Pessoa e segundo os desígnios de Deus em graça quanto à nossa relação com Deus, nós também estamos em conflito com o Inimigo. Ele entra também nesse lado da nossa posição. Temos a nossa relação com Deus nosso Pai.
Ele venceu por nós e mostrou-nos como vencer. Note-se também que, primeiramente, a relação do Senhor com Deus é plenamente estabelecida e revelada, e que em seguida começa o conflito com Satanás. E dá-se o mesmo conosco.
Mas a questão era esta: Manter-se-ia o Segundo Adão onde o primeiro Adão tinha falhado? E, além disso, estava no deserto deste mundo e sob o poder de Satanás — em lugar das bênçãos de Deus — pois era ali que nós tínhamos chegado.
Devemos também notar outro ponto aqui, a fim de vermos o lugar que o Senhor toma. A lei e os profetas vigoraram até João. É então anunciado algo de novo — o reino dos céus. O Juízo termina pelo povo de Deus. O machado está posto à raiz das árvores, a pá está nas mãos d'Aquele que vem, o trigo é recolhido no celeiro de Deus, a palha é queimada. Quer dizer, há um fim da história do povo de Deus em Juízo. Nós entramos no campo onde o homem está perdido e espera o julgamento; mas a história do homem como responsável terminou. Por isso é dito: «Mas agora na consumação dos séculos Se manifestou para tirar o pecado pelo sacrifício de Si mesmo». Isto aconteceu literalmente com Israel; mas é também moralmente verdadeiro a nosso respeito; com a diferença que nós somos recolhidos para o Céu, assim como o Remanescente de então, e estaremos no Céu. Mas, sendo Cristo rejeitado, a história da responsabilidade acabou, e nós somos introduzidos em graça como seres já perdidos.
Consequentemente, após este anúncio, Cristo vem e, identificando-Se com o Remanescente que escapa ao Juízo por meio do arrependimento, prepara este novo lugar para o homem sobre a Terra.
Mas nós não podíamos ocupá-lo antes da redenção ser cumprida.
Entretanto Ele manifestou o nome do Pai àqueles que Ele Lhe tinha dado do mundo.