Bruce Anstey

A Importância de Ter um Espírito Correto

Mantendo uma Atitude Correta ao Interagir com Outros

Bruce Anstey

A IMPORTÂNCIA DE TER UM ESPÍRITO CORRETOMantendo uma Atitude Correta ao Interagir com Outros

Bruce Anstey

Originalmente publicado por:

CHRISTIAN TRUTH PUBLISHING

9-B Appledale Road

Hamer Bay (Mactier) ON P0C 1H0

CANADÁ

christiantruthpublishing@gmail.com

Título do original em inglês**: THE IMPORTANCE OF HAVING A RIGHT SPIRITE** – _Maintaining a Right Attitude in Interacting With Others_

Segunda edição – janeiro 2007

Traduzido, publicado e distribuído no Brasil com autorização do autor por:

ASSOCIAÇÃO VERDADES VIVAS, uma associação sem fins lucrativos, cujo objetivo é divulgar o evangelho e a sã doutrina de nosso Senhor Jesus Cristo.

atendimento@verdadesvivas.com.br

Primeira edição em português – fevereiro 2020

e-Book v.1.0

Abreviaturas utilizadas:

ARC – João Ferreira de Almeida – Revista e Corrigida – SBB 1969

ARA – João Ferreira de Almeida – Revista e Atualizada – SBB 1993

TB – Tradução Brasileira – 1917

ACF – João Ferreira de Almeida – Corrigida Fiel – SBTB 1994

AIBB – João Ferreira de Almeida – Imprensa Bíblica Brasileira – 1967

JND – Tradução inglesa de John Nelson Darby

KJV – Tradução inglesa King James

Todas as citações das Escrituras são da versão ARC, a não ser que outra esteja indicada.

A Importância de Ter um

Espírito Correto

Regina, Canadá – 3 de agosto de 2008

Vamos ler quatro versículos que tenho no meu coração.

- “O Senhor Jesus Cristo, seja com o teu espírito. A graça seja convosco. Amém” (2 Tm 4:22). - “A graça do Senhor Jesus Cristo seja com o vosso espírito” (Fp 4:23 – AIBB). - “A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja, irmãos, com o vosso espírito. Amém” (Gl 6:18). - “A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja com o vosso espírito. Amém” (Fm 25).

É interessante e instrutivo ver o apóstolo Paulo encerrando quatro de suas epístolas com estas palavras de admoestação. Elas têm relação com ter um espírito correto, algo de que todos nós precisamos desesperadamente. Estas declarações não são redundantes porque nada na Palavra de Deus é redundante. Elas foram escritas para quatro pessoas diferentes (ou grupos de pessoas) por quatro razões diferentes. O contexto e as circunstâncias em que Paulo escreveu cada uma delas toca em quatro áreas sensíveis de nossa vida onde temos de ser especialmente cuidadosos em manter um espírito correto.

Gostaria de ver cada uma dessas situações com o objetivo de aprender algo com elas para nossa vida. Gostaria também de olhar para quatro indivíduos no Velho Testamento que ilustram cada uma destas situações. Queridos amigos, precisamos dessas exortações nestes dias finais da história da Igreja, tanto quanto a Igreja primitiva precisou quando Paulo as escreveu.

Vamos voltar agora e ver o contexto de cada uma dessas palavras de admoestação e tentar obter uma lição delas.

Um Espírito Correto em um Dia em que o Testemunho Cristão Está em Ruínas

(2 Timóteo 4:22)

“O Senhor Jesus Cristo seja com o teu espírito”. O contexto em que Paulo deu esta exortação a Timóteo foi a ruína e o fracasso do testemunho Cristão nos últimos dias. Ele lhe disse em termos inequívocos que havia uma ruína irremediável chegando, e advertiu sobre os males que permeariam toda a profissão. Ele lhe deu uma descrição gráfica de todos os aspectos do grande abandono e não era uma imagem bonita. Haveria um abandono indiscriminado da verdade de Deus e muitas coisas seriam feitas em nome de Cristo que seriam uma desonra pública notória.

Os Cristãos hoje se encontram tão divididos e com opiniões e doutrinas tão diferentes que seria difícil para um observador honesto discernir o que é realmente o Cristianismo. Quase todo mal imaginável é permitido no Cristianismo hoje – até ao ponto onde dá vergonha ser identificado como Cristão. Gandhi, o ex-primeiro-ministro da Índia, disse: “Se não fosse pelos Cristãos, eu teria sido um!” Temos que baixar nossa cabeça em vergonha porque fazemos parte do testemunho Cristão corrompido que desonrou o Senhor.

Esta epístola foi escrita para encorajar Timóteo a servir tendo em vista o momento difícil que viria. Paulo passa para ele muitos indicadores úteis que iriam guiá-lo em seu serviço. Tendo em vista tudo o que estava por vir, há um espírito e maneira corretos em que os Cristãos devem se comportar, de modo a não trazer mais desonra para o nome do Senhor. Se alguma vez houve um dia em que uma pessoa precisava ter um espírito correto, é hoje. Portanto, antes de terminar a epístola, o apóstolo deu a Timóteo as palavras necessárias de admoestação: “O Senhor Jesus Cristo seja com o teu espírito”.

Nestas circunstâncias, há duas atitudes em particular contra as quais temos de nos proteger. São elas:

1) Desânimo

Podemos entender muito bem como Timóteo deve ter ficado desanimado quando pensamos em todas as coisas que Paulo disse que estavam acontecendo no testemunho Cristão e as que iriam acontecer. Viria o tempo em que aqueles que professam o nome de Cristo iriam desviar seus “ouvidos da verdade” (2 Tm 4:4). Tais são os dias em que vivemos. Você pode ser tentado a levantar os braços e dizer: “Não tem jeito; não há esperança. Quando tento falar da verdade a alguém, ele não quer saber.” Provavelmente todos aqui tivemos essa experiência. Assim, você pode ver como deve haver uma tendência a ficar desanimado nestes dias.

