A Segunda Epistola de Paulo aos CORINTIOS
As Características de um
Verdadeiro Ministro de Cristo
Bruce Anstey
A SEGUNDA EPÍSTOLA DE PAULO AOS CORÍNTIOS
As Características de um Verdadeiro Ministro de Cristo
Bruce Anstey
Originalmente publicado por:
12048 – 59th Ave.
Surrey, BC V3X 3L3
CANADÁ
Título do original em inglês: THE SECOND EPISTLE OF PAUL TO THE CORINTHIANS –The Characteristics of a True Minister of Christ
Primeira edição – outubro 2011
Traduzido, publicado e distribuído no Brasil com autorização do autor por:
ASSOCIAÇÃO VERDADES VIVAS, uma associação sem fins lucrativos, cujo objetivo é divulgar o evangelho e a sã doutrina de nosso Senhor Jesus Cristo.
atendimento@verdadesvivas.com.br
Primeira edição em português – setembro 2018
E-book v.1.1
Abreviaturas utilizadas:
ARC – João Ferreira de Almeida – Corrigida e Revisada – SBB 1969
ARA – João Ferreira de Almeida – Corrigida e Atualizada – SBB 1993
TB – Tradução Brasileira - 1917
ACF – João Ferreira de Almeida – Corrigida Fiel – SBTB 1994
AIBB – João Ferreira de Almeida – Imprensa Bíblica Brasileira - 1967
JND – Tradução inglesa de John Nelson Darby
KJV – Tradução inglesa King James
Todas as citações das Escrituras são da versão ARC, a não ser que outra esteja indicada.
A SEGUNDA EPÍSTOLA DE PAULO AOS CORÍNTIOS
O Propósito de Escrever a Segunda Epístola
O apóstolo Paulo escreveu a primeira epístola aos coríntios para corrigir muitas desordens entre eles. Na maioria, produziu resultados positivos, embora depois de escrevê-la estava preocupado que poderia não ter o efeito desejado (2 Co 2:1-3, 7:5-7). No entanto, houve bons resultados; os coríntios lamentaram seus erros, se arrependeram e os corrigiram.
Das diversas razões para Paulo escrever esta epístola a primeira foi explicar porque ele não foi a Corinto quando disse que iria (cap. 1). Ele mostra que seus princípios no agir não foram por falta de cuidado, mas estavam de acordo com o caráter e caminhos de Deus, e que havia uma boa razão de por que ele não foi quando tinha se proposto a ir.
A segunda razão foi para exortar os santos em Corinto a mostrar graça e perdão ao arrependido que tinha sido colocado fora da comunhão (cap. 2). Suas instruções a eles a esse respeito, nos fornecem a maneira apropriada de restaurar à comunhão uma pessoa que foi colocada fora.
A terceira foi uma questão delicada envolvendo o próprio Paulo. Uma reconstrução das circunstâncias que acompanham a escrita da epístola torna evidente que havia um grupo de caluniadores entre os coríntios que estava com amargura contra Paulo. Eles procuraram desacreditar seu ministério com uma enxurrada de críticas, opondo-se a ele alegando numerosas falhas imaginárias. O efeito de sua obra maligna foi levar os santos de Corinto a desconfiar do apóstolo e a questionar seu ministério. Isso certamente não era bom, e eles precisavam ser libertos daquela facção.
Paulo sabiamente não tratou desta questão em sua primeira epístola, mas deixou até então porque isso envolvia defender seu próprio caráter e ministério, bem como seu apostolado. Como esse grupo de oposição estava profundamente arraigado naquela assembleia, lidar com esse problema exigiria maior tato. Paulo não queria parecer como alguém que estivesse apenas se defendendo em uma briga pessoal. Poderia ser facilmente interpretada como uma ação da carne, e os santos estariam inclinados a acreditar que seus críticos estavam certos. O assunto era muito mais sério do que aparentava; seus opositores eram “falsos apóstolos” e “obreiros fraudulentos” que estavam realizando a obra de Satanás entre os coríntios, desviando-os do apóstolo e da verdade que Deus lhe revelara para dar a eles (2 Co 11:13). Assim, lidar com esse problema sem diretamente dar a impressão de que estivesse se defendendo, exigiria sabedoria que somente o Espírito de Deus poderia dar.
Nos capítulos 1-7, o apóstolo explica aos coríntios seus movimentos e princípios que o levou a agir. Ao fazer isso, de uma maneira indireta, ele dá um esboço notável do que deve caracterizar um verdadeiro ministro Cristão. De certo modo ele “mata dois coelhos com uma cajadada”. Aparentemente, parece que ele está dando uma explicação simples de seus movimentos no serviço do Senhor, mas no fundo, ele cuidadosamente faz defesa contra as alegações de seus acusadores e, assim, fornece fundamentos para a aprovação de seu próprio ministério. Não é até a última parte da epístola (cap. 10-13), assumindo que naquele momento que teria ganhado a confiança dos coríntios, que Paulo expõe abertamente esse grupo. Ele fala diretamente e mostra que eram homens falsos e enganosos que estavam fazendo o trabalho de Satanás.
A quarta razão para escrever a epístola era encorajar os santos de Corinto a se dedicarem ao ministério de dar (caps. 8-9). Isto era também um assunto delicado, porque poderia parecer que ele estava atrás do dinheiro deles – especialmente depois que lhes dissera em sua primeira epístola que não faria isso (1 Co 9:6-15). Uma vez que abordar este assunto poderia ser mal interpretado, sabiamente esperou até que houvesse uma necessidade entre os santos que não envolvesse o apoio a obreiros como ele próprio. Os pobres santos de Jerusalém precisaram de ajuda financeira, e neste contexto, ele encoraja os coríntios a dar. Ninguém poderia acusá-lo de estar tirando proveito da riqueza deles porque não estava pedindo nada para si mesmo. No entanto, os princípios que ele dá nesses dois capítulos têm uma ampla aplicação e podem ser postos em prática por aqueles que trabalham para o Senhor ministrando a Palavra, bem como para qualquer um do povo do Senhor que esteja em alguma necessidade financeira.
A Aplicação Prática
Como mencionado anteriormente, esta epístola apresenta um quadro maravilhoso das características de um verdadeiro ministro Cristão, como visto no próprio Paulo. Sua aplicação prática está em entender que todo Cristão é um ministro de Cristo Jesus – ou pelo menos deveria ser. Ministério é o exercício do nosso dom no serviço do Senhor (1 Pe 4:10-11; Rm 12:5-8). É simplesmente a execução do nosso serviço para o Senhor, seja qual for – ensinando, pregando, pastoreando, ajudando, mostrando misericórdia etc. Todos temos um serviço a fazer para Ele, e, portanto, estamos todos no ministério em um sentido ou outro. Uma vez que todos somos ministros, esta epístola tem uma importante aplicação prática para cada um de nós. Ela apresenta um elaborado perfil de um verdadeiro ministro Cristão, delineando as características morais e exercícios que devem caracterizar todos os que estão no ministério.
As Três Principais Divisões na Epístola
- Capítulos 1-7 – As características de um verdadeiro ministro Cristão e seu ministério. - Capítulos 8-9 – O apoio do ministério Cristão pelo ministério de dar. - Capítulos 10-13 – A defesa do apostolado de Paulo e do verdadeiro ministério Cristão.
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AS CARACTERÍSTICAS DE UM VERDADEIRO MINISTRO E SEU MINISTÉRIO
(Capítulos 1-7)
A Introdução à Epístola
Vs. 1-2 – Mesmo sendo Paulo um apóstolo, ele inclui Timóteo em sua saudação. Mencionar Timóteo não quer dizer que ele era coautor da carta, mas que atestou as observações de Paulo aos coríntios. Isto foi porque ele estava se dirigindo a uma assembleia, e todas as coisas nessa esfera coletiva deveriam ser feitas “Por boca de duas ou três testemunhas” (2 Co 13:1; Jo 8:17).
Paulo chama a si mesmo um apóstolo de “Cristo Jesus”, porque esta expressão indica Cristo tendo completado a redenção e retornado ao céu como um Homem glorificado. Foi de Cristo no alto em glória que Paulo recebeu seu apostolado (1 Co 9:1-2). Em cada uma de suas epístolas, quando menciona seu apostolado, fala de o tendo recebido de “Cristo Jesus”. (A KJV não faz esta distinção, mas a maioria das traduções críticas e interlineares faz). Pedro, por outro lado, chama a si mesmo apóstolo de “Jesus Cristo” (1 Pe 1:1; 2 Pe 1:1). Esta expressão indica Cristo como aqu’Ele que veio do céu para fazer a vontade de Deus, e foi aqui, quando o Senhor estava na Terra, que Pedro recebeu seu apostolado (Lc 6:13-16).
A epístola é endereçada “à igreja de Deus [assembleia], que está em Corinto, com todos os santos que estão em toda a Acaia”. “Santos” como mencionados aqui, não indica perfeição moral, como comumente pensado, mas aqueles que foram separados pela obra de Deus no novo nascimento. “Santo” quer dizer alguém separado. Leva a ideia de ter sido feito santo, porque foi colocado em um lugar limpo com uma natureza santa, e está lá por um chamado divino. Um santo, embora separado para Deus por meio de uma obra divina, na prática pode ser completamente pecaminoso em sua doutrina e andar. Este, é triste dizer, era o caso da assembleia em Corinto. Paulo se dirigiu a eles como sendo “santos” nas duas epístolas, apesar de que seguiam com algumas doutrinas e práticas muito profanas. Isto mostra que o termo se refere à posição de uma pessoa diante de Deus, não seu estado prático.
“Graça” e “paz” são mencionadas como sendo dadas “da parte de Deus nosso Pai, e da do Senhor Jesus Cristo”. Ele dá graça para nossas necessidades no caminho e paz em todas as circunstâncias em que nos encontramos.
AS CARACTERÍSTICAS DE UM VERDADEIRO MINISTRO DE CRISTO
Atacado por certos críticos, Paulo agora apresenta a grande defesa de sua vida e ministério. À medida que explica seus movimentos no serviço do Senhor, remove as dúvidas e suspeitas que foram implantadas nas mentes dos coríntios por seus opositores. Ele expõe de maneira cuidadosa e metódica o engano e o absurdo das falsas alegações feitas a ele, mostrando aos coríntios que aquelas críticas eram infundadas.
Como mencionado, à medida que faz isto, ele apresenta uma breve descrição do caráter que um verdadeiro ministro de Deus deveria ter. Isto daria aos coríntios um padrão pelo qual eles poderiam discernir todos os que viessem a eles se apresentando como ministros da Palavra, e nos fornece um perfil do que deveria nos caracterizar como ministros de Cristo.
Um Verdadeiro Ministro Cristão é Cheio da Compaixão de Deus
(cap. 1:3-11)
O povo do Senhor está continuamente passando por sofrimento e provações; se o servo do Senhor vai ministrar a eles efetivamente, deve ter um coração como o de Deus – cheio de compaixão. Deus é “o Pai das misericórdias [compaixões]” e quer isso muito característico em Seus ministros. Esta, então, é a primeira grande característica que deveria marcar todo ministro Cristão – um coração cheio da compaixão de Deus.
Isto foi algo que caracterizou a vida e ministério do Senhor Jesus Cristo – nosso Modelo de Servo. Diz que quando via as multidões, “Ele era movido de grande compaixão” (Mt 9:36, 14:14; Mc 1:41). Sem esta importante qualidade pessoal, o servo do Senhor terá falta de poder e efetividade em alcançar os corações das pessoas que estão passando por provações e aflições.
Esta importante qualidade, no entanto, não é adquirida estudando-se livros; não podemos obtê-la fazendo seminário, ou estudando “Sinopses dos Livros da Bíblia” de J. N. Darby. É uma particularidade que não vem naturalmente ao coração humano, porque somos naturalmente mais preocupados conosco do que com o bem estar dos outros. O próprio Deus forma esta importante qualidade em nossas almas na escola da aflição. Ele prepara Seus servos (ministros) moral e espiritualmente fazendo-os passar por circunstâncias difíceis (provas) pelas quais aprendem lições valiosas e obtêm graça d’Ele no caminho da vida. Se examinarmos as Escrituras, veremos que praticamente todo servo que Deus chamou e usou, Ele primeiro o educou em segredo, no que podemos chamar de “história secreta com Deus no deserto”. Por esse meio, o servo é capacitado por Deus para ministrar efetivamente aos outros, entrando em suas provações e genuinamente condoendo-se com eles em suas dificuldades.
Experimentar provações na vida é o modo designado por Deus de treinar Seus servos em Sua escola; é assim que Sua compaixão é neles formada. O Senhor não comete erros em Suas lições. Tudo o que Ele permite em nossas vidas é para nosso desenvolvimento moral e espiritual. Eliú corretamente disse “quem ensina como Ele?” (Jó 36:22). O propósito do ensino em Sua escola é o de Ele ter um lugar maior em nossas afeições e de que não tenhamos confiança na carne. A Escritura fala sobre ser “mudado de vasilha para vasilha” (Jr 48:11 – ARA) descrevendo esses exercícios. Tem sido dito que nenhum servo foi usado por Deus que não tenha sofrido. Sendo este o caso, muitos podem invejar o ministério de um servo, mas ninguém vai invejar sua disciplina. Grande parte do trabalho de Deus em Sua escola consiste em nos reduzir a um tamanho adequado no qual Ele pode nos usar em Seu serviço. Com todos nós, este é um trabalho em andamento. O surpreendente sobre isto é que Deus usa vasos que Ele ainda não terminou no que diz respeito ao seu desenvolvimento pessoal.
Vs. 3-11 – Paulo bendiz Deus pelo conforto divino que recebeu em suas provações e aflições (vs. 3-7), e pelo livramento divino que recebeu quando Deus o tirou daquelas provações (vs. 8-11). Entendendo que essas coisas todas trabalham juntas para glória de Deus e para o supremo conforto do Seu povo, Paulo fala com louvor das “misericórdias [compaixões] de Deus” em tempos de aflição. Ele exulta: “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias [compaixões] e o Deus de toda a consolação; Que nos consola [encoraja] em toda a nossa tribulação, para que também possamos consolar [encorajar] os que estiverem em alguma tribulação, com a consolação [encorajamento] com que nós mesmos somos consolados [encorajados] por Deus”. Nesta curta bênção, ele relacionou o verdadeiro conforto à sua fonte divina – o próprio Deus. Satanás é o deus de todo o desencorajamento, mas nosso Pai é “o Deus de toda a consolação [encorajamento]”. Paulo podia bendizer a Deus por tudo o que ele teve de passar na vida porque sabia que algo estava sendo trabalhado nele que o ajudaria ao final a encorajar os santos.
Então, Paulo se gloriou nas “tribulações” (Rm 5:3-5). É preciso fé para ser capaz de honestamente agradecer a Deus por toda situação de prova em que Ele nos coloca, contudo é isto que o apóstolo fez. É fácil bendizer o Senhor em tempos bons, mas fé O bendiz em todo o tempo – mesmo quando os tempos são difíceis. Davi disse “Bendirei o Senhor em todo o tempo” (Sl 34:1 – ARA). Da mesma forma, Paulo disse “Em tudo dai graças, porque esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco” (1 Ts 5:18).
É significativo que a palavra “consolação [encorajamento]” apareça dez vezes em cinco versículos curtos (vs. 3-7). Esta repetição nos diz que o povo de Deus precisa muito de encorajamento. Deus, portanto, tinha um propósito definido em transmitir Seu consolo ao apóstolo. Ele queria que ele “confortasse [encorajasse] os que estivessem em alguma tribulação, com a consolação [encorajamento]” que ele recebeu do Senhor (v. 4).
Ele chama os sofrimentos que ele passou de “as aflições de Cristo” (v. 5). Ele quis dizer que a perseguição e as hostilidades que ele suportou eram do mesmo caráter que aquelas que o Próprio Senhor suportou quando ministrou na Terra. Esses são parte dos sofrimentos do martírio do Senhor. Se formos fiéis, compartilharemos esses sofrimentos do Senhor (Mc 10:39), mas nunca podemos compartilhar os Seus sofrimentos expiatórios (Mc 10:38).
Como mencionado, os confortos que Paulo recebeu de Deus em Suas aflições, foram, fundamentalmente, para o bem dos coríntios. Ele disse “Mas, se somos atribulados, é para vossa consolação [encorajamento] e salvação” (v. 6). Eles eram os que se beneficiariam das aflições de Paulo, porque ele era capaz de ministrar a eles o conforto de Deus mais efetivamente. Paulo acrescentou “E a nossa esperança acerca de vós é firme, sabendo que, como sois participantes das aflições, assim o sereis também da consolação [encorajamento]” (v. 7). Sua “esperança” para eles era que se beneficiassem de seus sofrimentos recebendo seu ministério.
As experiências pelas quais Paulo passou nas provações produziram nele um efeito triplo:
- Deu-lhe uma nova causa para bendizer a Deus (v. 3). - Ele adquiriu um entendimento de como Deus dá consolo ao Seu povo em tempos de provação (v. 4a). - Permitiu-lhe consolar e encorajar outros que passavam por provação (vs. 4b-7). Sua “esperança” era que os santos se beneficiassem dos resultados de suas provações em seu ministério.
V. 8 – Ele passa a dar-lhes um exemplo da aflição que passou, apontando para o problema que sofreu “na Ásia”, que era bem conhecido entre os santos em geral (At 19:22-41). Ele diz que eles foram “sobremaneira agravados mais do que podíamos suportar, de modo tal que até da vida desesperamos”. Em sua primeira epístola, referiu-se a este mesmo conflito, dizendo que “combati em Éfeso contra as bestas” (1 Co 15:32). Os homens naquela região eram tão veementemente contra a verdade do evangelho que se comportavam como bestas selvagens.
Paulo tinha uma razão definida para dizer isso aos coríntios; havia alguns entre eles que diziam que ele era um indivíduo problemático e que provocava problemas e controvérsias por toda parte em que ia. Eles o acusaram de constantemente se envolver em problemas com as autoridades e de ser um incômodo público, e este incidente em particular foi usado para fundamentar o argumento deles. Mas não era este o caso. As aflições que ele passou na Ásia foram sofrimentos legítimos pelo amor do evangelho e não foram por causa de qualquer erro pessoal. Alguns dos coríntios estavam criticando o apóstolo pelos problemas nos quais ele havia se envolvido, mas, na realidade, Deus ordenou isso para que eles acabassem por receber uma bênção disso!
Eles seriam os recebedores da graça e conforto que Paulo recebeu de Deus naqueles problemas pelo seu ministério de conforto para eles. Aprender isso deve ter surpreendido os coríntios.
V. 9 – Sofrer aflição desta maneira obviamente não era algo agradável. Paulo diz “Mas já em nós mesmos tínhamos a sentença de morte, para que não confiássemos em nós, mas em Deus, que ressuscita os mortos”. Ele e seus cooperadores chegaram perto da morte (martírio) naquela ocasião, mas eles entenderam totalmente que eram homens que tiveram um encontro com a morte por amor de Cristo; era só uma questão de tempo até isso acontecer.
Independentemente dos equívocos de seus difamadores (intencionais ou não), esta prova em particular ensinou a Paulo algumas lições valiosas que todos precisamos aprender. Foram elas:
- Não confiar em si mesmo, senão em Deus (v. 9). Uma das grandes lições na escola de Deus que o servo do Senhor deve aprender de uma vez por todas é não confiar em si mesmo (Jr 17:9; Pv 28:26; Is 2:22). O Senhor sabe como tirar de nós a autoconfiança, colocando-nos em circunstâncias difíceis na vida onde somos sobremaneira pressionados. O resultado é que aprendemos mais plenamente d’Ele, e assim o nosso ministério é mais sincero e efetivo. - Ter um conhecimento prático do cuidado preservador de Deus em várias situações na vida real (v. 10). - Experimentar a comunhão e o conforto das orações dos santos em tempos de necessidade, por meio dos quais se desenvolve um vínculo mais profundo de amor e apreço por nossos irmãos no Senhor (v. 11).
V. 10 – Paulo então fala da fidelidade de Deus em libertar ele e seus cooperadores de sua experiência que beirou a morte, Ele diz “O qual nos livrou de tão grande morte, e livrará; em Quem esperamos que também nos livrará ainda”. Eles tinham um senso profundo do cuidado preservador de Deus, tendo aprendido a confiar n’Ele em circunstâncias tão difíceis.
Alguns pensaram que este versículo está se referindo aos três aspectos da salvação completa de Deus – salvação da punição dos nossos pecados, salvação do poder do pecado em nossas vidas, e salvação da presença do pecado, conforme apresentado na epístola aos Romanos. No entanto, o contexto desta passagem mostra claramente que Paulo estava falando sobre uma libertação transitória, não a libertação da alma. Na realidade, ele estava falando de três diferentes tempos de libertação transitória. Isto é, libertação em um sentido literal, semelhante ao que Israel conheceu nos tempos do Velho Testamento, quando eles foram libertados (fisicamente) dos egípcios e dos filisteus, etc. Deus libertou Paulo e seus cooperadores do perigo do martírio, e Ele continuava a libertá-los daquele perigo atualmente. Paulo estava confiando que Deus faria isso nos dias vindouros, enquanto pregavam o evangelho entre pessoas hostis.
V. 11 – Paulo deu crédito aos coríntios por sua parte na libertação presente que ele e seus cooperadores estavam experimentando de Deus. Ele presume que a compaixão, da qual ele tinha falado, estava em seus corações para com ele, e que eles estavam orando por ele em seus trabalhos. Ele usa uma pequena ironia aqui, pois eles tinham sido críticos para com ele e era questionável se eles ainda se lembravam dele diante do trono da graça.
Podemos aprender com isso que não devemos desprezar as provações e tribulações pelas quais passamos porque Deus tem nelas um plano definido. Ele está formando algo valioso em nós, que Ele pode usar para ajudar Seu povo. Cada um de nós está em Sua escola; se nos beneficiarmos das coisas pelas quais passamos, seremos uma ajuda e uma bênção para outros que estão passando por dificuldades. Quanto maior o sofrimento que somos chamados a suportar, maior a oportunidade que temos de aprender o conforto de Deus. Ele quer nos encher com Sua compaixão, e não há melhor maneira do que ser colocado em situações difíceis, onde nós mesmos precisamos de compaixão, e tê-Lo, ternamente ministrando-a para nós. Se tal for o caso, o que virá de nossos corações no ministério terá poder para com aqueles a quem ministramos. Eles verão que genuinamente nos preocupamos com eles e estamos interessados na sua bênção. Consequentemente, eles receberão nosso ministério.
Um Verdadeiro Ministro Cristão é Consistente em Todas as Suas Relações na Vida
(cap. 1:12-24)
Paulo continua a explicar seus movimentos na obra e a abordar (indiretamente) as alegações que foram feitas contra ele. Ao fazer isso, ele apresenta outra característica que deve marcar um verdadeiro ministro de Cristo – consistência.
Seus acusadores estavam dizendo que ele não era uma pessoa sincera e nem confiável. O exemplo que eles apontaram foi que ele havia dito que viria a eles antes do inverno, mas não veio (1 Co 16:4-6). Querendo encontrar falha nele, viram isso como uma promessa quebrada. Eles o acusaram de vacilação e duplicidade – de dizer uma coisa, mas fazer outra. Disseram que era um homem que não mantinha sua palavra, e insinuaram que ele não poderia ser confiável. Aparentemente, tinham se esquecido que ele tinha condicionado suas intenções de vir dizendo “se o Senhor o permitir” (1 Co 16:7). De toda forma, nos versículos 12-24, Paulo explica a razão da sua mudança de planos. Ao mesmo tempo, ele usa a oportunidade para mostrar outra grande característica que deveria marcar um ministro de Cristo – ele deve ser consistente em todas as suas relações na vida.
V. 12 – É difícil acreditar que o apóstolo fosse acusado de ser indeciso. Essas acusações lançam dúvidas sobre sua honestidade e integridade. Para remover essas dúvidas e suspeitas que os coríntios tinham, Paulo começa com uma afirmação positiva e enfática de sua sinceridade, dizendo: “Porque a nossa glória é esta: o testemunho da nossa consciência, de que com simplicidade e sinceridade de Deus, não com sabedoria carnal, mas na graça de Deus, temos vivido no mundo, e de modo particular convosco”. A “consciência” de Paulo era testemunha do fato de que sua conduta havia sido caracterizada por absoluta sinceridade. Toda a sua vida foi de “simplicidade”. Esta é uma palavra antiga que significa “mente simples”. Ele não era uma pessoa de dupla palavra; ele era um homem de integridade e “sinceridade”. Seu propósito de vir a eles não era algo “carnal” que mudaria de um dia para outro; foi o que ele propôs pela “graça de Deus”. Esta era sua conduta normal com homens “no mundo” e com os Cristãos.
Vs. 13-14 – Ele disse, “Porque nenhumas outras coisas vos escrevemos, senão as que já sabeis ou também reconheceis”. Ele não tinha um significado oculto para suas palavras quando escreveu a respeito de suas intenções de ir até eles. O significado das suas palavras era claro e óbvio. Ele disse o que quis dizer, e não pensou em fazer outra coisa senão o que pretendia fazer.
Ele estava grato que eles reconheceram o conteúdo de sua primeira epístola, e confiou que continuariam a fazê-lo, enquanto vivessem (“também até ao fim”). Mas ele acrescenta tristemente, “Como também já em parte reconhecestes em nós”. Foi apenas “em parte” porque havia uma divisão entre os coríntios que não apreciava Paulo e seus cooperadores. Ao dizer isso, ele os avisou que estava ciente de que havia alguns entre eles que estavam contra ele.
Vs. 15-16 – Com essa pureza de pensamento, Paulo tinha a “intenção” (TB) de ir ter com eles. De fato, tão transparentes eram seus motivos que não tinha dificuldade em dizer-lhes que realmente pretendia ir duas vezes, para que eles tivessem “um segundo benefício” (TB). Ele queria ir até eles a caminho da Macedônia, e depois visitá-los novamente, retornando da Macedônia em seu caminho para a “Judéia”.
Vs. 17-18 – Ele lhes pergunta, “E, deliberando isto, usei porventura de leviandade? Ou o que delibero, o delibero segundo a carne, para que haja em mim sim sim, e não não?” Isto poderia ser respondido com um sonoro, “Não!” (“Leviandade” é uma antiga palavra que significa ser volúvel). Ele insiste que seus planos não eram sim, sim, e então, por um capricho, ele os mudou para não, não.
Paulo usou as críticas deles como uma oportunidade de mostrar que o servo do Senhor deve ser coerente com sua palavra em todas as suas questões. Suas relações com as pessoas devem ser consistentes com o caráter do próprio Deus. Ele insiste que aquele era o seu caso, dizendo “como Deus é fiel, a nossa palavra para convosco não foi sim e não”. Veja também Tiago 5:12.
Vs. 19-20 – De acordo com isto, o evangelho que ele, “Silvano” e “Timóteo” levaram entre os coríntios desde o início não era “sim e não, mas n’Ele era sim”. Tudo o que Deus promete no Evangelho Ele cumpre em Cristo. Além disso, “tantas quantas forem as promessas de Deus, n’Ele está o sim; porquanto também por Ele é o amém, para a glória de Deus por nosso intermédio”. Não apenas era o “sim” encontrado em Cristo, mas também o “Amém”. O Senhor não apenas concorda com a vontade de Deus como expressado nas promessas de Deus no evangelho, Ele as leva à conclusão. Além disso, Ele ganha pessoas por meio da graça, e faz deles Seus servos para a realização da vontade de Deus. Isso é indicado nas duas palavras “por nós” no final do versículo 20.
Vs. 21-22 – Tudo o que Deus faz é sólido e confiável. Ele estabelece almas em Cristo pela habitação do Espírito de Deus que confirma o trabalho divino em nós. O efeito deste trabalho nos dá absoluta certeza de tudo o que Deus prometeu. Ele fala de três coisas em particular: “Mas o que nos confirma convosco em Cristo, e o que nos ungiu**,** é **Deus, O qual também nos** selou **e deu o** penhor **do Espírito em nossos coraçõe**s**”**. Estas são três diferentes operações do Espírito em nós quando somos salvos. Elas nos capacitam a viver inteligentemente, com uma sensação de segurança e felizes no Senhor.
- A unção do Espírito é para poder e discernimento (1 Jo 2:18-21, 24-27). - O selo do Espírito é para nossa certeza (Ef 1:13; 4:30). - O penhor do Espírito é para o nosso regozijo presente do que virá no futuro (Ef 1:14).
Paulo menciona isso para mostrar que, já que tudo o que Deus faz e diz pode ser considerado eterno, Seus ministros devem mostrar o mesmo caráter de imutabilidade e confiabilidade em todas as suas relações com os homens, para que eles representem adequadamente a Deus.
V. 23 – Se a integridade das relações de Paulo era de caráter excelente, então por que ele não foi até eles como planejado? Paulo agora responde isto: Para mostrar a absoluta sinceridade da explicação que estava prestes a dar, ele chama Deus por testemunha, dizendo, “Invoco, porém, a Deus por testemunha sobre a minha alma”. Isto mostrou que sua consciência estava limpa diante de Deus, e que estava dizendo a verdade. Ele continua dizendo, “que para vos poupar não tenho até agora ido a Corinto”. Se ele tivesse ido quando pretendia, teria de lhes infligir severa disciplina por causa dos muitos males e desordens que havia naquela assembleia! Ele os queria “poupar” do julgamento que certamente recairia sobre eles, então ele atrasou sua ida para dar-lhes tempo para se arrependerem e colocarem as coisas em ordem. Então, não era que ele fosse descuidado; foi exatamente o oposto – foi porque cuidava deles! Para eles, como assembleia, foi totalmente falta de consideração que ele não tivesse ido! A acusação deles de inconstância, era, portanto, simplesmente infundada. Perceber isso deve ter humilhado ainda mais os coríntios.
V. 24 – Ter que intervir e exercer sua autoridade apostólica em Corinto (se as coisas não tivessem sido colocadas em ordem) poderia ter sido entendido como se ele estivesse procurando ter domínio sobre eles e controlar sua fé. Portanto, ele acrescenta, “Não que tenhamos domínio [governo] sobre a vossa fé, mas porque somos cooperadores de vosso gozo; porque pela fé estais em pé”. Isso, ele esperava, aliviaria as suspeitas que pudessem ter de que queria dominar suas consciências. Ele não tinha pensado em dominar sua fé; só queria aumentar a felicidade deles e ser um “cooperador” de seu “gozo”. Ele não queria dominar suas consciências nessa questão, mas sim fazê-los agir para a glória de Deus ao colocar as coisas em ordem. Como ninguém tem autoridade apostólica hoje em dia, quando há desordens numa assembleia, tudo o que um servo do Senhor pode fazer é instruir, encorajar e guiar os santos em assuntos locais que os possam estar incomodando, e deixar suas consciências agirem diante do Senhor.
Já que estamos todos no ministério de uma forma ou de outra, esse princípio de consistência se aplica a todos nós. Portanto, tenhamos o cuidado de ser consistentes em todas as nossas questões na vida; isso dará peso ao nosso ministério.
