A Epístola de Paulo aos GÁLATAS
O Perigo do Legalismo no Cristianismo
Bruce Anstey
A EPÍSTOLA DE PAULO AOS GÁLATAS – O Perigo do Legalismo no Cristianismo
Bruce Anstey
Originalmente publicado por:
9-B Appledale Road
Hamer Bay (Mactier) ON P0C 1H0
CANADÁ
christiantruthpublishing@gmail.com
Título do original em inglês: THE EPISTLE OF PAUL TO THE GALATIANS – The Peril of Legalism in Christianity
Primeira edição em inglês – agosto 2009
Versão 1.8
Traduzido, publicado e distribuído no Brasil com autorização do autor por:
ASSOCIAÇÃO VERDADES VIVAS, uma associação sem fins lucrativos, cujo objetivo é divulgar o evangelho e a sã doutrina de nosso Senhor Jesus Cristo.
atendimento@verdadesvivas.com.br
Primeira Edição em português – julho 2018
e-Book versão 2.0
Abreviaturas utilizadas:
ARC – João Ferreira de Almeida – Revista e Corrigida – SBB 1969
ARA – João Ferreira de Almeida – Revista e Atualizada – SBB 1993
TB – Tradução Brasileira – 1917
ACF – João Ferreira de Almeida – Corrigida Fiel – SBTB 1994
AIBB – João Ferreira de Almeida – Imprensa Bíblica Brasileira – 1967
JND – Tradução inglesa de John Nelson Darby
KJV – Tradução inglesa King James
Todas as citações das Escrituras são da versão ARC, a não ser que outra esteja indicada.
A Epístola de Paulo aos
GÁLATAS
Introdução
A Galácia era uma província na Ásia menor (Turquia) onde o apóstolo Paulo havia trabalhado no evangelho (At 16:6; 18:23). Mapas mostram que Antioquia da Pisídia (At 13:14), Icônio (At 14:1), Listra e Derbe (At 14:6) estavam localizadas na província da Galácia. (Esta última é de onde veio Timóteo – At 16:1). Se Paulo estava se referindo a assembleias nestes lugares ou em cidades que estavam mais ao norte destas não sabemos. A Galácia teve uma grande população de judeus, dos quais alguns se converteram ao Cristianismo (1 Pe 1:1).
Paulo escreve esta epístola porque mestres judaizantes tinham semeado suas sementes malignas entre os gálatas e os tinham enganado fazendo-os receber “outro evangelho” (Gl 1:6; 2 Co 11:4). Estes judaizantes eram judeus que professavam conversão ao Cristianismo (2 Co 11:22), mas Paulo não os reconhece como crentes verdadeiros, chamando-os “falsos irmãos” (Gl 2:4). Estes “falsos apóstolos” e “obreiros fraudulentos” estavam trabalhando em outros lugares além da Galácia – tal como Corinto (2 Co 11:13). Infelizmente, eles se infiltraram “secretamente” na comunhão dos santos (Gl 2:4). Havendo se infiltrado nas fileiras Cristãs e ganhando uma base entre os gálatas, eles estavam fazendo o trabalho do inimigo de minar o evangelho (2 Co 11:13-14).
Em Filipenses 3:2 Paulo chama estes judaizantes (que provavelmente eram de origem judaica) de “concisão” (JND). “Con” significa contra, e “cisão” significa cortar. Esse é um título bem apropriado a eles porque, enquanto insistiam no rito literal da circuncisão, eles eram contrários ao seu espiritual significado – o “cortar fora” das obras da carne na vida do crente. Eles ensinavam que os santos deveriam guardar a lei de Moisés para serem salvos (At 15:1). Ao insistir na guarda da lei para salvação, eles estavam dizendo essencialmente que o homem na carne poderia obter uma posição justa diante de Deus por suas boas obras. Portanto, não estavam admitindo a verdadeira ruína da raça humana, e que a carne não poderia merecer nada diante de Deus (Rm 8:8). O Cristianismo, por outro lado, representa a verdadeira “circuncisão” (num sentido espiritual) porque rejeita todas as coisas relacionadas à carne – mesmo o melhor da carne, como Paulo mostra pelo exemplo de sua própria vida (Fp 3:3-8).
Pela influência desses mestres judaizantes, os gálatas imaginaram que poderiam aplicar a lei de Moisés ao evangelho e que isso seria o meio pelo qual uma pessoa pudesse assegurar sua aceitação para com Deus, e também isso seria o meio de aperfeiçoar santificação (santidade prática) na vida dos crentes. Dificilmente haveria algo mais longe da verdade do que isso! Portanto, havia uma necessidade imediata de correção do erro no qual tinham caído, e também de se estabelecer a verdade da liberdade Cristã à parte da lei.
A Natureza Corretiva da Epístola
No livro de Atos, Paulo prega o evangelho, na epístola aos Romanos ele ensina o evangelho, porém em Gálatas ele o defende. Gálatas é uma epístola corretiva, como são também as epístolas aos coríntios. Ela foi escrita para corrigir o legalismo, enquanto que a 1ª e 2ª epístolas aos Coríntios foram escritas para corrigir a iniquidade. O Cristão deve ser cuidadoso com estes dois perigos opostos. Eles são como duas valas em ambos os lados do caminho; os dois estão relacionados com permitir um lugar à carne na vida do crente.
- Legalismo é uma tentativa de controlar a carne por meio de regras e ordenações e assim produzir santidade no crente. - Iniquidade é dar liberdade para a carne e é um evidente desprezo à santidade.
As pessoas hoje acrescentam a lei ao evangelho por duas razões e ambas são incorretas:
- A primeira é para justificação. Pessoas com esta linha de pensamento estão essencialmente tentando trabalhar por sua salvação. Paulo mostra no capítulo 2:16-17 que uma pessoa não pode ser justificada por guardar a lei, mas tão somente “no princípio de fé” (JND). Assim é improvável que qualquer que sustente tal visão seja verdadeiramente salvo. - A segunda é para santificação prática. Os que têm essa ideia pensam que guardar a lei é a maneira de Deus restringir a atividade da carne no crente, e assim, produzir santidade em sua vida.
Se esses mestres judaizantes lessem estas palavras provavelmente diriam que não estamos representando adequadamente aquilo que eles creem e ensinam. Talvez dissessem: “Não queremos confiar na lei em lugar de Cristo. Ensinamos que é necessário crer em Cristo e que o crente deve também guardar a lei”. No entanto, veremos nesta epístola que Paulo não irá permitir que coisa alguma seja acrescentada a Cristo e Sua obra consumada. Salvação é somente por fé em Cristo – ou não é salvação de modo algum. Cristo e alguma outra coisa a mais não é o meio de salvação de Deus. Cristo suplementado é, na verdade, Cristo suplantado! É a falsificação do diabo para a salvação de Deus. Misturar a lei com a graça faz com que as bênçãos do evangelho dependam do homem cumprindo suas responsabilidades na sua salvação. Isso é minar seriamente a verdade do evangelho. Na sua essência, essa mistura anula a graça, fazendo a obra de Cristo por nós ser de nenhum proveito (Gl 5:4 – JND). Além disso, também coloca de lado a obra do Espírito em nós (Gl 3:2), e transforma o Cristianismo numa religião de formas externas e obrigações. Todas essas ideias colocam o Cristianismo um fundamento errado e o faz como uma relação com o Senhor baseada em obras em lugar de uma relação baseada em fé.