Quando vemos tais condições desanimadoras, temos a tentação de buscar o isolamento ao invés de tentar andar com o povo de Deus. Você já teve um pensamento como esse? Com todas as situações difíceis e frustrantes ao nosso redor, podemos querer fazer isso, mas o isolamento não é a resposta. Paulo nunca apresenta essa opção a Timóteo. Não, mas ter um espírito correto é a resposta. Se estamos deixando as coisas nos levar até o ponto onde queremos desistir, algo ficou fora de foco.

Um desânimo deste tipo vem geralmente de se ocupar com a falha. Estejamos atentos quanto a isto; aqueles que estão habitualmente ocupados com a falha se tornarão falhos! Devemos estar ocupados com o Senhor Jesus Cristo e o que diz respeito aos Seus interesses na Terra. Este é o nosso foco adequado; não a ruína e as falhas entre o povo de Deus. Há alguns que têm mais dificuldade com isso do que outros. Parece que eles sempre querem falar sobre os problemas que existem. Digo-lhes que não é uma ocupação saudável.

Havia um irmão que tinha um problema crônico com isso, e o Sr. Hayhoe disse a ele: “Se você tem que ser melancólico, seja um melancólico agradável”. É verdade que Deus quer que sintamos o estado das coisas, mas não tanto ao ponto de querer desistir. Precisamos orar pelo estado atual das coisas e assumir nossa parte no fracasso, como Daniel fez em relação à condição arruinada de Israel (Dn 9). Oremos por ouvidos para ouvir e olhos para ver, porque Deus ainda está trabalhando nestes dias. Haverá sempre alguns que receberão a verdade, mesmo que as massas não o façam.

Uma das razões pelas quais temos de ter cuidado em não desanimar é que o desânimo é contagioso. Podemos desencorajar os outros! Pedro é um exemplo disso. Ele estava desanimado, após ter falhado, e isso afetou os outros discípulos. Ele lhes disse: “Eu vou pescar” (Jo 21:3). É como se ele tivesse dito: “vou voltar ao meu antigo trabalho, porque eu falhei e não acho que o Senhor vai me usar mais em seu serviço.” E os outros discípulos responderam: “Também nós vamos contigo.” Isso é realmente triste – Pedro deixou seu desânimo afetar seus irmãos, e os sete se afastaram da obra a que o Senhor os chamou. Digo-vos, o desânimo é contagioso. Precisamos ter o cuidado de, quando chegamos às reuniões, incentivar nossos irmãos e não os desencorajar.

2) Orgulho

A outra atitude que precisamos estar em guarda contra ela é o orgulho. Isso pode rastejar para dentro de nós sem que percebamos. Se houve algum tipo de fidelidade da nossa parte, pode haver uma tendência de menosprezarmos, com pensamentos depreciativos sobre os nossos irmãos que não mostrem o mesmo interesse que temos. Precisamos ter cuidado com isso. Existe o perigo de ficar inchado de orgulho e pensar que somos melhores do que os nossos irmãos. Estamos indo na direção da queda quando esse é o caso, porque “A soberba precede a ruína, e a altivez do espírito precede a queda” (Pv 16:18).

Não queremos nos ocupar do fracasso ao nosso redor, nem queremos ficar ocupados com nossa própria fidelidade, se há alguma em nossa vida. Você pode entender por que Paulo disse isso a Timóteo. Muitos estavam abandonando o apóstolo. Ele disse: “os que estão na Ásia todos se apartaram de mim” (2 Tm 1:15). Ele também disse: “Só Lucas está comigo” (2 Tm 4:11). Não restaram muitos com disposição para servir o Senhor da maneira que o apóstolo queria e você pode ver que existia o perigo de Timóteo ter a ideia de que ele era melhor do que seus irmãos.

Você sabe, uma atitude de superioridade é uma coisa perigosa entre o povo do Senhor. Os santos reunidos precisam estar especialmente atentos contra isso porque foram extremamente privilegiados, tendo sido expostos a muita verdade que se perdeu por séculos. Podemos ter uma atitude sobre isso que certamente desagrada ao Senhor. Podemos ter a ideia de que somos melhores do que nossos irmãos que foram espalhados nas várias denominações, e achar que somos “os poucos fiéis” que restaram. É possível estar correto na doutrina, correto em princípio e até mesmo correto na conduta externa, mas estar errado em espírito. Podemos ter uma atitude que vai desviar outros Cristãos ao invés de atraí-los para a verdade.

O servo do Senhor precisa entender que qualquer fidelidade que tenha havido em sua vida é inteiramente por causa da obra da graça de Deus. Precisamos servir com um profundo sentimento de que não somos em nada melhores do que qualquer um de nossos irmãos nas denominações. Não temos nada a nos vangloriar, senão na graça pura e soberana de Deus.

Elias

Como falado, quero ilustrar cada uma dessas condições com uma figura do Velho Testamento. Para esta primeira condição, vamos ver Elias. Ele ilustra ambas as atitudes erradas das quais falei. Vamos voltar para 1 Reis 19:1-10. “E Acabe fez saber a Jezabel tudo quanto Elias havia feito, e como totalmente matara todos os profetas à espada. Então Jezabel mandou um mensageiro a Elias, a dizer-lhe: Assim me façam os deuses, e outro tanto, se de certo amanhã a estas horas não puser a tua vida como a dum deles. O que vendo ele, se levantou, e, para escapar com vida, se foi, e veio a Berseba, que é de Judá, e deixou ali o seu moço. E ele se foi ao deserto, caminho de um dia, e veio, e se assentou debaixo de um zimbro: e pediu em seu ânimo a morte, e disse: Já basta, ó Senhor: toma agora a minha vida, pois não sou melhor do que meus pais. E deitou-se, e dormiu debaixo dum zimbro: e eis que então um anjo o tocou, e lhe disse: Levanta-te, come. E olhou, e eis que à sua cabeceira estava um pão cozido sobre as brasas, e uma botija de água: e comeu, e bebeu, e tornou a deitar-se. E o anjo do Senhor tornou segunda vez e o tocou, e disse: Levanta-te e come, porque mui comprido te será o caminho. Levantou-se pois, e comeu e bebeu: e com a força daquela comida caminhou quarenta dias e quarenta noites até Horebe, o monte de Deus. E ali entrou numa caverna e passou ali a noite: e eis que a palavra do Senhor veio a ele, e lhe disse: Que fazes aqui Elias? E ele disse: Tenho sido muito zeloso pelo Senhor Deus dos Exércitos, porque os filhos de Israel deixaram o teu concerto, derribaram os teus altares, e mataram os teus profetas à espada, e eu fiquei só, e buscam a minha vida para ma tirarem.”

