Disciplina na Igreja
Outro assunto relacionado ao governo da igreja local, que é negligenciado nas assim chamadas "igrejas", é o da disciplina e excomunhão. Como já vimos no capítulo com o título "Um chamado à separação", cada cristão é individualmente responsável por separar-se do mal. Portanto é óbvio que uma assembleia de cristãos também deve se manter livre do mal. Trata-se de uma responsabilidade coletiva. O motivo disso é que a associação com o mal corrompe toda a assembleia.
Conforme mencionamos, os três principais tipos de mal que devem ser mantidos fora de um grupo de cristãos são o mal moral, doutrinal e eclesiástico. Se uma pessoa em uma assembleia se envolve ou está associada com um mal assim, a assembleia local tem a responsabilidade de tirar essa pessoa de sua comunhão. O apóstolo Paulo escreveu: "Porque, que tenho eu em julgar também os que estão de fora? Não julgais vós os que estão dentro? Mas Deus julga os que estão de fora. Tirai, pois, dentre vós a esse iníquo" (1 Co 5:12-13). Isto demonstra que a assembleia é responsável por julgar o mal em seu meio quando este se manifesta.
Existem três razões principais pelas quais a assembleia deve afastar pessoas envolvidas com o mal.
1) A glória do Senhor -- A assembleia deve ter o cuidado de não permitir que o Nome do Senhor esteja associado com o mal diante dos olhos do mundo. Quando os irmãos em Corinto agiram em prol da glória do Senhor e colocaram fora a pessoa em pecado, o apóstolo escreveu em aprovação: "Porque, quanto cuidado não produziu isto mesmo em vós que, segundo Deus, fostes contristados! que apologia, que indignação, que temor, que saudades, que zelo, que vingança! Em tudo mostrastes estar puros neste negócio" (2 Co 7:11). Eles agiram com zelo, adotando medidas extremas visando a glória do Senhor.
2) A santidade na assembleia, a qual deve ser mantida -- Existem duas razões para isto: primeiro, a assembleia é o lugar da habitação de Deus. Ela deve ser mantida em condições adequadas para a Sua santa presença. O Senhor habita no meio do Seu povo congregado ao Seu Nome (Mt 18:20), portanto a assembleia deve manter o mal fora do seu meio a fim de permanecer um lugar adequado à Sua presença. "A santidade convém à tua casa, Senhor, para sempre" é um princípio que permanece válido para todas as épocas (Sl 93:5). "O que usa de engano não ficará dentro da minha casa" (Sl 101:7; 1 Coríntios3:17; Números 5:1-4). A segunda razão é a característica que o mal tem de fermentar. Como já mencionamos, a associação com o mal corrompe. O apóstolo Paulo escreveu: "Não sabeis que um pouco de fermento faz levedar toda a massa? Alimpai-vos, pois, do fermento velho, para que sejais uma nova massa" (1 Co 5:6-8; Gálatas 5:9-12). Ele também escreveu: "As más conversações corrompem os bons costumes" (1 Co 15:33). Se a assembleia não tirasse o mal de seu meio, logo outros seriam afetados por ele.
3) A correção e restauração do ofensor -- A ação de colocar alguém fora de comunhão deveria ter sempre em vista o bem e a bênção da pessoa que errou. Ela é colocada fora e não se deve ter contato com ela, para que seja humilhada para arrependimento e restaurada ao Senhor. "Mas agora vos escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se irmão, for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com o tal nem ainda comais" (1 Co 5:11). Quando alguém se encontra numa condição de arrependimento e julgamento de seu próprio pecado, cabe à assembleia receber essa pessoa de volta à comunhão. Referindo-se à pessoa que os irmãos em Corinto haviam colocado fora de seu meio, o apóstolo Paulo escreveu: "Basta-lhe ao tal esta repreensão feita por muitos. De maneira que pelo contrário deveis antes perdoar-lhe e consolá-lo, para que o tal não seja de modo algum devorado de demasiada tristeza. Por isso vos rogo que confirmeis para com ele o vosso amor" (2 Co 2:6-8).
A assembleia deveria sempre tratar do assunto como sendo seu próprio pecado. Sua atitude quanto à excomunhão de alguém deveria ser de lamentação -- reconhecendo que falharam, por terem sido incapazes de alcançar o irmão enquanto ele seguia em direção ao pecado. Os coríntios nada fizeram a respeito. Paulo lhes escreveu: "Estais ensoberbecidos, e nem ao menos vos entristecestes por não ter sido dentre vós tirado quem cometeu tal ação" (1 Co 5:2). Cada um na assembleia deveria investigar seu próprio coração e perguntar a si mesmo: "O que eu poderia ter feito para impedir que essa pessoa caísse em pecado?" Devemos reconhecer que não fizemos nada a respeito; que não pastoreamos essa pessoa da forma adequada, ou que não oramos por ela o suficiente etc. Era isto que significava o sacerdote comer da oferta pelo pecado: "O sacerdote que a oferecer pelo pecado a comerá" (Lv 6:26).
Este tipo de cuidado pela glória do Senhor é algo que quase não existe na cristandade hoje, todavia deveria ser praticado por cada assembleia cristã.