Uma grande parte da profissão Cristã caiu no erro dos gálatas e se colocou debaixo da lei de Moisés – não tanto para serem justificados, mas como uma regra para a vida Cristã. Portanto, esta epístola é hoje extremamente necessária. Não nos enganemos, os falsos mestres que fizeram desviar os gálatas possuem hoje uma multidão de descendentes – e estes estão igualmente determinados tentando convencer Cristãos de que precisam guardar a lei exatamente como estavam fazendo aqueles em dias passados. Quando apresentados à verdade desta epístola aos gálatas eles irão dizer que isto não se aplica a eles porque afinal eles não sustentam a doutrina de que um crente precise ser circuncidado para ser salvo (At 15:1; Gl 5:2), e nem mesmo creem que um Cristão deva observar ordenações judaicas e dias santos como faziam os gálatas (Gl 4:9-10). Todavia, eles se colocam sob a lei (os dez mandamentos) para se manter salvos e usavam a lei numa tentativa de produzir santidade prática em sua vida. Quando tudo isso é resumido, manifesta-se que na realidade trata-se de Cristo e as boas obras do crente para obter-se salvação e santidade. Esta não é a verdade do evangelho.
Além disso, a partir do erro de se misturar lei e graça surge a confusão da distinção intencionada por Deus entre judaísmo e Cristianismo. Estas são duas maneiras completamente distintas de se aproximar de Deus em adoração, ambas as quais foram por Deus destinadas a dois grupos de pessoas completamente diferentes. Invariavelmente aqueles que seguem nessa linha judaico-Cristã irão confundir o chamado de Israel com o da Igreja e suas respectivas esperanças. Muitos deles nos dirão que somos o Israel espiritual e que as promessas e concertos feitos aos patriarcas nos tempos do Velho Testamento foram cumpridos na Igreja. Também nos dirão que estamos agora no Milênio, e que o Arrebatamento, como sendo distinto da Aparição de Cristo, é um fruto de nossa imaginação. Essas ideias errôneas podem ser classificadas sob o que é conhecido como “Teologia Reformada”, porque os reformadores nos anos 1500, que romperam com o catolicismo, sustentavam esses erros.
Sendo assim, esta epístola tem uma aplicação muito necessária para aqueles que se colocam debaixo da lei, ainda que não seja no mesmo nível dos mestres judaizantes daqueles dias.
Quatro Coisas Faltando em Gálatas
Existem quatro coisas que normalmente são mencionadas nas epístolas de Paulo que estão faltando nesta carta aos gálatas.
A primeira é a vinda do Senhor (o Arrebatamento). Esta é uma de apenas três epístolas de Paulo nas quais a vinda do Senhor (o Arrebatamento) não é mencionada. (Não é mencionada em Efésios porque os santos são vistos naquela epístola como já estando no céu – Ef 2:6. A vinda do Senhor também não é mencionada em Filemon). E nesta epístola aos gálatas o Arrebatamento não é mencionado porque o propósito da vinda do Senhor é levar crentes ao lar celestial e o erro em que os gálatas estavam envolvidos era tão sério que colocava em questão se eles eram realmente salvos. Portanto, a vinda do Senhor não seria para eles e, portanto, não haveria sentido em Paulo mencioná-la. O fato de Paulo chamá-los de “irmãos” no decorrer da epístola prova que ele os via como crentes verdadeiros, mas a esperança da vinda do Senhor é deixada de lado para exercitar a consciência deles quanto ao erro no qual haviam entrado.
A segunda coisa é que não existem elogios. O que Paulo poderia elogiar quando tinham se desviado para tão longe do caminho?
A terceira coisa faltando na epístola é a menção de Paulo orando por eles. Como Paulo poderia orar pelas necessidades deles como Cristãos quando havia uma questão quanto ao fato de serem ou não Cristãos?
A quarta coisa é que Paulo também não faz pedido algum para que eles orassem por ele e por aqueles que com ele serviam. Novamente, se eles não eram salvos, qual seria a razão em pedir que orassem por ele e seus cooperadores?
As Divisões Principais da Epístola
Os ataques dos mestres judaizantes a Paulo eram três. Primeiramente, eles atacaram seu apostolado. Se conseguissem minar sua autoridade poderiam então destruir sua doutrina. Portanto, Paulo defende seu apostolado nos capítulos 1 e 2. Em segundo lugar, eles atacaram o evangelho que Paulo pregava. Disseram que seu evangelho era deficiente porque negligenciava a lei, a qual Deus não havia colocado de lado. Paulo se defende quanto a isto nos capítulos 3 e 4. Em terceiro lugar, seus difamadores acreditavam que guardar a lei produziria santidade prática na vida do crente. Paulo responde a este erro nos capítulos 5 e 6.
As três principais divisões na epístola seguem este triplo ataque:
- Capítulos 1-2 são de caráter pessoal, apresentando uma defesa histórica do apostolado de Paulo. - Capítulos 3-4 são de caráter polêmico, mostrando uma defesa doutrinal do evangelho que Paulo pregava. - Capítulos 5-6 são de caráter prático, expondo a maneira de Deus de santidade.
A Defesa de Paulo de seu Apostolado
(Capítulos 1-2)
O método dos mestres judaizantes não era atacar a verdade diretamente, mas atacar o instrutor da verdade – Paulo. O plano deles era simples, mas eficaz: Se conseguissem minar a autoridade de Paulo, poderiam então destruir seu ensino. Eles haviam persuadido os santos na província da Galácia que Paulo era um pregador renegado que não possuía credenciais ou suporte de Pedro e dos outros apóstolos em Jerusalém. Portanto, ele não tinha autoridade para aquilo que estava fazendo, e consequentemente, eles não deveriam lhe dar ouvidos. Tendo colocado dúvida suficiente na mente dos santos na Galácia quanto à autenticidade do ministério de Paulo, eles lançaram o alicerce para introduzir as sementes de sua má doutrina em relação a guarda da lei.
Como essa era a tática dos mestres judaizantes, Paulo começa a epístola estabelecendo sua autoridade apostólica que lhe foi dada por Deus nos capítulos 1 e 2. Tendo feito isso, ele segue ensinando a verdade da justiça sendo estabelecida sem a lei nos capítulos 3 e 4, e então exorta os santos baseado nesta verdade nos capítulos 5 e 6.
Paulo sabia que precisava estabelecer a realidade de seu apostolado antes que pudesse esperar que os gálatas recebessem sua doutrina e exortação. Portanto, os dois primeiros capítulos são introdutórios ao ensinamento contido na epístola.
A Saudação
Cap. 1:1-5
Paulo começa expondo de maneira simples e clara a autoridade de seu apostolado (vs. 1-2) e os principais elementos do evangelho que pregava (vs. 3-5). Essas eram as duas coisas que seus opositores estavam desafiando. Este tipo de franqueza era algo que infelizmente estava faltando em seus difamadores, os quais tinham interesses ocultos.