Um Verdadeiro Ministro Cristão é Fiel para Confrontar Questões que Afetam a Glória do Senhor
(cap. 2:1-13)
Paulo torna a abordar outro assunto que dizia respeito à assembleia em Corinto. Os coríntios precisavam saber o que fazer com o homem que eles tinham colocado fora de comunhão, que agora estava arrependido. Paulo torna a abordar isto no capítulo 2. Ao mesmo tempo, ele esclarece outro equívoco que tinham dele. Fazendo isto Paulo toca em outra característica que deveria marcar um verdadeiro ministro de Cristo – fidelidade para confrontar questões entre os santos que afetam a glória de Deus.
Alguns dos coríntios estavam dizendo que Paulo era um homem duro e insensível. Escrevendo uma carta tão severa como ele escreveu (a primeira epístola) e exigindo a excomunhão do homem imoral do meio deles, confirmou isto nas suas mentes. Eles podem ter pensado que chamar o homem de “esse iníquo” (1 Co 5:13) era excessivamente crítico – até mesmo cruel. Esta crítica, sem dúvida, veio daquele mesmo grupo de opositores que procuraram desacreditar o ministério do apóstolo. Portanto, ele se compromete a explicar suas ações.
Vs. 1-3 – Paulo reitera seu propósito de não ir a Corinto “em tristeza” e exercer disciplina apostólica sobre eles. Em vez disso, enviou a carta de correção. Pelos resultados obtidos, lidar com o assunto dessa maneira apenas confirmou a sabedoria em tratá-lo. Além disso, os próprios coríntios, em certo sentido, reconheceram essa sabedoria! Eles receberam a carta e acertaram as coisas que estavam deficientes na assembleia, e ao fazê-lo, estavam realmente concordando com sua linha de ação de não ter ido a Corinto, como planejava, e, em vez disso, enviar a carta.
A primeira epístola fez com que eles se entristecessem, como ele pretendia que fizessem (v. 2). Eles foram “entristecidos para o arrependimento (…) segundo Deus” (TB) e acertaram as desordens que ele apontou. Isto foi bom e contribuiu para a “salvação” da assembleia do julgamento que sobre ela viria diretamente de Deus, ou pela mão do apóstolo (2 Co 7:9-11).
Enquanto o conteúdo da primeira carta fez os coríntios ficarem “entristecidos”, o arrependimento deles fez Paulo ficar “alegre”. Os “mesmos” (os coríntios) que se sentiram entristecidos por ele, agora o alegraram. (No versículo 2 da KJV “quem é ele então que me alegrará?”, a palavra “ele” não existe no texto original, e poderia nos induzir a pensar que Paulo estava falando sobre o ofensor que foi tirado da comunhão. No entanto, estava falando da assembleia como um todo).
Ele enviou a carta antes, assim quando ele fosse, iria “confiando” e não com tristeza, e o resultado seria que sua “alegria” seria a “alegria” deles (v. 3).
Vs. 4-5 – Ele vai adiante e mostra que não era uma pessoa insensível sem sentimentos pelos santos. Deixou-o muito consternado dirigir-se a eles como fez na primeira carta. Não foi algo fácil de fazer porque os amava profundamente. Ele diz “Porque em muita tribulação e angústia do coração vos escrevi, com muitas lágrimas”. A verdade é que ele escreveu essa carta de correção por fidelidade ao Senhor. Tinha de ser feito para a glória de Deus. Aqueles males entre eles simplesmente não podiam continuar em associação com o nome do Senhor. Ele não “varreu para baixo do tapete”, mas fielmente confrontou as questões que eram necessárias no meio deles. Ele não tinha alegria em dizer-lhes que tinham de afastar o homem, mas a fidelidade ao Senhor exigiu isso.
Paulo não estava tentando entristecê-los por razão alguma, mas que eles “conhecessem o amor” que ele tinha “abundantemente” por eles. O amor falará fielmente. “Fiéis são as feridas feitas pelo que ama” (Pv 27:6). No entanto, ao ser fiel com os coríntios, ele foi mal interpretado, mas esse é frequentemente o caso. Pode-se esperar que, se formos fiéis em relação às questões da assembleia, possivelmente poderemos ser mal compreendidos.
Aqueles que haviam pecado entre eles não apenas entristeceram Paulo, mas “em parte” entristeceram a “todos”. Os tais estavam trazendo problemas a todos na reunião. Por causa da sua associação com o malfeitor, Deus considerou toda a assembleia responsável (1 Co 11:30). Isto é ilustrado no relato de Acã. Quando ele pecou, o Senhor disse a Josué, “Israel pecou” (Js 7:11). Seu pecado pessoal de cobiça e engano afligiu todo o Israel, e custou a vida dele (Js 7:25; 1 Cr 2:7).
Paulo disse “em parte” porque nem todos os santos de Corinto estavam tristes com a desonra que isso trouxe ao nome do Senhor. No entanto, a assembleia ainda era responsável por lidar com isso, e felizmente eles o fizeram. Isso mostra que não é necessário unanimidade na assembleia antes que ela haja administrativamente em uma decisão de julgamento de ligar ou desligar.
V. 6 – O apóstolo agora indica que a assembleia precisava receber de volta em comunhão o homem que tinha sido colocado fora de comunhão. Isto certamente mostrou que ele se preocupava com o homem, e que não era cruel e implacável. Ele diz, “Basta-lhe ao tal esta repreensão feita por muitos”. A censura colocada sobre ele funcionou e o trouxe ao arrependimento diante do Senhor, e agora era hora de recebê-lo de volta em comunhão. Este é um momento feliz para uma assembleia.
Paulo disse “feita por muitos”. A nota de rodapé da tradução J. N. Darby de 2 coríntios 2:6 indica que “muitos” é o corpo como um todo – a massa dos santos universalmente. Ele cita 2 coríntios 9:2 como exemplo de uso e significado. O ponto aqui é que, se uma assembleia local deve tomar uma decisão de ligação colocando alguém fora de comunhão, o corpo como um todo age em conjunto com aquela assembleia local e reconhece a ação, então aquela pessoa “afastada” é considerada “fora” em todas as outras reuniões também, não só na localidade onde reside. Portanto, o ofensor é levado a sentir a repreensão por mais do que apenas aqueles que estão em sua assembleia local. Não dizemos que o homem em questão realmente foi a outras localidades e sentiu a “repreensão” deles, mas que a execução da ação foi expressa universalmente – pelo corpo como um todo. Se uma pessoa tiver de ser tirada de comunhão numa determinada localidade, ela deve ser considerada fora da comunhão em toda a Terra, porque o que é feito em nome do Senhor em uma assembleia local na prática afeta o todo. Isto mostra que as assembleias que se reúnem no terreno bíblico, como reunidos ao nome do Senhor, não são autônomas. Eles agem juntos, expressando a verdade que são um corpo (Ef 4:4).
Vs. 7-8 – Paulo diz a eles, primeiramente para “perdoar” o homem, e “consolá-lo [encorajá-lo – JND]” no Senhor. Paulo rogou-lhes: “que confirmeis para com ele o vosso amor [afirmassem – JND]”. Esta foi a sanção do apóstolo permitindo agora que o homem arrependido tivesse comunhão com os santos. O fato de que o homem estava expressando “tristeza” sobre o que tinha feito indicava que o arrependimento estava operando em sua alma. Paulo diz “deveis”. Isto significa que todos os santos em unidade deveriam mostrar graça para com o ofensor arrependido; isto não deveria ser feito por poucos que se sentissem assim, mas por todos os santos. Algumas vezes nesse tipo de situação se torna evidente que há alguns que têm um espírito implacável e resistem, mas não é isto que Paulo deseja aqui.
A palavra “perdão” no versículo 7 (na KJV) deveria ser na realidade traduzida como “mostrar graça”. (veja também Lucas 7:42). Depois, no versículo 10, outra palavra é usada na linguagem original que está corretamente traduzida “perdão” na KJV. Isto se refere ao perdão administrativo – a retirada oficial da censura colocada sobre uma pessoa em excomunhão, por meio do qual ela estaria novamente em plena comunhão como antes. O fato de mostrar graça ser mencionado antes e separado do perdão administrativo indica que a assembleia tem a opção de exercer graça para com uma pessoa arrependida antes de realmente retirar o julgamento administrativo. A assembleia poderia escolher permitir que uma pessoa, a quem estão procurando restaurar, andasse novamente entre os santos, sem que ela tivesse o privilégio de comunhão completa participando da Ceia do Senhor. Sob condições normais, as duas coisas precisariam ser feitas juntas, mas pode haver certos casos onde a assembleia precise observar a profundidade de arrependimento da pessoa antes que seja confortável recebê-la de volta em comunhão, e estes versículos permitem isso. Uma palavra de cautela aqui; se uma assembleia decide tratar um caso desta maneira, deve atentar para que todos na assembleia ajam juntos, fazendo um anúncio com esse fim.
Há uma figura desses dois passos para restauração à Mesa do Senhor, em Levítico 14, na limpeza do leproso. Após o leproso ser limpo, a ele era dada liberdade de entrar no arraial de Israel novamente, mas não lhe era permitido retornar a sua posição original imediatamente. Ele tinha de ficar “fora da sua tenda por sete dias” (Lv 14:8). E então após mais lavagens e ser cortado todo o seu pelo (o que fala de julgamento próprio), ele era autorizado a retornar a sua tenda.
Vs. 9-10 – Paulo afirma que a maneira com que eles tratassem da questão da restauração à comunhão, do ofensor arrependido, seria para ele uma “prova” se eram “obedientes em tudo”. Ele acrescenta, “E a quem [vós] perdoardes alguma coisa também eu”. “[Vós]” neste versículo refere-se à assembleia de Corinto. Com isso, ele indicou que era a assembleia em Corinto que deveria retirar a censura imposta ao homem, já que foram eles que a impuseram. Embora Paulo tivesse autoridade para agir apostolicamente nesta questão e restaurar o homem à comunhão, ele escolheu esperar até que a assembleia em Corinto agisse, e então daria um passo em acordo com eles e também perdoaria a pessoa. Temos grande instrução aqui. Aprendemos que a assembleia local (onde ocorre a ação de julgamento de ligar ou desligar) deve agir primeiro retirando a censura que colocaram sobre o ofensor, perdoando-o administrativamente. Os santos de outras localidades (o corpo como um todo) devem, então, agir em harmonia com isso e também perdoar a pessoa. Se o ofensor restaurado fosse visitar outras assembleias, elas iriam recebê-lo. Agindo assim, a verdade de o “um só corpo” é expressada na prática.
Os santos no corpo como um todo não devem interferir em outra assembleia em sua responsabilidade administrativa. Eles não devem se adiantar à assembleia local recebendo uma pessoa porque acreditam que ela está arrependida; isso leva à confusão. Embora a pessoa possa estar muito bem arrependida e pronta para ser recebida (como era o caso aqui), ainda assim os santos devem agir juntos na questão. O caminho de Deus é que a assembleia local, que aplicou a censura, deve agir primeiro em nome do corpo como um todo. As vozes de irmãos de outras localidades poderiam fazer conhecidos seus exercícios àquela assembleia, como ilustrado pelo apóstolo Paulo encorajando os coríntios a receberem o homem arrependido, mas a efetiva retirada da ação (liberação) é puramente de responsabilidade daquela assembleia (Mt 18:18).
V. 11 – Paulo segue dizendo “para que [nós] não sejamos vencidos por Satanás; Porque não ignoramos os seus ardis”. Ele não diz “para que [vocês] não sejam vencidos por Satanás” – os coríntios. “Nós” refere-se aos santos como um todo no “um só corpo”. Paulo sabia que uma das táticas de Satanás é dividir os santos da maneira que puder, e esses delicados assuntos interassembleias são um lugar onde é provável que atue. Este é um dos seus “instrumentos” que não devemos ignorar.
Sabendo que Satanás tentará usar essas circunstâncias para dividir os santos, Paulo mostra em suas ações como temos de agir nessas questões de liberar julgamentos da assembleia (exercendo perdão administrativo). Embora ele, e talvez outros, soubessem que o homem estava arrependido e deveria ser restaurado à comunhão, ele não foi adiante da assembleia em Corinto agindo independentemente. Agindo juntos nessas questões interassembleias, “a unidade do Espírito” é mantida “pelo vínculo da paz”. Divisões entre assembleias reunidas ao nome do Senhor resultaram de pessoas bem intencionadas agindo independentemente nessas questões.
Vs. 12-13 – Para mostrar a genuína preocupação que Paulo tinha pela assembleia dos coríntios, ele lhes fala da ansiedade que tinha em relação a como receberiam sua primeira carta. Apesar de que havia para ele “uma porta” aberta “no Senhor” para pregar o evangelho em Trôade enquanto esperava que Tito viesse com a notícia de como eles receberam a carta, não teve descanso em seu espírito até saber que o assunto estava resolvido. Portanto, ele deixou o trabalho e atravessou o Mar Egeu para a Macedônia para encontrar Tito, que estava subindo a costa com as notícias. Capítulo 7:6-7 nos diz que Tito encontrou Paulo na Macedônia com boas notícias que os coríntios haviam lamentado seus erros e acertado as coisas na assembleia.
Ao reiterar isso aos coríntios, Paulo mostrou a profundidade de sua preocupação por eles. Ele não era um homem duro e crítico como alguns deles imaginavam que fosse. Ao contrário, tinha tanto cuidado por eles que escolheu renunciar ao trabalho do evangelho para saber da resposta deles à sua primeira epístola! Suas preocupações pastorais prevaleceram sobre seu fervor evangelístico. Paulo tinha sido um ministro fiel ao apontar os erros deles, mas também era um ministro carinhoso e amoroso que tinha o bem deles em seu coração.
Isto nos ensina que as questões que pertencem à assembleia deveriam ter precedência aos serviços no evangelho. Aquilo que pertence à unidade da assembleia deve ser de extrema preocupação para nós. Muitos pensam que o serviço do evangelho é o serviço mais alto que podemos render a Deus, mas na realidade, sustentar e manter a verdade da Igreja que uma vez foi dada aos santos deveria ser nossa primeira preocupação (Jd 3). Infelizmente, alguns que sabem disso usam-no para dispensar completamente o trabalho do evangelho de suas atividades, mas isso é um desequilíbrio na direção oposta.
A essa altura, se os coríntios tivessem lido esta carta apropriadamente, teria ficado muito claro para eles que tinham tido uma impressão errada de Paulo – eles haviam mal entendido Paulo totalmente. Alguém entre eles havia insinuado que ele era um sujeito problemático que se envolveu em numerosos incidentes com as autoridades, mas ele mostrou que, realmente, Deus permitiu que se envolvesse nessas situações para proveito deles (cap. 1:3-11). Eles também o acusaram de inconstância em seus planos de ir a Corinto, mas ele mostrou que não tinha ido por causa de seu desejo de poupá-los de julgamento e não que fosse uma pessoa de duas palavras (cap. 1:12-24). Eles também insinuaram que era um homem duro e insensível, ordenando que o homem imoral no meio deles, fosse tirado da comunhão – até mesmo o chamando de pessoa iníqua, mas ele mostrou que foi por fidelidade ao Senhor que havia ordenado aquela ação contra o homem (cap. 2:1-13). Aprender da explanação de Paulo sobre essas questões os ajudaria muito a restaurar sua confiança nele como um verdadeiro ministro de Cristo.
Um Verdadeiro Ministro Cristão tem um Ministério que Impacta Seus Ouvintes
(cap. 2:14-3:18)
Tendo mencionado seu ministério no evangelho em Trôade, Paulo é levado a se desviar do assunto de receber sua primeira carta para continuar expondo as características de um verdadeiro ministro Cristão e seu ministério. Isto estava particularmente pressionando sua alma porque havia “muitos” que estavam trabalhando com motivos insinceros e dissimulados (v. 17). Mais tarde na epístola ele os chama de “falsos apóstolos” e “obreiros fraudulentos” (2 Co 11:13).
Uma vez que esses assim chamados doutores e ministros estavam afetando os coríntios de forma negativa, eles precisavam de um modelo endossado por Deus, para que pudessem identificar um verdadeiro ministro de Cristo Jesus, dentre aqueles que eram falsos. Portanto, começando no capítulo 2:14 e continuando até o capítulo 7:5, o apóstolo faz uma longa digressão na qual dá mais detalhes sobre seu caráter e ministério. Então, no capítulo 7:6 ele retorna as suas observações sobre a recepção de sua primeira carta. Esta digressão tem quatro parênteses (cap. 3:7-16, 5:7, 6:2, 6:13).
Continuando seu tema, Paulo passou a falar de outra distinta característica de um verdadeiro ministro Cristão – ele tem um ministério que impacta seus ouvintes. Em outras palavras, há poder no seu ministério. Não é suficiente ao servo do Senhor ter um coração cheio de compaixão, um caráter admirável, e bons motivos; seu ministério também tem que ter poder. O ministério oral não é apenas falar muitas palavras; é falar pelo Espírito para que o coração e a consciência dos santos sejam atingidos. É possível falar, mas na verdade não dizer nada, porque há falta de substância em nosso ministério. Evidentemente este era o caso com muitos que estavam se apresentando como ministros naquele dia. Portanto, Paulo enaltece duas grandes características do ministério que carregava. Se os coríntios pudessem ver isto, o diferenciariam dos “falsos apóstolos” e dos “obreiros fraudulentos” que estavam entre eles (2 Co 11:13).
1) É um Ministério Triunfante
Capítulo 2:14-17 – A primeira característica do verdadeiro ministério Cristão – do qual o apóstolo Paulo era o principal ministro – é a de triunfo. Ele diz, “E graças a Deus, que sempre nos faz triunfar em Cristo, e por meio de nós manifesta em todo o lugar a fragrância do Seu conhecimento. Porque para Deus somos o bom cheiro de Cristo, nos que se salvam e nos que se perdem: Para estes certamente cheiro de morte para morte: mas para aqueles cheiro de vida para vida”. Ser um ministro Cristão triunfante não é ser popular e ter grande número de seguidores; é ter um ministério que exalta Cristo – quer todos recebam ou não! Ministério que exalta Cristo é um triunfo contínuo.
Relembrando todo o incidente a respeito da vinda de Tito com as boas novas da recepção positiva de sua primeira carta aos coríntios, Paulo percebeu que Deus comandou maravilhosamente o assunto para a glória de Cristo, e isso o levou a transbordar em uma doxologia em agradecimento a Deus.
Deus é soberano, e serão salvos todos que foram ordenados para a salvação (At 13:48), quer seja a mensagem pregada por nós ou por outra pessoa. Saber disso deu paz a Paulo sobre se permaneceria em Trôade para pregar, ou se partiria para a Macedônia para encontrar Tito. Para ilustrar isso, Paulo usou uma figura emprestada de um costume romano daquela época. Um general romano vitorioso desfilava pelas ruas da cidade imperial em sua carruagem, coroado de louro, com seus prisioneiros acorrentados. O orgulhoso conquistador e suas tropas subiam ao Capitólio com nuvens de incenso enchendo o ar de perfume. À medida que faziam sua marcha triunfante pela cidade, o louvor do vencedor era gritado pelas multidões que se alinhavam no caminho. Os cativos estavam lá para aumentar o triunfo, e isso era demonstrado quando alguns cativos eram apontados para morrer, e alguns para viver. Da mesma forma, Deus está fazendo uma marcha vitoriosa por este mundo, e Paulo e todos os que estão envolvidos na propagação do evangelho são parte de Seu exército triunfante. “A fragrância do Seu conhecimento” no evangelho, como o perfume doce que subiu na marcha dos conquistadores romanos, estava sendo espalhada afora por eles “em todo o lugar” que iam (v. 14).
Paulo e aqueles que serviram com ele eram o meio pelo qual o perfume do evangelho era difundido. Não apenas o que pregavam era o “bom cheiro de Cristo”, mas eles próprios o eram, porque tinham sido transformados em Sua imagem pelo poder do Espírito (v. 15). Por isso, eles não apenas pregaram a Cristo; eles viveram Cristo diante do mundo. Assim como os cativos dos conquistadores romanos desfilavam na cidade do Capitólio com alguns apontados para morrer e alguns para viver, Paulo viu como tal a vitória de Deus no evangelho; alguns creram “para vida” e alguns rejeitaram “para morte”. Por isso, existem duas classes de pessoas entre as quais circula a fragrância do evangelho – aqueles que serão salvos e aqueles que irão para a perdição (v. 16). Tais são os efeitos do evangelho; trabalha tanto a vida quanto a morte naqueles que o ouvem. Isso mostra a solenidade de pregar Cristo, pois as questões eternas dependem da aceitação e rejeição da mensagem. A grandeza disso fez com que o apóstolo clamasse, “Quem, porém, é suficiente para estas coisas?” (ARA). Só poderiam ser aqueles com quem Deus havia operado Sua “suficiência” divina (cap. 3:5 – ARA). Ele só pode fazer Seus servos capazes de levar o evangelho efetivamente por meio dos vários exercícios e disciplinas pelos quais passam em Sua escola.
V. 17 – No entanto, havia “muitos” no ministério naquela época que eram falsos. Deus não havia trabalhado com eles para torná-los verdadeiros ministros. Os tais não tinham as qualificações morais e espirituais de um verdadeiro ministro de Cristo, nem tinham qualquer solidez ou poder real em seu ministério. Eles estavam usando a Palavra de Deus para servir a seus próprios fins e assumiram o serviço do Senhor como mera profissão – como “um comércio!” (JND). Os coríntios precisavam ser cautelosos com esses homens e testar sua veracidade pelo perfil de um verdadeiro ministro de Cristo que Paulo lhes dava ao descrever seu serviço ao Senhor.
O que distinguia Paulo e seus cooperadores desses falsos apóstolos era que eles, com “sinceridade”, ministraram “na presença de Deus” como representando Cristo. O ministério deles era triunfante porque exaltava Cristo – mesmo que alguns não acreditassem na mensagem.
2) É um Ministério Transformador
Capítulo 3:1-18 – Outra grande característica que marca o verdadeiro ministério Cristão (do qual Paulo era o principal ministro) é que ele é eficaz – possui um poder transformador. Verdadeiro ministério Cristão não apenas exalta Cristo, mas também produz resultados nas vidas daqueles que o recebem. A existência da assembleia em Corinto provou isso. Os coríntios eram a prova viva do poder do ministério de Paulo no evangelho – eles tinham sido salvos por meio dele! Eles, mais do que todos, não podiam negar que Deus estava operando por meio de Paulo.
Vs. 1-2 – Sendo este o caso, Paulo lhes pergunta por que alguém entre os coríntios pensaria que ele e os que trabalhavam com ele precisavam ser “recomendados” a eles – a assembleia dos coríntios era sua recomendação! Ele diz, “Vós sois a nossa carta”. Ao mencionar “cartas de recomendação” Paulo estava dirigindo outra crítica aos seus difamadores. Eles estavam dizendo que ele não havia sido aprovado pelos apóstolos em Jerusalém e, portanto, não tinha autoridade para agir como agia. Eles se basearam no fato de que ele não tinha uma carta de recomendação. A Escritura indica que uma pessoa deve ter uma carta de recomendação se estiver indo a uma área onde ela não é conhecida (At 18:24-28; Rm 16:1-2), mas Paulo não precisava de uma carta em Corinto, tendo estado com eles durante um ano e meio (At 18:1-17). Ele não precisava recomendar a si mesmo “como alguns”, aludindo aos seus adversários que foram a Corinto com cartas recomendando a si próprios. Ele não precisava de tal certificado; todos os homens poderiam conhecer o caráter de seu trabalho apostólico tornando-se familiarizados com seus convertidos coríntios. Apesar de suas falhas, eles foram o fruto de uma genuína obra de Deus por meio de Paulo. Isso mostra que as melhores credenciais que um ministro Cristão pode ter são encontradas nas vidas daqueles a quem ele ministra; isso prova a qualidade de seu trabalho. Um homem pode ter um alfabeto de graduações após o seu nome, tendo se formado em algum respeitável seminário Cristão, mas isso em si mesmo não dará poder ao seu ministério.
Vs. 3-5 – Os coríntios eram uma “carta” em duas maneiras:
- Eles eram uma recomendação do ministério de Paulo (vs. 1-2). - Eles eram também uma recomendação do Próprio Senhor para todos os homens (v. 3).
Este último é verdadeiro para todos os Cristãos; somos representantes de Cristo neste mundo. Nossas vidas deveriam recomendar Cristo a todos os homens. Nesse sentido, somos Sua carta ao mundo. Muitos Cristãos citam erroneamente o versículo 3, dizendo: “Cartas (plural) de Cristo”, mas Paulo estava falando dos coríntios coletivamente como sendo uma “carta de Cristo”. Isto é uma alusão ao fato de que o mundo deveria ver a companhia dos Cristãos movendo-se juntos como um todo, expressando o que verdadeiramente são – o um só corpo de Cristo.
Paulo continua falando sobre como o ministério Cristão transforma os crentes, tornando-os representantes de Cristo. Eles são feitos tais por meio de um trabalho interior nas “tábuas de carne do coração”. “O Espírito do Deus vivo” escreve Cristo no coração do crente, e isso aparece em uma manifestação de características semelhantes a Cristo no caminhar e nas maneiras do crente. Paulo acrescenta, “Não em tábuas de pedra”, o que é uma referência à Lei. Isto aponta para o fato de que tal obra não é realizada nas almas por meios legais.
Uma vez que o que Paulo disse de si mesmo poderia soar como autoelogio, ele lembrou aos coríntios de que ele e seus cooperadores não eram “competentes” (JND) em si mesmos. Eles não podiam levar o crédito pelo que o Senhor havia feito neles e por meio deles para a bênção dos santos; a “suficiência [competência]” era toda “de Deus” (v. 5).
V. 6 – Paulo passa a chamar a si mesmo e aqueles que trabalharam com ele de “ministros dum novo testamento”. Rapidamente acrescenta, “não da letra, mas do espírito”, porque a “letra” da nova aliança será feita com Israel, e não com a Igreja. A “letra” da nova aliança é o cumprimento literal de suas condições em um dia vindouro, quando um remanescente de Israel é salvo e trazido para o reino (Jr 31:31-34; Rm 11:26-27). Aplicá-la em “letra” à Igreja seria vê-la sendo cumprida na Igreja de alguma forma, o que é um erro. Este é o erro da Teologia Reformada que imagina que as promessas a Israel no Velho Testamento estão sendo cumpridas hoje na Igreja em um sentido espiritual, vez que falam da Igreja como “Israel espiritual”. Paulo não fez isso com aquelas promessas do Velho Testamento; ele ministrou o “espírito” da nova aliança, que é graça. Ele ensinou aos Cristãos as bênçãos espirituais da aliança que era deles pela graça, sem que eles estivessem formalmente conectados a ela. Por isso, o evangelho que pregamos no Cristianismo não é a nova aliança, mas é da nova ordem da aliança, que é a graça.
As três grandes bênçãos espirituais da nova aliança são:
- A possessão de vida divina (Hb 8:10). - Um relacionamento inteligente com o Senhor (Hb 8:11) - O conhecimento dos pecados perdoados (Hb 8:12).
Estas bênçãos da nova aliança são as menores das bênçãos espirituais que os Cristãos possuem. Mas elas não são exclusivamente Cristãs; Israel redimido e gentios convertidos no Milênio terão essas bênçãos também. Em Romanos, Colossenses e Efésios, Paulo revela a plenitude de nossas bênçãos Cristãs – cujo alcance é muito mais elevado em caráter e substância, e é dito que todas estão “em Cristo” à destra de Deus. Tais bênçãos são manifestamente Cristãs – apenas os Cristãos as têm. Ele então diz, “porque a letra mata”. Se ele (ou nós) aplicasse a nova aliança de acordo com a letra, destruiria o caráter celestial do chamamento Cristão, e destruiria a diferença entre Israel e a Igreja.
A primeira coisa que este grande ministério produz nos crentes é vida – “mas o espírito dá vida” (KJV). À medida que a Palavra é ministrada, o Espírito de Deus trabalha nas almas para transmitir a vida divina, a qual tem a capacidade espiritual de conhecer e desfrutar coisas divinas. Mudança real e duradoura nas almas vai resultar apenas do seu prazer nas coisas divinas. Não é o que sabemos ou rituais ascéticos com que nos ocupamos que produz mudança moral em nossas vidas. Os homens tentaram todos os tipos de ferramentas externas para produzir mudança nas pessoas, mas todas falharam. Mas o caminho de Deus é começar por dentro – com os corações e almas dos homens – e trabalhar a partir daí.
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Vs. 7-16 – Paulo abre um parêntese para mostrar que o poder desse ministério de realizar coisas positivas nos crentes não é por meios legais. Para enfatizar isto, ele contrasta a Lei, a qual chama de “o ministério da morte” e “o ministério da condenação” com o ministério de graça da nova aliança, sobre a qual ele se refere na epístola sob três nomes. Cada um vê um aspecto diferente do poder e funcionamento deste ministério:
1) “O ministério da justiça” (cap. 3:9) fala de uma obra consumada de redenção testemunhada no fato de que há um Homem glorificado no céu e que o crente tem n’Ele um lugar de aceitação diante de Deus. Assim, enfatiza o que Cristo fez para os crentes.
2) “O ministério do Espírito” (cap. 3:8) refere-se ao efeito moral interior do ministério que produz semelhança de Cristo nos crentes. Isso tem a ver com o que o Espírito faz nos crentes
3) “O ministério da reconciliação” (cap. 5:18) é o anúncio ao mundo do que a graça realizou para a glória de Deus e a bênção do homem. Tem a ver com o que Deus faz pelos crentes.
Vs. 9-11 – Os dois sistemas de lei e graça são contrastados; um é um sistema de exigência (a velha aliança), o outro é um sistema de provisão (a nova aliança). Paulo se concentra em um dos muitos contrastes entre os dois ministérios, nos dizendo que a ministração da morte e da condenação (a entrega da Lei) “veio em glória” (v. 7), enquanto a ministração do Espírito da justiça “subsiste” (JND) em uma “excelente glória” (vs. 8, 10). Não é que a antiga aliança fosse gloriosa, mas que o sistema (no Sinai) que a introduziu era glorioso. De fato, ambos os sistemas são gloriosos; mas um ofusca de tal forma a glória do outro que dificilmente podem ser comparados.
Vs. 12-13 – O caráter glorioso do ministério, que ao apóstolo foi confiado, foi tão grande que influenciou o modo de sua apresentação. Por isso, Paulo diz, “Tendo, pois, tal esperança, usamos de muita ousadia no falar”. Quando Moisés veio ao povo para ministrar o conteúdo e as exigências da antiga aliança, ele não podia usar ousadia. Ele colocou um véu sobre si porque a glória condenadora da Lei que refletia em seu rosto aterrorizava o povo. Isso significava que a Lei não era uma revelação completa de Deus. Assim, as pessoas sob aquela antiga aliança não poderiam olhar para o “fim” dela – que é o cumprimento dela em Cristo. Mas em contraste com Moisés, Paulo podia ministrar as bênçãos da nova aliança com ousadia, porque o que apresentava era baseado em uma obra realizada (na cruz), e assim ele tinha uma revelação mais completa da verdade em Cristo glorificado.
