CAPÍTULO 10 - A PROCLAMAÇÃO DE UMA PERFEITA JUSTIÇA
O APÓSTOLO faz aqui uma pequena pausa. Trata-se da pressão do amor de seu coração. "Irmãos, o bom desejo do meu coração e a oração a Deus por Israel é para sua salvação." (Rm 10:1) Eles tinham zelo por Deus, mas não com entendimento. O apóstolo estava imensamente triste com os que causavam problemas, e buscavam inquietar os gálatas, sim, ele desejava até que fossem cortados (Gl 5:12). Mas o quanto ele chorou sobre a grande multidão de judeus enganados. Estamos nós tristes pela multidão que nos cerca? Podemos dizer que o desejo de nosso coração e nossa oração por eles a Deus é que possam ser salvos?
"Porquanto, não conhecendo a justiça de Deus, e procurando estabelecer a sua própria justiça, não se sujeitaram à justiça de Deus." (Rm 10:3) Você deve estar lembrado de que a justiça de Deus é revelada no evangelho. (Veja os capítulos 1:17 e 3:21-25.) Assim, os judeus que rejeitaram o evangelho, permaneceram necessariamente ignorantes daquela justiça. E assim acontece até o dia de hoje: todo aquele que rejeita a revelação de que Deus é justo e ainda o Justificador do ímpio, acaba, se estiver ansioso para ser salvo, buscando estabelecer sua própria justiça, recusando-se, assim, a submeter-se ao fato de que Deus é justo em justificá-lo gratuitamente, por meio da redenção que há em Cristo Jesus.
O encontro do pai com o pródigo em Lucas 15 ilustrará este assunto. O pródigo, assim como o pobre gentio, caiu em si. A parábola toda é surpreendente: o pastor tinha vindo para buscar a ovelha perdida, sim, como sabemos, Ele morreu por ela. O Espírito Santo foi enviado desde o céu e procura o perdido. E agora o pai tem o seu gozo completo ao receber o filho perdido; ele, o pai, vai ao seu encontro. Um profundo exercício de consciência havia tomado lugar no pródigo. Um senso de que havia abundância na casa do pai, e uma prontidão em confessar seu pecado; isto é o que sempre marca a obra do Espírito. Todavia, até aqui ele ignorava acerca do melhor vestido.
Ele esperava ser um servo, como acontece em cada coração humano, mas estava totalmente ignorante do que lhe estava reservado. Tudo o que tinha eram seus trapos, sua culpa, sua vergonha. Tudo isso ele reconhecia diante de seu pai. Tinha ele uma túnica para apresentar ao seu pai? Não tinha nada senão trapos. Teria o pai dito a ele que fizesse uma túnica, uma vestimenta que o deixasse adequado para entrar em sua casa? Não. O pai tinha uma túnica para ele. Oh, olhe para o pai: "E, quando ainda estava longe, viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão, e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou." (Lc 15:20) É assim que Deus vai ao encontro do pecador arrependido, que está em seus trapos, sem sequer uma túnica.
O pai disse: "Trazei depressa o melhor vestido, e vesti-lho, e ponde-lhe um anel na mão, e alparcas nos pés." (Lc 15:22) Do mesmo modo o gozo enche o coração de Deus ao receber o pecador perdido. Mas não acontece o mesmo com o irmão mais velho, que prefere lutar por uma justiça própria. Que contraste! Um erro triste e fatal! O pródigo não tinha nem uma túnica para apresentar-se ao pai. Ele não tinha nada além de trapos e pecado. O pai tinha a melhor roupa, a justiça de Deus para o pródigo. Sim, e o anel para sua mão, prova de amor eterno; e o andar condizente também lhe foi providenciado, sandálias para seus pés. Tudo novo e tudo proveniente de Deus. Israel, assim como o irmão mais velho, não podia ter essa compaixão e justificação de Deus. É certo que estavam ignorantes acerca disso. "Porquanto, não conhecendo a justiça de Deus, e procurando estabelecer a sua própria justiça, não se sujeitaram à justiça de Deus." (Rm 10:3) Eles haviam seguido a lei da justiça; haviam tentado guardar a lei para serem justos. Haviam tentado fazer uma túnica para apresentarem a Deus; mas não conheciam a melhor roupa que Deus tinha para dar-lhes. Será este o seu caso, leitor? Será que você está tentando produzir, fazer uma justiça, para apresentá-la a Deus? Talvez você esteja perguntando: Não devo tentar guardar a lei para ser bom e apto para a presença de Deus? Você não vê onde está seu erro? Você não vê que está tentando trazer a túnica para Deus? Qual é a melhor roupa? "Porque o fim da lei é Cristo para justiça de todo aquele que crê." (Rm 10:4) Sim, Cristo é a melhor roupa -- o fim de todas as exigências, e de todos os sacrifícios da lei, que eram tipos. Deus fez dEle justiça para nós. Não necessitamos de outra justiça para entrarmos na presença de Deus nosso Pai. A justiça prática, exercitada diante dos homens, é uma outra questão, mas não é o assunto tratado aqui.