V. 1 – Ele anuncia claramente que era um “apóstolo” expondo três fatos de tal verdade que eram irrefutáveis. O apostolado de Paulo:
- Não era “da parte dos homens” como uma fonte (v. 1a). Seu apostolado não emanava de homens – independentemente de quão piedosos e bem-intencionados pudessem ser. A fonte da autoridade de Paulo era muito mais elevada que o homem. - Não era “por homem” como meio (v. 1b). Ela não veio como uma sucessão passada a ele vinda de outros antes dele, nem era resultado de uma ordenação por outros. - Era “por Jesus Cristo e por Deus Pai” (v. 1c).
Assim, isso não foi por meio de Pedro e dos outros apóstolos, mas de Pessoas divinas na Divindade. Portanto, rejeitar Paulo como um apóstolo é também rejeitar o Pai e o Filho que o comissionaram.
É significativo que Paulo diz: “…que O ressuscitou dos mortos”. A ressurreição de Cristo é o selo de aprovação de Deus por aquilo que Cristo realizou na cruz para a salvação do homem. Paulo menciona isso no início porque aqueles que estavam inquietando os gálatas claramente não haviam entendido a obra de Cristo. Eles pensavam que havia alguma coisa que o crente tinha que fazer para assegurar sua salvação, a saber, guardar a lei. A ressurreição de Cristo é a resposta de Deus para Sua obra consumada na cruz. Ao ressuscitar o Senhor Jesus de entre os mortos Deus estava dizendo “Amém” para aquilo que Cristo havia realizado. Não existe nada que possamos fazer para acrescentar a essa obra perfeita e completa. Somos chamados a “crer” no testemunho de Deus quanto à satisfação da justiça divina na obra de Cristo em expiação; aquele que crê nela é salvo (Jo 3:14-17). Ambos, Pedro e Paulo, confirmam isto (Rm 4:24-25; 1 Pe 1:19-21).
V. 2 – Paulo acrescenta: “E todos os irmãos que estão comigo”. Ele menciona isto para mostrar que aquilo que ele estava para escrever era considerado ortodoxo1 pela maioria dos Cristãos daqueles dias. Eles estavam “com” Paulo no sentido de que estavam em concordância com ele e com sua doutrina. Eles obviamente não estavam concordando com os erros judaizantes os quais os gálatas haviam absorvido. Os gálatas precisavam entender que eles haviam abandonado a fé comum dos irmãos como um todo. Isso também mostra que as doutrinas da graça que Paulo ensinava não se tratavam de uma interpretação particular de sua invenção; antes eram aquilo que “todos os irmãos” que eram ortodoxos sustentavam e ensinavam.
“Às assembleias da Galácia” (JND). É significativo que isto esteja no plural. Elas não eram só uma, mas várias “assembleias” que tinham sido afetadas pelo fermento desses judaizantes. Portanto, esta epístola foi escrita a todas as assembleias daquela região. O caso deles ilustra como a má doutrina se espalha, e porque deve ser impedida antes que venha a levedar toda a massa de crentes (Gl 5:9; 2 Tm 2:17).
Paulo deseja “graça” e “paz” aos gálatas. Se eles haviam de ser corrigidos quanto a este erro grave, iriam precisar de “graça” para o fazer; “paz” seria o resultado. Ele não menciona misericórdia, como faz em suas saudações nas suas epístolas pastorais, porque eles não poderiam esperar misericórdia de Deus se recusassem a correção apostólica de Paulo nesta epístola.
Vs. 3-5 – Havendo declarado o fato de seu apostolado, Paulo apresenta um resumo das principais verdades do evangelho que pregava, já que isso também estava sob ataque.
- Paulo pregava que: “nosso Senhor Jesus Cristo, o Qual Se deu a Si mesmo por nossos pecados”. Isto mostra que Paulo ensinava que o sacrifício do Senhor Jesus Cristo na cruz era o meio de Deus de resolver a questão dos pecados do crente. É digno de nota que ele não faz menção alguma de que o crente precise guardar a lei para assegurar essa grande bênção. - Paulo também pregava que a obra de Cristo livra o crente do “presente século mau”. O mundo é uma vasta sociedade que o homem construiu para se manter satisfeito em sua alienação de Deus. Ele possui vários departamentos, tais como política, religião, esportes, teatro, etc. É da “vontade de Deus”, ao salvar almas, que elas sejam libertas de todo o curso deste mundo, o qual está caminhando em direção ao juízo. Isso é significativo porque o que os judaizantes estavam ensinando deixava a pessoa no mundo, isto é, o lado religioso do mundo. - O evangelho que Paulo pregava, se recebido em fé, produzia no redimido espontâneo louvor e adoração diretamente ao Pai e o Filho. Ele diz: “Nosso Pai, ao Qual glória para todo o sempre. Amém”. Isso, lamentavelmente, estava faltando entre os gálatas; legalismo não tinha feito outra coisa senão expulsado a liberdade de filiação para fora deles (Rm 8:15; Gl 4:6 – clamando “Aba Pai”).
O erro que eles haviam adotado essencialmente negava estes três resultados básicos do evangelho: remoção de pecados, libertação do mundo, e espontâneo louvor e ações de graças a Deus, o Pai. Tal erro, de maneira prática, colocava de lado a obra de Cristo substituindo-a com as obras do homem (guardar a lei). Isso abandonava o homem no mundo com suas formas e rituais de religião terrena. E roubava o crente de sua liberdade de filiação na presença do Pai. Consequentemente, o Cristão é deixado a certa distância de Deus, como os santos estavam no Velho Testamento, adorando a Deus fora do véu (Hb 10:19-20), o que não é de modo algum o terreno Cristão.
A Repreensão Necessária
Cap. 1:6-12
Esse sério afastamento da verdade do evangelho demandava uma repreensão severa. Normalmente nas epístolas de Paulo, após saudar os santos, ele os elogia por certas coisas que havia visto neles que glorificavam a Deus e Paulo os louva por isso. Porém, nesta epístola, ele não faz seu habitual elogio e ações de graças, nem os louva. Em lugar disto, ele parte diretamente para uma repreensão. Isso é bem impressionante, porque mesmo com os coríntios, em todos os seus erros, Paulo ainda encontrou coisas para elogiar. Mas este não era o caso aqui. Isso nos mostra a gravidade do erro no qual eles haviam caído.
V. 6-7 – Paulo se maravilha diante da instabilidade dos crentes da Galácia que tinham “tão depressa” se desviado após “outro evangelho, o qual não é outro”. Os gálatas podem ter pensado que estavam recebendo uma versão nova e melhorada do evangelho, mas na verdade tratava-se de “outro evangelho” (2 Co 11:4).
Neste momento Paulo não menciona o que é este outro evangelho. Ele deixa claro do que se tratava mais adiante na epístola, que era algo que envolvia acrescentar a lei de Moisés à obra de Cristo para justificação. (Gl 2:16-18). Como mencionado anteriormente, este era um erro grave que minava verdades fundamentais do Cristianismo. Misturar a lei com a graça faz a bênção do evangelho depender do homem cumprir sua responsabilidade em sua salvação e, essencialmente, impede a ação da graça, tornando a obra de Cristo por nós de nenhum proveito (Gl 5:4 – JND). Acrescentar a lei ao evangelho é na realidade “outro evangelho”. Não é algo que Paulo ou qualquer outro apóstolo ensinou (At 15:8-11; 2 Co 11:4).
