CAPÍTULO 2

PERGUNTA: Se professamos congregar no terreno do "um só corpo", por que assumimos uma posição de separação de todos os outros membros do corpo e não partimos o pão com eles? Isto parece totalmente inconsistente com a verdade do Novo Testamento, que apresenta a comunidade cristã como sendo uma família feliz com todos caminhando juntos em amor. A Bíblia ensina que deveríamos andar juntos em uma feliz unidade com nossos irmãos, não em separação deles.

RESPOSTA: O problema aqui é que a pessoa que faz tal pergunta não leva em consideração onde estamos na história da igreja. Sete dentre os oitos escritores do Novo Testamento nos dizem que nos últimos tempos haveria um abandono em massa da "fé que uma vez foi dada aos santos" (Atos 20:19-30; 1 Timóteo 4:1; 2 Timóteo 3:1-5; 4:3-4; Judas 1:3-4). Por isso é importante ter uma compreensão dos tempos e do dia em que vivemos. Não estamos nos tempos pentecostais, e nem mesmo em tempos de grande reavivamento; estamos nos "últimos dias" da história da igreja na terra (2Tm 3:1), e o testemunho cristão sofre de uma ruína irremediável.

As segundas epístolas insistem na separação em um dia de ruína.

Havendo estabelecido este fato posso dizer que Deus certamente gostaria que todos os que pertencem ao Seu povo andassem juntos na prática, como uma só família. Mas Ele também nos disse que quando o testemunho cristão se corrompesse e a ruína tomasse conta deveríamos aplicar a verdade ulterior do Novo Testamento, a qual nos foi dada nas segundas epístolas. Estas epístolas falam da ruína que se introduziria na profissão cristã e ensinam como o crente deve agir em relação a isso. Alguém que faça esta pergunta está lendo sua Bíblia sem verificar as segundas epístolas.

Há duas coisas que ficam claras em cada uma das segundas epístolas: primeiro, a evidência do abandono do verdadeiro cristianismo em suas doutrinas e práticas; segundo, a importância de o crente separar-se do erro e da corrupção -- não apenas individualmente, mas também coletivamente.

A segunda epístola aos Coríntios lida com um movimento mundano entre eles, o qual estava corrompendo sua doutrina e prática. A resposta a isso é: "Saí do meio deles, e apartai-vos, diz o Senhor; e não toqueis nada imundo, e eu vos receberei" (2 Co 6:17).

A segunda epístola aos Tessalonicenses lida com um movimento que havia se introduzido e negava a vinda do Senhor e outros eventos escatológicos (proféticos). A resposta a isso é "que vos aparteis de todo o irmão que anda desordenadamente, e não segundo a tradição que de nós recebeu" (2 Ts 3:6).

A segunda epístola a Timóteo lida com ensinos doutrinários errôneos e corrupções profanas que estavam se introduzindo na casa de Deus. A exortação aqui é: "Todavia o fundamento de Deus fica firme, tendo este selo: O Senhor conhece os que são seus, e qualquer que profere o nome de Cristo aparte-se da iniquidade. Ora, numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra. De sorte que, se alguém se purificar destas coisas, será vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra" (2 Tm 2:19-21).

A segunda epístola de Pedro lida com o inevitável abandono da piedade prática e alerta o crente: "Guardai-vos de que, pelo engano dos homens abomináveis, sejais juntamente arrebatados, e descaiais da vossa firmeza" (2 Pe 3:17).

A segunda epístola de João fala do quão sério é abandonar a doutrina da Pessoa de Cristo. Ele nos admoesta a nos mantermos separados daqueles que ensinam tais erros, chegando ao ponto de dizer que não devemos nem sequer recebê-los em nossa casa. Na verdade, nos é dito para nem mesmo "saudar" essas pessoas (2 Jo 1:8-11).

Voltamos a dizer que Deus deseja que todos os membros do corpo de Cristo estejam juntos em comunhão prática (Ef 4:1-16). Este é o ideal de Deus. Mas já que a ruína se espalhou por todo o testemunho cristão, a Palavra de Deus (nas segundas epístolas) indica que devemos assumir uma posição de separação da desordem. A segunda epístola a Timóteo 2:19-21 é particularmente útil em nos guiar nestes tempos difíceis. Ela indica que devemos nos desassociar de tudo na casa de Deus que esteja manchado com erro, afastando-nos dessas coisas. Isto inclui qualquer tipo de erro, seja doutrinal, moral ou eclesiástico.