Elias caiu no desânimo, mas ele também se tornou cheio de orgulho. Seu desânimo surgiu de os filhos de Israel se voltarem por completo ao culto de Baal que Jezabel havia introduzido. Ele tinha feito todo o possível para afastar as pessoas disso, mas sem obter sucesso. É verdade que ele matou os profetas de Baal, mas as pessoas ainda tinham o coração nisso. E agora havia uma mulher ímpia que estava controlando o reino, e ela o estava buscando para matá-lo. Era uma época muito desanimadora para se viver se uma pessoa quisesse agradar ao Senhor. Elias não podia suportar mais e sua fé falhou. Então fugiu para salvar sua vida. No capítulo 17, ele tinha estado diante de Deus; no capítulo 18 ele estava diante de Acabe e de todo Israel, mas no capítulo 19 ele foge de uma mulher!

Elias deixa a terra de Israel e vai para o isolamento, pensando que essa é a resposta. Ele deitou-se sob uma árvore de zimbro em desânimo, mas é bom ver o Senhor cuidando dele. Ele vem com graça e encontra Elias em seu desânimo, dando-lhe algo que o fortaleceria para que ele pudesse voltar para a terra de Israel e continuar como um profeta do Senhor. Mas Elias pegou a comida que o anjo lhe deu e continuou indo na direção errada, até o Monte Sinai, onde a lei foi dada. Quando ele chega lá, se esconde em uma caverna e desiste.

É claro que desistir assim não é bom. Não é uma opção para nós. A escritura nos diz para não abandonar “a nossa congregação, como é costume de alguns” (Hb 10:25). Elias deixou seu desânimo levá-lo até o ponto onde este se transformou em vontade própria. Ele pegou o fornecimento de comida e água que o Senhor lhe deu e o usou para ir mais longe de seu local de testemunho! Deus entende quando ficamos desanimados e o Senhor nos alcançará em nosso desânimo e nos encorajará. Mas se agirmos em vontade própria, o que podemos esperar é o Senhor ficar descontente conosco. Elias ilustra essa atitude de desânimo.

No versículo 10, quando o Senhor fala com ele, o vemos manifestar uma atitude de orgulho. Ele disse: “Tenho sido muito zeloso pelo Senhor”. Você pode ver, por sua resposta, que ele tinha o problema do egocentrismo. Ele estava muito orgulhoso de ter sido fiel, e isso não era bom. Então ele diz: “os filhos de Israel deixaram o Teu concerto, derribaram os Teus altares, e mataram os Teus profetas à espada”. Isso era verdade, mas ele estava apontando falhas, com a infidelidade de seus irmãos, com uma atitude condenatória e isso também não era bom. Então disse: “eu, somente eu, fiquei” (TB). Oh aí está, pensou que era o único correto! Isto é triste; ele não tinha um espírito correto. O Senhor lhe respondeu e disse que ele não era o único correto. O Senhor tinha “sete mil em Israel” que não tinham dobrado os joelhos para Baal (v. 18). Isso nos mostra que, mesmo no dia mais sombrio, Deus terá alguns com quem podemos caminhar.

Ter esse tipo de atitude é uma coisa muito séria e vemos o que o Senhor pensa dela aqui. Ele descarta Elias como Seu profeta! Os dias de seu ministério público em Israel acabaram. Foi-lhe dito para ir e ungir Eliseu, que iria tomar o seu lugar (v. 16). A lição que devemos aprender aqui é que Deus não pode nos usar se tivermos uma atitude de superioridade. Talvez Paulo estivesse pensando que Timóteo poderia cair nisso. Se ele desenvolvesse um espírito errado, ele seria removido de um lugar de utilidade no testemunho Cristão, então ele lhe deu a palavra de conclusão: “O Senhor Jesus Cristo esteja com o teu espírito”.

Podemos ter uma atitude como a de Elias e Deus pode nos remover da assembleia reunida em nome do Senhor. É possível que o Senhor venha a nos peneirar se tivermos um espírito errado. Vou te dar um versículo que mostra isso. “tirarei do meio de ti os que exultam na sua soberba, e tu nunca mais te ensoberbecerás no Meu monte santo. Mas deixarei no meio de ti um povo humilde e pobre; e eles confiarão no nome do Senhor” (Sf 3:11-12). Irmãos, vamos ter a certeza de ter um espírito correto em todos os momentos.

Um Espírito Correto em Situações Tensas na Assembleia Local

(Filipenses 4:23)

Vamos olhar agora para o comentário de Paulo para os filipenses. “A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja com vós todos. Amém”. O contexto aqui, que exigia a palavra de advertência de Paulo, é bem diferente do contexto de 2 Timóteo. A unidade da assembleia local em Filipos estava sendo ameaçada e eles precisavam deste comentário final do apóstolo. Na verdade, havia duas irmãs naquela assembleia que não estavam se dando bem (Fp 4:2) e Paulo sabia que se isso não fosse tratado, poderia polarizar os santos na assembleia e causar uma divisão definitiva. Você poderia dizer: “Mas eram apenas duas irmãs que não estavam se dando bem; como elas poderiam ter tal efeito sobre a assembleia?” Bem, isso só nos mostra que os problemas nas assembleias geralmente começam com algo pequeno. Todos afetamos um ao outro, quer percebamos ou não. A Escritura diz: “Porque nenhum de nós vive para si, e nenhum morre para si” (Rm 14:7).