Se de fato Derbe, Listra e Icônio eram as assembleias da Galácia, às quais Paulo estava escrevendo, era de se esperar que tivessem mais entendimento porque eles haviam recebido “os decretos” dos apóstolos que ditavam muito claramente que a lei de Moisés e a circuncisão não deveriam ser impostas sobre os santos (At 15:23-29, 16:4). Numa questão de cerca de cinco anos após Paulo ter pregado o evangelho naquela região (At 16:6), eles haviam “passado [se mudado – JND] daqu’Ele” que os tinha chamado. No texto original grego a palavra “mudado” está na voz reflexiva, implicando que a mudança estava ainda ocorrendo, o que iria continuar levando-os para ainda mais longe da verdade se não julgassem seu erro. Isso mostra que não tem como dizer quão longe alguém pode ir ao se apartar da fé. É algo verdadeiramente muito solene.
Paulo diz: “mas há alguns que vos inquietam e querem transtornar [perverter – JND] o evangelho”. Note que ele não diz que estes mestres judaizantes negavam o evangelho, mas que pervertiam o evangelho. Eles não negavam diretamente a verdade da Pessoa de Cristo ou os fatos de Sua morte e ressurreição, mas tinham acrescentado (se isso fosse possível) à obra de Cristo na cruz. Eles ensinavam que Sua obra consumada não era suficiente para a salvação de alguém, mas que para ser salvo era necessário guardar a lei e ser circuncidado (At 15:1). Isso era uma perversão do evangelho e frequentemente uma perversão é mais perigosa do que uma clara negação do evangelho. Na perversão do evangelho existe verdade suficiente para enganar o Cristão descuidado, e existe também erro suficiente para anular a verdade.
Vs. 8-9 – Paulo não enfrenta os mestres judaizantes e nem tenta corrigi-los. Bem pode ser que ele os havia enxergado como apóstatas, e para tais não há arrependimento (Hb 6:4-6). Em lugar disso, ele lança seu anátema apostólico. Paulo declarou que havia uma maldição sobre todos que tinham falsificado ou alterado a mensagem do evangelho. Falando hipoteticamente, ele supõe que, se fosse possível, mesmo se ele e aqueles que trabalhavam com ele (“nós”) pregassem outro evangelho além daquele que os gálatas tinham ouvido dele, eles seriam “anátema”. E que se fosse possível um anjo descer do céu com outro evangelho ele também seria anátema. No versículo 9 ele diz: “Se alguém vos anunciar outro evangelho…”, a palavra “alguém” aqui abrange além dos homens e refere-se a todas as criaturas de Deus, até mesmo anjos.
V. 10 – Paulo começa a falar dos seus motivos em servir ao Senhor. Ele diz: “Porque, persuado eu agora, a homens ou a Deus? Ou procuro agradar a homens? Se estivesse ainda agradando aos homens, não seria servo de Cristo”. Ele coloca isso em questão porque era uma das coisas que caracterizavam os judaizantes que estavam inquietando os gálatas. Ao sugerir que não estava buscando “agradar a homens” ele estava na verdade expondo os motivos dos judaizantes para que os gálatas pudessem enxergar sem apontar diretamente o dedo para eles. Paulo indica em outro lugar que esses “falsos apóstolos” e “obreiros fraudulentos” (2 Co 11:13) viram o movimento do evangelho como uma oportunidade de ouro para conseguirem uma vida confortável para si mesmos (2 Co 2:17 – “um negócio” – JND). Eles, portanto, trabalharam duro para obter uma posição entre os santos gálatas que ainda não estavam firmados, passando-se por servos de Cristo. Eles agradavam homens servindo a eles para ganhar seguidores e o suporte monetário deles (Gl 4:17, 6:13; Jd 16). Em contraste com esta forma desonesta de ganho, Paulo não se inclinaria a tais princípios. (2 Co 11:8-9, 12:14-17). Ele não buscava o aplauso do homem, e nem queria o seu dinheiro.
Vs. 11-12 – Os três pontos que Paulo menciona no versículo 1, em relação ao seu apostolado, eram os mesmos em relação ao “evangelho” que ele pregava. O apostolado de Paulo não era “da parte de” homens e nem “por” homens (v. 1). Semelhantemente, o evangelho que ele pregava não era “segundo os homens” nem “de homem”. Não era de homem – naquilo que diz respeito à fonte e canais porque era algo totalmente externo ao homem. O que é do homem glorifica, honra e lisonjeia o homem e consequentemente será agradável aos homens. Tal era a linha de coisas com que se ocupavam os falsos mestres. O evangelho, por outro lado, rejeita todas as coisas relacionadas ao homem e introduz o que é infinitamente melhor em Cristo.
Aqueles que estavam pervertendo o evangelho estavam reivindicando possuir autoridade dada por Jerusalém (At 15:24). Em contraste com isso, Paulo mostra que sua autoridade era do céu. Ele possuía uma autoridade muito mais elevada para seu apostolado devido ao fato deste ter sido recebido por “revelação de Jesus Cristo”.
Sua Conversão e Comissão Divina
Cap. 1:13-17
Paulo começa falar de sua conversão e comissão divina vinda do Senhor. Ele não tinha intenção de ocupar seus leitores consigo desnecessariamente (2 Co 4:5), mas sua vida era um testemunho do poder e graça de Deus, e isso era algo que os gálatas desesperadamente precisavam enxergar.
Três Razões para Mencionar sua Conversão
Das muitas coisas que Paulo poderia ter mencionado sobre sua vida, enquanto não convertido, o que certamente iria nos distrair, o Espírito de Deus o leva a falar de três coisas significantes que dizem respeito ao assunto em pauta. Elas são introduzidas aqui porque possuem uma aplicação direta na dificuldade em que os gálatas haviam entrado.
1) V. 13 – A primeira razão para chamar a atenção para sua conversão era mostrar onde o seu zelo extremo em guardar a lei o tinha levado – Isso o fez um franco perseguidor da “Igreja de Deus”! Isso mostra que quanto mais alguém é envolvido no sistema de obras baseado na guarda da lei, tanto mais ele será antagônico aos princípios da graça, que é a essência do evangelho. Legalismo e graça são completamente opostos um ao outro e não podem permanecer em um terreno comum. A verdade disso deveria ter alarmado os gálatas. Significava que a linha em que estavam os levaria a serem oponentes diretos do evangelho da graça de Deus!
2) V. 14 – A segunda razão pela qual Paulo menciona os dias anteriores à sua conversão é para mostrar aos gálatas que ele era bem versado na religião dos judeus. E tinha excedido “em judaísmo a muitos” de seus “contemporâneos” (JND). Ele não estava se gloriando, mas dando a conhecer a eles que não era negligência de sua parte a omissão de elementos judaicos (guardar a lei, circuncisão, etc.) no seu evangelho. Paulo sabia tudo sobre essas coisas e as omitiu em suas pregações porque essas coisas não têm absolutamente nada a ver com a maneira de Deus de salvar por graça.