Como foi mencionado, as segundas epístolas servem para modificar a aplicação da verdade dada nas outras epístolas. Não é o caso de a Palavra de Deus estar se contradizendo, mas sim de indicar outra forma de agir para quando chegassem os tempos de ruína. Para ilustrar este ponto suponha que você trabalhasse em uma grande fábrica ou indústria onde existissem instruções específicas para serem seguidas no desempenho normal da função. Mas, se surgissem determinados problemas, você receberia um diferente conjunto de instruções para serem seguidas em caso de emergência. É assim também quando as Escrituras ensinam quanto ao modo de agir no dia de ruína. Há certas instruções dadas nas segundas epístolas que modificam a aplicação dos princípios apresentados no ensino das outras epístolas. Elas não invalidam a verdade das outras epístolas, mas alteram a senda do crente nas questões eclesiásticas da cristandade. Toda a verdade de Deus pode ser praticada hoje, porém ela deve ser praticada em separação da confusão. Por exemplo, ainda podemos nos reunir no terreno do "um só corpo" (Ef 4), mas não podemos colocar isto em prática com todos os membros do corpo, como Deus inicialmente planejou.

A atitude correta na separação: humilhação.

Havendo assumido esta posição de separação na casa de Deus, devemos nos guardar o tempo todo do orgulho que pode surgir em nosso coração. Devemos tomar cuidado para não sermos levados a nos considerarmos melhores ou mais fiéis do que aqueles de quem nos separamos. O Senhor não aprovará uma atitude do tipo "sou mais santo do que tu" (Is 65:5) . A atitude correta é de humilhação. J. N. Darby disse que "se alguém falar em separação do mal, sem estar humilhado, é bom ter cuidado porque tal posição não passa da mesma que em todas as épocas deu origem às seitas". O espírito adequado a alguém que se purifica da confusão na casa de Deus é o de juízo próprio, não de justiça própria.

A separação na casa de Deus é dolorosa, pois implica separar-se de muitos verdadeiros crentes que não estão conscientes de suas associações com a corrupção. Algo assim deveria cortar nosso coração, pois amamos a todos os nossos irmãos. Todavia, a obediência à Palavra de Deus deve ter prioridade sobre todas as nossas preferências pessoais. Na verdade a obediência neste aspecto é uma prova de nosso amor para com nossos irmãos. "Nisto conhecemos que amamos os filhos de Deus, quando amamos a Deus e guardamos os seus mandamentos" (1 Jo 5:2). Os que estão congregados ao nome do Senhor assumem esta posição de separação na cristandade por estar em conformidade com a Palavra de Deus.

Muitos acham que a solução esteja em permanecer na confusão e tentar consertar os erros da cristandade, mas isto está claramente em desacordo com a Palavra de Deus. Quando o "joio" foi semeado entre o "trigo", o pai de família disse aos seus servos que não tentassem consertar o problema, mas que deixassem "crescer ambos juntos até à ceifa" -- a qual é "o fim do mundo" ou "a consumação do século" -- e então o próprio Senhor cuidaria disso (Mateus 13:24-30). Felizmente o Senhor não deixou tal "fardo" de responsabilidade sobre o Seu povo (Ap 2:24-25). A solução é nos mantermos à parte da confusão e do erro, separando-nos deles. A segunda epístola a Timóteo 2:22 indica que Deus nos dará alguns com os quais possamos caminhar nesta senda de separação. É isto que os congregados ao nome do Senhor estão fazendo quando se reúnem para adoração e ministério em separação.

Conhecemos uma querida irmã no Senhor cuja denominação está passando por uma reviravolta. O ministro ali nega a inspiração das Escrituras, o nascimento virginal de Cristo e Sua ressurreição. Ele também ensina que existem muitas maneiras de se salvar e aceita o casamento de homossexuais na igreja, além de ter abandonado sua própria esposa. Mostramos a esta irmã que a Palavra de Deus ensina que ela deveria separar-se daquela denominação, mas ela acha que seria errado separar-se por ter frequentado aquela igreja toda a sua vida. Porém, quanto mais tempo ela ficar ali, mais frustrada e envergonhada se sentirá. Se ela fizesse o que a Palavra indica talvez outros pudessem ter o mesmo exercício de se separarem, mas o fato de ela permanecer em comunhão ali anula qualquer poder que ela gostaria de ter em seu testemunho individual. A intenção dela pode ser boa, mas não é o caminho de Deus para o crente que deseja ser fiel.

RESUMINDO: os santos reunidos ao nome do Senhor ocupam uma posição de separação da confusão religiosa e do erro na cristandade porque a Palavra de Deus (as segundas epístolas) nos admoestam a fazer isso. Esta é a única posição bíblica a ser tomada quando a ruína do testemunho cristão é irremediável.