O apóstolo Paulo deu aos filipenses um remédio para o problema de forma que eles pudessem ser proativos e enfrentar a situação antes de esta causar dano. Ele disse: “De sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora na minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e tremor” (Fp 2:12). Isto se refere a uma salvação prática e coletiva da assembleia que os filipenses deveriam resolver entre si na ausência de Paulo.

Muitos Cristãos tomaram este versículo descuidadamente fora do contexto. Parece que eles não percebem que há uma série de diferentes aspectos da salvação na Escritura. Quando se deparam com as palavras “salvo” ou “salvação”, imaginam que deve estar se referindo à salvação de nossa alma da pena de nossos pecados, conforme anunciado no evangelho. Eles concluem que o apóstolo estava dizendo aos filipenses que precisavam obter sua salvação, que receberam pela fé no evangelho, e a expor em suas vidas para que outros pudessem vê-la. Então as pessoas saberiam que eram verdadeiramente crentes no Senhor Jesus. Isso é um pensamento agradável, mas não é o que este verso está falando. Não é o contexto do capítulo.

O assunto aqui é uma salvação prática e coletiva da assembleia, contra as incursões do inimigo. Satanás gostaria de fazer estragos na assembleia, destruindo-a internamente, interrompendo a unidade e criando divisão. Poderíamos perguntar: “Como eles deveriam resolver sua própria salvação?” O apóstolo lhes disse, no segundo capítulo, que o remédio estava em seguir o padrão do Senhor Jesus em Sua humildade e abnegação (vs. 5-8). Tendo-lhes dado o padrão, Paulo estava dizendo: “vocês precisam operá-la entre vocês mesmos”.

Porém, não sou tão ingênuo a ponto de pensar que as assembleias reunidas ao nome do Senhor não têm tais problemas de vez em quando. Mas eu diria o seguinte: a salvação, neste sentido, não virá por meio de algum “cavaleiro de armadura reluzente” que visite a assembleia. Não, Deus não permitirá que a libertação venha por meio de um irmão visitante. Ele quer que aqueles que compõem a assembleia local trabalhem entre si, imitando a atitude humilde do Senhor Jesus, que desceu, passo a passo, sete vezes neste capítulo. Eu apressar-me-ia a dizer, no entanto, que a assembleia em Filipos estava, no geral, em um bom estado, mas havia um perigo da desunião. O apóstolo estava sendo proativo.

Algumas dessas dificuldades que se desenvolvem nas assembleias locais podem ser rastreadas até algo tão simples como palavras descuidadas. Há uma expressão muito popular que até as crianças dizem no pátio da escola, “Palavras não me atingem” Quero dizer que isso não é verdade! É falso. Palavras e insultos machucam. Provérbios 26:22 diz: “As palavras do maldizente são como bocados vorazes, que descem ao mais íntimo do ventre” (JND). Muitas vezes palavras causam mágoas, e às vezes as pessoas não superam isso. Fofocas são igualmente perigosas. Temos que ter cuidado, irmãos. Estou falando comigo mesmo tanto quanto eu estou falando para vocês neste assunto. Há um velho provérbio (não na Bíblia) que diz: “Aquele que vai fofocar para você vai fofocar sobre você.” E descobri que isso é verdade.

Um irmão, que conheço bem, entrou em uma assembleia onde havia condições conturbadas, e ele disse: “Quando entrei eu vi ‘nitro’ de um lado da sala, e eu olhei e vi ‘glicerina’ do outro lado, e eu sabia que tínhamos o potencial de uma bomba explodindo na reunião!” Isso não deveria ocorrer, mas às vezes ocorre. A resposta é “operai a vossa salvação com temor e tremor”. Temor de quê? Precisamos temer o inimigo trabalhando em nosso meio para destruir a feliz condição de paz. Há carne suficiente em qualquer um de nós para destruir toda a reunião! E Satanás quer, se puder, nos usar para esse fim.

Os dois grandes inimigos da unidade são ambição e exibicionismo. Ambos não têm lugar na assembleia. Precisamos do que Paulo diz no final do terceiro versículo: “cada um considere os outros superiores a si mesmo”. A melhor ilustração disso é o profeta Ezequiel. Ele disse: “Ainda que estivessem no meio dela estes três homens, Noé, Daniel e Jó (Ez 14:14). Ele colocou Daniel – um contemporâneo dele – no mesmo plano que os dois patriarcas notáveis dos tempos antigos! Ele falou de Daniel nos mesmos termos como aqueles velhos homens reverenciados e isso mostra que não havia um pensamento de ciúme no coração de Ezequiel. Ele obviamente amava e valorizava Daniel e falava dele respeitosamente. Irmãos, esse é o espírito que precisamos ter em relação aos nossos irmãos na assembleia.

Se houver um impasse na assembleia, precisamos descer e tomar o lugar mais baixo. Lembro-me de ouvir de um homem que estava viajando em um caminho pelas montanhas nos Andes com sua mula totalmente sobrecarregada. A estrada era extremamente estreita, o suficiente para apenas um viajante de cada vez. A estrada foi esculpida na montanha tendo um penhasco íngreme ao lado. Ele prosseguiu, serpenteando uma curva após a outra. Quando chegou no meio de uma curva, o que você acha que ele viu? Outro homem com sua mula totalmente sobrecarregada olhando para ele! O que eles iam fazer? Os dois homens discutiram as possibilidades. Eles perguntaram um ao outro se eles poderiam se lembrar de a que distância se encontrava o lugar onde o caminho se alargava para que dois pudessem passar. Talvez eles pudessem conduzir os animais até aquele ponto. Outra ideia era descarregar os animais. Mas enquanto os homens discutiam isso, as duas mulas descobriram um meio. Uma ficou de joelhos e ficou o mais perto possível da montanha, então a outra passou em torno dela! O ponto que eu estou chamando a atenção aqui irmãos é que, se um impasse na assembleia ocorre, a resposta para cada um de nós é se abaixar, tomar o lugar de submissão e deixar nossos irmãos passar por nós.