Observe que Paulo a chama de “a religião dos judeus” (Gl 1:14 – KJV); ele não diz que era a religião de Deus. Ele fala dessa forma porque o judaísmo tinha, há muito, sido colocado de lado e já não era reconhecido por Deus (Jo 4:21; Rm 11:1-16). O apóstolo João fala de modo semelhante, chamando as diferentes festas em Jerusalém de “a páscoa dos judeus” e “a festa dos judeus”. Ele não as chama de festas de Jeová (Jo 2:13, 5:1, 6:4, 7:2, 10:22, 11:55). O Senhor também indicou isso em Seu ministério. No começo de Seus dias de ministério Ele chamou o templo de “casa de Meu Pai” (Jo 2:16), e mais tarde de “Minha casa” (Mt 21:13), mas depois de ter sido formalmente rejeitado pela nação Ele deixou o templo e o chamou de “vossa casa” (Mt 23:38). Sendo assim, os gálatas precisavam entender que estavam adotando elementos de um sistema que havia sido deixado de lado por Deus. Eles claramente estavam indo para a direção errada.
3) Vs. 14-16 – A terceira razão pela qual Paulo menciona sua conversão é para demonstrar o poder de Deus para libertar alguém do legalismo. Ele mesmo havia sido “extremamente zeloso” da lei e das “tradições” de seus pais, mas Deus o libertou! E se Deus pôde libertar alguém zeloso como Saulo de Tarso, um que estava outrora muito mais arraigado ao legalismo do que os gálatas, Ele poderia certamente libertá-los. Isso mostra que a triste condição deles era recuperável. Este fato apresentado pelo apóstolo tinha a intenção de encorajar os gálatas a ouvir e agir naquilo que estava para lhes falar nesta epístola em relação ao erro deles.
É significativo que a conversão de Paulo aconteceu quando ele estava no caminho para Damasco (At 9). Paulo ouviu o chamado do Senhor quando ele estava viajando para fora de Jerusalém. E também não foi por acaso que o Senhor tenha ensinado a Seus discípulos a verdade da Igreja, pela primeira vez, quando Ele os havia levado para os limites territoriais ao norte da terra de Israel – o ponto mais longe de Jerusalém (Mt 16:13-18). Estas coisas são indicativas do fato de que judaísmo e Cristianismo são duas ordens contrastantes. Quanto mais alguém se afasta do judaísmo, tanto mais claramente enxergará a verdade do Cristianismo. Deus nunca teve a intenção de que ambos fossem misturados em uma ordem judaico-Cristã – um termo impróprio que caracteriza muito da Cristandade hoje.
O primeiro ponto de Paulo deve ter alarmado os gálatas e produzido uma busca em seus corações quanto ao caminho em que estavam. Seu segundo ponto deve ter feito com que eles percebessem que haviam adotado algo o qual Deus não apoiava. E este terceiro ponto deve tê-los preparado para ouvir aquilo que ele estava para escrever.
A mensagem de Paulo foi divinamente revelada a ele. Mas não foi apenas revelada a ele (v. 12) foi também revelada nele (v. 16). A partir de então, Paulo procurava pregar “Seu Filho” (não um sistema baseado em obras) “a toda criatura que há debaixo do céu” (Cl 1:23). Não era uma religião que ele pregava, mas um relacionamento com uma Pessoa divina – o Filho de Deus (At 9:20).
Três Lugares Significativos na História de Paulo
Nos versículos 17 e 18 Paulo menciona três lugares que foram significativos em seu chamado e preparação divina para seu serviço – Damasco, Arábia e Jerusalém.
Primeiramente “Damasco” (At 9:1-22), foi onde ele foi convertido a Deus, recebeu o Espírito Santo e onde foi primeiramente introduzido à comunhão com os irmãos de “fé igualmente preciosa” (2 Pe 1:1).
Em segundo lugar, “Arábia” (o deserto), foi onde Deus o preparou para o trabalho que ele haveria de fazer (At 9:22-23). Ele tinha recebido sua mensagem por revelação, mas precisava aprender, assim como todos precisamos, que a carne para nada aproveita nas coisas de Deus (Jo 6:63; Rm 7:18). Esta lição somente pode ser aprendida por experiência, e isto leva algum tempo. Era algo que os judaizantes evidentemente não haviam aprendido. Acrescentar a lei à vida de um crente para seu aperfeiçoamento Cristão, que era aquilo que eles estavam tentando fazer (Gl 3:3), é uma prova clara de que alguém não entende o fim da carne, como sendo totalmente inútil e condenada por Deus (Rm 8:3).
O terceiro lugar que Paulo menciona é “Jerusalém”, o centro do judaísmo, onde os legalistas se gloriavam na lei de Moisés. Paulo deixa muito claro que ele havia se afastado de Jerusalém depois de ter sido salvo. Isso era um bom exemplo para os gálatas, porque tudo que Jerusalém significa apenas tende a dificultar os Cristãos – suas influências contribuem para a servidão da lei (Gl 4:24-25). Paulo mesmo é um exemplo disso. Quando ele foi para Jerusalém mais tarde, caiu sob a influência de Tiago e dos outros que lá estavam, os quais não estavam esclarecidos quanto à distinção existente entre judaísmo e Cristianismo, e isso levou Paulo à prisão em Cesareia (At 21:18-29). Isso mostra que grande força a influência de Jerusalém tinha sobre alguém de origem judaica.
Paulo foi ajudado em Damasco e na Arábia, mas ele foi impedido por Jerusalém. Os gálatas precisavam entender isso, porque os judaizantes, que estavam lançando os gálatas em confusão, tinham vindo de Jerusalém e trouxeram aquela influência com eles.
Três Encontros com Pedro
(Capítulos 1:18–2:21)
Paulo teve que contender com certas acusações que foram designadas para enfraquecer a confiança que dos santos da Galácia tinham nele e em seu ministério. Desde que Pedro era considerado por muitos o apóstolo mais preeminente, Paulo se concentra em suas interações com Pedro. Paulo menciona três diferentes encontros que ele havia tido com Pedro que desmascaravam completamente as falsas acusações. Estes três acontecimentos são apresentados para mostrar de maneira conclusiva que o apostolado de Paulo não estava em oposição aos dos outros apóstolos – na verdade, os outros apóstolos davam suporte ao seu apostolado!
O Primeiro **Encontro de Paulo com Pedro
Cap. 1:18-24**
Vs. 18-19 – Os difamadores de Paulo tinham espalhado a ideia de que ele era um pregador renegado que estava fora de sintonia com os outros apóstolos e não tinha autorização alguma deles para as coisas que ensinava.
Paulo responde a isso mencionando um acontecimento que provava que não havia verdade alguma em tal acusação. Três anos depois que tinha sido salvo ele subiu à Jerusalém e “ficou com” Pedro por quinze dias (At 9:26). Isso mostra que havia perfeita harmonia entre Pedro e ele. Ele menciona “Tiago” num tom semelhante. Simplesmente não era verdade que Paulo estava fora de sintonia com os outros apóstolos. Se ele fosse algum renegado que era heterodoxo2 no que concerne a fé Cristã, Pedro teria detectado isso e o teria rejeitado.