Vs. 14-16 – Até hoje, o mesmo véu permanece “não removido” (JND) quando os judeus se reúnem para ler as Escrituras do Velho Testamento em suas sinagogas. Aqueles sob aquela antiga aliança ainda não veem seu fim em Cristo. Mas não há razão para isso agora porque o “véu” “foi por Cristo abolido”. Existe agora uma revelação completa na face de Jesus no alto em glória. Se existe alguma dificuldade da parte de Israel agora, não é porque o véu está no rosto de Moisés (significando uma revelação parcial), mas porque está “sobre o coração deles” na incredulidade da revelação completa da verdade que o evangelho anuncia.
A lição prática que devemos obter com esse parêntese é que a formação do caráter de Cristo nos crentes não é por meios legais e esforços. Se pensarmos que podemos realizá-la estabelecendo um código de regras e regulamentos para nós mesmos mantermos, não teremos sucesso. Não teremos mais êxito do que Israel sob a Lei.
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Vs. 17-18 – Tendo contrastado os dois sistemas (lei e graça) num parêntese, Paulo retoma seu assunto de como o Espírito de Deus faz dos crentes a epístola de Cristo. Ele diz: “Ora o Senhor é o espírito; onde está o Espírito do Senhor, há liberdade” (Tradução W. Kelly; J. N. Darby, “Collected Writings”, vol. 26, pág. 322). A palavra “espírito” na primeira parte deste versículo não é o Espírito Santo (como KJV o interpreta), mas o espírito da antiga aliança. Todas as formas e cerimônias relacionadas com a antiga aliança prefiguravam a Cristo. Ele é o espírito, ou a substância espiritual e a essência daquelas coisas, pois todas apontavam para Ele. Isto é o que os judeus falharam em ver e ainda falham. Da mesma forma, Cristo é “o espírito de profecia” (Ap 19:10). Isto é, todas as Escrituras proféticas do Velho Testamento se relacionam a Ele, direta ou indiretamente.
O argumento de Paulo aqui é que o ministério não só comunica vida às almas pelo Espírito (v. 6), mas também dá ao crente liberdade na presença de Deus em oração e adoração (v. 17). Esta é a segunda grande coisa que o ministério da justiça faz. Nos fala de uma obra consumada de redenção e de nosso lugar de aceitação diante de Deus em Cristo, mas também quando recebida em fé, dá ao crente “liberdade” para vir pelo Espírito Santo à presença de Deus e olhar para o “rosto descoberto” do Senhor Jesus, o Mediador da nova aliança. O brilho da face de Moisés (o mediador da antiga aliança) era o reflexo do poder de condenação da Lei, o qual Israel não podia suportar. Portanto, ele cobriu o rosto. Mas que contraste de glória no ministério da justiça! Os Israelitas não podiam contemplar a glória evanescente da Lei, mas podemos contemplar o completo resplendor da excelente glória no rosto descoberto de Jesus!
Quando nos aproveitamos desse privilégio e passamos um tempo na presença de Deus observando “a glória do Senhor”, uma terceira coisa resulta: somos **“**transformados de glória em glória na mesma imagem, como pelo Espírito”. Isso é chamado de “o ministério do Espírito” (v. 8). Quando o Espírito de Deus está livre para agir, Ele ocupa o crente com Cristo em glória; ao mesmo tempo, Ele faz Sua silenciosa obra de escrever Cristo nas tábuas de carne do coração. Quando Cristo é gravado nas afeições do crente, o caráter de Cristo aparece no caminhar e nas maneiras do crente. A Lei regulamentou a conduta exterior por meios legais, mas o ministério do Espírito produz uma obra interior, transformando o crente por dentro; isso resulta em uma mudança externa de caráter.
Paulo diz: “… na mesma imagem”. A imagem na Escritura tem a ideia de representação, que é o propósito da transformação de Deus – nos tornar verdadeiros representantes de Cristo neste mundo. Este processo é “de glória em glória”. Isto é, uma coisa gradual; a mudança ocorre um grau de glória por vez. Além disso, não é algo que é produzido pelo esforço pessoal, mas “pelo Espírito”. Portanto, o Senhor é o Objeto da nossa fé e o Espírito é o poder para nossa transformação.
Olhando para trás no capítulo (excluindo o parêntese nos versículos 7-16) vemos o trabalho eficaz e o poder glorioso do ministério da nova aliança. Três grandes coisas são produzidas nos santos pelo poder do Espírito, pelo Qual eles são feitos representantes adequados para Cristo neste mundo como Sua “epístola”. O Espírito de Deus trabalha no ministério para dar:
- “Vida”, e assim, capacidade de conhecer e desfrutar as coisas divinas (v. 6). - “Liberdade” na presença de Deus (v. 17). O ministério da justiça que Paulo anunciou fala de um Homem no alto em glória, na presença de Deus, e isso nos dá a conhecer nossa aceitação n’Ele. Assim, temos liberdade para entrar na presença de Deus para contemplar a glória do Senhor. - “Transformação” de caráter (v. 18). Quando estamos ocupados com o Senhor em glória, o Espírito escreve Cristo em nossos corações e assim somos transformados em Sua imagem.
Um Verdadeiro Ministro Cristão Tem seu Exercício Pessoal a Respeito do Ministério que Possui
(cap. 4:1-18)
O verdadeiro ministério Cristão não apenas faz com que o crente se ocupe com Cristo em glória, pelo qual ele é transformado à Sua imagem; também produz exercício espiritual no crente em relação a levar isto aos outros. Paulo continua falando de alguns desses exercícios no capítulo 4.
No capítulo 3, temos Cristo formado dentro do crente; no capítulo 4 temos Cristo brilhando para fora do crente. Estes são o resultado de duas coisas excelentes – “a glória excelente” que nos transforma (cap. 3:10), e “excelência do poder” que trabalha para irradiar Cristo por meio de nós para os outros (cap. 4:7). É o desejo de Deus que Cristo resplandeça por meio do vaso sem obstrução. Portanto, os exercícios morais neste capítulo têm muito a ver com remover conscientemente tudo em nossas vidas que impeça esse fluir. A obra transformadora do Espírito em nós é, como mencionado, uma obra silenciosa da qual não temos consciência, mas as coisas diante de nós neste capítulo são resultado de um exercício consciente no crente. Se o processo de transformação no capítulo 3 é algo passivo, o que está diante de nós no capítulo 4 é algo muito ativo.
Um Vaso Pronto
V. 1 – O primeiro exercício que todo ministro Cristão deve ter é estar pronto e disposto a ser usado pelo Senhor no serviço. Isso exige coragem. Paulo disse: “Pelo que, tendo este ministério, segundo a misericórdia que nos foi feita, não desfalecemos”. Ele encorajou Timóteo exatamente nisso, dizendo, “Tu, pois, meu filho, fortifica-te na graça que há em Cristo Jesus” (2 Tm 2:1; compare Ef 6:10). Não somente Paulo recebeu “este ministério” para cumprir, ele também “recebeu misericórdia” de Deus para realizá-lo, porque havia muita oposição a ele (2 Co 1:10). Isso curvou seu coração com gratidão e inspirou coragem espiritual nele. A ideia de ser escolhido pela graça de Deus para ter o grande privilégio de ministrar tal verdade maravilhosa curvou o coração de Paulo e o fez disposto a ser usado no serviço do Senhor. Ele não iria “desfalecer” (desanimar), mas seria preciso coragem e ser forte e lançar sua energia com convicção para aquele trabalho.
Um ponto prático a considerar aqui é: receber este ministério e misericórdia especial produziram convicção em Paulo e seus cooperadores para levá-lo a outros. E deve produzir a mesma convicção em nós, pois recebemos o mesmo “ministério” e a mesma provisão de “misericórdia”. A grande questão é: somos exercitados a fazer algo com a verdade que temos? É triste, de fato, ter essas coisas preciosas e não as cumprir. Sentar-se (confortavelmente) e não ministrar essas coisas aos outros certamente não é a vontade de Deus (Pv 11:26; 2 Rs 7:9). Podemos pensar que não poderíamos ter muita utilidade no serviço do Senhor, mas o serviço d’Ele não é algo tanto de nossa capacidade quanto é da nossa disponibilidade. Então, estamos dispostos a ser usados pelo Senhor? Temos a convicção de nos tornarmos disponíveis a Ele para o Seu serviço? Podemos ter certeza de que qualquer que seja a oposição ou dificuldade no caminho, Deus nos dará a “misericórdia” necessária para levar a mensagem de Sua graça aos outros.
Um Vaso Limpo
Vs. 2-4 – O segundo exercício de Paulo era se apresentar como vaso limpo. Ele entendeu que se o ministério deveria ter poder para com aqueles que o ouviam, a pessoa que o exercia precisava ter cuidado para que não houvesse nada em sua vida que fosse de caráter questionável. Isso apenas impediria o fluir de Cristo. Por isso, Paulo testificou que ele e seus companheiros tinham rejeitado “as coisas que por vergonha se ocultam, não andando com astúcia nem falsificando a palavra de Deus”. Paulo pode ter mencionado isto porque seus difamadores estavam sugerindo que era um indivíduo um tanto duvidoso, ou ele pode ter pensado que precisavam ouvir isso porque as práticas deles eram questionáveis.
Há muitos obstáculos para a mensagem Cristã alcançar as pessoas. Pode ser incredulidade ou o trabalho do diabo para cegar as pessoas, mas um dos maiores obstáculos é frequentemente encontrado no próprio ministro! Uma vida de “vergonha [desonestidade]” e “astúcia [engano]” naqueles que levam a mensagem da graça pode anular seu poder mais rápido que qualquer outra coisa. A Igreja tem estado em falta nisto – não apenas em nossos dias, mas ao longo da história – e devemos ser humilhados por isso. Gandhi (o ex-primeiro-ministro da Índia) disse que ele teria sido um Cristão se não fossem os Cristãos! Isto é realmente triste. Tais acusações poderiam ser feitas contra outros que professavam servir ao Senhor, mas não poderiam ser feitas contra Paulo e seus cooperadores porque suas vidas estavam acima de quaisquer suspeitas em todas as coisas.
A palavra “renunciado” (na KJV) deveria ser traduzida por “rejeitado” (W. Kelly). Renunciado implica que Paulo esteve envolvido anteriormente nessas práticas malignas, mas as abandonou, mas na realidade ele nunca havia vivido dessa maneira. Mesmo em seus dias de incrédulo, no judaísmo, ele vivia com escrúpulos exigentes e não podia ser acusado de tais coisas (At 23:1). “Rejeitado” implica que ele manteve essas coisas à distância de sua vida e ministério.
Paulo falou da “manifestação da verdade”, que indica ela ser vivida na prática. Em outra parte, ele diz “para que em tudo sejam ornamento da doutrina de Deus, nosso Salvador” (Tt 2:10). O ponto aqui é que o ministério deve ser recomendado pela vida do ministro. Paulo diz: “e assim nos recomendamos à consciência de todo o homem, na presença de Deus” (2 Co 4:2). Sendo cuidadosos em suas interações com os homens do mundo, eles se mantiveram além de qualquer suspeita, para que o ministério não pudesse ser censurado (2 Co 6:3). O resultado foi que havia poder em seus ministérios; registrado nas consciências dos homens e testemunhado o fato de que era a verdade de Deus.
Sendo este o caso, Paulo diz “se ainda o nosso evangelho está encoberto, para os que se perdem está encoberto”. Se as pessoas não acreditaram na mensagem, não foi porque ele a falsificou por inconsistências em sua vida, mas porque Satanás, “o deus deste século cegou os entendimentos dos incrédulos”. O problema era que havia um véu de incredulidade sobre seus corações e Satanás o usou para cegá-los.
Satanás, o inimigo de Deus e do homem, tem duas grandes esferas nas quais trabalha:
- Como “o deus deste século” ele está no controle das atividades religiosas deste mundo (2 Co 4: 4). - Como “o príncipe deste mundo” ele está no controle das atividades seculares deste mundo (Jo 12:31, 14:30).
Não é que Satanás indiscriminadamente cega quem escolhe. Se fosse esse o caso, ninguém jamais creria e seria salvo. Paulo mostra que há certo tipo de pessoa a quem Satanás cega – aqueles que são “incrédulos”. Quando uma pessoa não crê, ela se abre para o trabalho de Satanás. O triste resultado na pessoa é “que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, que é a imagem de Deus”. Por isso, Paulo e seus cooperadores foram exercitados para andar de tal maneira que, se alguém não acreditasse na mensagem que levavam a culpa não era deles, porque em palavras e atos eles apresentaram a verdade de forma incorruptível.
Da mesma forma, Deus gostaria que Seus ministros hoje em dia removessem tudo em suas vidas que impedissem o fluir de Cristo. Nós também precisamos ser exercitados sobre sermos vasos limpos (compare Isaías 52:11). Quão cuidadosos devemos ser para que nossas vidas não falsifiquem a mensagem que levamos. Cada Cristão precisa “possuir o seu vaso em santificação e honra”, no que se refere à santidade pessoal (1 Ts 4:4). Também precisamos nos manter separados de toda falsa associação que desonre a Cristo, para que sejamos verdadeiramente “vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra” (2 Tm 2:21).
A única Bíblia que lerá o desatento mundo, somos nós,
O evangelho do pecador, o credo do zombador, somos nós
E a última mensagem do Senhor,
E se as letras forem deturpadas
E se a impressão estiver borrada?
Um Vaso Vazio
V. 5 – O terceiro exercício que Paulo e seus cooperadores tinham como ministros de Cristo era estarem vazios de si mesmo. Ele diz, “Porque não nos pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus, o Senhor”. O desejo deles era que não houvesse nada de si próprios na mensagem, porque sabiam que isso apenas obstruiria o resplandecer da glória de Cristo brilhando para outros. Eles procuravam apresentar Cristo em palavras e em ação de tal maneira que toda a atenção fosse dirigida a Ele, e somente a Ele. Eles não estavam buscando louvor, ou ganhos temporais ou qualquer outra coisa para si mesmos. Isto aparentemente era o que aqueles que ensinavam em Corinto estavam fazendo, e essa foi uma das razões pelas quais os santos de lá estavam exaltando seus mestres (1 Co 1:12; 3:4-5).
O grande teste para todo ministério Cristão é se ele exalta a Cristo. Se de alguma forma der glória e crédito ao homem, o ministério perdeu o alvo. Uma tendência no ministério da Palavra é trazer algo de nós mesmos para a mensagem, e isso apenas a estraga. O Senhor disse: “Quem fala de si mesmo busca a sua própria glória” (Jo 7:18). Paulo poderia ter fascinado os santos com histórias sobre suas aventuras em servir ao Senhor, mas isso teria ocupado os santos com o vaso, em vez do Senhor. Portanto, se ele tivesse que falar de si mesmo, optaria por mencionar algo que fosse pessoalmente humilhante, em vez de algo que tivesse o efeito de exaltá-lo (2 Co 11:23-33). Sua maneira modesta é o modelo para o ministério Cristão.
Observe também: Paulo e seus cooperadores não apenas pregaram “Cristo Jesus”, eles pregaram “Cristo Jesus o Senhor”. Isso mostra que o encargo deles não era apenas apresentar a Cristo – por mais maravilhoso que seja em si mesmo – mas trazer os santos sob as reivindicações de Seu Senhorio. O objetivo final no ministério é apresentar a Cristo de tal maneira que os santos sejam constrangidos a entregar o controle de suas vidas a Ele como Senhor de todos. Ministrar de uma forma que resulte em pessoas seguindo após o ministro, é claramente uma obra da carne nas coisas de Deus.
V. 6 – Paulo passa a falar da razão para esses exercícios. Fundamentalmente, é para a manifestação da glória de Cristo. Como Deus “disse que das trevas resplandecesse a luz”, quando criou os céus e a Terra (Gn 1:3), Ele fez com que a luz espiritual brilhasse no coração sombrio dos homens com o propósito de “iluminação do conhecimento da glória de Deus, na face de Jesus Cristo”. A KJV traduz este versículo como se o propósito de Deus fosse dar ao crente a luz do conhecimento de Cristo, mas realmente a ideia é que por meio do crente o conhecimento glorioso d’Ele “brilharia” para os outros. Deus “brilhou” em nossos corações e nos iluminou, mas esse não é o fim que Ele tem em vista. Ele nos salvou com o propósito de manifestar a glória de Cristo, não apenas agora neste mundo, mas também no dia vindouro de manifestação (o Milênio). Portanto, a luz celestial que brilha em nossos corações não se destina a ser guardada em nós mesmos, mas deve ser transmitida a outros. Como crentes iluminados, não somos o ponto final dessas coisas gloriosas, mas os canais delas.
Quando a luz do evangelho da glória de Cristo brilhou no coração de Paulo, seu primeiro efeito foi mostrar-lhe o que era em si mesmo – ele aprendeu sua própria nulidade. Depois disso, ele não poderia mais falar de si mesmo, mas apenas de Cristo Jesus, o Senhor, e de si mesmo como Seu servo. Os exercícios nestes versículos nos mostram que precisamos tirar tudo que é duvidoso de nossas vidas (vs. 2-4), e ainda tirar todo nosso ego também (v. 5), de modo que a glória que flui da “face de Jesus” pudesse fluir em poder para os outros (v. 6). Estes são exercícios saudáveis para todos os que ministram a Palavra. É claro que, se não tomarmos tempo para contemplar a face de Jesus (cap. 3:18), não podemos esperar ter algo para irradiar d’Ele para os outros. Isso também é exercício.
Um Vaso Quebrado
V. 7 – Para aumentar a manifestação da excelente glória de Cristo, Deus achou por bem colocar o tesouro de Cristo em “vasos de barro”. Isto se refere aos nossos corpos humanos. Os homens geralmente colocam seus caros tesouros em caixas dispendiosas, mas Deus coloca esse “tesouro” em frágeis vasos de barro. E por que Ele faria isso? Paulo explica, dizendo: “para que a excelência do poder seja de Deus, e não de nós”. Se Deus tivesse colocado este tesouro nos gloriosos anjos que se destacam em força, os homens seriam levados pela glória do vaso e não pelo tesouro. Para evitar a possibilidade de a atenção ser desviada da glória de Cristo, Deus sabiamente coloca o tesouro em vasos de barro. Então, nenhum poder que resulte em testemunho pode ser atribuído ao vaso. O resultado é que muita importância é dada a Cristo e nenhuma àqueles que carregam o tesouro. Se Deus tivesse trabalhado por meio de Paulo em um esplêndido corpo de glória, ele teria sido visto como uma espécie de super-homem, e o poder teria sido atribuído a ele.
Vs. 8-11 – Mesmo com frágeis vasos de barro (a fragilidade da humanidade), é preciso humilhar-se antes que o esplendor do tesouro resplandeça de maneira eficaz. Nestes versículos, Paulo fala do exercício de quebrar o vaso para que a glória de Cristo resplandecesse de maneira mais distinta e com poder. Este quebrar não vem de sentar-se em uma cadeira de balanço e ler os escritos de J. N. Darby, mas de ser colocado em circunstâncias difíceis e de provação. Paulo diz, “Em tudo somos atribulados, mas não angustiados: perplexos, mas não desanimados; Perseguidos, mas não desamparados; abatidos, mas não destruídos”. No seu caso e de seus cooperadores, era perseguição, mas as condições adversas que Deus usa também podem ser doenças, acidentes que ameacem a vida, problemas financeiros, problemas conjugais, problemas familiares, má vontade dos outros, etc. Essas coisas têm uma maneira de quebrar a força natural e a autoconfiança que apenas impedem o tesouro de brilhar por meio do vaso.
Observe como Paulo diz, “…mas não angustiados;… mas não desanimados;… mas não desamparados;… mas não destruídos”. Isso mostra que eles foram mantidos naquelas provações e aflições pelo poder divino. Era algo como a sarça ardente que Moisés viu; ela queimava, mas o fogo não a consumia (Êx 3:1-6). Assim, vemos a fragilidade humana de um lado e a capacitação divina do outro. A própria fraqueza do vaso se torna a oportunidade para Deus demonstrar a suprema grandeza de Seu poder que irradia do vaso.
Paulo diz que aquelas circunstâncias de provações onde eles foram “sobremaneira agravados” (cap. 1:8) os levou a ele e a seus cooperadores ao exercício de trazer “sempre por toda a parte a mortificação do Senhor Jesus no nosso corpo, para que a vida de Jesus se manifeste também em nossos corpos”. Ou seja, eles procuraram imitar o espírito de submissão que o Senhor demonstrou em Sua vida, em Sua disposição para ser reduzido a nada. Nota: não é da morte de Jesus que Paulo está falando aqui, mas do morrer de Jesus. (A aplicação da morte de Cristo ao crente, desenvolvida em Romanos 6 e Colossenses 2, é uma linha de verdade diferente da que temos aqui. Ela tem a ver com uma aplicação experimental da morte de Cristo à carne no crente, pela qual ele se considera “como morto para o pecado” (Rm 6:11). Tampouco esse versículo se refere ao fato da morte do Senhor para fazer expiação pelos nossos pecados, mas ao contrário, é Sua disposição de ser reduzido a nada como um Mártir justo.
No versículo 10 a KJV diz “o Senhor Jesus”, mas deveria dizer “Jesus”. O Espírito de Deus está enfatizando a graça que estava em Sua vida como um homem na Terra, que Seu nome “Jesus” transmite. O ponto de Paulo nesta passagem é que as perseguições a que ele foi submetido foram uma ocasião para ele mostrar as graças da vida de Jesus. Seu exercício pessoal em relação a essas provações de perseguição foi que ele seria verdadeiramente um vaso quebrado nas mãos do Senhor, aceitando, submetendo-se e compartilhando Seus sofrimentos de martírio. Ele desejava que a mesma disposição de ser reduzido a nada, que foi vista em perfeição no Senhor, também fosse vista nele. Este foi um exercício voluntário de Paulo.
Deus usa essas circunstâncias adversas que entram em nossas vidas acima de nosso controle para nos exercitar sobre como imitar o espírito de submissão e abnegação que o Senhor tinha em Sua vida. O princípio é simples: quando há menos de nós no vaso, mais se verá de Cristo resplandecendo por meio do vaso. Com o obstáculo do “eu” fora do caminho, as pessoas verão “Jesus” em nós. O resultado é que a glória vai para Deus, e não para o vaso que foi usado para transmiti-la.
Há um tipo no Velho Testamento desta quebra na vida e serviço de Gideão (Jz 7:16-20). Em seu testemunho para o Senhor, ele e seus homens deviam ter “cântaros vazios, com tochas neles acesas” os quais eles seguraram à noite. Os cântaros nos quais as lâmpadas estavam acesas impediam o brilho da luz e, portanto, precisavam ser quebrados. Mas quando eles o foram, um poderoso testemunho foi dado diante de seus inimigos e uma grande vitória foi alcançada para o Senhor e Seu povo. Mas note, não foi Deus quem quebrou os cântaros de barro que os homens de Gideão seguravam; seus homens os quebraram. Isso mostra que os servos de Deus precisam ser exercitados sobre a quebra do vaso. Quando esse mesmo exercício de abnegação própria é confirmado em nós em experiência prática, a vida de “Jesus” também será “manifesta” em nós.
Enquanto Paulo procurava, por meio de exercício, imitar o espírito de Jesus em negar a si mesmo (v. 10), Deus também o entregava a situações onde era forçado a guardar a sentença de morte em si mesmo (v. 11). Ele diz: “E assim nós, que vivemos, estamos sempre entregues à morte por amor de Jesus”. Isso era uma coisa involuntária, pois ninguém procura entrar voluntariamente nessas situações que ameaçam à vida. Deus permitiu que muitas coisas sobreviessem a Paulo – como o episódio em Éfeso, que ele descreveu no capítulo 1 como “tão grande morte” – e usou essas coisas para manifestar a vida de Jesus no corpo mortal de Paulo.
V. 12 – Assim, embora a “morte” tenha operado em sentido prático em Paulo e seus companheiros de trabalho, o grande resultado foi que a “vida” operou nos santos. Isto é, aquelas coisas celestiais que pertenciam à vida eterna foram para o bem dos santos, na medida em que eles se beneficiaram do ministério.
Portanto, a ideia de ser um vaso quebrado é não ter vontade própria em questões da vida e do serviço para o Senhor. O coração humano é naturalmente oposto à submissão e obediência. Entretanto, as provações e sofrimentos que encontramos no caminho são colocados ali por um Pai amoroso para quebrar nossas vontades, de modo que haja menos “eu” no vaso. Tudo é feito com vistas a que mais de Cristo brilhe a partir da vida do crente. O irmão Whitaker disse apropriadamente: “Deus nos esculpe a um tamanho utilizável”.
As várias tribulações pelas quais passamos são ordenadas por Deus para nos exercitar sobre certas coisas que possam estar em nossas vidas, as quais apenas impedem o fluir de Cristo. J. N. Darby disse, “Tribulação não pode em si mesma conferir graça, mas sob a mão de Deus, pode quebrar a vontade e detectar males ocultos e insuspeitados, de modo que, se julgados, a nova vida é mais plenamente desenvolvida e Deus tem um lugar maior no coração. Ela ensina humilde dependência; há mais desconfiança de si mesmo e da carne, e uma consciência de que o mundo não é nada, e o que é eternamente verdadeiro e divino tem um lugar maior na alma”.
Na inauguração de uma enorme estátua de um leão, perguntaram ao escultor como ele produziu uma obra de arte tão magnífica. Ele disse: “Eu apenas talhei tudo o que não parecia um leão!” Da mesma forma, Deus está desbastando nossos vasos humanos para que mais de Cristo seja visto. Muito do trato de Deus conosco em provações e aflições são, fundamentalmente, para ajudar o resplendor do “tesouro” que Ele colocou dentro de nós.
Existem duas coisas então; devemos ser exercitados sobre sermos reduzidos (v. 10), e Deus também está trabalhando para esse fim (v. 11).
Ao resumir esses exercícios que devem caracterizar um verdadeiro servo do Senhor, Paulo tocou em quatro coisas que impedem o fluir de Cristo de nossos vasos humanos. Eles são:
- Falta de coragem (v. 1). - Desonestidade e engano (vs. 2-4). - Importância de si próprio (vs. 5-6). - Uma vontade não quebrada (vs. 7-11).
Quatro Coisas que Mantêm o Ministro
Capítulo 4:13-18 – Paulo segue falando das quatro coisas que mantiveram ele e seus cooperadores no serviço Cristão. Eles estavam constantemente sendo submetidos aos perigos da perseguição, e isso estava cansando, pois acontecia dia após dia. Há muito para desencorajar e “desgastar” (JND) os servos do Senhor (Dn 7:25), mas Deus tem Sua maneira para sustentá-los no caminho. Paulo fala agora dessas coisas para nosso encorajamento.
1) Fé no Deus de Ressurreição
Vs. 13-15 – A primeira coisa que Paulo menciona é sua fé em Deus. A fé no Deus de ressurreição o fortaleceu a falar pelo Senhor e a sofrer pelo Senhor. Ele diz “o mesmo espírito de fé” que operou no salmista operou nele e em seus cooperadores. Salmo 116:10 diz, “Cri, por isso falei”. Ele se encorajou com isso e disse, “nós cremos também, por isso também falamos”. Há uma ordem moral no que Paulo nos tem dado: ele se referiu a manifestar a vida de Jesus (vs. 10-12); agora ele se refere a falar a verdade aos outros (v. 13). Uma é a plataforma para a outra. Sem a manifestação de Cristo em nossas vidas, falar a verdade terá pouco poder.
Paulo não só tinha fé para falar a verdade (v. 13), mas tinha fé para sofrer pela verdade (v. 14). O que o manteve no caminho do testemunho foi sua fé no poder de Deus que ressuscitou Cristo de entre os mortos. Ele acreditava que, mesmo que ele tivesse de morrer como um mártir, o mesmo poder que ressuscitou o Senhor Jesus também o ressuscitaria. Ele disse, “Sabendo que o que ressuscitou o Senhor Jesus nos ressuscitará também por [com] Jesus, e nos apresentará convosco”. Ser ressuscitado “com Jesus” não significa que a ressurreição de Cristo ainda seria futura, mas que, se ele morreu em serviço, ele seria ressuscitado da mesma forma e caráter da ressurreição de Cristo, porque Sua ressurreição é “as primícias” da ressurreição dos santos (1 Co 15:23). Assim, a fé o fortaleceu a continuar no serviço do Senhor. Ele poderia enfrentar a morte diariamente e ainda ser sustentado em tal adversidade, porque sabia que se morresse, estaria com Jesus.
Paulo acrescenta que “tudo isto” (as aflições) pelo que ele passou foi “por amor de vós”. Toda a sua vida foi empenhada em manifestar Cristo e falar de Cristo para o bem e a bênção dos santos. O grande objetivo disso tudo era que faria “abundar a ação de graças para glória de Deus” nos santos. Seu desejo era que eles se beneficiassem do ministério e produzisse uma resposta neles no transbordar de ação de graças a Deus. Por isso, a graça de Deus se multiplica nos que a recebem e faz com que a ação de graças seja abundante para Deus.
2) Uma Renovação Diária do Homem Interior por Meio da Oração e Meditação na Palavra
V. 16 – Uma segunda coisa que manteve Paulo e seus companheiros de trabalho foi a renovação diária do homem interior. Isso se refere ao rejuvenescimento da alma e do espírito por meio da oração e da meditação. Ele disse, “mas, ainda que o nosso homem exterior se corrompa, o interior, contudo, se renova de dia em dia”. O “homem exterior” são nossos corpos físicos. Nossos corpos estão perecendo porque são mortais – sujeitos à morte. Eles estão lentamente desgastando-se com a idade e o uso, e no caso de Paulo, pelos rigores da perseguição. “O homem interior” é a alma e o espírito. Comida e descanso rejuvenescem nossos corpos físicos, mas nossas almas e espíritos são rejuvenescidos por meio da oração e se alimentando de Cristo na Palavra de Deus (Jo 6:54-57). Esta renovação espiritual manteve o apóstolo avançando no caminho da fé e do serviço.
Note: Paulo disse que era de “dia em dia”. Isso mostra que a oração e a meditação deveriam ser uma coisa diária. Ter “um momento de silêncio” com o Senhor uma vez por semana não é suficiente. Se Paulo e seus cooperadores negligenciassem o tempo pessoal com o Senhor, eles não teriam conseguido seguir no caminho da fé – e nem nós o faríamos! Todo Cristão precisa de um “tempo quieto” diário de oração e leitura das Escrituras, por meio do qual sua alma e espírito são renovados e fortalecidos; é a linha de vida espiritual do Cristão.
3) Entendendo que as Aflições no Caminho Estão Trabalhando para Nosso Proveito Eterno
V. 17 – Uma terceira coisa que manteve Paulo e seus cooperadores foi entender que as aflições e dificuldades que eles experimentaram no caminho estavam operando algo para eles que era de valor eterno. Ele disse, “Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós um peso eterno de glória mui excelente”. Paulo não estava falando sobre recompensas, mas de capacidade espiritual. As recompensas pela fidelidade em nossa vida Cristã são para o reino Milenar quando reinarmos com Cristo (Mt 19:28, 20:23, 24:45-47; Lc 19:16-19), nós não levamos nossas recompensas para o Estado Eterno (Ap 22:5 – “e reinarão para todo o sempre”). No entanto, a Escritura nos diz que nossa capacidade espiritual, que está sendo formada agora na Terra, será levada para a eternidade.