Gideão

Vamos abrir em Juízes 8:1-3 para uma ilustração de como devemos lidar com condições conturbadas e problemáticas que surgem entre os irmãos. “Então os homens de Efraim lhes disseram: Que é isto que nos fizeste, que não nos chamaste, quando foste pelejar contra os midianitas? E contenderam com ele fortemente. Porém ele lhes disse: Que mais fiz eu agora do que vós? não são porventura os rabiscos1 de Efraim melhores do que a vindima de Abiezer? Deus vos deu na vossa mão aos príncipes dos midianitas, Orebe e Zeebe; que mais pude eu logo fazer do que vós? Então a sua ira se abrandou para com ele, quando falou esta palavra.”

Os efraimitas eram um povo orgulhoso. Eles, na realidade, disseram de si mesmos: “sendo eu um tão grande povo” (Js 17:14). Eles eram a maior tribo numericamente e tinham o maior pedaço de terra na herança. Eles também tinham o tabernáculo em uma de suas cidades (Siló), onde todas as outras tribos tinham que vir adorar. Estas coisas alimentavam o orgulho deles. Eles pensavam que se alguma coisa tivesse de ser feita em Israel, seria feita, afinal de contas, por e através deles! Quando Gideão agiu por Deus e alcançou uma vitória sobre os midianitas, os efraimitas naturalmente quiseram ter parte nessa glória. Temos aqui uma imagem da ambição e do exibicionismo de que estávamos falando. Às vezes, há pessoas como essas na assembleia e isso traz, para alguns, momentos de bastante prova.

Bem, como Gideão enfrentou isso? Ele o enfrentou com a “mansidão e benignidade de Cristo” (2 Co 10:1). A Bíblia nos diz: “A resposta branda desvia o furor” (Pv 15:1), e isso é exatamente o que aconteceu aqui. Gideão apaziguou os efraimitas. O que ele estava realmente fazendo é o que Paulo disse aos filipenses para fazer, “cada um considere os outros superiores a si mesmo”. Ele diz a eles: “O que eu fiz em comparação com vocês? Você fez muito mais do que eu. Porque a quantidade de uvas deixadas após a colheita em Efraim é maior do que toda a colheita em Abiezer (cidade de Gideão)”. Além disso, ele se firma no fato de que eles haviam capturado os príncipes dos midianitas que eram pessoas importantes do exército midianita e lhes dá o crédito por esse bom trabalho.

A atitude de Gideão estava correta, mas não desculpa a má atitude dos efraimitas. Se não nos julgarmos, mais cedo ou mais tarde vamos nos deparar com alguém que não vai recuar e haverá um repugnante confronto. Isto é exatamente o que aconteceu com os efraimitas no capítulo 12. Eles conheceram um homem (Jefté) que não era do mesmo caráter que Gideão, e faíscas começaram a voar. A coisa explodiu em uma guerra total entre o povo de Deus e muitos foram mortos. Acredito que foi a primeira guerra civil em Israel.

Se comparamos passagens em outros lugares no livro de juízes, aprenderemos que havia uma linhagem ruim entre os efraimitas. Juízes 12:15 nos diz que os amalequitas realmente habitaram entre os efraimitas. Quando a tribo de Efraim entrou para tomar sua porção na terra, nos dias de Josué, eles “não os expeliram de todo” (Js 17:13). Assim, eles se estabeleceram entre os amalequitas. Então lemos em Juízes 5:142 que alguns deles tinham uma “raiz” em Amaleque, porque os efraimitas haviam se casado com os amalequitas! Isso era inevitável. Primeiro eles habitaram entre os amalequitas e então começaram a se casar com eles.

Como você sabe, na Escritura os amalequitas falam da carne e das operações de Satanás. Isso explica por que os efraimitas eram tão carnais. Desnecessário dizer que vamos nos deparar com pessoas com este tipo de personalidade na assembleia e vai ser preciso graça para lidar com eles em um espírito correto. Se não o fizermos, poderemos facilmente destruir a unidade da assembleia. A personalidade efraimita na assembleia terá sua disciplina no tempo certo de Deus. Cedo ou tarde eles vão encontrar o “Jefté” deles, mas não deixe que este seja você. O Senhor não é indiferente às injustiças de Seu povo. Nada na assembleia passa sem que Ele perceba, e se for preciso ser tratado, Ele o trará à tona.

Um Espírito Correto Quando Somos Corrigido por Outros

(Gálatas 6:18)

Vamos agora para Gálatas 6:18. “A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja**, irmãos, com o vosso espírito.”** Aqui temos a mesma palavra de advertência dada aos gálatas, mas é por uma razão totalmente diferente. Os gálatas tinham absorvido uma doutrina terrivelmente errada em relação à lei e à graça e precisavam ser corrigidos. O apóstolo Paulo escreveu para corrigir o erro deles e, antes de terminar sua epístola, lhes deu esta palavra necessária. Conhecendo as tendências da natureza humana, Paulo tinha razões para acreditar que eles poderiam se ressentir de ele lhes ter falado da maneira firme que falou. Então, em graça, encerrou com esta palavra de advertência. Ele desejava que eles recebessem a correção em um espírito correto e não se ofendessem com o que ele disse.

Irmãos, precisamos estar dispostos a ser corrigidos. Há uma tendência natural (mas carnal) em nosso coração para reagir de uma maneira errada quando alguém nos fala sobre algo que estamos fazendo de errado. Podemos abrigar sentimentos de ressentimento. Nenhum de nós gosta de ser corrigido porque o nosso orgulho está em jogo e quanto mais velhos ficamos, mais difícil é receber correção. Queridos irmãos mais jovens, isso significa que o momento de aprender a verdade é agora quando você é jovem, porque se você tem algum ponto errado de doutrina, quanto mais velho você fica, mais difícil será para você aceitar os ajustes necessários. Este não deveria ser o caso, porque à medida que amadurecemos na família de Deus, deveríamos ser mais brandos, mas geralmente não é o caso! Eu costumava dizer: “Você simplesmente não pode corrigir alguém que tem mais de 50 anos de idade!” Observe que eu disse, “Eu costumava dizer isso” – Eu tenho mais de 50 anos agora e eu sei o quão difícil é. Um velho pregador há muito tempo orou antes de dar seu sermão: “Senhor, ajude-me a falar corretamente na primeira vez porque Tu sabes como é difícil para mim admitir que estou errado”. Irmãos, aquele velho pregador não é o único que tem essa dificuldade!