Paulo deixa claro que não havia ido à Jerusalém para se tornar um apóstolo, ele tinha sido feito apóstolo pelo chamado do Senhor (Gl 1:1; 1 Co 1:1, 9:1). Nem tinha ido até lá para ser treinado no Cristianismo ou para receber autorização dos outros apóstolos. Na verdade, ele menciona que propositadamente permaneceu longe de Jerusalém depois de ter sido salvo – não por desrespeito por seus companheiros apóstolos – mas porque sua comissão do Senhor não necessitava de autorização humana. O especial chamado do Senhor feito a Paulo era para ele levar o evangelho aos gentios (At 9:15, 13:46, 18:6, 22:21, 28:28) e, portanto, não precisava ter ido para Jerusalém, o centro judaico.
Por que então Paulo foi à Jerusalém? Ele foi para lá para comunhão, não para autorização. Ele queria familiarizar-se com Pedro que havia sido testemunha ocular da vida e ministério do Senhor. Paulo foi recebido por ele e estava em feliz comunhão com os outros que encontrou em Jerusalém (At 9:28).
Vs. 20-24 – Depois de sua visita a Pedro, Paulo retornou para “as partes da Síria e da Cilícia”. Ele acrescenta que as “igrejas da Judeia” se regozijaram no fato de que ele havia sido convertido e estava pregando Cristo, ainda que não fosse “conhecido de vista” deles. Eles estavam tão felizes com sua conversão que “glorificavam a Deus”. Isso mostra que os santos da Judeia, de maneira geral, apoiavam a ele e ao evangelho que pregava.
O ponto de Paulo aqui é claro e simples. Se os apóstolos e os santos na Judeia estavam em feliz comunhão com ele, os gálatas deveriam ter total confiança nele também. No entanto, estavam lhe tratando como um inimigo! (Gl 4:16).
O Segundo **Encontro de Paulo com Pedro
Cap. 2:1-10**
Havendo falado da harmonia existente entre Pedro e ele, Paulo segue enfatizando a plenitude de seu entendimento da revelação Cristã. Os difamadores de Paulo insinuavam que ele era inferior aos outros apóstolos naquilo que diz respeito ao seu conhecimento da verdade, e consequentemente, em sua pregação estava faltando alguns elementos importantes – tal como guardar a lei. Como criam que Paulo era deficiente em seu entendimento, eles falaram aos gálatas que a pregação dele não poderia ser confiada.
Paulo responde a isso apresentando outro encontro que ele teve com Pedro. Este acontecimento mostra que ele conhecia a verdade tão bem que os outros apóstolos não puderam acrescentar nada a ele, no que diz respeito a seu entendimento. Paulo omitiu elementos judaicos em sua pregação, tal como guardar a lei e a circuncisão, não porque ele não entendia o evangelho, mas porque tais coisas não têm parte na revelação Cristã.
V. 1 – Ele traz à memória um acontecimento, registrado em Atos 15, onde o assunto do guardar a lei na Igreja foi confrontado e resolvido. Quatorze anos após a primeira visita de Paulo à Jerusalém, ele foi para lá novamente para tratar do que diz respeito à necessidade de crentes serem ou não circuncidados e guardarem a lei. Paulo, e aqueles que estavam com ele, não haviam subido à Jerusalém para serem repreendidos pelos líderes de então por aquilo que estavam fazendo, nem era também para procurar ter a aprovação deles naquilo que pregavam. Ele subiu à Jerusalém “por uma revelação”. O Senhor lhe revelou que ele deveria ir, e os irmãos em Antioquia estavam em comunhão com isso (At 15:2). O propósito desta visita era considerar a relação da lei com o evangelho e expedir uma declaração apostólica definitiva quanto a isso.
Havia “alguns” que tinham vindo de entre eles na Judeia que não estavam esclarecidos quanto ao relacionamento da lei com o evangelho. Eles estavam essencialmente propondo o erro no qual os gálatas haviam caído (At 15:1, 5, 24). Era correto, portanto, que os irmãos em Antioquia levassem e tratassem o problema em sua origem (Jerusalém). Ao fazer isso, a unidade do Espírito entre a assembleia em Jerusalém e a assembleia em Antioquia seria mantida. Este é um princípio importante sobre o qual as assembleias deveriam agir quando há dificuldades que surgem entre elas. Depois de conferenciarem com os apóstolos acerca desta questão, a grande conclusão era de que não havia palavra da parte de Deus para se colocar crentes gentios debaixo da lei. Os apóstolos, portanto, emitiram uma carta com certos decretos para a conduta Cristã que estritamente proibia a colocação de jugo (a lei) sobre os gentios que criam no evangelho.
V. 2 – Paulo diz que quando ele chegou a Jerusalém e foi recebido pela assembleia, em primeiro lugar se comunicou “particularmente [privadamente – JND]” (separadamente dos outros) com aqueles que “estavam em estima”. Estes eram os “apóstolos e anciãos” em Jerusalém (At 15:6). As mulheres e recém-convertidos não foram incluídos nesta reunião, o que está em acordo com todas as atividades administrativas da assembleia. Eles fizeram isso porque havia a possibilidade de a igreja se dividir. Era bem conhecido que havia um forte elemento judaico em seu meio que não estava liberto do judaísmo, o qual iria se opor à verdade do evangelho (At 15:5). Lidar com a questão em um fórum aberto (diante de todos) colocava a comunhão dos santos em risco de ruptura e da igreja ser dividida em um lado judeu e outro gentio.
Os apóstolos, de forma privada, foram completamente inteirados do evangelho de Paulo de maneira que se tal coisa acontecesse eles poderiam lidar com isso. Paulo diz: “para que de maneira alguma não corresse ou não tivesse corrido em vão”. O inimigo gostaria de ter lançado os santos em confusão; tendo a assembleia inteira reunida ele poderia facilmente ter feito isso, e o propósito de Paulo vir à Jerusalém teria sido frustrado. Isso mostra que podem existir momentos quando é necessário que os líderes responsáveis em uma assembleia se reúnam juntamente para discutir certos assuntos que dizem respeito à assembleia local, sem que estejam presentes aqueles que não estão estabelecidos ou que são governados por emoções. Tais pessoas estando presentes estariam inclinadas a fazer alarde.
V. 3 – Os irmãos em Antioquia “resolveram” (At 15:2) que Paulo e Barnabé deveriam tomar consigo a Tito como um caso precedente. Tito era um crente gentio que nunca havia sido circuncidado. O que os apóstolos em Jerusalém teriam a dizer quanto a ele? É significativo que Pedro, Tiago e João e os outros apóstolos nunca “constrangeram” Tito a ser circuncidado! Isso provou que eles não viam isso como necessário. Este fato era algo para os gálatas considerarem; se os apóstolos em Jerusalém não viram isso ser uma coisa necessária, por que tinham eles então adotado tal ideia?