Há duas coisas em particular que Deus usa para aprofundar nossa capacidade espiritual: Em primeiro lugar, existe o que ganhamos ouvindo, lendo e meditando na Palavra de Deus. À medida que lemos e meditamos em Sua Palavra, o Espírito de Deus produz em nossas almas impressões indeléveis de misericórdia, amor, graça, bondade de Deus, etc. Essas coisas “não serão tiradas” de nós; as levaremos para a eternidade. Isso é o que o Senhor disse sobre Maria, que dedicou tempo para sentar-se a Seus pés e a ouvir a Sua Palavra (Lc 10:42). Todos os filhos de Deus então terão completo seu entendimento das coisas divinas (1 Co 13:12), e seu gozo será pleno, mas essas impressões serão diferentes em cada um de nós. Em segundo lugar, há lições espirituais que obtemos por meio das provações no caminho da fé. Paulo diz que essas coisas trabalham “para” nós como um “peso eterno de glória”. Note que não é um peso Milenar de glória. Isso mostra que o que passamos com o Senhor durante o tempo terá uma resposta na eternidade.
Todos nós teremos um copo cheio na eternidade, mas cada copo será diferente em tamanho e forma de acordo com as experiências que tivemos na vida. Nossas capacidades estão sendo formadas agora na medida em que aproveitamos as lições e experiências no caminho. E lembremo-nos também de que o que Deus permite que nos aconteça em forma de sofrimento e provação, tudo é **“**para nós”. Jó reconheceu isso ao dizer: “Pois ele cumprirá o que está ordenado para mim” (Jó 23:14 - TB). Às vezes, quando estamos passando por uma provação, podemos pensar que Deus está contra nós, mas isso não é verdade. Essas coisas “contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm 8:28-29). Ter um entendimento deste grande fato permitiu que Paulo suportasse os sofrimentos deste “um pouco” (1 Pe 5:10) e continuasse no caminho do serviço.
O apóstolo considerou as aflições presentes pela causa do evangelho como sendo “leve” e “momentânea”, embora para ele tenham sido cerca de 30 anos! À luz da eternidade, tais sofrimentos na senda do serviço são apenas “momentâneos”. A lição para nós aqui não é lutar contra as dificuldades e provações que experimentamos, mas sim ser exercitados nelas e tentar tirar proveito delas.
4) Mantendo Nossos Olhos Fixos em Coisas Invisíveis que são Eternas
V. 18 – A última coisa que Paulo menciona que o manteve no caminho foi ter os olhos fixos em coisas eternas “que se não veem”. Para o homem do mundo, isso é um absurdo. Ele perguntaria: “Como pode uma pessoa olhar para coisas invisíveis?” É claro que o Cristão olha para essas coisas com os olhos da fé, pois a fé vê coisas invisíveis (Hb 11:1).
Provérbios 29:18 diz: “Não havendo profecia, o povo se corrompe”. Paulo tinha uma visão diante de sua alma da glória e das coisas eternas, e isso o manteve seguindo no caminho. Ele estava passando por essa cena, mas ele não estava mantendo nela seus olhos; seus olhos estavam fixos no que está à frente. Se ele tivesse se concentrado nessa cena, ele teria perdido sua energia espiritual para continuar. Quando Pedro manteve os olhos no Senhor, ele andou sobre a água turbulenta, mas quando ele se virou e olhou para as ondas, ele começou a afundar (Mt 14:29-30). Se nós, como Paulo, tivermos nossos olhos fixos em Cristo e nas coisas eternas além desta vida, seremos sustentados pelo poder divino e nossa força será renovada para continuar no caminho.
Assim, nesses capítulos, vemos que o olhar de Paulo estava focado em duas coisas: “a glória do Senhor” (cap. 3:18) e as coisas que são “eternas” (cap. 4:18). A primeira produz uma transformação moral do caráter, a segunda, um poder sustentador do caminho da fé e do serviço.
Os Motivos do Ministro Cristão se Devotar ao Serviço do Senhor
(cap. 5:1-21)
No capítulo 5, Paulo continua explicando seus princípios de ação no serviço ao Senhor, que estavam sendo questionados por seus difamadores. Ele agora revela os motivos internos de seu coração no serviço. Ele fala de três grandes coisas que o motivaram. Isso é trazido aqui porque seus difamadores interpretaram sua grande devoção ao Senhor como sendo a evidência de um homem que era mentalmente instável. Eles estavam espalhando histórias de que era um louco fanático que não deveria ser levado a sério. Ele faz alusão a essa acusação no versículo 13 (“fora de nós mesmos” [JND]).
Ao responder isso, Paulo mostra que não era loucura, mas profunda devoção a Cristo que o motivou. Ao fazê-lo, ele aproveita a oportunidade para falar das forças motivadoras por trás de sua vida de devoção à causa de Cristo. Esses mesmos três motivos deveriam energizar todos os Cristãos a viver e servir ao Senhor.
1) A Certeza da Sublime Condição de Glória Guardada no Céu para Nós, Nos Compele a Viver Agora por Essas Coisas Eternas
Vs. 1-9 – No capítulo 4, Paulo estava falando de coisas eternas e da possibilidade de perder sua vida como mártir de Cristo. Neste capítulo prossegue, dizendo que, se tal coisa tivesse de acontecer, ele tinha a garantia de que um dia seria glorificado em um corpo completamente transformado, que não seria afetado por doença, decadência e morte. Ele tinha certeza disso porque recebera uma revelação da verdade sobre essas coisas. Portanto, poderia dizer com segurança: “Porque sabemos que, se a nossa casa terrestre deste tabernáculo se desfizer, temos de Deus um edifício, uma casa não feita por mãos, eterna, nos céus”. Paulo sabia que se morresse em batalha (martírio), haveria uma magnífica condição de glória esperando por ele. Isso o encorajou a lançar sua energia no ministério.
Há duas pequenas expressões que Paulo usa no versículo 1 que aparecem muitas vezes em suas epístolas. São elas: “nós sabemos” e “nós temos”. Estas expressões denotam conhecimento Cristão e possessão Cristã, os quais caracterizam Cristianismo. “Nós sabemos” não é o conhecimento da experiência, ou o conhecimento da instrução, mas o conhecimento adquirido por revelação divina. Os apóstolos receberam revelações pelas quais o conjunto do conhecimento Cristão foi dado à Igreja (1 Co 2:10-16). “Nós temos” refere-se à porção especial (bênçãos) que pertence a todos os Cristãos por meio da obra consumada de Cristo e da presença interior do Espírito de Deus. Quão gratos devemos ser em saber o que sabemos e ter o que temos!
Paulo falou anteriormente da transformação moral que Deus atualmente está operando em nós (cap. 3:18), mas aqui ele fala de uma transformação física que ocorrerá quando o Senhor vier para nós (cap. 5:1). Usando a figura de uma “casa”, Paulo contrasta a condição de nossos corpos agora com o que eles serão num dia vindouro. Ele chama nossos corpos em sua condição atual de um “tabernáculo”, que é uma tenda (uma habitação portátil), porque eles são um alojamento temporário da alma e do espírito. Então, ele fala de nossos corpos quando eles serão glorificados como “um edifício de Deus, uma casa não feita por mãos, eterna nos céus”. Isso significa seu caráter permanente no estado glorificado. O contraste é óbvio; uma tenda deve ser removida em algum momento, mas uma casa é permanente.
Paulo havia dito aos coríntios em sua primeira epístola que essa mudança surpreendente para o estado glorificado ocorreria “num piscar de um olho” (JND) na vinda do Senhor – o Arrebatamento (1 Co 15:23, 51-57). “Não feita por mãos” significa simplesmente “não desta criação” (Hb 9:11). “Nos céus” não significa que Deus já fez nossos corpos glorificados e que eles estão sentados lá no céu desocupados, nos esperando chegar lá, mas sim que o céu é nosso destino, e o estado glorificado é de uma ordem e caráter celestial.
É interessante que a Escritura não diz que recebemos “novos” corpos, embora os Cristãos frequentemente falem isso. Mas os nossos corpos mortais é que são “transformados” para um estado glorificado (1 Co 15:51-52; Fp 3:21; Jó 14:14). Este estado glorificado é uma condição completamente nova, mas não é o recebimento de outro (ou novo) corpo. Dizer que um crente que morre (cujo corpo é enterrado) recebe um novo ou outro corpo quando o Senhor vier, nega a ressurreição. A Escritura indica que os próprios corpos em que vivemos, nos movemos e tivemos nosso ser, serão ressuscitados – embora que em uma condição inteiramente nova de glória. Por isso, temos a certeza da glorificação de nossos corpos, mas não necessariamente a dissolução de nossos corpos, porque “nem todos dormiremos” (1 Co 15:51). Alguns crentes estarão “vivos” na vinda do Senhor e serão “arrebatados” junto com aqueles que serão ressuscitados dentre os mortos naquele momento (1 Ts 4:16-17).
A compreensão da sublime condição de glória, guardada no céu para nós, motivou Paulo a viver para o Senhor e O servir com fervor. Ele disse: “E por isso também gememos, desejando ser revestidos da nossa habitação, que é do céu”. Nós “gememos” nesses corpos mortais porque eles estão sofrendo dos efeitos do pecado na criação. As dores e mágoas que experimentamos em nossos corpos nos lembram constantemente de que ainda não estamos em casa. O Senhor deseja que tais experiências tenham o efeito de diminuir nosso apego às coisas daqui e de voltar nossos espíritos em direção a nosso lar. Por isso, nesses capítulos, Paulo toca em duas coisas que produzem o correto desejo de ser “revestido” com nossos corpos glorificados: as coisas que são “eternas” que contemplamos pela fé (cap. 4:18), e os gemidos que experimentamos em nossos corpos mortais (cap. 5:2, 4).
O gemido aqui não é porque os desejos da carne não podem ser satisfeitos, nem porque temos algum medo ou incerteza de sermos aceitos diante de Deus em Cristo, mas porque a nova vida anseia pelo estado final (glorificado). O corpo em seu estado presente tende a entristecer a nova vida, e isso pode de algum modo impedir a alma de desfrutar da glória que a nova vida vê e deseja. Embora não seja errado gemer nesses corpos, é errado murmurar. Não há lugar para reclamação no Cristianismo (Fp 2:14; Jd 16).
Vs. 3-4 – Já que seremos “vestidos” com corpos glorificados, temos a bendita certeza de que não seremos encontrados “nus”. Nus é um termo que Paulo usa para denotar o estado de uma pessoa que está eternamente perdida sem uma cobertura para seu pecado.
Paulo acrescenta que não procuramos estar “despidos”, mas sim “revestidos”. Despido é outro termo que usa para descrever a alma e o espírito do crente no estado de morte desencarnado (intermediário). Não ansiamos por isso porque a morte não é nossa esperança. A postura Cristã apropriada é esperar o Senhor vir e nos transformar em seres glorificados. Estamos esperando Cristo para “vivificar” nossos “corpos mortais”, não para ressuscitar nossos corpos mortos (Rm 8:11). Daí vem o gracejo frequentemente usado: “Estamos esperando pelo Agente celestial, não por um agente funerário”.
Vs. 4-5 – Neste ínterim, enquanto esperamos que o “mortal” seja “absorvido pela vida”, Deus nos deu “o penhor do Espírito”. Isso se refere ao Espírito de Deus habitando em nossos corpos como uma promessa de que Deus vai completar o que Ele já começou. O processo de transformação começou em nossas almas e espíritos (cap. 3:18), mas naquele dia nossos corpos também serão transformados. O Espírito de Deus habita em nós, não apenas para nos dar a garantia de alcançarmos o estado glorificado, mas também para nos dar um gozo presente das coisas futuras. Assim, Ele nos dá uma amostra das coisas celestiais em que iremos viver por toda a eternidade, enquanto ainda estamos aqui na Terra.
Vs. 6-8 – Esse entendimento proporcionou a Paulo estar “sempre de bom ânimo” em servir ao Senhor. A KJV diz: “Em casa no corpo…”, mas deveria ser traduzido como “presente no corpo”. Viver em nossos corpos mortais em seu estado atual não é lar para o crente; como já mencionado, é um estado temporário. Somos estrangeiros e peregrinos neste mundo, e nossos corpos são apenas um tabernáculo (tenda); ainda não estamos em casa. Nem a Escritura chama de lar o estado intermediário de almas e espíritos desencarnados com Cristo. Costumamos dizer: “Fulano de tal foi para casa para estar com o Senhor”. Entendemos o que quer dizer, mas a Escritura não chama este estado de casa bem aventurada. Lar, para o crente, é o estado final quando ele estiver glorificado. Aqueles no estado desencarnado estão esperando por aquele dia, como nós estamos – mas eles estão em uma “sala de espera” mais brilhante, por assim dizer. Quando o Senhor vier, todos nós iremos juntos para a casa do Pai (Jo 14:2-3).
Em um pequeno parêntese (v. 7), Paulo diz: “Porque andamos por fé, e não por vista”. Isso significa simplesmente que ele estava vivendo para as coisas eternas agora. É necessário primeiro ver as coisas eternas pela fé (cap. 4:18) antes que se possa andar nelas pela fé.
Embora “partir e estar com Cristo” (Fp 1:23) por meio da morte não seja a esperança do Cristão, é uma opção. Se Deus escolhe isso para nós, deveríamos “desejar antes deixar este corpo”, pois então iríamos “habitar com o Senhor” no estado desencarnado. E sabemos que isso é “muito melhor” do que estar agora em nossos corpos mortais (Fp 1:23).
V. 9 – O efeito prático de tudo isso é que Paulo trabalhou (esforçou-se) para ser aceitável ou agradável para Ele que o chamou para o serviço. Novamente, a KJV traduz “aceitos por Ele”. Isto não é muito correto, porque as Escrituras dizem que somos “aceitos no Amado” (Ef 1:6 – KJV). Não labutamos para ser aceitos porque já fomos aceitos. A interpretação correta deveria ser “agradável [ou aceitável] a Ele”. Seu ponto é que ele trabalhou para ser agradável ou prazeroso ao Senhor, e a condição vindoura de glória o motivou para esse fim. Isso age como uma transição adequada para o próximo ponto de Paulo sobre o tribunal de Cristo.
Nesta passagem, Paulo falou de três condições do crente e uma condição dos incrédulos. A primeira é nossa vida atual na Terra em nossos corpos mortais – “presentes no corpo”. O segundo é o estado desencarnado, quando a alma e o espírito partem para estar com Cristo – “despidos”. A terceira é a consumação de nossa salvação quando nossos corpos serão glorificados na vinda do Senhor (o Arrebatamento) – “vestidos”. O primeiro estado é bom (se for vivido em comunhão com Deus), o segundo é melhor, mas o terceiro é o melhor. A quarta condição que ele menciona (“nu”) pertence puramente ao incrédulo.
Um resumo desses termos é o seguinte:
- “Presente no corpo” – vida vivida na Terra em nossa condição atual. - “Despido” – a alma e o espírito do crente desencarnado no estado intermediário de felicidade. - “Vestido” – o crente glorificado em um estado inteiramente novo. - “Nu” – uma pessoa perdida eternamente sem cobertura para o pecado.
Assim, a antecipação da condição vindoura de glória guardada no céu para todos os redimidos compeliu Paulo a viver para as coisas eternas enquanto esteve aqui neste mundo. Isso fará o mesmo em todo Cristão de mente sensata. O fato de não estarmos neste mundo para ficar e de não podermos guardar as coisas temporais que vemos ao nosso redor, deveria nos motivar a viver para as coisas eternas. O processo de decadência nesses corpos mortais já começou, e deveria nos lembrar de que não vamos ficar aqui para sempre – especialmente quando as dores e mágoas aumentam com a idade. Nós não temos muito tempo para viver neste mundo e deveríamos orar, como Moisés fez: “Ensina-nos a contar os nossos dias, de tal maneira que alcancemos corações sábios” (Sl 90:12). Sabedoria deveria nos dirigir a vivermos para as coisas eternas agora.
2) O Tribunal de Cristo nos Comanda a Usar Nossas Vidas para as Coisas Eternas
Vs. 10-13 – Isso leva Paulo a falar do “tribunal de Cristo”, que foi outra grande coisa que o motivou a servir ao Senhor. Ele disse: **“**Todos devemos comparecer ante o tribunal de Cristo”. Essa é uma referência à sua mais ampla aplicação. “Todos” neste versículo refere-se à toda a humanidade – que inclui incrédulos. Ele diz: “Ou bem, ou mal”. Os crentes receberão o “bem” em forma de recompensas e os incrédulos receberão o “mal”, sendo banidos da presença de Deus para o lago de fogo. Os crentes virão perante o tribunal imediatamente após serem arrebatados para o céu, mas os incrédulos que morrerem em seus pecados serão julgados mais de 1.000 anos após, depois do Milênio (Ap 20:11-15).
Para o crente, é a hora em que o Senhor vai rever nossas vidas e nos recompensar pelo que fizemos por Ele. O lado solene desta sessão é a possibilidade de sofrermos a perda da nossa recompensa, se tivermos vivido nossas vidas apenas para as coisas temporais (1 Co 3:15). Essa ideia impeliu Paulo ao serviço zeloso para o Senhor. Deveria ter o mesmo efeito em nós.
Assim como existem dois tipos de juízes na sociedade, o Senhor julgará toda a humanidade em um ou outro desses dois modos. Primeiramente, há um magistrado legal que é investido de autoridade nos tribunais da Terra. Ele tem poder para julgar um criminoso e condená-lo à prisão. O Senhor tratará com os incrédulos desta forma triste e solene (Ap 20:11-15). O crente nunca enfrentará esse tipo de julgamento porque seu caso foi resolvido quando ele recebeu o Senhor Jesus como seu Salvador e descansou na fé em Sua obra consumada na cruz. O Senhor disse: “quem ouve a Minha palavra, e crê naquele que Me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação [julgamento – JND]” (Jo 5:24). Por isso, o crente tem confiança “no dia do juízo [julgamento – JND]” (1 Jo 4:17).
Em segundo lugar, há um juiz (um árbitro) em uma exposição – ou seja, uma mostra de arte. Esse tipo de juiz tem conhecimento em um determinado campo de especialidade para decidir os méritos dos objetos diante dele. Ele está na exposição para avaliar a qualidade e mão de obra das peças em exibição. Da mesma forma, o Senhor irá rever a vida do crente no caráter deste juiz, avaliando as coisas em nossas vidas que foram feitas para Ele e nos recompensando de acordo. O caráter de toda a sessão para os crentes será: revisão, recompensa e consequente regozijo.
É significativo que cada vez que o tribunal de Cristo é mencionado no Novo Testamento, ele é visto de um ponto de vista diferente. Quando os colocamos todos juntos, aprendemos que o Senhor examinará todos os aspectos de nossas vidas. As várias áreas de revisão são:
- Nossos caminhos em geral (2 Co 5:9-10). - Nossas palavras (Mt 12:36). - Nossas obras de serviço (1 Co 3:12-15). - Nossos pensamentos e motivos (1 Co 4:3-5). - Nossos exercícios pessoais quanto às questões de consciência (Rm 14:10-12).
Uma pergunta que muitos Cristãos têm em relação ao tribunal de Cristo é: “Por que temos de passar por isso? É realmente necessário que o crente seja julgado dessa maneira?” A resposta é: “sim”, pois o Senhor não fará algo que não seja necessário. Há duas razões principais para esta sessão: uma tem relação futura e a outra tem relação presente.
a) Aumentará o Louvor Eterno a Deus
Primeiro, quanto à influência futura do tribunal, é que resultará em um aumento do louvor a Deus no céu. Todos os crentes concordam que o Senhor merece o mais completo louvor de toda pessoa redimida; o resultado imediato do tribunal de revisão fará exatamente isso. Existem três maneiras pelas quais isso será realizado:
I) O Senhor magnificará a graça de Deus perante os nossos olhos, pelo que o nosso apreço por ela será significativamente aprofundado e, assim, produzirá um maior volume de louvor de nossos corações. O Senhor reverá nossas vidas e veremos nossos pecados à luz da infinita santidade de Deus. Coisas que podemos pensar que não são tão seriamente graves agora, veremos então como pecado de fato. Conhecemos nossos pecados agora como sendo uma pilha repugnante – e certamente não estamos orgulhosos dela – mas naquele dia Ele nos mostrará que eles eram uma montanha! Tudo então será visto em sua verdadeira luz, e aprenderemos sobre a verdadeira maldade de nossas naturezas pecaminosas caídas.
Uma vez que diz: “que tiver feito por meio do corpo” – e estávamos todos em nossos corpos antes de sermos salvos – essa manifestação será de toda a nossa vida, não apenas de depois que fomos salvos. Se Ele não revisse certos episódios de fracasso e vergonha em nossas vidas, haveria alguma reserva de nossa parte, e Deus não quer isso – e nós também não iríamos querer. A brilhante eternidade diante de nós seria obscurecida em parte pela sensação de que um dia eles poderiam ser trazidos à luz. Portanto, o caminho de Deus é que tudo seja tomado e colocado fora do caminho para sempre. (Temos cinco ou seis expositores respeitados que afirmam que esta manifestação não será um assunto público perante todos os santos no céu, mas algo privado com o Senhor.)
Então, depois de nos mostrar os nossos pecados à luz da Sua santidade, nós vamos ver a graça de Deus elevar-se acima de todos eles, colocando-os todos na justa base da obra consumada de Cristo. Vamos entender a verdade de Romanos 5:20 de um modo mais profundo: “onde o pecado abundou, superabundou a graça”. O resultado será um romper alto e eterno de louvor da companhia redimida. O volume de louvor será muitas vezes maior do que se não tivéssemos passado por esse processo de revisão.
II) O Senhor revelará a sabedoria de Seus caminhos conosco na Terra. Isso também aumentará o volume do louvor. Todos nós tivemos algumas coisas difíceis e desconcertantes acontecendo em nossas vidas, e muitas vezes nos perguntamos por que o Senhor permitiu isso. A revisão no tribunal justificará Deus em Seus caminhos conosco. O Senhor nos levará por meio de nossas vidas, passo a passo, e nos mostrará que Ele não cometeu nenhum erro no que Ele nos permitiu passar. Naquele dia, Ele responderá a todas as perguntas difíceis que temos sobre nossas vidas, e Ele nos mostrará que havia um propósito divino de amor por trás de tudo e um “sendo necessário” para tudo (1 Pedro 1:6). No tribunal, o Senhor nos mostrará que não derramamos uma lágrima despercebida. Aprenderemos que cada grama de sofrimento e tristeza pela qual passamos foi pesada em Suas divinas balanças no mais terno amor, antes de ser colocado sobre nós. Ele nos mostrará que isso foi usado para nos conformar à Sua própria imagem (Rm 8:28-29). E diremos: “O caminho de Deus é perfeito” (Sl 18:30). Como resultado, nós O louvaremos de uma maneira muito maior e mais significativa do que jamais faríamos, se não tivéssemos tido a experiência do tribunal.
III) O Senhor nos concederá recompensas por aquilo que fizemos por causa do Seu nome. Ele usará a ocasião do tribunal para determinar nossas recompensas no reino. Quando recebermos uma recompensa pela menor coisa que fizemos por Ele – até mesmo algo tão insignificante como dar água em Seu nome (Mt 10:42) – seremos surpreendidos por isso e O louvaremos muito mais. Naquele dia, Ele encontrará algo para recompensar todo crente. “então cada um receberá de Deus o louvor” (1 Co 4:5). Ele encontrará coisas feitas para Si que há muito esquecemos, e ficaremos maravilhados que Ele nos dará uma recompensa por isso.
Feitos grandiosos que nos tornou convencidos,
Ele mostrará que eram apenas pecado.
Atos de bondade, há muito esquecidos,
Eram para Ele, é o que será mostrado.
É ainda mais difícil acreditar que, quando chegarmos lá, Ele nos louvará! “então cada um receberá de Deus o louvor”. Podemos ter pensado que iríamos ao céu para louvá-Lo – o que certamente é verdade – mas quando chegarmos lá Ele também nos louvará! Isso é surpreendente. Não será no senso comum de adoração, é claro, mas Ele dirá a cada um de nós: “Bem está, servo bom e fiel” (Mt 25:21). Nós seremos maravilhosamente humilhados pela Sua graça e bondade, e o grande resultado será que nós encheremos os céus com o Seu louvor porque Ele é digno.
b) Nos Motiva a Viver para Cristo
O outro propósito para o tribunal de Cristo é nos motivar a viver para Cristo agora. Este é o contexto no qual Paulo estava escrevendo neste quinto capítulo. Deus pretende que esse evento futuro tenha um efeito presente em nós. Quando percebemos que tudo o que fazemos para o Senhor vai ter uma recompensa no dia futuro, e que podemos perder nossa recompensa se vivermos para nós mesmos agora, isso deve nos motivar a começar a ajuntar tesouros no céu para aquele dia (Mt 6:20-21).
Já foi dito que não devemos fazer as coisas apenas para obter uma recompensa; tudo deve ser feito com o desejo de agradar ao Senhor. Isso é verdade; nosso maior motivo para as coisas que fazemos deve ser puramente porque amamos o Senhor e queremos agradá-Lo. No entanto, o Sr. Kohler costumava dizer: “Quero pegar todas as coroas que conseguir, porque naquele dia terei mais para lançar a Seus pés!” (Ap 4:10).
V. 11 – A realidade da revisão diante do tribunal de Cristo num futuro próximo produziu um duplo efeito que estava presente em Paulo e seus cooperadores. Deveria fazer o mesmo efeito em nós. Em primeiro lugar, eles foram motivados pelo “temor que se deve ao Senhor”. O pensamento do “temor” de Deus contra o pecado fez com que pensassem nos incrédulos e em sua sorte ante o tribunal. Isso os levou a usar toda a sua energia para “persuadir os homens” a fugir da ira vindoura. Assim, Paulo se lançou na obra do Senhor. Nota: ele era fervoroso em seu serviço, não para obter uma recompensa, mas sim por preocupação com aqueles que viviam sem referência à eternidade. Em segundo lugar, o pensamento do tribunal o levou a viver agora como “manifesto a Deus” e nas “consciências” dos santos. Em outras palavras, ele queria ser transparente diante de Deus e dos homens em relação a seus motivos no serviço. Ele desejou que todos vissem que seus motivos eram puros.
- Quanto ao mundo – Paulo procurou “persuadir os homens”. - Quanto a ele – Paulo andava conscientemente sob os olhos do Senhor que tudo vê, como “manifesto a Deus”. - Quanto aos santos – Paulo procurou andar de um modo que “recomendasse” a si mesmo às suas consciências.
Sabendo que logo seremos “manifestos” diante do tribunal de Cristo, devemos estimular um exercício presente em nós para usar nossa energia no serviço do Senhor, e para viver aberta e honestamente diante de Deus e dos homens.
Vs. 12-13 – Percebendo que o que ele acabara de dizer poderia ser mal entendido como sendo um autoelogio, Paulo esclarece suas declarações dizendo que não estava tentando “recomendar-se” a si mesmo. Ele estava, antes, deixando os santos conhecerem a sinceridade piedosa de sua vida e ministério, de modo que eles teriam “algo para responder” (KJV) àqueles que o atacavam com seus relatos caluniosos.
O zelo que impulsionou Paulo a servir ao Senhor com toda a sua energia levou seus críticos a rotulá-lo como um fanático que estava “fora” (JND) de si mesmo. Sua pregação e ensino apaixonados foram interpretados como sendo de um homem que era mentalmente instável e, portanto, não confiável.
Paulo responde a essa insinuação dizendo que se sua devoção ao Senhor se parecia assim, em ambos os casos (quer estivesse em êxtase ou sóbrio) era porque seus motivos eram totalmente não egoístas. Ele amava a Deus e se importava profundamente com os santos de Deus.
3) O Amor de Cristo nos Constrange a Vivermos para Ele que Morreu por Nós e Novamente Ressuscitou
Vs. 14-21 – Isso leva Paulo a falar de uma terceira grande força motivadora em sua vida e ministério. Ele foi movido pelo “amor de Cristo”. Que grandioso poder é esse! Sua vida de devoção a um serviço incansável pode ter parecido insanidade para seus críticos, mas foi realmente resultado do poder constrangedor do amor de Cristo.
Paulo não estava falando de seu amor por Cristo, mas sim do amor de Cristo por ele. O poder desse amor o havia capturado de tal maneira que alterou completamente o curso de sua vida. Não é a glória de Cristo à destra de Deus que está diante de nós aqui (como no capítulo 3:18), mas “o amor de Cristo” que O levou a morrer. Ele morreu não apenas para tirar nossos pecados, mas também para transformar todo o propósito de nossa existência neste mundo. Ao dizer: “julgando nós assim: que, se Um morreu por todos, logo todos morreram”, Paulo estava afirmando que, uma vez que Cristo teve de morrer por toda a humanidade, é uma prova de que toda a raça estava em uma condição de morte espiritual – todos eram apenas homens mortos diante de Deus (Ef 2:1, 5). Não obstante Ele “morreu por todos”; o efeito de Sua morte foi alterar o curso da vida daqueles que creem.
V. 15 – Aqueles que foram vivificados do estado da morte espiritual (mencionados no versículo 14) devem encontrar no Cristo ressuscitado o Objetivo e o Fim da nova vida que eles agora vivem. Antes da conversão, tudo na vida de um homem gira em torno de seus próprios interesses, mas quando Cristo é seu Salvador e Senhor, há um motivo inteiramente novo para viver em sua vida. O objetivo e propósito de sua vida são os interesses de Cristo. Este foi o caso de Paulo e daqueles que trabalharam com ele, e este deveria ser o caso de todo Cristão de coração sincero. O poderoso amor de Cristo o constrangeu a não viver para si mesmo, mas para aqu’Ele que morreu e ressuscitou. Vemos a partir disso que realmente existem apenas duas maneiras nas quais os Cristãos podem viver: “para si mesmos” ou “para Ele”. Não podemos fazer nada sobre o modo como vivemos nossas vidas Cristãs no passado. Se foi para nós mesmos, o que foi feito não pode ser mudado, mas todos nós temos um “daqui por diante”. Há o “tempo que vos resta” (1 Pe 4:2); a grande questão para nós é o que faremos com esse tempo. As escolhas que fazemos em nossas vidas daqui em diante refletirão onde estão nossas afeições.
Por isso, nesses capítulos, tivemos:
- A transformação do nosso caráter moral (cap. 3:18). - A transformação de nossos corpos (cap. 5:1-4). - A transformação do nosso propósito em viver (cap. 5:14-15).
Vs. 16-17 – Paulo mostra que a vida que ele agora vivia estava em uma esfera inteiramente nova. Quando o Senhor ressuscitou dos mortos, Ele deixou para trás a esfera que pertencia à existência natural da carne e Se tornou a Cabeça de uma raça de uma “nova criação” de homens (Cl 1:18; Ap 3:14). Como crentes, somos parte dessa nova raça, e nossos vínculos uns com os outros nessa nova esfera não estão mais nas linhas das relações e interesses naturais. Paulo diz: “daqui por diante a ninguém conhecemos segundo a carne”. Isso não significa que não tenhamos mais relacionamentos e interesses naturais, mas que, nas coisas espirituais (comunhão e ministério Cristãos), nossas ligações uns com os outros são em linhas espirituais. Assim, nossa comunhão na nova criação não é baseada em nós tendo interesses similares naturais em recreação, artes e música, relações familiares, diferenças nacionais, etc.