Eu acho que você sabe o que quero dizer. As três palavras mais difíceis de se dizer em cada língua no mundo, se é alemão, ou chinês, ou russo etc., é, “eu estava errado!” Tenho dificuldade em dizer isso à minha mulher. Se eu tenho dificuldade em dizer isso a ela, como vou dizer isso aos meus irmãos? Que o Senhor nos ajude a todos com isso.

Rute

A pessoa no Velho Testamento que ilustra de uma bela maneira um espírito correto ao ser corrigida é Rute. Vamos voltar para Rute 2:21-23 para ver isso. “E disse Rute, a moabita: Também (Boaz) ainda me disse: Com os moços que tenho te ajuntarás, até que acabem toda a sega que tenho. E disse Noemi, a sua nora, Rute: Melhor é, filha minha, que saias com as suas moças, para que noutro campo não te encontrem. Assim, ajuntou-se com as moças de Boaz, para colher até que a sega das cevadas e dos trigos se acabou; e ficou com a sua sogra.” E então, no capítulo 3:10, “E disse ele (Boaz): Bendita sejas tu do Senhor, minha filha; melhor fizeste esta tua última beneficência do que a primeira, pois após nenhuns mancebos foste, quer pobre quer rico.”

No versículo 8 do capítulo 2 Boaz tinha dito a Rute para ficar próxima de suas donzelas durante a colheita. Ela estava muito feliz e animada ao saber do favor dele em relação a ela e, quando chegou em casa, disse à sua sogra o que tinha acontecido. Ela disse que Boaz queria que ela ficasse junto com os rapazes, o que de alguma forma em sua excitação ela havia se enganado. Ele nunca disse isso a ela. Garotas que gostam de correr atrás de rapazes podem gostar dessa palavra, mas Rute estava enganada. Naomi, que agora estava restaurada, teve o discernimento de saber que ele não teria dito isso a ela e corrige o mal-entendido de Rute. Ela diz a ela para ficar entre as moças de Boaz e assim Rute fez. Mais tarde, a coisa que Boaz notou e apreciou sobre ela foi que ela não correu atrás dos jovens. Não é isto bonito? Ela aceitou o ajuste e a correção em um espírito correto e Deus trabalhou as coisas em sua vida para que ela colhesse o benefício.

Irmãos, podemos aceitar a correção? Se você pode, você vai obter bênção disso. Eu tenho uma grande admiração por aqueles que podem dizer que estão errados, porque eu sei como é difícil fazê-lo. Às vezes, Deus nos permitirá sermos corrigidos por uma pessoa que previamente já teve esse mesmo espírito. Talvez pensemos que ele não tem o direito de falar conosco, porque ele mesmo falhou nessa mesma coisa, mas ele pode muito bem ser aquele que Deus vai usar para expor a nossa má atitude. Independentemente de por quem vem a correção, precisamos de graça para aceitá-la e se beneficiar com isso. Nós todos “frequentemente ofendemos” (Tg 3:2 – JND) e precisamos de correção, às vezes. E se a confissão do nosso erro for necessária, deve ser franca, real e completa. Você não quer ser como o homem que veio e confessou que tinha roubado alguns metros de corda, mas esqueceu de dizer que havia um cavalo preso à outra extremidade!

Um Espírito Correto em Relação Àqueles que nos Ofenderam

(Filemom 25)

Agora vamos voltar para a quarta vez que Paulo usa essas palavras de admoestação – Filemom 25. “A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja com o vosso espírito”. O contexto aqui é diferente novamente, tem a ver com receber e perdoar uma pessoa arrependida. Foi o caso em que havia um homem (Onésimo) que tinha ofendido seu mestre (Filemom) e tinha fugido, e agora ele estava arrependido e retornava. Ele precisava ser perdoado e recebido de volta de uma maneira correta. Onésimo tinha realmente injustiçado Filemom e Paulo estava com medo de que Filemom não fosse manter um espírito adequado de perdão para ele. Então ele deu-lhe esta palavra necessária de admoestação.

Isso é algo que também precisamos – um espírito indulgente para com todos os que nos ofendem. Deus está no processo de restaurar as pessoas e trazê-las de volta para o lugar onde deveriam estar entre seu povo e precisamos ter um espírito correto em recebê-las. É desnecessário dizer que houve ocasiões em que a pessoa voltou e certos irmãos não tiveram um espírito correto para com ela. Deus não pode estar contente conosco quando agimos assim. Precisamos ter o espírito de graça de que Paulo fala aqui e perdoar de coração a pessoa. A coisa triste sobre o perdão fraterno é que podemos pensar que temos um espírito indulgente para com alguém quando realmente não o temos. Nosso coração é tão enganoso! “Enganoso é o coração, mais do que todas as cousas, e perverso: quem o conhecerá?” (Jr 17:9) Podemos dizer que está tudo certo e que perdoamos a pessoa, mas certas coisas que se seguem deixam claro que não temos perdoado. O Sr. Clark costumava dizer que enterramos o machado, mas ainda seguramos o cabo! Algumas pessoas não abrem mão. Eles têm muita dificuldade em perdoar alguém que os ofendeu. Nós os ouvimos dizer: “Eu posso perdoar, mas não posso esquecer!” Mas o que eles estão realmente dizendo é: “Eu não vou perdoar!” Você sabe que nesse caso, poderíamos estar indo na direção de alguma disciplina do Senhor porque Ele não ficará satisfeito com esse tipo de atitude.