Alguns podem dizer que Paulo havia cedido neste ponto porque ele circuncidou Timóteo mais tarde (At 16:3). Porém, isso foi feito por uma razão totalmente diferente. Ele fez isso por causa da sua liberdade no evangelho. Ele procurava ser “como” um judeu para alcançar e ganhar os judeus naquela área com o evangelho. Ele disse que iria até ao ponto de fazer-se “como” “os que estão debaixo da lei”, mas ao dizer isso ele rapidamente acrescentou “não estando eu debaixo da lei”. Ele disse: “Para ganhar os que estão debaixo da lei” (1 Co 9:20 – JND). Ele não cria que um Cristão deveria estar sob a lei, mas faria vista grossa para ganhar, para Cristo, alguns sob ela.
V. 4-5 – Além disso, quando “falsos irmãos”, que haviam se infiltrado na reunião privada, levantaram-se e tentaram convencer os outros que Cristãos precisavam estar debaixo da lei, Paulo diz: “Aos quais nem ainda por uma hora cedemos com sujeição”. Seu ponto aqui é igualmente poderoso. Os apóstolos testemunharam, em primeira mão, este afrontamento e não ficaram do lado dos judaizantes que estavam no meio deles impondo a guarda da lei! Em lugar disto, eles deram suporte a Paulo posicionando-se pela “verdade do evangelho”. E foi a partir da boca de Pedro que isso foi estabelecido (At 15:7-11).
Paulo diz claramente que estes judaizantes haviam se introduzido “secretamente [sorrateiramente – JND]” entre os santos. Uma lição que podemos aprender disso é que existe a necessidade de sermos cuidadosos na recepção. Os irmãos naqueles dias não foram cuidadosos e essas pessoas acabaram entrando. Hoje, em quase todos os lugares, a igreja não pratica princípios de recepção, e isso tem causado a entrada de muito mal e muito dano na Igreja.
V. 6 – Já que os judaizantes estavam estimando em demasia os líderes em Jerusalém, Paulo – não intentando falar deles de maneira depreciativa – diz: “aqueles que eram distintos como sendo alguma coisa (o que tenham sido não me faz diferença)” (JND). Seu ponto aqui era de que os apóstolos e líderes em Jerusalém não o intimidavam, embora ele os respeitasse no Senhor (Mc 8:24; Jd 16).
Quando Paulo expôs aos outros apóstolos o seu evangelho, eles não precisaram corrigir ou modificar o que ele pregava, como foi o caso com Apolo quando Áquila e Priscila o tomaram e “lhe expuseram com mais precisão o caminho de Deus” (At 18:24-28 – AIBB). Na verdade, os apóstolos não podiam acrescentar “nada” a Paulo no que diz respeito à comunicação de maior luz e conhecimento na revelação Cristã. Eles simplesmente reconheceram a fonte divina de seu ministério e afirmaram sua verdade e perfeição.
Vs. 7-10 – Os apóstolos reconheceram que o evangelho da “circuncisão” havia sido confiado a Pedro, e o “evangelho da incircuncisão” a Paulo. Paulo segue adiante e diz: “Aqu’Ele” que havia operado em Pedro, fazendo-o um apóstolo, era a mesma Pessoa que havia operado nele, fazendo dele um apóstolo. “Esse”, obviamente, tratava-Se do Senhor. Não somente os apóstolos em Jerusalém reconhecem e afirmam a verdade que Paulo ensinava, mas alegremente prestam suporte a ele e a Barnabé em sua obra, dando-lhes “as destras em comunhão”.
Este segundo acontecimento histórico responde à insinuação de que o evangelho de Paulo era deficiente em certos elementos de doutrina, a saber, a exclusão da lei no evangelho que ele pregava. Tal acontecimento prova que a acusação de seus difamadores era completamente falsa.
Portanto, existem três coisas aqui que os santos gálatas precisavam considerar. Os apóstolos de Jerusalém:
- Nunca insistiram para que Tito fosse circuncidado. - Não dariam suporte ao elemento judaizante que havia se levantado e pressionava para que crentes se colocassem debaixo da lei, antes ficaram do lado de Paulo e contra tais pessoas. - Alegremente reconheceram o ensino de Paulo e deram a ele e a Barnabé “as destras em comunhão”, em suporte àquilo que eles estavam fazendo.
O argumento de Paulo aqui é poderoso. Se os apóstolos em Jerusalém estavam em feliz comunhão com aquilo que ele estava ensinando, por que então os gálatas estavam tendo dificuldade com seus ensinamentos? Aqueles que eram “colunas” na Igreja estavam de acordo com Paulo e não viam seus ensinamentos como imperfeitos de forma alguma. Pensavam os gálatas serem mais espirituais e conhecedores do que os apóstolos em Jerusalém? Condenar a doutrina de Paulo significava condenar os apóstolos que davam suporte à sua pregação com as destras em comunhão! Isso mostrava que os gálatas estavam num terreno perigoso. Eles haviam tomado uma posição que os colocava em colisão, não apenas com Paulo, mas também com os outros apóstolos que estavam em Jerusalém.
O Terceiro **Encontro de Paulo com Pedro
Cap. 2:11-21**
Os difamadores de Paulo também alegavam que ele não possuía autoridade como um apóstolo. Paulo responde a isso mencionando outro acontecimento quando ele havia se encontrado com Pedro. Paulo mostra que tinha autoridade suficiente para repreender aquele que era reputado como o principal apóstolo. Ao mesmo tempo, Paulo lida com a questão que dizia respeito a crentes judeus, se deveriam ou não guardar a lei. O acontecimento anterior havia mostrado que crentes gentios não deveriam ser colocados sob a lei (vs. 1-10), mas a questão ainda permanecia quanto aos crentes judeus, se deveriam estar debaixo dela. Essa questão é endereçada no terceiro encontro com Pedro onde Paulo mostra, conclusivamente, que crentes judeus também não deveriam estar debaixo da lei.
Vs. 11-13 – Algum tempo depois do concílio de Jerusalém de Atos 15, Pedro foi à Antioquia e encontrou os crentes judeus comendo livremente com os crentes gentios. Ele sabia que esta era a ordem de Deus e ajuntou-se a eles, porque “a parede de separação que estava no meio” de judeus e gentios havia sido derrubada (Ef 2:14). Mas quando chegaram certos homens de Jerusalém, da parte de Tiago, Pedro “se foi retirando, e se apartou deles, temendo os que eram da circuncisão”. Outros, incluindo “Barnabé”, se deixaram “levar pela sua dissimulação”. Pedro sustentou a verdade do evangelho em palavra no concílio em Jerusalém (At 15:7-11), mas, na hora de praticá-la, Pedro fez o contrário. Ele falhou ao negar a verdade que ensinava pela sua conduta. Algumas Bíblias traduzem “dissimulação” como “hipocrisia” – e isso é exatamente o que estava acontecendo. A raiz da falha de Pedro estava em que ele queria ter sido considerado por aqueles que tinham reputação em Jerusalém. Ele temeu perder o respeito deles e isto o levou a dissimular. O fato de que ele possuía a posição de um apóstolo fazia da ofensa algo muito mais sério. Quanto mais um homem é honrado, tanto maior pedra de tropeço ele será para outros se vier a falhar. Foi exatamente isso que aconteceu: “E os outros judeus dissimulavam com ele, de maneira que até Barnabé se deixou levar”. O livro de Provérbios diz: “O receio do homem armará laços” (Pv 29:25). Pedro certamente caiu nesse laço e isto o levou a comprometer princípios.