Além disso, como Cristãos, nosso relacionamento com o Senhor não está nas linhas terrenas – como Ele foi para Israel como seu Messias. Paulo diz: “e, ainda que também tenhamos conhecido Cristo segundo a carne, contudo agora já O não conhecemos deste modo”. Como Cabeça de uma raça de nova criação, conhecemos o Senhor de uma maneira nova e diferente. O Senhor indicou isso a Maria quando Ele ressuscitou dos mortos, dizendo: “Não Me detenhas, porque ainda não subi para Meu Pai” (Jo 20:17). A relação que Maria e os outros discípulos tinham com o Senhor antes de Sua morte (como o Messias de Israel) agora já não era mais. Havia uma nova relação de criação prestes a ser estabelecida para os crentes com Ele em conexão com Sua ressurreição e ascensão. Paulo traz este fato aqui porque os falsos apóstolos que estavam circulando entre os coríntios estavam ministrando em linhas judaicas com uma esperança judaica segundo a velha ordem das coisas.
Problemas surgiram no testemunho Cristão porque os Cristãos não entenderam que eles são uma nova criação em Cristo. Eles criaram igrejas onde as relações entre eles são baseadas em “coisas velhas” e interesses naturais. O resultado tem sido a formação de partidos e facções dentro da Igreja de Deus que são puramente alinhadas com nossos gostos e desgostos naturais.
Em Efésios 2, Paulo afirma que fomos “criados em Cristo Jesus” (Ef 2:10). Paulo aqui o amplia dizendo, “Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é [criação]” – tudo da velha ordem “passou” e “eis que tudo se fez novo”. Isso não significa que quando uma pessoa é salva, ela não tenha mais uma natureza caída pecaminosa, as luxúrias e velhos hábitos que a acompanham. Muitos novos convertidos erroneamente pensaram que isso aconteceria quando eles fossem salvos, e se desiludiram quando descobriram que ainda têm aqueles desejos pecaminosos. Mas isso não é o que Paulo está descrevendo aqui. Ele está falando da nova posição e esfera na qual o crente está agora; o estado moral e a prática do crente são outra coisa completamente diferente. O equívoco vem do confundir posição Cristã e prática Cristã.
Vs. 18-21 – Por isso, Paulo diz: “E tudo isto provém de Deus” – isto é, todas as coisas na nova criação têm sua origem no próprio Deus. Os crentes hoje estão esperando pela plenitude da nova criação. Nossas almas e espíritos estão na nova criação, mas nossos corpos esperam ser trazidos a ela na vinda do Senhor (o Arrebatamento). Paulo falou dessa notável mudança em nossos corpos no início deste capítulo, e faz novamente em 1 Coríntios 15:51-57 e Filipenses 3:20-21.
O Cristianismo deve ser conhecido por todos os homens pelas vidas transformadas dos crentes (cap. 3:18), e pela proclamação das grandes verdades do evangelho (cap. 5:18-21). Por isso, ao reconciliar os homens a Ele mesmo, Deus nos deu “o ministério da reconciliação”. Quando Cristo esteve aqui na Terra, Deus operou por meio d’Ele com o objetivo de “reconciliar Consigo o mundo” (João 5:17). Naquele momento, Ele não estava “lhes imputando os seus pecados [ofensas]” porque Cristo não veio “para que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por Ele” (Jo 3:17). Mas desde que Cristo voltou para o céu, Deus “confiou a palavra da reconciliação” (ARA) aos crentes. As pessoas redimidas são as únicas que podem levar corretamente a mensagem da reconciliação ao mundo porque experimentaram pessoalmente a graça de Deus. Esse privilégio não foi confiado aos anjos eleitos porque eles nunca conheceram a graça de Deus dessa maneira. Essas coisas eram tão prementes a Paulo que ele tinha pressa em sua pregação aos outros.
Como “embaixadores da parte de Cristo”, Deus usou Paulo e os que estavam com ele para pregar a mensagem: “que vos reconcilieis a Deus” (KJV). O versículo 20 nos dá:
- Os mensageiros – “Somos embaixadores”. - Os meios – “como se Deus por nós rogasse”. - A mensagem – “sejamos reconciliados a Deus” – (JND)
Na tradução Almeida o pronome “vos” (mencionado duas vezes) foi colocado no texto erroneamente, como se Paulo estivesse rogando aos coríntios que se reconciliassem a Deus, o que é sem sentido, porque eles, como crentes, já estavam reconciliados a Deus. O versículo deveria simplesmente dizer: “Deus rogou por nós, rogamos-vos por Cristo, sejamos reconciliados a Deus” – (JND). Paulo e seus cooperadores eram apenas instrumentos (canais) que Deus usou no chamado aos pecadores para Si mesmo.
V. 21 – O apóstolo explica então a base sobre a qual Deus reconcilia pecadores Consigo mesmo; é um resultado de Seu próprio ato realizado na morte de Cristo. Deus tinha o Senhor Jesus para ficar no lugar do crente por meio do qual foi “feito pecado por nós”. Ele foi tratado como o próprio pecado sob o julgamento de Deus. Como isto poderia ser possível, desafia toda explicação lógica, e assim é melhor deixar como a Escritura o coloca. O que sabemos é que na cruz Ele Se tornou a grande oferta pelo pecado [Is 53:10 – “uma oferta pelo pecado” (TB); Rm. 8:3] que satisfez as exigências da justiça divina e, portanto, é o meio pelo qual Deus poderia revelar-Se em bênção para o homem. O resultado para o crente é “que n’Ele fôssemos feitos justiça de Deus”. Esse versículo tem uma dupla antítese: o inocente sendo feito pecado, e os injustos sendo feitos justos em Cristo.
Olhando para este terceiro fator motivador na vida e ministério de Paulo, podemos ver que o “amor de Cristo” o havia capturado de tal forma que alterou o curso de sua vida de maneira plena. Isso o constrangeu a viver pela causa de Cristo – e pode fazer o mesmo conosco. Podemos não ver a evidência do poder constrangedor do amor de Cristo na vida de todos os crentes, como vemos em Paulo, mas isto não é porque o Seu amor carece de poder para movê-los; é porque não vivem perto d’Ele o suficiente para sentir Seu efeito constrangedor. Um enorme imã com bastante poder de atração não irá pegar o menor objeto de ferro se o objeto estiver muito longe do imã. Se andarmos perto do Senhor, sentiremos o poder impressionante de Seu grandioso amor e isso nos constrangerá como aconteceu com o apóstolo Paulo. Isso nos levará a desistir de nossas próprias ambições e a tomar um curso de abnegação, que resultará no compromisso com a causa de Cristo neste mundo.
Um Resumo das Três Grandes Coisas que Motivaram Paulo no Serviço
- A certeza da maravilhosa condição de glória que está guardada no céu compeliu Paulo a servir ao Senhor em vista daquelas coisas eternas (cap. 5:1-9). - A realidade do tribunal de Cristo o comandou a usar seu tempo com sabedoria no serviço do Senhor (cap. 5:10-13). - O poder do amor de Cristo o constrangeu a não viver para si mesmo, mas para aqu’Ele que morreu por ele e ressuscitou, e assim rogar aos homens que se reconciliem a Deus (cap. 5:14-21).
O Ministro Cristão Testado e Aprovado por Deus
(cap. 6:1-10)
No capítulo 6, Paulo fala de ser testado e aprovado por Deus no ministério. Ele e seus cooperadores haviam sido verdadeiramente testados em situações da vida real no campo do serviço, e foram encontrados com aprovação divina.
Vs. 1-2 – No capítulo 5, Paulo falou de como rogou aos pecadores que se reconciliassem a Deus; agora no capítulo 6, ele roga aos santos de Corinto que “não recebais a graça de Deus em vão”. Tais verdades motivaram-no tanto que dedicou toda a sua vida ao serviço do Senhor, como visto no capítulo 5. Agora, ele roga aos coríntios que respondam da mesma maneira. Ele os convida a responder à graça de Deus que lhes foi mostrada e a permitir que as coisas preciosas que lhes foram transmitidas por meio do ministério afetem praticamente suas vidas.
As palavras “com Ele” no versículo 1 não são encontradas no texto em grego.
Elas fazem o versículo significar que Paulo e seus cooperadores de trabalho eram cooperadores com Deus. Isto é verdade (1 Co 3:9), mas não é esse o ponto que ele está enfatizando aqui. Ele desejava provocar os coríntios a responder à graça de Deus e a unir-se à obra em que ele e seus cooperadores estavam engajados. O Sr. F. B. Hole disse: “A graça é recebida em vão se não funcionar para seu fim e efeito legítimos”. É triste dizer que esse foi o caso dos coríntios. Sob a influência dos falsos apóstolos que haviam se infiltrado em seu meio, eles haviam se tornado “críticos de plantão” daqueles engajados na obra do Senhor, ao invés de “cooperadores também” com eles. Eles criticavam o apóstolo, mas não se engajaram no serviço do Senhor de maneira significativa. Essa foi uma terrível inconsistência, e é um problema que ainda hoje existe na Igreja.
Em um parêntese (v. 2), Paulo cita Isaías 49:8 para mostrar que o tempo para estar ocupado na obra do Senhor é “o dia da salvação”. Isaías estava falando profeticamente do encorajamento de Deus ao Messias de Israel (o Senhor Jesus) quando Ele foi rejeitado, no momento de Sua primeira vinda (Jo 1:11). Deus prometeu a Ele que Sua oração em relação à salvação de Israel seria ouvida no “tempo aceitável”, que será na Sua Aparição. Deus vai agir para a bênção de Israel naquele dia e prometeu ajudar o Senhor a cumpri-lo. Paulo faz uma aplicação daquela Escritura para mostrar que devemos ser encontrados trabalhando neste presente dia de salvação quando o Evangelho da Graça de Deus está sendo pregado. O argumento de Paulo aqui é que podemos contar com a assistência de Deus neste trabalho de maneira semelhante (compare Marcos 16:20). Ele traz isto diante dos coríntios como um encorajamento para estarem ocupados no ministério de reconciliação mencionado no capítulo 5. Em vez de dar ouvidos às pessoas que estavam se opondo e criticando Paulo e seu ministério, os coríntios precisavam apoiá-lo de qualquer maneira que pudessem. Precisamos fazer o mesmo.
V. 3 – Paulo adverte aos coríntios, que estando envolvidos no trabalho, precisavam ser cuidadosos em todas as suas relações com as pessoas e não darem qualquer “escândalo”, para “que nosso ministério não seja censurado”. A verdade pode escandalizar (Mt 15:12), mas não é disso que Paulo está falando. Ele está falando de escândalos pessoais por causa de nossas próprias tolices. É extremamente importante não permitir que algo seja inconsistente em nossas vidas, para que não façamos tropeçar aqueles a quem proclamamos a graça de Deus. Isso poderia levá-los a rejeitá-la.
Vs. 4-10 – Paulo traz seus princípios de agir no serviço ao ápice ao mencionar nada menos que 28 coisas nas quais ele e seus cooperadores foram testados e aprovados por Deus. Esses testes e provas se dividem em três categorias, cada uma com nove itens: em circunstâncias externas adversas, em formas e características morais, e equívocos paradoxais.
Nove Circunstâncias de Teste nas Quais o Ministro Deve Honrar a Deus
Vs. 4-5 – Paulo apresenta uma lista das circunstâncias adversas externas que alguém que fielmente ministra a verdade encontrará. Ele começa falando de “paciência”. Essa é a qualidade da resistência espiritual que é necessária em todas as difíceis provações que se encontram ao servir ao Senhor.
Paulo então prossegue em nomear nove circunstâncias adversas. “Aflições” referem-se a vários problemas que o servo encontrará (2 Tm 1:8). “Necessidades” são privações (At 20:34). “Angústias” são situações de provação (Sl 120:1). “Açoites” referem-se a espancamentos (At 16:22-23). “Prisões” estar encarcerado (At 24:27). “Tumultos” são os resultados da rejeição do evangelho (At 19:29-34). “Trabalhos” referem-se a trabalho duro de qualquer tipo (At 20:33-35). “Vigílias” são noites sem dormir. “Jejuns” não é o jejum voluntário resultante do exercício da alma diante de Deus, mas a fome pela falta de comida.
Em todas essas coisas, Paulo e aqueles que trabalharam com ele enfrentaram essas situações e se comportaram de forma recomendável, como “ministros de Deus” (v. 4).
Nove Características Morais
Vs. 6-7 – Passando para outra área onde o ministro de Cristo deve mostrar-se “aprovado para Deus” (2 Tm 2:15 – JND), Paulo fala de nove coisas pelas quais o servo deveria ser caracterizado.
Ele começa com “pureza”, que tem a ver com a piedade pessoal. Os servos de Deus devem andar sem culpa diante de seus irmãos e do mundo. A próxima é “ciência”. O servo deve ter uma sólida compreensão da verdade de Deus (Ef 3:4), de modo a poder responder a qualquer um que pergunte sobre a fé Cristã (1 Pe 3:15). Os ministros de Deus também devem ser marcados por “longanimidade”. Essa é a qualidade de ter um espírito paciente com aqueles que se opõem à verdade (2 Tm 2:24). “Benignidade” mostra que eles devem manifestar um espírito de graça para todos. Além disso, o ministro de Cristo deve ser marcado por ser cheio do “Espírito Santo” em todos os momentos (Gl 5:25; Ef 5:18). “Amor não fingido”, é claro, significa que eles devem ser verdadeiros em sua afeição por todos.
Paulo então diz: “Na palavra da verdade”. Aparentemente, isso significa que quando o servo está sob pressão para abrir mão de algum ponto da verdade para tornar a mensagem mais aceitável, ele deve apegar-se a toda a verdade de Deus. Então ele acrescenta: “No poder de Deus”, o que significa que a obra do Senhor não deve ser realizada com energia carnal, mas pelo poder que Deus dá pelo Espírito (Zc 4:6). Por último, ele diz: “Pelas armas da justiça, à direita e à esquerda”. Isso se refere a agir com integridade moral em todos os negócios, de modo a não ofender o evangelho.
Isso mostra que há um certo caráter que o ministro deve manter diante de todos para que não haja acusações contra o Senhor e a verdade de Deus. Em cada uma dessas coisas, Paulo e os que estavam com ele foram aprovados por Deus.
Nove Situações Paradoxais
Vs. 8-10 – No último grupo de nove coisas, Paulo mostra que o ministro pode ser às vezes mal compreendido e até mesmo rejeitado no serviço do Senhor. Não podemos esperar que as pessoas do mundo entendam o propósito do evangelho, nem podemos esperar que os Cristãos mundanos apreciem todos os aspectos da verdade. Como resultado, haverá oposição e distorção dos motivos e do trabalho do servo. Essas coisas não podem ocorrer senão na vida do servo que tenta honrar a Deus em seu serviço. Consequentemente, deve aceitar o fato de que ele parecerá, às vezes, de um modo contraditório diante dos outros.
Paulo diz: “Por honra e desonra”. O servo será apreciado Entre aqueles que valorizam a verdade, mas entre aqueles que a rejeitam, ele será menosprezado. “Por infâmia e por boa fama” significa que ele pode ser difamado, mas aqueles que valorizam a verdade levarão boas referências de seu caráter e maneiras. “Como enganadores, e sendo verdadeiros” significa que o servo pode ser acusado de ser um impostor, mesmo que tais alegações não sejam verdadeiras. “Como desconhecidos, mas sendo bem conhecidos” refere-se a ser visto como nada neste mundo, mas tendo a silenciosa confiança da aprovação do Senhor. J. N. Darby observou apropriadamente que “a verdadeira grandeza é servir despercebido e trabalhar sem ser visto”. O servo do Senhor deve estar contente com isso. “Como morrendo, e eis que vivemos” refere-se à vida do servo sempre estando em perigo, mas tendo misericórdia divina para continuar no caminho. “Como castigados, e não mortos” refere-se às muitas coisas que o servo irá suportar no caminho do serviço, que Deus usará como uma disciplina em Sua escola e que acabará sendo de proveito do servo. “Como contristados, mas sempre alegres” refere-se à tristeza que o ministro experimenta quando a verdade é rejeitada ou resistida, mas há regozijo quando é recebida. “Como pobres, mas enriquecendo a muitos” refere-se ao gasto de recursos materiais para prover os meios de alcançar as pessoas e transmitir bênçãos espirituais a elas (At 20:34). “Como nada tendo, e possuindo tudo” significa que o servo parecerá estar desperdiçando sua vida em uma causa inútil, mas na realidade ele ganhou todas as coisas – espirituais e materiais (Ef 1:3; 1 Co 3:22).
Assim, o servo deve suportar todas as coisas pelo amor do evangelho e, ao mesmo tempo, manter um espírito e caráter corretos como servo de Deus. Para resumir todas essas coisas, Hamilton Smith disse: “Quer fossem nas circunstâncias pelas quais passaram, ou nas provações que tiveram que enfrentar, nos exercícios espirituais que o serviço deles envolveu, nas qualidades morais que exibiram, na justiça prática que os marcaram, ou no caminho que eles percorreram seguindo o Mestre, o apóstolo e seus companheiros recomendaram a si mesmos como servos de Deus”.
A grande conclusão aqui é que Paulo e seus cooperadores se mostraram aprovados e recomendados por Deus – a mais alta de todas as autoridades. Que bases os coríntios poderiam ter para rejeitar a ele e a seu ministério se Deus os aprovou? É inconcebível que alguém tão devotado e tão abnegado possa ser acusado de insinceridade, egoísmo, engano etc. No mínimo, Paulo havia dado a seus amigos em Corinto, que formavam a maioria da assembleia, o material para responder aos falsos mestres que questionaram sua honestidade e integridade.
Resumo das Características de um Verdadeiro Ministro Cristão nos Capítulos 1-6
- Ele está cheio das compaixões de Deus e, portanto, capaz de simpatizar e encorajar aqueles a quem ministra (cap. 1:3-11). - Ele é um modelo de coerência em todas as suas relações na vida e, portanto, é confiável (cap. 1:12-24). - Ele é fiel para confrontar assuntos entre os santos que afetam a glória do Senhor (cap. 2:1-13). - Ele tem um ministério que impacta seus ouvintes e os transforma na imagem de Cristo (cap. 2:14, 3:18). - Ele é exercitado em manter seus próprios interesses fora do ministério, de modo que Cristo seja tudo (cap. 4:1-18). - Ele é motivado em seu serviço pela cena vindoura de glória, o tribunal de Cristo e o amor de Cristo (cap. 5:1-21). - Ele foi testado no campo do serviço de todas as formas e foi aprovado por Deus (cap. 6:1-10).
O Apelo de Paulo aos Coríntios
(cap. 6:11-7:5)
Baseado em suas credenciais como um verdadeiro ministro de Jesus Cristo nos capítulos anteriores, Paulo agora apela aos coríntios para que o “recebam”. Os fundamentos de seu apelo são: sua afeição profunda e verdadeira por eles (cap. 6:11-13) e o caráter irrepreensível de sua vida (cap. 7:2-4).
1) Sua Afeição Genuína por Eles
Capítulo 6:11-13 – Paulo diz, “Ó coríntios, a nossa boca está aberta para vós, o nosso coração está dilatado. Não estais estreitados em nós; mas estais estreitados nos vossos próprios afetos. Ora, em recompensa disto (falo como a filhos), dilatai-vos também vós”. Sua boca sendo aberta para os coríntios se refere ao fato de que ele havia lhes revelado francamente as fontes secretas de suas ações no serviço ao Senhor. Ele não reteve nada ao expor seus desejos e seus motivos diante deles. Seu coração estava verdadeiramente “dilatado” aos coríntios; ele verdadeiramente os amava, e isso o levou a abrir a sua boca em sinceridade para com eles (Mt 12:34). Ele sinceramente lhes roga que respondam de maneira recíproca e que deixem seus sentimentos virem sobre ele. Ele disse: “dilatai-vos também vós”. Qualquer restrição de afeto entre os coríntios e Paulo não era da parte dele; ele não estava retendo seu afeto por eles. O obstáculo era obviamente da parte deles.
Capítulo 6:14-16 – Uma vez que havia um óbvio obstáculo no fluir das afeições deles, Paulo aproveita para resolver isso. Ele relaciona as afeições limitadas deles aos jugos desiguais que haviam formado com o mundo. Eles tinham sido descuidados em suas associações e isso teve o efeito de diminuir suas afeições para com o Senhor e Seu povo. Aqui reside o perigo do jugo desigual.
Um jugo desigual é qualquer coisa que ligue o crente a um incrédulo em um propósito comum – seja social, comercial, religioso, marital ou político. Tais falsos elos minam a comunhão Cristã e têm uma maneira de diminuir nossas afeições para com o Senhor e nossos irmãos. Nós não somos “do mundo” porque somos homens celestiais por meio do chamado do evangelho. No entanto, temos que viver “no mundo” (Jo 17:11-15), mesmo assim, não precisamos nos prender a um jugo desigual com o mundo. Temos de fazer nossos negócios no mundo e, assim, entramos em contato com ele, mas não precisamos nos envolver pessoalmente com ele. Influências negativas do mundo não resultam do contato, mas da cumplicidade com ele. Era a cumplicidade o problema dos coríntios. Portanto, o remédio de Paulo para suas limitações afetivas era: “Não vos prendais a um jugo desigual com os infiéis”.
Nestes versículos (14-16), Paulo faz cinco perguntas retóricas destinadas a mostrar quão desnaturais, incompatíveis e inseguras são as alianças com o mundo. Cada uma toca em um diferente terreno de incompatibilidade em relação aos crentes e incrédulos.
- “Justiça com injustiça” – a esfera do comportamento moral. - “Luz com trevas” – a esfera do conhecimento espiritual. - “Cristo e Belial” – a esfera da autoridade espiritual. - “Fiel com o infiel” – a esfera da fé. - “O templo de Deus com ídolos” – a esfera da adoração.
As cinco palavras que Paulo usa – “sociedade”, “comunhão”, “concórdia”, “parte” e “consenso” – devem ser cuidadosamente observadas. Tais palavras implicam cumplicidade com o mundo. Alguns gostariam de ignorar a exortação de Paulo relegando-a ao vínculo matrimonial, tornando-a nada mais que isso, mas suas observações a respeito do jugo desigual vão muito além dos casamentos com incrédulos. Um jugo desigual pode ser um elo social com os incrédulos em jogos, clubes, associações, fraternidades, etc. (Tg 4:4; 1 Jo 2:15). Ou, poderia ser uma parceria comercial com incrédulos (Dt 22:10; 2 Cr 20:35-37; Pv 6:1-5). Ou, poderia ser uma ligação eclesiástica com uma seita no Cristianismo, onde os incrédulos são autorizados a participar nos serviços de comunhão (1 Co 11:19). Ou poderia ser um laço matrimonial (Dt 7:3-4; Js 23:12-13; 1 Co 7:39). Um Cristão não deve se casar com um incrédulo, mas se um crente está casado com um, esta passagem não justifica o divórcio (1 Co 7:12-16). Ou, o jugo desigual poderia ser um elo político com os incrédulos, unindo-se aos seus empenhos políticos (2 Cr 18:1-34, 25:5-10; Is 45:9). O ponto aqui é que existem duas grandes esferas opostas de ação moral e espiritual que não podem seguir juntas na vida de um Cristão sem sérias ramificações práticas.
Capítulo 6:17-18 – Para encorajar os coríntios a se separarem dos vínculos ímpios com o mundo, Paulo cita o Próprio Senhor, dizendo: “Pelo que saí do meio deles, e apartai-vos, diz o Senhor; e não toqueis nada imundo, e Eu vos receberei”. Esta afirmação no grego original está no tempo aoristo1, significando que deveria ser uma coisa de uma vez por todas na vida de um crente.
Portanto, os coríntios precisavam não apenas mudar sua atitude em relação a Paulo (vs. 11-13), mas também em relação ao mundo (vs. 14-16). Eles precisavam abrir seus corações para Paulo e fechar seus corações para o mundo. Todos nós precisamos tratar o mundo como ele realmente é – um inimigo de nossas almas. A alma do Cristão é sempre atraída de volta ao mundo, assim como Israel foi constantemente tentado a voltar-se para a idolatria. Existem algumas razões muito importantes pelas quais a separação é necessária na vida de um Cristão. Sem ela:
- Nossa santidade pessoal será comprometida pelas impurezas do mundo (2 Co 6:17). - Nossa comunhão com o Senhor será seriamente ameaçada, se não totalmente perdida (Jo 14:21-23). - Nossos corações serão afastados do Senhor (Dt 7:2-4). - Nossos padrões morais se corromperão (1 Co 15:33). - Nosso crescimento espiritual será impedido (Os 7:8). - Nossa energia espiritual e discernimento ficarão enfraquecidos (Os 7:9). - Nosso testemunho pessoal terá pouco poder perante os outros (Gn 19:14).
Separação das pessoas e coisas mundanas não significa que o crente acabe andando sozinho. O Senhor faz uma promessa tripla de nos compensar com Sua companhia pessoal; é-nos dado um senso especial de Sua presença.
Ele diz:
- “Eu vos receberei”. - “Eu serei para vós Pai”. - “E vós sereis para Mim filhos e filhas”.
Esta é uma recompensa maravilhosa prometida àqueles que andam em separação – o Senhor promete ser o nosso Amigo mais próximo e mais querido! Isso nos lembra de Abrão quando ele recusou as ofertas do rei de Sodoma como recompensa por sua ajuda no massacre dos exércitos confederados sob Quedorlaomer. O Senhor imediatamente apareceu a ele e disse: “Eu sou o teu escudo, e o teu grandíssimo galardão” (Gn 15:1). Poderia haver uma Pessoa maior em todo o universo com quem podemos andar? Por outro lado, se um crente escolhe continuar com alianças e amizades mundanas, ele não pode esperar ter esse senso especial da comunhão do Senhor em sua vida. Isso não significa que o Senhor o abandona (Mt 28:20; Hb 13:5), mas que não recebe esse senso especial de Sua presença (Lc 24:15-16). Esse privilégio é condicionado à obediência (Jo 14:21-23). Haverá também outros Cristãos com quem podemos andar no caminho, mas isso não é mencionado aqui (2 Tm 2:22).
Capítulo 7:1 – Esse versículo pertence à exortação do capítulo 6. Com o encorajamento das promessas do Senhor nas mãos, Paulo diz: “Ora, amados, pois que temos tais promessas, purifiquemo-nos de toda a imundícia da carne e do espírito, aperfeiçoando a santificação no temor de Deus”. Essa exortação vai além de não estar em jugo desigual com incrédulos. Uma pessoa poderia fazer isso e ainda viver na impiedade. Separar-se das conexões externas impuras com o mundo deveria estar associado à limpeza de toda a imundícia da carne e do espírito dentro de nós. Isso mostra que é possível separar-se das coisas exteriormente, mas continuar com todos os tipos de impureza interiormente em nossas vidas pessoais. Portanto, a exortação não estaria completa sem que esse lado das coisas fosse abordado.
Nota: Paulo diz: “Purifiquemo-nos…” A purificação que ocorre quando somos salvos por crer no evangelho é feita para nós pelo Senhor (1 Co 6:11; 1 Jo 1:7; Ap 1:5), mas esta limpeza é algo que somos responsáveis por fazer.
2) O Caráter Irrepreensível de sua Vida
Capítulo 7:2-5 – A segunda razão pela qual ele roga aos coríntios para “recebê-lo” é que ele foi aprovado em todas as avaliações como um verdadeiro ministro de Jesus Cristo. Há sempre o perigo de haver alguma reserva em relação a uma pessoa que nos corrige. Paulo sabia que esse poderia ser o caso com os coríntios e pede que eles o recebam. Ao mesmo tempo, ele confirma seu amor por eles, dizendo-lhes que estavam em seu coração, e que nem a morte nem a vida os separariam de seu amor por eles (v. 3-4).
Também nos mostra que podemos errar com alguém, e embora estejamos arrependidos, podemos deixar uma marca em nós mesmos, por meio do qual as pessoas ainda manterão alguma reserva em relação a nós. Mas esse não foi o caso com Paulo; ele e aqueles que ministravam com ele não haviam “agravado”, “corrompido” a ninguém, nem “buscado proveito” de algum homem.
Os Terrenos nos Quais Paulo Poderia Agora ir a Eles
(cap. 7:6-16)
Capítulo 7:6-16 – Com as coisas sendo esclarecidas em ambos os lados, agora não havia razão para qualquer distanciamento entre Paulo e os coríntios. Eles não tinham razão para não o receber, e ele agora não tinha razão para não ir até eles.
No versículo 5, Paulo retoma o fio histórico das coisas que havia discorrido no capítulo 2:14. Ele elogia os coríntios por seu espírito correto ao receber a carta que enviara.
Vs. 6-7 – Paulo fala de sua ansiedade sendo aliviada pelo relato favorável de Tito, mas ele dá crédito a Deus. “Mas Deus, que consola [encoraja] os abatidos, nos consolou [encorajou] com a vinda de Tito” Tito relatou a verdadeira “saudade” e “choro” dos coríntios. Isso mostra que eles tinham sido verdadeiramente exercitados sobre os erros na assembleia e, arrependidos, lamentaram sobre eles, tendo-os corrigido. Isso foi bom. Outra fonte de gozo para Paulo era que, exceto por um grupo de difamadores, eles tinham um “zelo” para com ele. Isto mostrou que eles encararam a correção em um espírito correto, e desejavam se reconciliar com o apóstolo.
Vs. 8-10 – Vemos quão terno era o coração de Paulo pelos coríntios; ele quase pede desculpas por ter escrito a carta. Mas, em retrospecto, ele diz que, apesar de tê-los “contristado” “com a carta”, ele não “se arrependeu” porque ela tinha produzido agora esses resultados positivos. Mas admite que depois de ter escrito a carta ele teve dúvidas, e na verdade, por um tempo, havia “se arrependido”. Vemos seu cuidado por eles nessa hesitação. Ele reconhece que a dor que causou ao escrever aquela carta severa foi “ainda que por pouco tempo”. Assim, a primeira epístola trouxe duas coisas aos coríntios:
- Arrependimento quanto aos males que Paulo havia denunciado. - Um reavivamento da afeição deles (em parte) pelo apóstolo.
Ao acertar as coisas, os coríntios haviam se livrado de “padecerem dano” pelo julgamento apostólico de Paulo, que teria caído sobre eles (v. 9). Como uma assembleia, eles “foram contristados para o arrependimento” (v. 10). Essa foi uma tristeza coletiva e um arrependimento coletivo. Isso mostra que tristeza e arrependimento são duas coisas diferentes. A tristeza segundo Deus é a tristeza pelo pecado permitido ou cometido. O arrependimento é ter uma mudança de mentalidade sobre um curso de pecado que tivermos percorrido e executar julgamento sobre ele.