"Moisés descreve a justiça que é pela lei, dizendo: O homem que fizer estas coisas viverá por elas." (Rm 10:5) Mas o pródigo não tinha feito estas coisas. E nós não fizemos estas coisas: somos culpados e não temos justiça para apresentar a Deus. Mas, crendo em Deus, Ele pode considerar-nos, e nos considera de fato, justos; e isso por uma obra que já foi consumada, e não algo que ainda necessite ser feito. Cristo não descerá do céu para morrer na cruz. Ele já veio aqui e morreu por nosso pecados. Ele não terá que ressuscitar de entre os mortos, pois tudo já foi feito, tudo consumado. Assim como o pai saiu ao encontro do pródigo, "a palavra está junto de ti, na tua boca e no teu coração; esta é a palavra da fé, que pregamos, a saber: SE com a tua boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus O ressuscitou dos mortos, serás salvo". (Rm 10:8,9) Era justamente isto o que Israel não iria fazer. Eles não confessariam que Deus fez aquele mesmo Jesus, que eles haviam rejeitado e crucificado, Senhor e Cristo. Eles se apegariam à lei para justiça, e em seus corações não iriam crer em Cristo como a justiça deles diante de Deus. E quantos estão fazendo o mesmo até hoje! Procurarão ser justos, mas nunca conseguirão. Nunca conheceram a justiça de Deus em justificá-los no momento em que cressem.
Agora o apóstolo cita, como prova, a própria Escritura que eles possuíam. "Porque a Escritura diz: Todo aquele que nEle crer não será confundido." (Rm 10:11) Isto prova que haveria um tempo em que a doutrina do "não há diferença" estaria em vigor. "Porquanto não há diferença entre judeu e grego (ou gentio): porque um mesmo é o Senhor de todos, rico para com todos os que O invocam. Porque todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo." (Rm 10:12,13; Joel 2.32.) Que bendito fato é este: todos, seja judeus ou gentios, que verdadeiramente se achegam ao Senhor, invocando-O, estão assegurados das boas vindas, assim como aconteceu com o pródigo.
O que você prefere, leitor? Nunca ter pecado e ter produzido uma justiça que o deixasse apto para comparecer diante de Deus (se fossem coisas possíveis), trazendo assim uma túnica para Deus, ou, reconhecer tudo o que você é, e tudo o que praticou, e agora, como um pecador merecedor do inferno, confessar com sua boca e crer em seu coração no Senhor Jesus, como sua eterna justiça diante de Deus? Não podemos nos detestar muito a nós mesmo; mas, oh, que profunda compaixão a que nos encontra exatamente como estamos, e nos veste com a melhor roupa, com anel e sandálias. E como nos é dado conhecer esta justiça de Deus? Leia os versículos 14 e 15 para ter a resposta. Escutando a Palavra, o evangelho da paz que nos foi enviado. Que boas novas! Aqueles que buscavam a justiça pela lei odiaram essas boas novas e os pregadores do evangelho. É exatamente o que acontece até hoje, por todos os que dizem que são judeus e não o são.
Não seria este um fato dos mais espantosos que o homem pudesse odiar e rejeitar o seu maior bem, o evangelho da paz? O homem tentará, ou pensa poder tentar, atingir algum dia a sua própria paz com Deus. Mas não terá a paz que é feita pelo sangue de Jesus; a paz que é pregada àqueles que estão longe, e àqueles que estão perto. Sim, a paz que é proclamada a todos. "Mas nem todos obedecem ao evangelho; pois Isaías diz: Senhor, quem creu na nossa pregação?" (Rm 10:16) A palavra do evangelho foi pregada a todo o Israel: mas não quiseram crer. É pregada agora, talvez como nunca o foi antes, a toda a cristandade; mas eles não a receberão. Veremos o resultado final de tudo isso no próximo capítulo.
Deus tem os que Lhe pertencem, apesar de toda a perversidade do homem, sejam judeus ou gentios, como Isaías claramente disse: "Fui achado pelos que me não buscavam, fui manifestado aos que por Mim não perguntavam". (Rm 10:20) O apóstolo provou, assim, as duas coisas tiradas das passagens do próprio Antigo Testamento deles: que não há diferença, e que prevalece a soberania de Deus. Quem quer que seja, judeu ou grego, que invocar o Senhor será salvo -- e, oh, que verdade que sustenta a alma, Ele terá misericórdia de quem tiver misericórdia. Teria Israel se perdido por Deus não desejar salvá-los? "Mas contra Israel diz: Todo o dia estendi as minhas mãos a um povo rebelde e contradizente." (Rm 10:21) Eles não quiseram ir a Ele: eles recusaram o melhor vestido, o anel e as sandálias. Que isto não aconteça com os leitores destas linhas. Aquele que vai a Ele, de maneira nenhuma será lançado fora.