A Bíblia diz que devemos perdoar uns aos outros **“**como também Deus vos perdoou em Cristo” (Ef 4:32). Como Deus nos perdoou? Hebreus 10:17 diz: “jamais Me lembrarei de seus pecados e de suas iniquidades”. Ele nos perdoa e coloca nossos pecados fora de Sua mente para sempre. Nossos pecados não são mantidos contra nós. É triste dizer que alguns de nós parece manter um registro das coisas em nossa “lista negra” e procuram uma oportunidade para retaliar. Não é assim que Deus perdoa.

Vamos voltar para Mateus 18:21-35 para ver o que o Senhor tem a dizer sobre um espírito implacável. “Então Pedro, aproximando-se d’Ele, disse: Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei? Até sete? Jesus lhe disse: Não te digo que até sete, mas, até setenta vezes sete. Por isso o reino dos céus pode comparar-se a um certo rei que quis fazer contas com os seus servos; e, começando a fazer contas, foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos. E, não tendo ele com que pagar, o seu senhor mandou que ele, e sua mulher e seus filhos fossem vendidos, com tudo quanto tinha, para que a dívida se lhe pagasse. Então aquele servo, prostrando-se, o reverenciava, dizendo: Senhor, sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. Então o senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida. Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos, que lhe devia cem dinheiros, e, lançando mão dele sufocava o, dizendo: Paga-me o que me deves. Então o seu companheiro, prostrando-se a seus pés, rogava-lhe, dizendo: Sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. Ele, porém, não quis, antes foi encerrá-lo na prisão, até que pagasse a dívida. Vendo, pois os seus conservos o que acontecia, contristaram-se muito, e foram declarar ao seu senhor tudo o que se passara. Então o seu senhor, chamando-o à sua presença, disse-lhe: Servo malvado, perdoei-te toda aquela dívida, porque me suplicaste, não devias tu igualmente ter compaixão do teu companheiro, como eu também tive misericórdia de ti? E, indignado, o seu senhor o entregou aos atormentadores, até que pagasse tudo o que devia. Assim vos fará também Meu Pai celestial, se do coração não perdoardes, cada um a seu irmão, as suas ofensas.” Este é um aviso solene para quem não quer perdoar uma pessoa que o ofendeu.

Vemos nesta passagem a interação do perdão governamental e do perdão fraterno. Começa com Pedro perguntando ao Senhor quantas vezes ele deveria perdoar seu irmão. Os rabinos ensinaram que uma pessoa deveria perdoar seu irmão três vezes. Pedro estava disposto a ir até sete vezes. Mas ele queria a opinião do Senhor sobre isso. O Senhor disse: “até setenta vezes sete”, o que significa que devemos ter perdão ilimitado para com nosso irmão. Isso levou o Senhor apresentar uma parábola que ilustra o perigo de ter um espírito implacável.

Alguns imaginaram que esta parábola ilustra o perdão oferecido no evangelho, mas não há verdade nisso. A passagem não tem nada a ver com o perdão eterno (judicial). Eu aprecio o evangelista que pode encontrar o evangelho em quase todas as páginas de Sua Bíblia, mas não é disso que se está falando aqui. Estaríamos distorcendo esta passagem para aplicar o evangelho aqui. Digo isto porque o perdão que este homem recebeu foi revogado! O homem tinha o perdão, mas, em seguida, por causa de seu espírito implacável subsequente para com seu servo companheiro, foi tirado dele. Certamente não acreditamos que nosso perdão eterno possa ser tirado! Se fosse assim, então estamos dizendo que uma pessoa poderia ser salva e depois se perder novamente. Deus não salva uma pessoa e então, por causa do mau comportamento, tira sua salvação. Além disso, o senhor do servo perverso fala da possibilidade de ele sair da prisão, se e quando, tiver pagado tudo. Poderia levar algum tempo, mas havia uma possibilidade disso. Certamente não há ninguém aqui que acredite que é possível sair de uma eternidade perdida! Não, o evangelho não é o assunto aqui.

Como eu disse, está falando da interação entre o perdão governamental e o perdão fraterno. Eles estão conectados (Mc 11:25-26). A diferença entre o perdão eterno e o governamental é esta: o perdão eterno (ou judicial) é um perdão de uma pessoa recebe pela fé que a livra do eterno julgamento no mundo vindouro; perdão governamental é um perdão que uma pessoa recebe que a livra do julgamento governamental neste mundo. Um tem a ver com o futuro, o outro tem a ver com o tempo presente.

O perdão governamental tem a ver com os caminhos de Deus com Seus filhos. Se tivermos uma má atitude ou um espírito implacável, nosso Pai pode nos entregar aos “atormentadores” para corrigir nosso espírito em relação àqueles que nos ofenderam. Ele fará com que abramos as mãos e perdoemos de coração todos os que nos ofendem. Agora poderíamos perguntar: “Em que sentido um Cristão seria entregue aos ‘atormentadores’?” Significa que Deus fará com que esse espírito amargo e implacável que temos governando sobre nós seja levado até a um ponto em que somos atormentados por isso. É um julgamento governamental sobre nós, enviado para nos levar ao ponto em que finalmente abriremos mão e perdoaremos o agressor. Quando uma pessoa é entregue aos “atormentadores”, fica atormentado toda vez que ouve ou vê a pessoa a quem não quer perdoar. Ele continuará a ser atormentado até que desista e realmente perdoe a pessoa que o ofendeu.

Irmãos, precisamos ter um espírito correto nisso. Como Cristãos, devemos ser capazes de perdoar os outros melhor do que ninguém, tendo recebido um perdão tão grande de nosso Próprio Deus. Pense em como Ele tem sido gracioso para conosco em nossa vida por todas as ofensas que fizemos. Quantas vezes fizemos algo errado e o Senhor, em graça, não nos pegou e nos fez pagar por isso? E não podemos perdoar nosso irmão? É inconcebível que tenhamos dificuldade em perdoar alguém! Devemos ser especialistas em administrar perdão aos outros.