Paulo diz que esse arrependimento que levou os coríntios a corrigirem as desordens na assembleia foi “para a salvação”. Isto é, ocasionou um livramento prático ou salvação do julgamento de Deus sobre a assembleia. Ao acertar as coisas, eles salvaram a assembleia do julgamento. Paulo acrescenta: “da qual ninguém se arrepende”, porque sua mudança de mentalidade para o que é certo não deveria ser rejeitada. Uma vez que voltamos para o que é certo, nunca devemos pensar em nos arrepender disso (mudar de ideia) e voltar atrás.
A Escritura diz: “há alegria diante dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende [que anda se arrependendo – JND]” (Lc 15:10). Embora o contexto deste versículo no evangelho de Lucas tenha a ver com o arrependimento em uma pessoa sendo salva, isso mostra que o arrependimento não é algo que ocorre uma só vez, mas é um exercício contínuo na vida do crente. A confissão é um ato, mas arrependimento é um processo. Isso não significa que devemos sair por aí nos açoitando em tristeza pelo resto de nossas vidas, porque o arrependimento e a tristeza são duas coisas diferentes. O que deve ser contínuo em nossas vidas é uma mente mudada em relação a todo pecado que uma vez cometemos. É arrependimento, não tristeza, que deve ser contínuo em nossas vidas. No caso dos coríntios, se eles deixassem de se arrepender em relação a esse assunto, significaria que eles se tornariam novamente indiferentes ao pecado em seu meio.
Enquanto a tristeza divina opera o arrependimento para a salvação, a tristeza mundana, que não é de Deus, apenas “opera a morte”. Isto é, trabalha para a ruína moral de um indivíduo. O primeiro sente tristeza por culpa e isso leva ao julgamento próprio; o último não é verdadeira tristeza pelo pecado, mas tristeza por ter de sofrer os efeitos dos atos pecaminosos (Mt 14:9). Um é arrependimento; o outro é remorso. A diferença entre eles é ilustrada em Pedro e Judas. Pedro saiu e “chorou amargamente” em verdadeiro arrependimento (Mt 26:75), mas Judas estava “cheio de remorso” (Mt 27:3 – JND). Um levou à restauração a Deus, o outro ao suicídio e à uma eternidade perdida.
Sete Coisas que Provaram que seu Arrependimento Coletivo foi de Acordo com Deus
V. 11 – Os frutos do arrependimento com os coríntios foram todos bons. Isso é visto em sete coisas que Paulo menciona. Ele diz:
- “Quanto cuidado” – eles manifestaram um cuidado para com a glória do Senhor ao tirar a pessoa iníqua do meio deles. - “Que limpeza de si mesmos” (KJV) – seu ato limpou a assembleia da cumplicidade com o pecado. - “Que indignação” – seu verdadeiro ódio pelo pecado. - “Que temor” – o temor da santidade de Deus. - “Que desejo veemente” (KJV) – seu desejo de justificar a Deus. - “Que zelo” – sua ânsia de agir pelo Senhor no assunto. - “Que vingança” – sua prontidão para ver a justiça feita.
Vs. 12-13 – Os coríntios tinham provado seu “zelo” por Deus ao agir para corrigir questões na assembleia ao excomungar o ofensor (v. 11), mas essa não foi a única razão pela qual Paulo havia escrito para eles. Ele diz que a situação também foi uma oportunidade para eles mostrarem seu “cuidado por nós” – ele e aqueles que com ele trabalharam (v. 12). Ele diz a eles que não escreveu meramente para garantir a disciplina do ofensor ou justificar o ofendido, mas que eles aproveitassem essa oportunidade de ouro para mostrar que realmente se importavam com o amor e a comunhão de Paulo e se reconciliassem com ele. Assim, a ruptura na comunhão prática entre os membros do corpo de Cristo seria sanada. Quando Tito veio e relatou que a primeira carta havia sido recebida e aplicada, Paulo percebeu que ambos os objetivos haviam sido garantidos – o zelo deles por Deus e o zelo deles por ele. Por isso, ele diz: “fomos consolados [encorajados]”. Mais que isso, quando Paulo e os que estavam com ele viram a alegria de Tito, eles “muito mais se alegraram”.
Vs. 14-16 – Ao encerrar o assunto, Paulo usa a toalha de conforto aos coríntios depois de lavar-lhes os pés em toda a questão (Jo13:5). Ele agora lhes diz que, em retrospecto, “não fiquei envergonhado” por ter dito a Tito antecipadamente sobre sua confiança nos coríntios – ao ponto de haver se vangloriado a Tito de que eles receberiam a repreensão em sua primeira carta. Agora ele diz: “nossa glória para com Tito se achou verdadeira”. Paulo havia dito a Tito que eles a receberiam e agiriam de acordo com ela, e assim, com a força disso, encorajou Tito a aceitar a delicada missão de ir a Corinto. Tito também foi profundamente afetado pela “obediência” deles.
O final feliz para toda a questão é encontrado nas palavras de Paulo: “Regozijo-me de em tudo poder confiar em vós”. A genuinidade de sua afeição por Paulo fez com que eles chegassem a essa conclusão feliz de arrependimento, provada por eles ao colocar em ordem as coisas que eram necessárias na assembleia. A ruptura entre os coríntios e Paulo foi sanada, no que lhe dizia respeito.
O MINISTÉRIO CRISTÃO DE DAR
(Capítulos 8-9)
Mantendo-se no tema do ministério Cristão nesta epístola, Paulo passa a falar de um tipo diferente de serviço – o ministério de dar. Ter comunhão de maneira prática com aqueles que estão em necessidade ou com aqueles engajados em pregar a Palavra é de fato um ministério. O contexto que Paulo usa para ensinar isso é o envio de uma oferta monetária aos “pobres dentre os santos” que estavam “em Jerusalém” (Rm 15:26). Hebreus 13:16 fala desse ministério como “compartilhar de vossa prosperidade” (JND). É um ministério no qual todos os santos podem estar envolvidos – como indivíduos e como assembleias.
Existe lógica na ordem dos assuntos que o apóstolo aborda nesta segunda carta. Visto que os coríntios haviam acertado as coisas que eram necessárias na assembleia, Paulo agora estava livre para encorajá-los nesse ministério prático de dar. É improvável que ele tivesse feito isso se eles não tivessem respondido à sua correção na primeira carta. Mas agora, com esses assuntos esclarecidos, ele está livre para falar-lhes sobre essa maneira muito prática de demonstrar comunhão com outros membros no corpo de Cristo. Eles mostraram um genuíno cuidado pela glória do Senhor (cap. 7:11) e um cuidado com a comunhão do apóstolo (cap. 7:12), agora ele os estimula a cuidar do povo necessitado do Senhor. (caps. 8-9)
Esse assunto de ofertar exigiu alguma diplomacia da parte de Paulo porque poderia ter sido interpretado que ele estava procurando o dinheiro dos coríntios, mesmo que lhes dissesse que não estava. Assim Paulo sabiamente esperou até que houvesse uma necessidade entre os santos que não envolvesse o apoio a obreiros como ele próprio. Desta forma, ele poderia se distanciar de quaisquer implicações diretas ao falar sobre este assunto. Ninguém poderia acusá-lo de estar tirando proveito da riqueza deles porque não era para si próprio. Ele não tiraria dinheiro dos coríntios para si mesmo, mas o tiraria deles se fosse para os outros.
Contudo, os princípios que Paulo dá nesses dois capítulos têm uma ampla aplicação, e podem ser adotados no dar daquilo que possuímos àqueles que trabalham para o Senhor ministrando a Palavra, bem como a qualquer um do povo do Senhor que tenha necessidade.
A situação aqui era que muitas assembleias estavam arrecadando uma coleta que alguns irmãos designados levariam a Jerusalém. O desejo de Paulo era que os coríntios fizessem sua parte da coleta antes de ele chegar à cidade a caminho da Judéia. Ao fazê-lo, Paulo apresenta alguns princípios orientadores em relação à oferta Cristã.
Se o dízimo do Velho Testamento fosse para a Igreja, Paulo o teria indicado nesses capítulos. No entanto, não há nada disso aqui ou em qualquer outro lugar no Novo Testamento. Paulo não diz aos santos para darem um décimo de sua renda, mas deseja que a graça aja em seus corações, e permita que sejam exercitados para darem tudo o que eles sentiram diante do Senhor.
Os Exemplos de Dar
Capítulo 8:1-9 – Uma das melhores maneiras de despertar qualidades divinas de amor e cuidado nos santos de Deus é tê-los vendo tanto o amor quanto o cuidado em ação. A ação da graça nos outros pode atuar como um estímulo. Portanto, Paulo começa apresentando diante dos coríntios dois exemplos notáveis de doação – vindos de dois extremos.
- Os Macedônios – os mais pobres dos doadores (vs. 1-8). - O próprio Senhor – o mais rico dos doadores (v. 9).
Os Macedônios
Vs. 1-2 – Houve uma notável demonstração de graça nas “igrejas da Macedônia”, tais como: Filipos, Tessalônica, Beréia, etc. Elas demonstraram um extraordinário grau de generosidade Cristã. Paulo apontou para eles como um modelo do espírito benevolente que precisamos ter em dar. Essas pessoas estavam em “profunda pobreza”, mas isso não as impedia de dar. Eles tinham uma “abundância do seu gozo” nas coisas espirituais que possuíam e isso fez com que eles estimassem em pouco as coisas temporárias. Assim, eles estavam dispostos a compartilhar suas coisas materiais no cuidado de outros. Eles foram um exemplo brilhante para os coríntios – e para nós também.
Vs. 3-5 – Essas pessoas estavam tão “dispostas” (JND) que davam “acima do seu poder”. Isto é, elas davam além do que normalmente se faz ao se repartir coisas. Eles na verdade rogavam ao apóstolo para que “aceitasse a graça [oferta]” que haviam reunido para que pudessem ter o privilégio de ter “comunicação deste serviço, que se fazia para com os santos” em Jerusalém. O fato de que eles pedirem “com muitos rogos” ao apóstolo que levasse sua oferta mostra que ele deve ter hesitado em aceitá-la, sabendo quão pobres eles eram.
Eles realmente foram muito além do que o apóstolo tinha “esperado”. Paulo revela a chave: “a si mesmos se deram primeiramente ao Senhor”. Esse é a maior oferta que podemos dar – nós próprios. A devoção de coração ao Senhor era tal que eles haviam dado tudo o que tinham ao Senhor – a si mesmos e suas posses. Sabendo que todas essas coisas pertenciam ao Senhor, eles ficaram felizes em ver seus bens usados em Seu serviço. Isso os levou a dar livremente suas posses materiais. Isso mostra que, quando há comprometimento com Cristo, haverá uma disposição de nossas coisas materiais no serviço de Cristo.
Vs. 6-8 – Paulo então encorajou os coríntios a imitar o exemplo dos macedônios. Ele menciona que havia exortado a Tito para “completar” (JND) o trabalho que ele havia começado em Corinto quando foi até eles com a primeira carta de Paulo. Quando Tito esteve lá pela primeira vez, ele disse aos coríntios que eles deveriam pensar em contribuir para a coleta. Agora, quando Tito retornou com esta segunda carta de Paulo, Paulo confiou que ele seria capaz de “completar” “esta graça também” (JND). Visto que os coríntios se destacavam de muitas maneiras, Paulo queria que também se superassem nessa questão de dar, que então abundariam em todos os aspectos da experiência Cristã. Paulo não estava ordenando isso, mas lembrando-lhes de que era uma oportunidade para “provar a sinceridade” de seu “amor” (JND).
O Próprio Senhor
V. 9 – Houve uma demonstração ainda maior da graça em nosso Senhor Jesus Cristo. Paulo agora se volta para falar d’Ele como o supremo exemplo de doação. Nada poderia ser maior que essa demonstração de graça. “Porque já sabeis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, por amor de vós Se fez pobre; para que pela Sua pobreza enriquecêsseis”. Graça significa conceder favor imerecido a alguém. No nosso caso, o Senhor abriu mão de tudo o que possuía no que diz respeito aos Seus direitos pessoais de exercer as prerrogativas da Sua divindade. Ele Se tornou um homem para ir para a cruz para que pudéssemos ser salvos e sermos feitos “ricos”. Ele vendeu tudo o que tinha para fazer isso (Mt 13:44). Ele Se deu a Si mesmo (Mt 20:28; Gl 2:20; Ef 5:25; 1 Tm. 2:6; Tt 2:14).
Deve-se notar que em ambos os exemplos houve verdadeiro gozo na doação. Os macedônios fizeram isso com “gozo” (v. 2), e o Senhor também fez isso com “gozo” (Mt 13:44). Isso mostra que há um gozo especial em dar que é conhecido apenas por aqueles que o fazem (At 20:35).
Note também que, ao falar de coleta, Paulo nunca usa diretamente a palavra “dinheiro”. Em vez disso, ele usa palavras como: “generosidade” (v. 2), “graça” (v. 4), “comunhão deste serviço” (v. 4 – JND), “bênção” (cap. 9:5), “semente” (cap. 9:10), etc.
Os Princípios em Dar
Capítulo 8:10-15 – Paulo passa a dar alguns princípios orientadores sobre o assunto de dar. Uma vez que é uma questão entre o Senhor e o indivíduo, ele não aborda o assunto como um mandamento, mas sim, diz: “E nisto dou o meu parecer [opinião]”.
Há três coisas em que ele se concentra em particular:
Vs. 10-12a – O primeiro princípio no ministério de dar é a necessidade de disposição. Paulo diz: “Porque, se há prontidão de vontade”. Nossa generosidade não é testada por nossa riqueza, mas por nossa disposição. Isso vem de Deus tocando o coração (Êx 35:5, 29). Ele dá crédito aos coríntios por estarem dispostos “desde o ano passado”, mas diz a eles que também precisa haver o “praticar”. “Prontidão de vontade” é uma coisa, mas tais intenções devem ser sustentadas por ações positivas.
V. 12b – O segundo princípio da oferta Cristã é que ela deve estar de acordo com o que temos. “Será aceita segundo o que qualquer tem, e não segundo o que não tem”. Paulo não estava propondo que os coríntios contribuíssem para o auxílio dos pobres santos em Jerusalém ao ponto que eles próprios se empobrecessem de tal forma a ponto de se tornarem um fardo para os outros. O argumento de Paulo é que não devemos nos arruinar financeiramente por nossas doações. Não devemos dar além das nossas condições, mas “segundo” nossas condições. É verdade que o Senhor Se tornou pobre para nos salvar (v. 9), mas não devemos O imitar nisso. Nem devemos dar além do que podemos, apenas para parecer bem diante dos outros; tais razões carnais e dissimuladas não devem entrar em nossas ofertas. O princípio é simples: à medida que Deus aumenta nossa capacidade de dar, devemos aumentar nossa generosidade.
Vs. 13-15 – A terceira coisa é que deve haver igualdade. Ou seja, eles devem dar com o entendimento de que é uma coisa recíproca. Ele diz: “Mas, não digo isto para que os outros tenham alívio, e vós opressão”, mas para lembrar de que eles nem sempre estão em condições de dar. Chegará o momento em que “as mesas poderão estar vazias” e aqueles na Judéia poderão ter o privilégio de aliviar as necessidades dos coríntios. Paulo diz: “para que também a sua [deles] abundância supra a vossa falta” – assim, o princípio da doação recíproca seria visto. Se naquele momento os coríntios tinham uma “abundância” nas coisas seculares (temporais), eles deveriam “suprir” a “falta” (necessidade) de outros que não tinham o suficiente.
Para ilustrar isso, o apóstolo cita a experiência dos filhos de Israel quando colheram o maná no deserto. Lendo o relato em Êxodo, poderíamos ter pensado que colher o maná era simplesmente uma coisa individual, cada um colhendo de acordo com a medida de seu próprio apetite. Mas Paulo mostra que houve realmente um compartilhamento mútuo do maná que eles colheram. As pessoas colheram quantidades diferentes, mas o que foi recolhido foi dividido igualmente, de modo que “O que muito colheu não teve de mais; e o que pouco, não teve de menos”. Aqueles que colheram muito não reclamaram daqueles que colheram pouco, mas de bom grado compartilharam o que recolheram coletivamente. Portanto, deveria ser assim no Cristianismo nas coisas seculares (temporais); devemos trabalhar com nossas mãos, não apenas para atender às nossas necessidades pessoais, mas também às necessidades dos outros (Ef 4:28).
A Administração das Ofertas
Capítulo 8:16-24 – Paulo se volta para falar da entrega da oferta aos santos pobres da Judéia. Se as ofertas das assembleias tivessem de chegar a eles, precisariam ter mensageiros para levá-las. Paulo fala disto a seguir. Seu ponto aqui é que a administração da oferta deveria ser feita de uma maneira que estivesse acima de qualquer suspeita de desonestidade. Isso nos ensina que os fundos da assembleia precisam ser tratados com cuidado escrupuloso.
Os envolvidos com o manuseio dos fundos da assembleia devem ter cuidado sincero com os santos e boa referência de honestas relações com todos. “Tito” foi um exemplo desse tipo de integridade, e ele “aceitou a exortação [solicitude]” de Paulo para ir nesta missão (vs. 16-17). Visto que todas as coisas relacionadas com as funções da assembleia deveriam ser feitas por boca de duas ou três testemunhas (2 Co 13:1), é necessário que haja outras pessoas envolvidas no cuidar das ofertas. Por isso, Paulo diz que eles enviaram com Tito “aquele irmão cujo louvor no evangelho” foi aprovado por “todas as igrejas” (vs. 18-19). Seu nome não é revelado propositalmente, mas ele era bem conhecido entre os irmãos. Ele foi realmente “escolhido pelas igrejas” para este trabalho; Paulo aceita de bom grado essa escolha.
Todo o propósito de selecionar cuidadosamente tais pessoas era evitar qualquer censura por lidarem deslealmente com os fundos e, assim, “zelar o que é honesto, não só diante do Senhor, mas também diante dos homens” (vs. 20-21). Certamente, se a Igreja primitiva precisava ser cuidadosa na administração dos fundos da assembleia, precisamos ser muito mais cuidadosos em nossos dias.
Um terceiro “irmão” foi enviado com eles que “experimentaram” ser “diligente em muitas coisas” e em quem os santos tinham “muita confiança” (v. 22). Esses três “embaixadores das assembleias” deveriam ser recebidos pelos coríntios e os coríntios deveriam mostrar “a prova” de seu “amor” pelos pobres santos em Jerusalém, dando aos mensageiros sua contribuição para a coleta (v. 24).
Capítulo 9:1-5 – Paulo retorna ao assunto da prontidão de dar dos coríntios e os elogia por isso. As assembleias macedônias haviam superado os coríntios – não em desejo, mas em desempenho. Paulo, portanto, apela aos coríntios para justificar o seu elogio ao desejo deles “desde o ano passado” e para que contribuíssem para a oferta coletiva das assembleias. O desejo de doar dessa maneira tinha estimulado a “muitos” (as assembleias em geral) e os estimulou “à caridade e às boas obras” (Hb 10:24).
Paulo estava agora enviando os mensageiros a Corinto porque estava ansioso para testar e justificar a firmação que vinha fazendo para com os “Macedônios”. Seria uma calamidade embaraçosa vir e encontrar os coríntios não “preparados” (TB) e, assim, “não sermos nós envergonhados (para não dizermos vós) nesta confiança” (AIBB). Assim, para evitar isso, Paulo julgou necessário rogar a esses três irmãos que fossem antes e coletassem a prometida “bênção”. Eles iriam primeiro aos coríntios e depois levariam a oferta ao apóstolo, que iria com eles para Jerusalém.
Os Frutos de Dar
Capítulo 9:6-15 – Paulo conclui suas observações sobre a oferta Cristã falando das coisas positivas que esse ministério produz. Ele os chama de “os frutos da vossa justiça” (v. 10). Isso foi mencionado para encorajar os coríntios (e nós) a dar generosamente.
Vs. 6-8 – A primeira coisa é que o próprio doador é aumentado em qualquer forma que Deus possa escolher recompensá-lo. Paulo traz o princípio do governo de Deus e mostra que ele funciona tanto em uma linha positiva, quanto em uma linha negativa. Ele se refere às leis naturais da agricultura para ilustrar isso. “O que semeia pouco, pouco também ceifará; e o que semeia em abundância, em abundância também ceifará [bênçãos]”. Seu argumento é simples: se semearmos com mão moderada em nossas ofertas, nossa colheita será escassa; inversamente, se semearmos com mão generosa, nossa bênção será abundante. É preciso fé para ver e agir assim.
Também deve ser notado que Paulo não diz exatamente que o doador colherá em riqueza secular, mas em “bênção”. Isto poderia ser tanto em sentido espiritual quanto temporal. Muitos Cristãos tropeçaram pela falsa ideia de que se eles doassem à causa de alguma organização de uma igreja, eles acumulariam riqueza material para si mesmos. Mas isso é cobiça. As pessoas têm sido encorajadas pelos pregadores a fazerem isso e, quando não juntam a consequente riqueza prometida, muitas vezes ficam desiludidas. Na dispensação judaica, podia ser assim (Pv 3:9-10), porque a porção deles era herdar a terra (Sl 37:22, 29), mas importar esse princípio para o Cristianismo é um erro. Paulo não estava encorajando os santos a serem cobiçosos.
Ele acrescenta que a única coisa que Deus requer de nós é um espírito correto em dar. No versículo 7 ele fala de três tipos de doadores cujos espíritos são muito diferentes. Existem aqueles que fazem isso:
- “Relutantemente” (KJV) – sendo forçados. - “Por necessidade” – sendo obrigados a fazê-lo. - “Com alegria” – de coração disposto.
Paulo lembra-lhes do poder soberano de Deus para recompensar aqueles que dá. Ele diz: “E Deus é poderoso para fazer abundar em vós toda a graça, a fim de que tendo sempre, em tudo, toda a suficiência, abundeis em toda a boa obra”. Nosso Deus é um Deus da providência, e Ele pode fazer as coisas acontecerem em nossas vidas para nos compensar as coisas temporais que temos dado aos outros. Mais uma vez, Paulo toma cuidado para não ir além disso dizendo que ficaremos ricos.
Vs. 9-10 – Outro fruto da doação Cristã é que o doador colhe a recompensa duradoura da “justiça”. Se os versículos 6-8 têm a ver com a presente recompensa de bênção (espiritual ou material) nesta vida, este fruto tem a ver com uma recompensa futura no reino de Cristo. Paulo cita o Salmo 112:9; “Distribui liberalmente, dá aos necessitados; A sua justiça subsiste para sempre; O seu poder será exaltado em honra” (TB). “Para sempre”, no Velho Testamento, significa enquanto o tempo durar; não inclui a eternidade. Por isso, o Senhor recompensará tais atos de bondade (“com justiça” – Ap 19:8), e eles serão levados para o reino Milenar. Deus é capaz de “multiplicar” nossa “sementeira” e, assim, “aumentar os frutos” de nossa “justiça”.
Vs. 11-12 – Outro grande resultado da doação liberal entre os santos é que ela faz “que por nós se deem graças a Deus”. Assim, não apenas os santos são ajudados pela oferta prática, mas Deus é glorificado. A oferta pode ser dada uma vez, mas os que a recebem agradecerão a Deus “muitas” vezes por isso. Assim, por meio da nossa doação, nós realmente ajudamos a aumentar a quantidade de louvor a Deus!
Vs. 13-15 – Outro resultado da doação Cristã é que os santos são aproximados em afeição. Assim, há uma ligação prática dos membros do corpo de Cristo em amor. Mesmo que os pobres não possam retribuir aqueles que lhes dão, tais atos de graça atraem as afeições dos que recebem pelos que doam, e retornam a bondade orando por eles. Paulo diz que a “liberalidade dos dons” dos coríntios em relação aos pobres na Judéia resultaria em “sua oração por vós”. Assim, haveria uma ligação mútua entre os santos nos laços do amor.
A sabedoria de Deus é vista aqui ao permitir que os Cristãos judeus entrem em dificuldades. Isso criou uma oportunidade para demonstrar a verdade do um só corpo, porque tanto os judeus como os gentios haviam sido reunidos em um corpo pelo Espírito Santo. Se a tendência natural do preconceito judaico ainda estivesse à espreita nas suas mentes em relação aos gentios, essa situação dava a oportunidade para que esses pensamentos fossem julgados. Esta oferta deve ter tocado os corações dos santos judeus na Judéia e fez com que os gentios se tornassem amados por eles. Isso deve ter produzido uma ligação prática entre os dois. Essa evidência de unidade prática no corpo de Cristo resultaria em um poderoso testemunho perante o mundo. “Nisto todos conhecerão que sois Meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (Jo 13:35). Também deu aos crentes judeus evidência em primeira mão de que os gentios realmente haviam recebido o evangelho e foram verdadeiramente convertidos a Deus.
V. 15 – Paulo encerra seu assunto sobre doações Cristãs com uma pequena doxologia de louvor: “Graças a Deus pois pelo Seu dom inefável”. Ele menciona isto para mostrar que talvez a maior coisa que resulta da oferta Cristã é que há uma apreciação mais profunda entre os santos por Cristo Mesmo – o “dom inefável” de Deus. Quando percebemos que essas expressões de amor mútuo e cuidado uns pelos outros eram por causa d’Ele, Ele Se torna mais precioso para nós – e isto resulta em mais ações de graças a Deus. Que resultado maravilhoso é esse!
Paulo começou sua exposição sobre a doação Cristã com o exemplo do dom do próprio Senhor (cap. 8:9), e agora ele conclui com o exemplo do dom de Deus, Seu Filho. Ele é o maior presente de todos; nenhum presente poderia ser maior.
Em resumo, os grandes resultados da doação Cristã são:
- Aquele que doa é recompensado nesta vida (vs. 6-8). - Aquele que doa é recompensado no futuro (vs. 9-10). - Deus recebe louvor e glória (v. 11). - Os que recebem são ajudados em suas necessidades temporais (v. 12). - Orações são feitas pelos que doam (vs. 13-14). - Os membros do um só corpo são unidos em amor mútuo (vs. 13-14). - Resulta uma apreciação mais profunda do dom inefável de Deus – Cristo (v. 15).
A DEFESA DA AUTORIDADE APOSTÓLICA DE PAULO
(Capítulos 10-13)
Os últimos quatro capítulos da epístola são uma defesa do apostolado de Paulo. Defender seu apostolado era a parte mais difícil e dolorosa de suas comunicações com os coríntios, porque ele teria que falar de si mesmo mais diretamente do que havia feito na primeira seção da epístola – e isso era algo que ele não queria fazer. Exigia também expor diretamente seus difamadores que estavam desafiando seu apostolado – o que era outra coisa que ele não desejava fazer.
É muito interessante ver as credenciais que Paulo dá nesses capítulos para provar que era verdadeiramente um apóstolo de Cristo. Ele não apresentou um diploma para mostrar que ele se formou em alguma faculdade reconhecida. Também não apresenta uma carta oficial assinada pelos apóstolos em Jerusalém afirmando que eles o tinham ordenado. Em vez disso, ele apresenta os sinais de um verdadeiro apóstolo e seu trabalho. Todos os Cristãos, uma vez que são ministros de Cristo, deveriam ter as características morais descritas nos capítulos 1-7, mas não podem alegar ter esses poderes e sinais apostólicos a que Paulo se refere nesta seção – pelo menos não nas proporções em que ele fala (Talvez seja por isso que essas coisas são tratadas em uma seção separada da epístola). Esses sinais, dos quais Paulo agora fala, atestam inegavelmente o fato de que ele era realmente um apóstolo.
Na primeira seção da epístola (caps. 1-7), Paulo estava se dirigindo à grande maioria dos coríntios os quais considerava seus amigos, e estava se esforçando para remover as suspeitas que talvez eles tivessem em relação à sua integridade e sinceridade como ministro de Cristo. Confiando que havia ganhado a confiança dos santos nos capítulos anteriores, ele agora lida com seus oponentes mais diretamente. Sem mencioná-los pelos nomes, ele confronta, expõe e repreende aqueles que o criticaram e ao seu apostolado; ao mesmo tempo, ele apresenta um retrato do que é um verdadeiro apóstolo.
Esses falsos obreiros estavam se gloriando na carne e, para exaltarem a si mesmos, procuravam desacreditar o apóstolo, questionando a autoridade apostólica dada a ele por Deus. Eles fizeram certas acusações contra ele em uma tentativa de atacar seu caráter e contradizer seus ensinamentos, e finalmente eles assumiram uma falsa autoridade sobre seus convertidos em Corinto. Assim, tornou-se necessário que Paulo reivindicasse seu apostolado e, ao mesmo tempo, informasse e alertasse os coríntios desses falsos obreiros. Eles precisavam ver esses charlatães como realmente eram – “falsos apóstolos” e “obreiros fraudulentos” que estavam fazendo a obra de Satanás entre os santos (cap. 11:13-15).
Paulo esperou para tratar deste assunto por último, confiando que os capítulos anteriores tivessem estabelecido a confiança dos coríntios nele e, portanto, aceitando o que estava prestes a dizer nesta exposição. Uma vez que esta era uma carta aberta à assembleia, ele não poderia ser acusado de estar dizendo essas coisas pelas costas de seus críticos, como foi o caso de seus difamadores.
AS MARCAS DE UM VERDADEIRO APÓSTOLO
Paulo passa agora a apresentar as marcas de um verdadeiro apóstolo no contexto de confrontar e expor os falsos obreiros que estavam entre os coríntios. Como mencionado anteriormente, esses homens haviam feito certas alegações contra ele. Esta é frequentemente a maneira dos inimigos da verdade; quando não conseguem contradizê-la, tentam denegrir o caráter daqueles que a transmitem. Portanto, nos capítulos seguintes, Paulo apresenta as marcas de um verdadeiro apóstolo de Cristo.
Um Apóstolo de Cristo tem Poder Especial no Ministério para Livrar Pessoas das Ideias Falsas e Produzir Nelas a Obediência de Cristo
Capítulo 10:1-6 – A primeira marca distintiva de um verdadeiro apóstolo que Paulo aponta é que ele foi dotado com poder especial de Deus no ministério para livrar pessoas das suas ideias falsas e produzir nelas “a obediência de Cristo” (v. 5). Os inimigos de Paulo o acusaram de andar “segundo a carne” e usar métodos “carnais” em seu serviço, supondo que fosse um homem carnal (v. 2). Ele faz defesa contra isso e, ao mesmo tempo, usa a oportunidade para mostrar os verdadeiros meios do ministério apostólico.
Vs. 1-2 – Expor esses opositores era uma questão delicada, porque poderia ser interpretado que Paulo estava utilizando as mesmas táticas que usaram contra ele. Por isso, sua defesa deveria ser feita em um espírito correto. Portanto, ele sabiamente abordou o assunto em “mansidão e benignidade de Cristo”. Em outra passagem Paulo disse: “E ao servo do Senhor não convém contender, mas sim ser manso para com todos, apto para ensinar, sofredor; instruindo com mansidão os que resistem” (2 Tm 2:24-25). Isso é algo que devemos lembrar quando temos de enfrentar oposição. “Mansidão” tem a ver com o caráter de uma pessoa; “benignidade” tem a ver com as maneiras de uma pessoa. Se formos mansos, não ofenderemos; se formos benignos, alcançaremos o coração daqueles a quem falamos.
Paulo reconhece que não tinha aparência nem personalidade que os gregos mundanos admiravam, sendo “humilde” na presença, embora tivesse sido “ousado” para com eles na escrita de sua primeira carta. Seus opositores viram isso como uma tática carnal de intimidação, portanto, ele explica por que houve essa mudança em relação a eles. Antes em sua história, quando estava lá com eles (At 18), a assembleia estava indo adequadamente bem, e não havia necessidade de falar-lhes severamente. Mas depois, quando ele os deixou, a assembleia entrou em terrível mal e desordem. Daí surgiu a necessidade de falar-lhes firmemente. Isso foi uma coisa tão óbvia que Paulo passa a tratar com a acusação que lhe fizeram de andar “segundo a carne”. Ao abordar isso, ele deixa claro que sua ousadia era realmente “contra alguns” (KJV), distinguindo assim os difamadores do resto dos coríntios.
Vs. 3-5 – A resposta de Paulo foi que, enquanto ele e seus cooperadores “andam em carne” (JND), eles “não militam segundo a carne”. Paulo usa a palavra “carne” de duas formas aqui. A primeira descreve a fragilidade humana de todos os homens. Paulo (como todos os outros homens) andou como tal. A segunda é uma referência à velha natureza pecaminosa, e Paulo não travaria o combate Cristão de acordo com os métodos carnais e mundanos daquela natureza caída. (Note a ausência do artigo “a” quando se fala do primeiro uso da palavra “carne”, e a presença dele no segundo. Isto é bastante consistente ao longo das epístolas na Tradução J. N. Darby.) Armas carnais não podem subjugar a carne tanto quanto Satanás não pode expulsar Satanás. O combate Cristão, por outro lado, é uma batalha espiritual, combatida por meios espirituais. As “armas” desse combate – a Palavra de Deus e a oração – são “sim poderosas em Deus”.
Muitos dos trabalhos apostólicos de Paulo no ministério envolveram a “destruição” das “fortalezas” espirituais do inimigo. Estas são ideias e crenças errôneas que estão obstinadamente alojadas nas mentes dos homens, que Satanás usa para mantê-los longe do conhecimento da verdade. Tais “conselhos [raciocínios – TB] e toda altivez” levantam-se contra “o conhecimento de Deus”, e assim impedem a pessoa de ver a verdade. Essas fortalezas precisam ser derrubadas se os homens vão ser abençoados, e isso não pode ser feito por argumentos carnais (2 Tm 2:14). A apresentação da verdade no poder do Espírito é o que derruba essas ideias falsas. Embora todo ministro Cristão use essas armas espirituais (a Palavra de Deus e a oração) em seu serviço ao Senhor, ninguém além de um apóstolo poderia usá-las com tal poder e eficácia.
O recebimento da verdade é mais do que julgar e deixar de lado ideias erradas; todo nosso “entendimento” sobre assuntos espirituais deve ser levado cativo “à obediência de Cristo”. Paulo não disse “obediência a Cristo”, como algumas traduções o fazem, mas “a obediência de Cristo”. Isto se refere ao tipo de obediência que Cristo teve em Sua vida – uma submissão voluntária ao Seu Pai. É uma obediência que procede do amor (Jo 14:31). Esse foi o caráter de obediência que Paulo trabalhou para com todos os homens.
Esta é a primeira grande marca de um verdadeiro apóstolo de Cristo que Paulo enfatiza. Um apóstolo tem armas espirituais em seu combate que são poderosas em Deus produzindo a obediência de Cristo nos santos. Em contraste com isso, a influência dos falsos apóstolos entre os coríntios apenas promoveu a desobediência naquela assembleia.
V. 6 – Por meio da escrita da primeira carta de Paulo, os coríntios, em obediência piedosa, trataram da desobediência em seu meio tirando o ofensor da comunhão e colocando em ordem as outras coisas necessárias na assembleia. Mas Paulo deixa claro aqui que “toda desobediência” não foi vingada. Esta foi uma alusão aos difamadores em seu meio que estavam minando a ele e seu apostolado. Ele deixa claro que estava “pronto para vingar” isso, usando seu poder apostólico para disciplinar esses opositores (Compare 1 Tm 1:20). Além disso, disse que o faria quando a “obediência” deles fosse “cumprida” na restauração do irmão arrependido (cap. 2:9).
Um Apóstolo de Cristo Tem Autoridade Especial do Senhor para Exercer Julgamento Disciplinar se Necessário
Capítulo 10:7-11 – A referência ao uso do poder apostólico para vingar a desobediência leva Paulo a falar de outra marca de um verdadeiro apóstolo – ele tem autoridade especial do Senhor e, se necessário, poderia ser usada em juízo para a disciplina e correção de ofensores.
Paulo menciona isso no contexto de outra acusação que seus difamadores apresentaram contra ele; eles o acusaram de ser um hipócrita. Disseram que ele era um homem manso e fraco “estando presente”, mas um homem corajoso e ousado “estando ausente” (vs. 9-10). Eles disseram que ele protelou ir até eles e os bombardeou à distância com uma carta severa e crítica porque não tinha a coragem própria de confrontar pessoalmente a assembleia e acusá-los cara a cara com relação as suas falhas. Eles viram essa mudança de atitude como uma falta de caráter, não percebendo que as circunstâncias eram completamente diferentes.
V. 7 – Em face dessa forte acusação, Paulo achou necessário se defender mais uma vez diante das pessoas que deveriam ter confiado nele. A pergunta de Paulo, “Olhais para as coisas segundo a aparência?” (v. 7) indica que seus opositores não foram libertos dos ideais gregos na sociedade em que viviam. Eles foram influenciados por aparências externas em vez de realidades internas, e isso mostra que eles não estavam libertos do pensamento mundano. Eles pensavam que o servo do Senhor teria uma presença dominante com uma eloquência impressionante. Isso os levou a concluir que uma pessoa com uma presença corporal tão fraca e um estilo pobre de fala não poderia ser um apóstolo e embaixador de Cristo. Eles obviamente contemplaram as qualidades opostas em si próprios e concluíram que eles eram “de Cristo” por causa disso! No entanto, seu critério para julgar se um homem era espiritual ou não era terrivelmente carnal e errado. Paulo disse que se essa fosse a base para ser “de Cristo”, então eles precisariam “pensar outra vez isto consigo”. Isso coloca em questão se essas pessoas eram realmente salvas.
Vs. 8-11 – Paulo diz que não queria se gloriar da “autoridade” (TB) que tinha como apóstolo e, assim, soar como se estivesse os ameaçando, mas seus oponentes precisavam levar a sério seu apostolado. Ele não era covarde e, se necessário, demonstraria isso quando viesse. Seu apostolado havia sido dado a ele para a “edificação” dos santos e não para sua “destruição”. Mas se surgisse uma situação, ele poderia exercer julgamento apostólico (cap. 13:10). Paulo numa ocasião entregou alguns a Satanás “para que aprendam pela disciplina a não blasfemar” (1 Tm 1:20 – JND), e para a “destruição da carne” daqueles que praticavam a imoralidade (1 Co 5:5). Isto é uma função puramente apostólica.
Se essas pessoas não parassem de denegri-lo e a seus cooperadores, ele usaria sua autoridade apostólica para lhes infligir esse tipo de disciplina. Paulo absteve-se de estar entre os santos com ousado poder apostólico, ou escrevendo “cartas” ou pelo ministério verbal, embora ele pudesse (e o fez ao escrever a primeira carta), porque não queria “atemorizar” (TB) a eles. (v. 9). Se agisse desta maneira entre os santos, eles seriam motivados à obediência pelo medo do juízo, e não por afeição a Cristo, e ele não queria isso.
Aparentemente, seus críticos sugeriram aos coríntios que as cartas “graves e fortes” de Paulo eram um esforço dele para contrabalançar sua fraca presença corporal e palavra desprezível (v. 10). Mas ele diz que quando fosse, eles veriam que não era hipócrita. Ele seria em “obra” o que ele era em “palavra” e assim, tratar com esse grupo de oposição (v. 11).
Um Apóstolo de Cristo Tem Poder para Abrir Novos Campos de Trabalho e não Invade a Esfera de Serviço de Outro Homem
Capítulo 10:12-18 – Os difamadores de Paulo estavam dizendo que ele estava invadindo seu campo de trabalho em Corinto. Eles obviamente não o queriam por perto e o viam como uma ameaça à sua situação confortável naquela cidade. Por isso, eles inventaram esse argumento para convencer os coríntios a dizer a Paulo que fosse ministrar em outro lugar. Aqui, mais uma vez, essa acusação era totalmente falsa. Paulo usa-a para falar de outra marca de um verdadeiro apóstolo de Cristo – ele tem poder no ministério para abrir novos campos de trabalho e, portanto, não precisa entrar na esfera de serviço de outro homem.
Essa acusação era totalmente infundada porque a assembleia em Corinto havia começado por meio dos trabalhos de Paulo; como poderia ser concebido que, ao ministrar aos seus próprios convertidos, ele avançava além de seu limite e usurpava a esfera de trabalho deles? De fato, as coisas eram exatamente o oposto; esses falsos servos haviam invadido a esfera que Paulo tinha iniciado em Corinto e estavam recebendo crédito pelos trabalhos dele!
Vs. 12-14 – Paulo passa a falar disso. Ao fazê-lo, diz que não “ousaria” se unir aos princípios mundanos de competição que marcaram “alguns” no ministério – uma alusão aos seus adversários. Eles “se medem a si mesmos, e se comparam consigo mesmos”. Paulo acrescenta que “estão sem entendimento”. Novamente, isso mostra que essas pessoas não foram libertas do princípio mundano de competição, que caracterizou os gregos. Paulo não queria dar a impressão de competir com aqueles que se opunham a ele. Ele disse: “Porém não nos gloriaremos fora de medida, mas conforme a reta medida que Deus nos deu”. Ao se gloriar “conforme a medida”, não se esticou demais para alcançar aos coríntios (“para chegarmos até vós”). A obra do Senhor nessa área começou com ele vindo e lhes “pregando o evangelho” (KJV), pelo qual foram salvos. Eles eram seus convertidos!
Vs. 15-16 – De fato, Paulo disse que tinha como prática não se intrometer “em campo de outrem”. Um apóstolo de Cristo tem poder no ministério para abrir novos campos de trabalho e não precisa invadir a esfera de serviço de outro homem. Esse poder apostólico é o que esses falsos obreiros não tinham, e isso mostra que não eram mesmo apóstolos de Cristo. Não tendo seu próprio campo de trabalho, trabalharam à sua maneira na assembleia em Corinto, que fora estabelecida por Paulo (At 18), e estavam construindo com “madeira, feno, palha” sobre o alicerce de outro homem (1 Co 3:9-15).
A “esperança” de Paulo para os coríntios era que a “fé” deles “crescesse” a ponto de apoiá-lo na abertura de um novo trabalho “nos lugares que estão além”. Ele teve o cuidado de não se gloriar “em esfera alheia de coisas já feitas” (TB).
Vs. 17-18 – Paulo faz uma pausa para dar uma lição prática a todos os que servem. Ele nos diz para nos resguardarmos de nos exaltar por meio do trabalho dos outros. Foi isso que o Rei Saul fez. Jônatas tinha conseguido uma vitória em Israel contra os Filisteus, e Saul tentou levar crédito por isso! Ele “tocou a trombeta por toda a terra” dizendo às pessoas que ele tinha ferido a guarnição dos filisteus (1 Sm 13:3-4). Se alguém se gloriar, deve se gloriar naquilo que o Senhor tem o prazer de fazer por meio dele. Paulo disse aos Gálatas “Mas prove cada um a sua própria obra, e terá glória só em si mesmo, e não noutro” (Gl 6:4).
Esses falsos obreiros entre os coríntios estavam se recomendando na tentativa de conseguirem um espaço entre eles, mas não era uma recomendação legítima. Os santos devem apoiar o ministério daqueles “a quem o Senhor louva”. Isto será evidente pelas pessoas sendo ajudadas pelo seu ministério.
Um Apóstolo de Cristo tem Poder no Ministério para Atrair as Afeições dos Santos a Cristo
Capítulo 11:1-6 – Paulo agora segue para falar de outra grande marca de um verdadeiro apóstolo de Cristo – seu ministério atrai as afeições dos santos a Cristo e, assim, torna Cristo precioso para seus corações. Ele apresenta este ponto no contexto de expor o falso ministério de seus opositores.
V. 1 – Paulo pede aos coríntios que o suportem um pouco, enquanto ele continua a falar de si mesmo no que ele admite ser “loucura”. Gloriar-se em qualquer coisa, exceto no Senhor, era uma coisa tola para Paulo. No entanto, ele acreditava que falar de si mesmo nessa ocasião era necessário a fim de expor adequadamente esses falsos obreiros.
Paulo tinha “zelo de Deus” pelo bem-estar espiritual dos coríntios. Ele acreditava que estavam em sério perigo pela influência desses falsos obreiros; portanto, eles precisavam ser expostos. Não pode haver nada mais angustiante para um servo do que perceber que alguém veio pelas suas costas e corrompeu seus convertidos por alguma má obra. Paulo temia – não que sua reputação fosse maculada por esses obreiros fraudulentos – mas que a obra de Deus nos coríntios corria o risco de ser destruída. O trabalho destrutivo do inimigo não poderia tocar a salvação de suas almas, mas poderia minar suas crenças e corromper sua afeição por Cristo.
V. 2 – Paulo começa falando de seu fardo no ministério. Na verdade, era duplo: em primeiro lugar, apresentar Cristo aos seus ouvintes em obras e em palavras (cap. 4:10-13); em segundo lugar, apresentar seus ouvintes a Cristo com indivisas afeições (cap. 11:2). Ele fez o primeiro vivendo Cristo e pregando a Cristo a todos que quisessem ouvir. Ele fez o segundo atraindo as afeições dos crentes a Cristo de tal maneira que se tornaram desapegados de coração a tudo neste mundo e ligados a Ele. O efeito desse ministério “desposou” (JND) os santos “a um marido” – o Senhor. Desposar significa aceitar em afeição nupcial. Esta é uma grande característica do verdadeiro ministério Cristão; torna Cristo precioso aos corações dos Seus santos e, assim, eles se apegam a Ele de coração. O resultado é que eles, de boa vontade e afetuosamente, se reservam para Ele somente “como uma virgem pura a um marido, a saber, a Cristo”. Uma “virgem” na Escritura é aquela que se mantém imaculada do mundo para Cristo.
V. 3 – Podemos ter certeza de que o ministério que atrai as afeições após Cristo estará sob ataque. Satanás odeia a Cristo e odeia qualquer coisa que desposa o coração dos santos para Cristo. Assim, ele tentará introduzir seus obreiros malignos entre os santos em um esforço para corromper suas afeições (Mt 13:25; Jd 4; 2 Pe 2:1). Paulo diz que esse inimigo é tão concentrado em sua missão que ele usará “qualquer meio” (JND) para realizá-la. Sua principal tática é o engano. “Assim como a serpente enganou Eva com a sua astúcia, assim também sejam de alguma sorte corrompidos os vossos sentidos, e se apartem da simplicidade que há em Cristo”. Satanás tentou Eva com a obtenção de conhecimento. Ele disse: “sereis como Deus, sabendo o bem e o mal” (Gn 3:5). Ele estava usando essa mesma tática com os coríntios, e ele ainda trabalha entre os Cristãos nessa linha. Esses falsos mestres estavam prometendo um conhecimento superior que intrigava as “mentes” (ARA) dos santos, mas no fundo Satanás estava usando isso para roubar seus corações de Cristo.
A verdade de Deus, no entanto, é marcada pela “simplicidade”; é pura e clara, e não é difícil de entender, se o coração está disposto. Simplicidade não deve ser confundida com o que é elementar. Alguns pensaram que Paulo estava dizendo que não deveríamos nos aprofundar nos detalhes das Escrituras, mas permanecer com as verdades elementares do evangelho em nossas leituras bíblicas. Mas não é isso que Paulo está dizendo aqui. Ele está falando de simplicidade no sentido de clareza. Ele está dizendo que a maneira de Satanás é afastar os santos da simplicidade, complicando a verdade com expressões esotéricas e obscuras que são confusas. Ele é um mestre em astúcia e sutileza e trabalha nesse contexto. Seus ministros serão conhecidos por sua fraseologia complexa e difícil de entender.
Vs. 4-6 – Em contraste com o ministério de Paulo, que ligava os corações dos santos a Cristo, esses falsos obreiros pregavam “outro Jesus”, “outro Espírito” e “outro evangelho”, que de fato afastavam os santos de Cristo. Nota: esses falsos mestres não atacaram a verdade diretamente, mas introduziram um ministério rival que minou a verdade. Esta é frequentemente a maneira do inimigo. Em vez de atacar a verdade abertamente, ele introduzirá seu veneno que realizará seu fim desejado de perverter a verdade. Muitas vezes é introduzido um pouco de cada vez, até que o todo seja envenenado (Mt 13:33). Este foi o caso quando Eliseu e os filhos dos profetas fizeram uma “panela grande” de “caldo” (2 Rs 4:38-41). Alguém inconscientemente “cortou” e colocou “coloquíntidas” venenosas na panela. Cortá-las na panela indica que o veneno foi introduzido um pouco de cada vez. Estejamos atentos.
O fato de Paulo usar o nome do Senhor como Homem quando Ele andou neste mundo (“outro Jesus”) indica que a mensagem daqueles falsos mestres tinha alguma corrupção em conexão com a Humanidade do Senhor. Tocar a Pessoa de Cristo dessa maneira é realmente algo muito sério. Paulo não fala sobre o que eles ensinaram e que era falso, e isso é uma lição para nós; não devemos nos ocupar em procurar e nos familiarizar com todos os erros da Cristandade. Examinar erros pode levar a cair em erros – mesmo que estejamos tentando corrigi-los. Nossa ocupação deve ser com a verdade; se o que é ensinado não coincide com a verdade (1 Jo 2:24), isso é tudo o que precisamos saber; devemos rejeitar tal ensino.
Esses falsos apóstolos também estavam ensinando que os santos precisavam receber “outro Espírito”. Ao dizer “Espírito” (“E” maiúsculo), Paulo indicou que eles estavam imitando o Espírito de Deus de alguma forma, e alegando que Ele os estava guiando. No entanto, é evidente que o espírito por trás de seus ensinamentos não era o Espírito Santo. Paulo avisou Timóteo que, nos últimos tempos, alguns se afastariam da fé “dando ouvidos a espíritos enganadores, e a doutrinas de demônios” (1 Tm 4:1). Aparentemente, o que esses homens estavam ensinando era dessa fonte maligna.
Esses falsos obreiros também estavam pregando “outro evangelho”. Havia algo em sua mensagem que fazia dela um falso evangelho. Isso também era muito sério, porque um falso evangelho não salvará uma pessoa – independentemente de quão sinceramente ele possa ser pregado ou quão sinceramente uma pessoa acredite nele. Compare Gl 1:5-8.
Uma vez que foram estes os tristes fatos sobre esses falsos apóstolos, Paulo diz aos coríntios que eles fariam bem em “suportá-lo” enquanto falava abertamente deles e de si mesmo, pois estava tentando defendê-los de um ataque traiçoeiro de Satanás por meio desses falsos obreiros. Em certo sentido, existem realmente apenas dois tipos de ministério – o verdadeiro e o falso. Um desposa o coração para Cristo no céu; o outro afasta de Cristo a mente e o coração em direção às coisas terrenas. Um glorificará a Cristo e fará muito d’Ele; o outro dará glória ao homem de alguma forma. Todo ministério pode ser testado por este simples critério.
Vs. 5-6 – Esses falsos obreiros haviam questionado o apostolado do apóstolo. Ele afirma que “em nada fui inferior aos mais excelentes apóstolos”. Vemos aqui que, mesmo quando Paulo falou de si mesmo, usou de humildade. Nota: ele disse que não era “inferior” aos outros apóstolos, mas não disse que era superior a eles (Gl 2:6; 2 Co 12:11).
Seus difamadores o questionaram porque ele era “simples no discurso” (JND). Ele explica que era seu hábito fazer isso ao “manifestar a verdade” (JND) entre os santos. Apresentar a verdade adornada por uma pomposa terminologia técnica (que Paulo poderia ter feito, sendo um homem muito instruído – At 22:3) tende a impressionar os ouvintes pelo professor e sua erudição, em vez de ocupá-los com Cristo. Portanto, Paulo evitou isso em seu ministério, mesmo que significasse ser criticado por isso. Nós faríamos bem em seguir essa mesma regra. Usar uma linguagem simples no ministério, no entanto, não significa que devemos tornar a verdade “simplória”. Paulo disse que, embora sua apresentação da verdade fosse simples no discurso, não era “contudo na ciência”. Ele apresentou as verdades profundas de Deus em linguagem simples, de modo que os santos pudessem entender. Esta é a marca de um verdadeiro professor.
Um Apóstolo de Cristo se Sacrificará para Transmitir Bênção aos Outros
Capítulo 11:7-15 – Outra marca de um apóstolo de Cristo é que é um trabalhador abnegado. Ele se sacrificará para transmitir bênçãos e ajudar os santos. Ele não tem interesse em tirar do rebanho de Deus – apenas dar ao rebanho. Um verdadeiro apóstolo não é conhecido pelo que tira do rebanho de Deus, mas pelo quanto dá ao rebanho. Portanto, ele não se rebaixará para usar o ministério como um meio de obter riqueza ou posição entre os santos.
Em contraste com isso, esses falsos obreiros estavam usando o ministério para servir aos seus próprios fins. Eles haviam assumido o serviço do Senhor como profissão – “negócio” (cap. 2:17 – JND), e gostavam de tomar fundos dos coríntios e até se gloriavam disso (cap. 11:12, 20). É nisto mesmo que o Senhor encontrou falta nos pastores que tosquiaram o rebanho de Deus em Israel (Ez 34:2-3). Esses falsos obreiros se aproveitaram do dinheiro dos coríntios. Eles realmente criticavam Paulo por não tomar financeiramente dos coríntios, porque para eles isso ia contra a imagem de um servo de Deus. Eles acreditavam que tais (como eles) eram para ser em tudo atendidos, e que deveriam andar entre os santos com presença dominante de um rei. Quando Paulo se humilhou e se dispôs a fazer o trabalho comum, seus difamadores usaram isso como prova de que ele não era um apóstolo de verdade.
V. 7 – Paulo pergunta aos coríntios se era realmente “uma ofensa” (KJV) se humilhar entre eles e trabalhar com suas mãos como um trabalhador comum, para que o evangelho pudesse chegar a eles “de graça”. Como regra geral, quando se trabalha em uma nova área, e novos convertidos resultam desses trabalhos, não é prudente começar imediatamente a receber ofertas financeiras deles. Produz uma imagem errada do evangelho na comunidade (1 Ts 2:9). Paulo sabia disso e disse aos coríntios em sua primeira carta que ele se absteve dessa prática porque temia que isso pudesse “pôr impedimento ao o evangelho de Cristo” (1 Co 9:12 – TB). Para evitar qualquer ideia errada do evangelho, era costume de Paulo trabalhar com suas mãos entre os santos até que estivessem estabelecidos (At 18:3; 20:34). Sua recusa em aceitar o apoio dos coríntios não era de forma alguma um reconhecimento de que ele não era um apóstolo.
Vs. 8-10 – Além disso, Paulo disse-lhes que recebia “salário” de “outras igrejas” enquanto estava com eles em Corinto. Ele menciona isso para mostrar que não se opunha ao princípio de receber ajuda financeira como comunhão das assembleias. Ele optou por não o fazer com os coríntios, e “homem algum” (KJV) poderia impedi-lo de se gloriar de que não tinha sido um fardo financeiro para eles enquanto estava lá.
Vs. 11-12 – Paulo fez isso, não porque ele não “amava” os coríntios – Deus sabia que ele realmente os amava. Ele disse que continuaria essa prática para “cortar ocasião [reivindicação]” daqueles que estavam tomando dos coríntios, e se gloriando disso. Esses falsos mestres estavam na verdade mirando as ofertas dos coríntios como uma espécie de prova de que eram apóstolos – (Paulo acrescenta) “como nós”. Mas eles não podiam usar corretamente esse argumento para “reivindicar” que eram apóstolos legítimos de Cristo, porque Paulo era um apóstolo de Cristo e não tomou financeiramente dos coríntios.
Vs. 13-15 – Os coríntios precisavam ver esses falsos obreiros pelo que eles realmente eram. Paulo diz que eles se autodesignaram “falsos apóstolos” e “obreiros fraudulentos” que estavam “transfigurando-se em apóstolos de Cristo”. Paulo se manifesta muito diretamente e os identifica como “ministros” de Satanás porque estavam fazendo a obra de Satanás na assembleia. Essa foi uma declaração realmente forte, mas os coríntios precisavam saber disso. Que tais indivíduos sejam encontrados circulando entre os santos não deveria nos surpreender, pois as Escrituras estão repletas de advertências de “falsos Cristos” (Mt 24:23-24), “falsos apóstolos” (2 Co 11:13), “falsos profetas” (Mt 7:15), “falsos doutores” (2 Pe 2:1) e “falsos irmãos” (Gl 2:4) – muitos dos quais se infiltrarão nos meios Cristãos.
Imitando seu mestre, esses falsos doutores cobriram seu mal com uma demonstração de justiça. Eles “se transfiguraram” em “ministros da justiça”. Essa é com frequência a maneira pela qual Satanás age para dar à sua obra maligna a aparência de ser de Deus. Muitas vezes os crentes que estão fora da comunhão com Deus, e estão fazendo a obra de Satanás na assembleia de alguma forma, terão um exterior pessoal de serem muito justos e extremamente piedosos – e muitos são enganados por isso. Quando eles pressionam suas ordens e impõem suas opiniões sobre a assembleia, as pessoas ficam impressionadas com seu ar de piedade e concluem que devem estar certos, e irão defendê-los, e às vezes até promovê-los. Mas realmente estão vestindo “um manto de pelos para mentirem” (Zc 13:4). Um manto de pelos é a roupa de um profeta. Tenhamos cautela; Paulo diz que o próprio Satanás pode se “transfigurar em anjo de luz” e que “seus ministros” também. Tenhamos o cuidado de não sermos apanhados em algo que parece justo, mas realmente é algo que não é de Deus. Satanás frequentemente trabalha em um contexto de justiça; é bem possível fazer algo que acreditamos ser para Deus, mas a coisa não é de Deus.
Um Apóstolo de Cristo Sofre pela Verdade que ele Leva
Capítulo 11:16-33 – Outra coisa que caracteriza um verdadeiro apóstolo de Cristo é que ele paga um preço por levar a verdade sofrendo perseguição. Os historiadores bíblicos registraram que todo apóstolo do Senhor Jesus Cristo sofreu o martírio, exceto João – embora tenham tentado matá-lo.
Vs. 16-20 – De forma a introduzir esta próxima marca de um apóstolo, Paulo novamente expressa sua relutância em falar de si mesmo, mas sentiu que era necessário para expor corretamente esses falsos obreiros. Ao dizer essas coisas sobre si mesmo, ele confiou que “ninguém” o julgaria “insensato”. Mas se os coríntios o vissem como tal, eles deveriam estar felizes em recebê-lo “como insensato”. Paulo diz: “de boa mente tolerais os insensatos” – uma alusão ao fato de permitirem que esses charlatões estivessem entre eles e até mesmo os apoiasse. Na essência, Paulo estava dizendo: “Eu sei que é tolice alguém gloriar-se de si mesmo, mas desde que vocês permitem uma boa parte daqueles que se exaltam a si mesmos e vos devoram e vos fazem cativos – se pensam que estou me gloriando, tenho certeza que vão me perdoar por dedicar-me a isso na tentativa de explicar”. Se eles estavam dispostos a tolerar os professores judaizantes entre eles, então deveriam dar a Paulo algum espaço para fazê-lo sem críticas. Assim, ele usou um toque de ironia aqui.
Vs. 21-22 – Paulo então se volta para falar do assunto de sofrer “reprovação” (KJV). Não tendo verdadeiras credenciais do Senhor, esses falsos obreiros estavam indicando falsas credenciais que de modo algum provavam que eram verdadeiros apóstolos. Eles não podiam usar sua herança e outras coisas naturais para provar que eram apóstolos e Paulo não, porque ele tinha essas credenciais também. Se apontassem para o discurso “ousado” deles, Paulo poderia fazer o mesmo. Se apontassem para a descendência deles dos “Hebreus” (orgulho de raça), Paulo também poderia. Se alegassem que eram “Israelitas” (os privilégios peculiares daquela nação), Paulo também poderia. Se fossem suas conexões familiares com “Abraão” (suas promessas especiais de bênção), Paulo também poderia reivindicar isso (v. 22). Mas essas coisas de maneira alguma provam que uma pessoa é apóstolo de Cristo.
Vs. 23-27 – Paulo prossegue mostrando que se eles ousassem alegar que eram verdadeiros “ministros de Cristo”, então deveriam ter sua participação dos sofrimentos de Cristo, como ele teve. Paulo e os outros apóstolos traziam as marcas dos sofrimentos de Cristo em seus corpos. Ele fala disso em Gl 6:17, dizendo: “trago no meu corpo as marcas do Senhor Jesus”. Se alguém questionasse o apostolado de Paulo, tudo o que eles tinham de fazer era olhar para aquelas marcas – elas atestam o fato de que era um verdadeiro apóstolo. Mas isso estava faltando a esses falsos mestres; não há evidência de que sofreram por Cristo. O apóstolo João diz que uma grande indicação reveladora de falsos profetas é que “o mundo os ouve” (1 Jo 4:5). Eles são aceitos pelo mundo porque falam coisas que o mundo entende. Assim, o mundo não lança sua reprovação sobre eles. Esta é uma evidência convincente de que eram falsos esses supostos ministros de Cristo.
Paulo toma a liberdade de continuar um pouco sobre o assunto de sofrimento para mostrar o que deve suportar um apóstolo de Cristo, pelo amor de Seu nome. O Senhor disse de Paulo: “E Eu lhe mostrarei quanto deve padecer pelo Meu nome” (At 9:16). Isto foi certamente cumprido em sua vida como um apóstolo. É Paulo como que dizendo: “Vocês me forçaram a gloriar-me em mim mesmo; mas não vou falar de coisas pelas quais as pessoas me invejassem; Eu falarei daquilo que ninguém desejaria – meus sofrimentos por Cristo no evangelho”. Ele então se lança na prova mais convincente de ser um apóstolo. Ele coloca diante de nós um registro comovente de seus sofrimentos por Cristo, listando umas 25 coisas – muitas das quais aconteceram com ele várias vezes. Em todas as coisas que Paulo menciona, ele não traz os muitos sinais e maravilhas que foram feitos por meio dele. Tais coisas apenas intrigariam e fascinariam nossas mentes e nos ocuparia com o servo. Em vez disso, ele nos apresenta incidentes de seu sofrimento e indignidade. Lembremo-nos, também, que o registro dos sofrimentos de Paulo por Cristo não estava completo no momento em que escreveu esta carta. Os sofrimentos que ele suportou nos últimos capítulos de Atos não seriam incluídos nisto, porque eles ainda não haviam ocorrido (por exemplo, At 20:23, 23:2, 12, 27:41-44).