Alguns dirão que não perdoarão a pessoa até que a pessoa se arrependa porque Lucas 17:3-4 diz isso. Eles usarão este versículo para continuar com um espírito implacável. Diz: “Olhai por vós mesmos. E, se teu irmão pecar contra ti, repreende-o, e, se ele se arrepender, perdoa-lhe.” Agora podemos nos perguntar como entendemos estas duas passagens. Parece que se contradizem. Um diz para perdoar nosso irmão quando ele se arrepende e o outro não exige tal condição. No entanto, um olhar mais atento sobre as passagens indica que Mateus está se referindo ao nosso coração, enquanto Lucas está falando de nossa boca. São duas partes de uma única coisa. Se alguém se comportar de forma errada e pecar contra nós, o Senhor nos diz para perdoá-lo em nosso “coração”. Isso deve ser feito, independentemente de a pessoa confessar seu erro ou não. É importante que façamos isso para que não desenvolvamos um espírito de amargura. Como Deus trabalha no coração da pessoa e produz arrependimento, para que ele ou ela confesse o seu erro, então podemos expressar o nosso perdão a eles verbalmente. Foi colocado desta forma: devemos ter um reservatório de perdão em nosso coração para com a pessoa ofensora, imediatamente após ela nos ter ofendido. Deveria estar se acumulando em nossos corações esperando para ser entregue. Quando a pessoa vem e assume seu erro, podemos nos expressar e perdoá-la formalmente, dizendo: “Eu te perdoo”.

Aitofel

O indivíduo no Velho Testamento que ilustra um espírito implacável é Aitofel. Vamos voltar para 2 Samuel 15:12, “Também Absalão mandou vir Aitofel, o gilonita, do conselho de Davi, à sua cidade de Gilo, estando ele sacrificando os seus sacrifícios”. E então, no versículo 31, “Então fizeram saber a Davi, dizendo: Também Aitofel está entre os que se conjuraram com Absalão.”

Houve uma conspiração no reino de Davi. Seu próprio filho (Absalão) tinha se levantado contra ele. Desnecessário dizer que Davi estava em apuros e fugiu para salvar sua vida e correu para o deserto para se refugiar. Quando Absalão e todo o Israel se voltou contra ele, descobrimos que Aitofel, amigo de Davi (Sl 41:9, 55:12-14), ficou do lado deles! Que choque e decepção isso deve ter sido. No exato momento em que ele mais precisava de seu amigo, este se virou contra ele. A razão para isso foi que Aitofel tinha um espírito implacável em relação a Davi. Ele o abrigara profundamente em seu coração e estava lá por um longo tempo, mas agora havia saído.

Se ligarmos o capítulo 11:3 com o capítulo 23:34, aprendemos que Aitofel era avô de Bate-Seba. E quando Davi cometeu adultério com ela e matou seu marido, Aitofel guardou sentimentos amargos em relação a Davi. Não achou que ele tinha recebido a devida disciplina do Senhor por seu erro. (Lv 18:20, 29, 20:10; Dt 22:22). Não há menção de qualquer espírito amargo em Aitofel até este momento. Ele tinha mantido bem escondido. Hebreus 12:15 diz: “Tendo cuidado de que ninguém se prive da graça de Deus, e de que nenhuma raiz de amargura, brotando, vos perturbe, e por ela muitos se contaminem”. Todos sabemos o que é uma raiz. É algo que cresce abaixo da superfície, e às vezes vai brotar do chão em um lugar longe da árvore. Isso nos mostra que se não julgarmos um espírito amargo e implacável, mais cedo ou mais tarde ele vai se exteriorizar. E isso explica por que Aitofel tomou partido contra Davi quando este foi rejeitado.

Tendo permitido que essa raiz crescesse abaixo da superfície, vemos que quando ela brotou era feia – muito feia. No capítulo 16:15-23 ele aconselha Absalão a fazer Davi pagar por seu pecado dez vezes! Ele sugere que ele vá para dez das concubinas de Davi. Ele tinha uma razão plausível para isso – para fortalecer o compromisso do povo ao seu lado contra Davi – mas ele realmente queria ver Davi pagando por seu adultério. Isso mostra que realmente não tinha qualquer preocupação piedosa para o pecado de Davi; se ele tivesse, não teria sugerido o mesmo pecado e dez vezes mais! Isso nos mostra que, se um espírito implacável é deixado sem julgamento, ao longo do tempo ele se tornará vingativo. No próximo capítulo (17), ele se oferece para sair para o deserto e matar Davi! Esta foi outra vingança pela morte do marido de Bate-Seba. Tal é a medida em que um espírito não julgado e amargurado agirá.

Oh, irmãos, precisamos ter um espírito correto nessas situações e perdoar de coração. Que Deus nos dê a graça de manter uma mão aberta para todos os que agem injustamente contra nós. O Senhor Jesus é o nosso exemplo perfeito. Quando O levaram e O crucificaram, Ele disse: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23:34).

Ore por um Espírito Correto

A última passagem que eu quero recorrer é Salmo 51:10. “Cria em mim, ó Deus, um coração puro, e renova em mim um espírito correto.” Davi havia falhado de uma forma muito séria, e agora ele desejava ser restaurado ao Senhor. Ele desejava que não só seus pecados fossem colocados de lado, mas que ele também teria um espírito certo. Se sentirmos que não tivemos um espírito certo para com alguém em alguma matéria, é isso que queremos fazer – orar para que o Senhor nos dê um espírito certo. É uma boa oração para todos nós. Então seremos como Calebe e Daniel – dois homens que tiveram um “espírito excelente” (Dn 5:12, 6:3; Nm 14:24).

Eu só pensei que deveríamos ter essas coisas diante de nós, porque vivemos em um dia difícil, com muitas coisas frustrantes para provar nosso espírito e é fácil desenvolver um espírito errado que vai estragar a nossa vida e testemunho. Que “a graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja com seu espírito”.

Notas

[←1]

N. do T.: O Concise Bible Dictionary diz que “… o resíduo (da colheita – os rabiscos) deveria sempre ser deixado para os pobres. Lv 19:9-10;23:22; Rt 2:2-23” – pág. 319.

[←2]

“De Efraim desceram os que tinham a sua raiz em Amaleque” (Jz 5:14 – AIBB)

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