Não entraremos em cada um desses sofrimentos, exceto para explicar o que ele quis dizer quando disse: “em perigo de morte muitas vezes”. Isso não significa que Paulo tenha morrido muitas vezes, mas ele arriscou sua vida com frequência em circunstâncias de ameaça de morte (1 Co 15:31, 2 Co 1:8-9, 4:11). Em todos esses terríveis sofrimentos, não há menção dele pedindo a empatia e as orações dos santos – eles provavelmente sabiam pouco ou nada deles. De fato, se não fosse por esses mestres malignos que se infiltraram na assembleia em Corinto, e os coríntios obrigando, então, a Paulo a falar de si mesmo, nunca teríamos sabido dessas experiências; o livro dos Atos não registra essas coisas. J. N. Darby disse: “Estas poucas linhas esboçam a imagem de uma vida de tão absoluta devoção que toca o coração mais frio; faz-nos sentir todo o nosso egoísmo e dobrar o joelho diante d’Ele, que era a Fonte viva da devoção do abençoado apóstolo, diante daqu’Ele cuja glória o inspirou”.
Vemos neste resumo dos sofrimentos de Paulo por Cristo uma prova notável de seu apostolado. Mesmo que seus opositores não o vissem como um verdadeiro apóstolo, é óbvio que Satanás via! Se ele fosse apenas um autônomo que não estivesse fazendo nada para construir a Igreja de Deus, Satanás não teria se preocupado com ele. Mas esse não foi o caso; Satanás lançou todas as perseguições concebíveis contra Paulo para impedi-lo em seu serviço ao Senhor. Não é esta uma prova notável de seu apostolado? Todo verdadeiro servo Cristão sofrerá perseguição se for fiel (2 Tm 3:12), mas é improvável que ela alcance essas proporções apostólicas. E o que esses falsos apóstolos poderiam trazer a esse respeito para provar que eles eram apóstolos de Cristo? Não há sequer registro de que eles sofreram por Cristo!
Vs. 28-31 – Talvez o mais difícil de todos os fardos de Paulo fosse seu “o cuidado de todas as igrejas [assembleias]”. O Sr. F. B. Hole disse: “Para suportar a fraqueza dos fracos, ouvir uma e outra vez as queixas dos ofendidos, corrigir a tolice dos santos e lutar pela verdade contra os falsos irmãos, tudo isso deve ter sido a maior prova de todas. No entanto, ele o fez.” Apenas pelo fato do quão profundamente Paulo estava preocupado com os santos, já o distinguia de todos os falsos obreiros. Ele verdadeiramente cuidou do bem estar de cada assembleia e deu a vida por elas. Não temos registro de que os falsos mestres de Corinto se importassem tanto com o rebanho de Deus.
Vs. 32-33 – Paulo, então, nos fala de como por um triz escapou em Damasco, sendo descido por seus irmãos “num cesto por uma janela” de sobre a muralha da cidade. Este é o primeiro sofrimento registrado de perseguição que Paulo experimentou (At 9:25). Parece bastante inofensivo e banal quando contrastado com os sofrimentos dramáticos de que vinha falando anteriormente. É um tanto decepcionante, mas serve para ilustrar o ponto de Paulo em não se gloriar de si mesmo. Ele marchou para Damasco com grande pompa e orgulho como um distinto representante do supremo conselho judaico, e saiu fugindo na escuridão como um ladrão caçado. Poderia alguma coisa ser mais humilhante? E por que isso aconteceu? Porque Cristo Se tornou o Objeto de sua vida e a Pessoa que ele agora servia. O leão foi transformado em cordeiro por meio do poder transformador da graça de Deus. Em sua fuga, o Senhor não lhe deu nenhum favor especial – nenhum milagre foi realizado para ele. Foi uma experiência inglória, para dizer o mínimo. Qualquer um que se gloriasse em si mesmo não mencionaria essa experiência humilhante. A narração indica humildade apostólica.
Aqui está uma lição prática para todos os que ministram a Palavra. Se fizermos uma referência pessoal no ministério, é melhor falar de algo que não traz glória a nós mesmos. Mencionar algo que nos deprecia, em vez de nos colocar em uma luz favorável, é a maneira discreta do apóstolo e o exemplo para nós.
É interessante que o Senhor usou os irmãos de Paulo para descê-lo, e esse foi o meio dele ser preservado. Nossos irmãos, que nos conhecem melhor, têm um modo de nos manter humildes, em situações que, de outra forma, ficaríamos inchados. Pode ser uma ou duas palavras dadas a nós, ou alguma ação em nossa direção. Paulo pôde agradecer ao Senhor por ter irmãos em Damasco que fizeram isso por ele. Quando nossos irmãos agem nessa função conosco, geralmente não apreciamos, mas quando refletimos sobre isso mais tarde, frequentemente percebemos que o Senhor estava nisso para nossa preservação.
Um Apóstolo de Cristo Recebe Visões e Revelações Especiais
Capítulo 12 – Nos dois últimos capítulos da epístola, Paulo continua a falar das marcas que distinguem um verdadeiro apóstolo e assim defende seu apostolado. Mas nesses capítulos, não mais compara os falsos apóstolos com os verdadeiros – na verdade, eles não são mais mencionados na epístola. Em vez disso, Paulo faz uma comparação entre ele mesmo e aqueles que eram verdadeiros apóstolos, e mostra que ele “em nada foi inferior” a eles (cap. 12:11), assim, ele prova seu apostolado de uma perspectiva diferente.
Neste capítulo (12), Paulo chega às “visões e revelações do Senhor” – outra característica distintiva de um verdadeiro apóstolo. Novamente, isso é algo que um servo do Senhor hoje em dia não pode alegar ter. Tais revelações foram dadas aos apóstolos e profetas nos anos iniciais da Igreja, quando a verdade da presente dispensação estava em processo de ser “dada aos santos” (Jd 3). Uma vez que a verdade foi registrada nas Sagradas Escrituras e tendo os apóstolos já saído de cena, as visões e revelações que Deus deu quando estava estabelecendo o Cristianismo não são mais necessárias.
No capítulo 11, Paulo falou de ser “humilhado” da maneira mais indigna; agora, no capítulo 12, fala de ser “arrebatado” da maneira mais majestosa. No capítulo 11, ele se gloriou em seus sofrimentos; aqui no capítulo 12 Paulo se gloria, não nas visões e revelações dadas a ele, mas em suas fraquezas (vs. 5, 9). As experiências do capítulo anterior foram no corpo, mas neste capítulo a experiência era algo fora do corpo, embora diga que não podia ter certeza de que foi.
Capítulo 12:1-4 – Paulo afirma novamente que era repugnante para ele se gloriar em si mesmo, mas se sentiu compelido a fazê-lo para silenciar seus críticos.
Ele agora relata algo que aparentemente manteve para si mesmo por quatorze anos. Esta foi outra evidência de humildade; uma pessoa comum teria declarado isso para todo mundo. Ele foi “arrebatado até ao terceiro céu”, que ele diz ser “paraíso”, onde ouviu palavras “inefáveis [indizíveis – TB]”. Essa experiência coincide com o incidente em Listra quando foi apedrejado para a morte (At 14:19). Ambos os fatos haviam acontecido “quatorze anos” antes. Aparentemente, ele estava tendo essa sublime experiência de ser levado ao paraíso enquanto eles arrastavam seu corpo morto para fora da cidade.
A visão e revelação do Senhor foi um privilégio especial dado a ele para sua própria iluminação e fortalecimento espiritual. Ao relatar a experiência, ele não fala de si mesmo como um apóstolo de Cristo, mas como “um homem em Cristo”. Isto não é porque ele não fosse um apóstolo, mas porque queria mostrar que isso não está além da experiência de todo Cristão, pois todo Cristão é “um homem em Cristo”. É a posição de todo crente na raça da nova criação em Cristo (2 Co 5:17). Será um privilégio de todos, na nova raça de homens, ter essa experiência quando forem chamados à presença do Senhor, seja quando morrerem ou na vinda do Senhor.
Ao dizer: “um homem em Cristo”, “tal homem”, “de um [homem] assim”, etc., Paulo mostra que quando uma pessoa está conscientemente na presença do Senhor, ela não se gloria em si mesma. Muito ao contrário, estando no gozo das coisas celestiais, perde toda a visão de si mesmo. Que livramento abençoado é esse! Alguém poderia pensar que, se alguma vez houvesse algo em que alguém pudesse se gloriar, seria essa experiência. Paulo prefere não entrar nos detalhes, mas afirma que o que experimentou “ao homem não é lícito falar” aos outros na Terra em seus corpos mortais.
Ele “ouviu palavras inefáveis, de que ao homem não é lícito falar”. Isso não significa que ele viu e ouviu declarações misteriosas que eram ininteligíveis para ele, mas que não temos palavras em nossa linguagem terrena para expressar a experiência. A experiência era indizível, mas não ininteligível. Paulo entendeu o que experimentou, mas não conseguiria expressá-lo em linguagem humana.
Três Céus nas Escrituras
- Os “céus” estelares – os céus físicos (Gn 1:1; Sl 19:1). - Os “lugares celestiais” – o esfera da atividade espiritual (Ef 1:3). - O “terceiro céu” – a morada de Deus (2 Co 12:2).
Paulo chama o terceiro céu de “paraíso”. É uma cena de alegria, beleza e glória onde Deus habita em luz e amor. É onde o ladrão na cruz foi imediatamente após a morte (Lc 23:43) e onde todos os redimidos estão ou estarão.
Capítulo 12:5-6 – Em vez de se gloriar nessa maravilhosa experiência, Paulo nos fala das “enfermidades” (KJV) que o Senhor permitiu que tivesse quando voltou à consciência, na Terra. Isso mais uma vez é uma prova de sua humildade.
Capítulo 12:7 – Tais eram as elevadas visões e revelações que Paulo experimentou que havia perigo de o orgulho surgir em seu coração. A carne nele não havia mudado pela experiência. Por isso, o Senhor permitiu um “mensageiro de Satanás” para o “esbofetear” com uma aflição corporal desconhecida. Paulo chama isso de “um espinho na carne”. Se o Senhor não tivesse feito isso, a carne teria se intrometido no trabalho de Paulo e estragado sua utilidade no serviço. Em condições normais, a carne deve ser mantida inativa no crente pelo andar no Espírito (Rm 6:11-14; Gl 5:16). Mas esta não era uma experiência comum e, portanto, exigiu um especial “espinho na carne”.
Isso nos mostra que a carne não é erradicada do crente por ter uma elevada experiência espiritual, como o Movimento de Santidade falsamente afirma. Magníficos privilégios e experiências espirituais não mudam a carne – nem mesmo de um apóstolo. Paulo não precisou do espinho quando foi arrebatado para o terceiro céu, mas precisou quando voltou à Terra.
Paulo não diz qual era o “espinho”, apenas que era uma enfermidade (v. 9). Foi alguma doença ou chaga corporal. Alguns especularam que, porque ele se refere a um problema que tinha com os olhos quando escreveu aos gálatas, que talvez fosse uma doença em seus olhos (Gl 4:15). Tudo o que realmente sabemos é que foi algo que fez Paulo desprezível aos olhos dos outros e, portanto, foi usado pelo Senhor para impedi-lo de exaltar-se com orgulho. O espinho não foi enviado para corrigir o mal da carne em Paulo – pois a carne não pode ser corrigida (Jo 3:6) – mas ajudá-lo em uma medida preventiva contra a carne se deixar levar pela sua própria importância.
Assim, o espinho teve um efeito duplo em Paulo:
- Mantinha-o em humilde dependência do Senhor. - Guardou os santos de exaltá-lo como algum excepcional servo de Deus.
Ele diz: “Para que não me exaltasse”. Algumas versões acrescentam “demais”, mas essa palavra não está no texto grego. Ela faz parecer que Paulo estava dizendo que seria aceitável exaltar a si mesmo, mas não muito. Isso, é claro, não transmite o ponto que Paulo estava expondo. A exaltação própria é sempre perigosa – mesmo que um pouco dela. Guardemo-nos de ter um espírito pretensioso e arrogante que aproveitasse algum incidente ou experiência em nossas vidas que pudéssemos usar para nos exaltar e que desse aos outros uma impressão de uma espiritualidade e devoção que realmente não possuímos.
Capítulo 12:8-10 – Paulo inicialmente pensou que o espinho o atrapalharia no seu serviço, e diz que “acerca disto três vezes implorei ao Senhor que o espinho se apartasse de mim” (TB). Em perfeita sabedoria, o Senhor respondeu à sua oração, mas não ao seu pedido da oração. O Senhor não removeu a aflição, mas usou-a para ensinar a Paulo algumas importantes lições espirituais que trabalhariam para preservá-lo em seu serviço. Quando ele discerniu que não era a vontade do Senhor tirar-lhe a provação, se submeteu “de boa vontade”, pois só queria ter a vontade do Senhor em sua vida. Em troca, o Senhor lhe deu a garantia de Sua suficiência em graça para sustentá-lo na enfermidade, e isso confortou seu coração. Isso permitiu suportasse suas enfermidades, censuras, sofrimentos, etc. Se o Senhor nos deu algum fardo ou aflição para suportar, não vamos nos queixar disso, mas nos submeter à Sua vontade na questão – pode ser o Seu modo de nos preservar no caminho, e nos fazer úteis em Seu serviço.
O resultado imediato da submissão de Paulo no assunto foi que “o poder de Cristo” habitou nele. Todos os que testemunharam seu ministério viram o Senhor operando por meio dele, e isso lhes causou uma profunda impressão. Assim, a mesma coisa que Paulo pensava que atrapalharia seu serviço, na verdade, ajudou-o nele! Ele aprendeu pelo menos duas grandes coisas com a provação:
- A graça do Senhor é suficiente para sustentar o Seu povo nas provações mais difíceis. - Fraqueza na provação pode se tornar ocasião para manifestar o poder do Senhor.
Isso mostra outra marca que distingue um apóstolo, que ninguém quer ter – ele tem disciplina especial do Senhor por causa das sublimes revelações que lhes foram dadas e do trabalho que é chamado a fazer. O que distinguiu Paulo como um verdadeiro apóstolo de Cristo não foi apenas o fato de ter essas visões e revelações – porque outros profetas verdadeiros nos primeiros dias da Igreja também os tiveram (Ef 3:5) – mas que precisou de disciplina especial na escola de Deus para mantê-lo humilde e útil. Não há registro desses falsos apóstolos tendo essa credencial. Eles podiam ter invejado o apostolado de Paulo, mas nenhum deles invejava sua disciplina. Eles podiam alegar serem apóstolos e terem revelações, etc., mas deixem que nos mostrem seu “espinho” na carne que comprovaria isso.
A lição prática para nós aqui é que Deus pode fazer muito mais com um homem quebrado do que com um homem que parece forte em sua própria força. As pessoas dizem: “Eu quero me sentir forte”. Mas o que elas precisam sentir é sua própria fraqueza, porque então o poder do Senhor pode operar por meio delas, e Ele recebe a glória. Paulo disse: “Quando estou fraco, então sou forte”.
Um Apóstolo de Cristo tem Poder do Senhor para Fazer Sinais e Maravilhas
Capítulo 12:11-12 – Os oponentes de Paulo o “constrangeram” a adotar um método de defesa, que ele declara ser “néscio”. Ele agora começa a falar de outra prova de seu apostolado – “sinais, prodígios e maravilhas”. É interessante que Paulo tenha deixado isso para a última de suas demonstrações; nós provavelmente teríamos manifestado isso primeiro.
Antes de se referir a esses sinais e maravilhas, Paulo parece usar um pouco de ironia ao mencionar primeiro a “paciência”. Com efeito, ele diz: “Como vocês poderiam questionar se eu sou um apóstolo? Basta olhar para toda a paciência que tive com vocês; isso em si deve provar que eu o sou!”. Quando se tratava de sinais, prodígios e maravilhas, os coríntios deveriam ter sido os que o recomendassem, pois fizera muitos milagres no meio deles. Se surgisse uma pergunta dos opositores de Paulo, eles deveriam estar prontos para enfrentar o desafio e defendê-lo. Eles, entre todo mundo, haviam testemunhado a prova de que ele não foi em nada “inferior aos mais excelentes apóstolos”.
Capítulos 12:13-15 – Continuando sua ironia, Paulo pergunta se havia alguma coisa em particular que houvesse feito aos coríntios que os levaria a duvidar de sua autoridade como apóstolo. Eles não ficavam atrás de nenhuma assembleia em dons espirituais (1 Co 1:7), mas neste assunto ele diz que foram “inferiores às outras assembleias” (JND), pois as outras assembleias o reconheceram como um apóstolo. Ele pergunta se foi sua recusa abnegada para não ser pesado com remuneração financeira por seus trabalhos. Se assim for, ele diz que devem exercer a verdadeira graça Cristã e perdoá-lo “este agravo”.
Ele diz que, se sua “terceira” proposta da prometida segunda visita fosse realizada, ele faria a mesma coisa novamente, e não lhes seria “pesado”, porque queria que soubessem que seus motivos para com eles eram puros. Ele não tinha interesse em tirar nada deles. Ele diz: “Pois que não busco o que é vosso, mas sim a vós”. Como um verdadeiro pai em Cristo, Paulo estava preparado para provê-los. Ele não queria tirar deles; queria dar a eles (espiritualmente). Mesmo na vida natural “não devem os filhos entesourar para os pais, mas os pais para os filhos”. Essa mesma ordem deveria prevalecer nas coisas espirituais. Ele com satisfação pôde dizer “gastarei tudo e serei inteiramente gasto por amor das vossas almas” (TB). “Gastar” é voluntariamente se utilizar de recursos próprios e dar onde houver necessidade. “Ser gasto” é ter alguém que tire proveito dos recursos alheios sem o seu consentimento. Em ambos os casos, Paulo estava feliz por isso em relação ao seu cuidado com o estado dos coríntios. Se isso significasse que cresceriam nas coisas de Deus, ele estava disposto a isso. Eles receberam muito dele, mas não apreciaram. Ele diz: “ainda que, amando-vos cada vez mais, seja menos amado”.
Capítulo 12:16-18 – Paulo previu que quando os coríntios recebessem esta carta da mão de “Tito” e “um irmão”, poderiam acusá-lo de tentar se ressarcir a si próprio. Ele percebeu que não estava longe deles o acusarem de manter uma aparência de não tirar nada deles, mas na realidade enviar aqueles irmãos para receber por ele. Por isso, Paulo se ocupa dessa falsa acusação e responde: “sendo astuto, vos tomei com dolo”. Ele já havia dito nos capítulos 8-9 que a coleta que Tito e o outro irmão iriam pegar com eles era para os santos pobres em Jerusalém; não era para ele. O mesmo espírito que havia em Paulo em seus labores entre os coríntios estava naqueles que trabalhavam com ele. Ele diz que andaram com o “mesmo espírito” e nas “mesmas pisadas” dele e que recusariam todos os benefícios.
Capítulo 12:19 – Ao falar dessa maneira, os coríntios poderiam ter pensado que Paulo estava tentando se justificar. Paulo se antecipa a isso também, dizendo que ele e seus cooperadores não estavam tentando “se desculpar”, mas falavam “em Cristo perante Deus” com uma boa consciência de que estavam afirmando a verdade. Eles procuravam fazer “todas as coisas” (TB) para a “edificação” deles, e não se rebaixariam a tais métodos dissimulados para obter dinheiro dos coríntios.
Capítulo 12:20-21 – Apesar do bom resultado que a primeira epístola produziu, Paulo temia que, quando novamente visitasse Corinto, os encontrasse em péssimo estado. Ele temia isso porque sabia que, se os falsos mestres permanecessem entre eles, sua influência maligna corromperia a moral dos coríntios. Isso mostra que má doutrina leva à prática do mal. Paulo declarou esse fato a Timóteo dizendo: “Mas evita os falatórios profanos, porque produzirão maior impiedade” (2 Tm 2:16). Por outro lado, a boa doutrina estabelece uma base na alma que produz bons costumes. Paulo falava “da verdade, que é segundo a piedade” (Tt 1:1). Isso mostra o quão sério era a questão de ter esses falsos obreiros entre os coríntios.
Além disso, Paulo menciona que “pendências, invejas, iras, porfias, detrações, mexericos, orgulhos, tumultos” levariam a pecados maiores de “imundícia, fornicação e desonestidade”. Isso levaria toda a assembleia à destruição. Ele sabia que se não tivessem “se arrependido” de seus antigos pecados dos seus dias antes da conversão, tais pecados voltariam para suas vidas por meio da influência desses professores malignos.
J. N. Darby apontou que o capítulo 12 começa com o mais alto privilégio que um Cristão poderia ter e depois encerra com o mais baixo dos pecados que um Cristão poderia cometer. Entre os dois há “o poder de Cristo” disponível a todos os crentes para produzir o bem e deter o mal.
CONCLUSÃO: Em cada uma dessas marcas de um verdadeiro apóstolo, Paulo mostrou que fora aprovado e, portanto, era um apóstolo de fato. Ele também mostrou que os falsos mestres entre os coríntios não passaram no teste das marcas que distinguem um apóstolo e, assim, provaram que eram falsos apóstolos.
OBSERVAÇÕES FINAIS
Capítulo 13:1-2 – Paulo conclui a defesa de seu apostolado dando uma advertência solene em vista da aproximação de sua visita a Corinto. Se não houvesse arrependimento e correção por parte dos coríntios em relação à permissão dos falsos mestres no meio deles, ele acharia necessário demonstrar sua autoridade apostólica exercendo disciplina sobre eles.
Ele faz uma “terceira” proposta para ir até eles “pela segunda vez”, lembrando-lhes de que se fosse e os encontrasse em um estado tal como temia, ele “não lhes perdoaria”, mas trataria com a assembleia em julgamento. Tal, é claro, seria fundamentado em fatos bem comprovados, porque todas as ações disciplinares devem estar de acordo com o princípio: “Por boca de duas ou três testemunhas será confirmada toda a palavra”.
Capítulo 13:3-6 – Por meio da influência dos falsos apóstolos e obreiros entre os coríntios, eles realmente pediram a Paulo por “uma prova de que Cristo fala” por meio dele! Antes de responder a essa objeção, em um parêntese do meio do versículo 3 ao versículo 4, Paulo lhes diz que muitas vezes Deus trabalha por meio de fraqueza externa. Ele aponta para o próprio Senhor. O Senhor não era “fraco” para com os coríntios quando o evangelho os alcançou; Ele fez uma tremenda revolução em suas vidas abençoando-os por seu recebimento em fé como seu Salvador (v. 3b). Mas na vida e ministério do Senhor na Terra, estava cercado de fraqueza externa e foi “crucificado em fraqueza” (ARA). Contudo, na ressurreição, o Senhor vive “pelo poder de Deus”. Esse mesmo poder opera no ministério por meio dos fracos servos do Senhor para com os santos. Os coríntios, no entanto, veriam o poder de Deus para com eles de outra maneira, se continuassem a permitir aquele ambiente de falsos apóstolos circulando entre eles – e não seria uma coisa agradável. Paulo teria que exercer o juízo quando viesse.
Então, nos versículos 5-6, Paulo assume o desafio de seus opositores quanto a se Cristo estava realmente falando nele. Os falsos mestres entre eles haviam questionado seu apostolado, e os coríntios tolamente escutaram esses questionamentos. Mas eles eram as últimas pessoas que deveriam ter dúvidas sobre se Cristo havia falado por meio de Paulo. Isso mostra que estavam sob a influência da ideologia grega da época que idolatrava a força e a beleza humanas, e haviam interpretado erroneamente a fraqueza corporal de Paulo, e isso os levou a concluir que ele não era um apóstolo de Cristo. A resposta de Paulo a esses pensamentos mundanos é: “Examinai-vos a vós mesmos, se permaneceis na fé”. Sendo seus convertidos, eles eram a prova de seu apostolado. Se queriam credenciais, tudo o que tinham de fazer era olhar para si mesmos!
O versículo 5 tem sido frequentemente transformado em um apelo para autoexame, e até mesmo fez com que alguns duvidassem de sua salvação. As Escrituras não ensinam que devemos olhar dentro de nós mesmos para encontrar a certeza de nossa salvação; isso só levará às dúvidas e ao desânimo. Devemos olhar para trás, para a cruz, para agradecer a Ele por tudo o que fez; olhar para frente para confiar n’Ele para o que está por vir; olhar para cima para esperar Sua vinda a qualquer momento; olhar ao redor para servi-Lo; mas nunca olhar para dentro. A introspecção é uma coisa perigosa – invariavelmente leva à ocupação consigo mesmo e ao desânimo.
A certeza da nossa salvação provém de considerar o que Deus disse em Sua Palavra. O “testemunho” é encontrado em Sua Palavra (Hb 10:15-17), não em nós mesmos. Descansar na fé no que a Palavra de Deus diz sobre Cristo ressuscitado e nossa aceitação n’Ele é o que dá paz interior (Rm 8:1-6).
Paulo não estava pedindo que se engajassem no autoexame como prova de sua salvação, mas sim que encontrariam na sua própria salvação uma prova de seu apostolado. Com um tom de ironia, ele acrescenta que, a não ser, é claro, eles estivessem “reprovados” – impostores sem valor e inúteis. O que eles estavam insinuando de Paulo significava que eles mesmos não eram salvos! Se fosse esse o caso, então Cristo não estava falando por meio dele. No entanto, Paulo estava confiante de que depois de terem feito um exame rápido de si mesmos como estando definitivamente na fé, eles saberiam que ele não era um impostor, mas um apóstolo de fato. Ele diz: “Mas espero que entendereis que nós não somos reprovados” (v. 6).
Oração do Apóstolo pelos Coríntios
Vs. 7-10 – No encerramento da epístola, Paulo expressa seu desejo e oração por eles como uma assembleia. Ele ora para que eles “não façam mal” em desafiar seu apostolado e permitir que os falsos mestres tenham livre domínio na assembleia. Ele deixa claro que sua oração não era para que ele e seus cooperadores fossem “achados” em uma melhor luz e fossem “aprovados”, mas que eles se comportassem corretamente como uma assembleia Cristã deveria ser nestes assuntos. Em outras palavras, não queria que fizessem isso apenas para que ele e seus cooperadores parecessem aprovados, mas que continuariam corretamente, mesmo que isso significasse que ele, e aqueles com ele, parecessem “reprovados”. Aqui vemos outro exemplo da disposição de Paulo em sacrificar sua reputação pessoal se isso significasse que outros seguiriam com o Senhor. Isso mostrou que não estava no ministério para se promover. O Sr. W. MacDonald disse: “Se Paulo fosse a Corinto com uma vara e afirmasse sua autoridade, e conseguisse obter obediência às suas instruções relativas à disciplina, então ele poderia usar isso como um argumento contra os falsos mestres. Ele poderia dizer que isso era evidência de sua autoridade legal. Mas ele preferiria que os coríntios tomassem as medidas necessárias sozinhos, na sua ausência, mesmo que isso pudesse colocá-lo sob uma luz desfavorável no que diz respeito aos legalistas”.
V. 8 – Paulo e os outros apóstolos fizeram apenas aquilo que promovia “a verdade”. Ao dizer isso, ele queria apagar qualquer pensamento que eles pudessem ter tido de que estava agindo em vingança pessoal em relação aos falsos mestres; todas as suas instruções eram “pela verdade” e pela glória de Deus.
V. 9 – Paulo também orou pelo “aperfeiçoamento” (ARA) deles quanto à sua condição coletiva como assembleia. Ele diz que, se sua fraqueza, humilhação e reprovação resultassem no fortalecimento deles nas coisas de Deus, então ele estaria “feliz” (KJV) por isso. Isso novamente mostra a total abnegação do apóstolo.
V. 10 – Ele explica porque escreveu a epístola. Ele escreveu “estando ausente” deles, esperando que isso os exercitasse ainda mais para corrigir os problemas remanescentes entre eles – a saber, a permissão de falsos mestres entre eles e o questionamento do apostolado de Paulo. “Estando presente” com eles, teria de “usar rigor” de acordo com seu poder apostólico e, assim, iria tratar com o mal que ainda estava no meio deles. Mas ele não queria fazer isso, porque o primeiro propósito de seu poder apostólico era para a “edificação” dos santos, e não para sua “destruição”. Ele já havia mencionado isso no capítulo 10:8.
A Saudação Final
Vs. 11-14 – Então, na saudação final, vemos que Paulo não pretendia apenas restaurar a comunhão dos coríntios consigo mesmo, mas também uns com os outros e com todos os santos – e com “o Deus de amor e paz”.
Cinco Curtas Exortações
Ele dá cinco breves exortações. Se essas coisas fossem praticadas, os coríntios teriam uma assembleia feliz e saudável.
A primeira exortação é “regozijai-vos”. Isso só resultaria ao seguir em comunhão com o Senhor.
A segunda é “sede aperfeiçoados” (JND). Esta é uma referência ao cumprimento de sua responsabilidade em lidar com a questão pendente em seu meio – ou seja, permitir que os falsos mestres ministrem.
A terceira é “sede encorajados” (JND). Esta é uma referência direta à necessidade de receber as admoestações que Paulo lhes deu nesta carta em um bom espírito.
A quarta é “tende um mesmo espírito” – (TB). Isso estava ligado à sua necessidade de ter unidade de pensamento na assembleia.
A quinta é “vivei em paz”. Isso resultaria de terem unidade de pensamento o que levaria à unidade de ação, que é tão importante na vida em assembleia.
Se os coríntios considerassem essas exortações finais, eles poderiam contar com “o Deus de amor e paz” estando “com” eles. Ele já estava no meio deles, mas se continuassem em bom estado, isso seria manifestado em poder.
- “Saudai-vos uns aos outros com ósculo santo” (v. 12) é uma expressão da comunhão uns com os outros. - “Todos os santos” saúdam os coríntios (v. 13), é uma expressão da comunhão com outras assembleias. - “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo seja com vós todos” (v. 14) é comunhão com a Divina Trindade.
CONTRACAPA
O apóstolo Paulo escreveu a primeira epístola aos coríntios para corrigir uma série de coisas fora de ordem entre eles. De um modo geral, ela produziu resultados positivos, porém depois de escrever, ele ficou preocupado se algo ocorreria. No entanto, houve bons resultados; eles lamentaram seus erros, se arrependendo e colocando aquelas coisas em ordem.
As razões de Paulo escrever esta segunda epístola foram:
- Explicar por que ele não foi para Corinto quando disse que iria. - Exortar os santos de Corinto a mostrar graça e perdoar o homem arrependido que havia sido tirado da comunhão. - Expor o grupo de difamadores, aos quais chama de “falsos apóstolos” e “obreiros fraudulentos” que estavam fazendo a obra de Satanás entre os coríntios, fazendo-os desconfiar do apóstolo e questionar seu ministério. - Encorajar os santos em Corinto a se envolverem no ministério de dar.
O resultado da escrita da epístola é que nos foi dada uma imagem maravilhosa das características de um verdadeiro ministro Cristão, como visto no próprio Paulo.
IMPRESSO NO BRASIL
Notas
[←1]
- N. do T.: A palavra grega Aoristos significa sem limite. Numa tradução mais livre, significa indefinido ou indeterminado. Indica uma ação que ocorreu pontualmente em algum momento do passado, sem relacioná-la com o presente. A ação ocorre uma única vez, de uma vez por todas.