V. 14 – Isso precisava ser tratado imediatamente. Paulo percebeu que a verdade do evangelho estava em jogo, talvez de uma maneira mais séria do que Pedro percebia. Uma falha pública – especialmente uma que influencia e afeta outros – requer uma repreensão pública (1 Tm 5:20). Paulo, portanto, perguntou a Pedro diante de todos: “Se tu, sendo judeu, vives como os gentios, e não como judeu, por que obrigas os gentios a viverem como judeus [a se judaizarem – JND]?” Ao recusar-se comer com os crentes gentios sua ação implicava em que, para a santidade, eram necessárias as observâncias dos costumes e das leis judaicas. E se isto fosse verdade, então depois de tudo, os gentios precisariam de fato estar debaixo da lei para que pudessem estar adequados para a comunhão com crentes judeus. Com efeito, Pedro, por meio de suas ações, estava compelindo os gentios a se “judaizarem”. Este era o mesmo erro que os mestres judaizantes estavam propagando na Galácia e, portanto, a repreensão de Pedro feita por Paulo continha uma repreensão implícita para os gálatas.
Pode parecer como algo pequeno simplesmente recusar comer uma refeição comum com crentes gentios, mas no fundo disso a “verdade do evangelho” estava sendo comprometida, e haveria grandes consequências práticas que colocariam em perigo a comunhão dos santos. Se as ações de Pedro seguissem sem que fossem contestadas, um círculo interno dentro da comunhão dos santos teria se desenvolvido – um tipo de aristocracia entre os irmãos. Criar-se-ia uma igreja dentro da Igreja. Isso implicava que existia algo como santidade e posição espiritual superiores entre os santos, e se os santos gentios quisessem ser admitidos neste círculo, teriam que se judaizar e obedecer aos requerimentos de Moisés. Isso é o que legalismo entre Cristãos frequentemente produz – um grupo de elite se desenvolverá dentro da comunhão dos santos. Tratava-se de algo divisório que precisava ser abordado imediatamente.
Pedro sabia muito bem disso porque o Senhor havia ensinado o contrário a ele quando estava no terraço de Simão, o curtidor. O Senhor havia a ele dito: “Não faças tu comum ao que Deus purificou” (At 10:15). Como todos às vezes fazemos, Pedro não viveu à luz da verdade que conhecia. Sua conduta revelava uma persistente convicção de superioridade dos judeus sobre os gentios. Isso mostra que enquanto os judaizantes haviam sido derrotados no concílio dos apóstolos em Jerusalém, a respeito de acrescentar a lei ao evangelho, o fermento do legalismo ainda estava operando na Igreja Cristã.
Vs. 15-18 – Nos versículos restantes do capítulo, Paulo registra um resumo de sua argumentação com Pedro quanto à lei em relação ao crente (A maioria dos expositores assumem que os versículos de 15 a 21 foram ditos a Pedro). Isso é apresentado aqui porque declara a própria essência de sua doutrina e atua como uma introdução para os próximos capítulos (3-4), onde ele expõe a verdade da justificação.
Paulo fez a Pedro uma segunda pergunta que expunha ainda mais a inconsistência de seu comportamento. Ele disse: “Nós, judeus por natureza, e não pecadores das nações, mas sabendo que um homem não é justificado sobre o princípio de obras de lei, mas pela fé de Jesus Cristo, nós também temos crido em Cristo Jesus, para sermos justificados sobre o princípio da fé de Cristo; e não de obras de lei; porque sobre o princípio de obras de lei nenhuma carne será justificada. Agora se ao procurarmos ser justificados em Cristo, nós somos também achados pecadores, é então Cristo um ministro de pecado?” (Gl 2:15-17 – JND). O ponto de Paulo aqui é que, se Pedro estava correto ao retornar à lei, então Cristo o havia guiado incorretamente ao recusar a lei em Atos 15. Mas isso era impossível; o Senhor não guiaria uma pessoa a fazer ambas as coisas. Paulo pergunta a Pedro: “Você está dizendo pelas suas ações que Cristo é um “ministro de pecado”? Paulo repele tal conclusão dizendo; “de maneira nenhuma”. O verdadeiro pecador ou transgressor não era Cristo, mas Pedro! Qualquer que fosse correto – abrir mão da lei ou retomá-la – uma coisa era certa, Pedro estava errado em um dos dois casos. Se Pedro estivesse certo agora (em retornar às observâncias legais), então suas ações anteriores estavam erradas. Se suas ações anteriores estivessem corretas, então ele estaria errado agora. Em qualquer um dos casos, ele permanecia como um transgressor.
Além da verdade aqui em questão, esta passagem efetivamente refuta a noção de que Pedro era o líder infalível da Igreja, como os católicos romanos ensinam. Pedro claramente errou aqui. Há uma lição para nós nisto: não devemos supor que pelo fato de um homem ser um líder em meio ao povo do Senhor, e honrado, que ele está sempre certo. Líderes também podem falhar.
A Morte e Ressurreição de Cristo Aplicada ao Crente
Vs. 19-21 – Nos últimos três versículos do capítulo, Paulo apresenta um resumo da verdade que ensinava em seu evangelho em conexão com a morte e ressurreição de Cristo em relação à lei. Se esta verdade é propriamente apreendida, uma pessoa não terá dificuldade em enxergar que a lei não tem aplicação alguma ao crente que é “justificado em Cristo”.
Na argumentação de Paulo com Pedro sobre essa particular verdade, ele muda da primeira pessoa do plural para a primeira pessoa do singular – de “nós” para “eu”, “me” e “mim”. Quando se tratava da verdade da identificação do crente com a morte e ressurreição de Cristo, ele não pôde dizer “nós” porque as ações de Pedro colocavam em dúvida se ele havia ou não entendido esta verdade, que é algo extremamente pessoal. Paulo tinha apreendido o significado disso e podia falar dela por si mesmo, mas as ações de Pedro não indicavam que ele estava no melhor entendimento disso. Paulo diz que se ele edificasse novamente as coisas que havia destruído, ele seria um “transgressor” (v. 18). Infelizmente, isso era o que Pedro havia feito.
Isso leva Paulo a mostrar que enquanto que a lei não pode justificar uma pessoa, ela pode matá-lo! Ele diz: “Pois eu, mediante a lei, morri para a lei” (v. 19 – TB). Em Romanos 7:9-11 ele se estende neste assunto, dizendo: “E eu, nalgum tempo, vivia sem lei, mas, vindo o mandamento, reviveu o pecado e eu morri; E o mandamento que era para vida, achei eu que me era para morte. Porque o pecado, tomando ocasião pelo mandamento, me enganou, e por ele me matou”. Tal é a experiência de todo homem que ansiosamente tenta salvar a si mesmo guardando a lei. A lei o mata, e pronuncia a sentença de morte sobre ele. Em lugar de a lei dar vida, ela somente produz morte! Mas tendo morrido **“**mediante a lei” o crente então está morto **“**para a lei” (v. 19). Isto é, a lei não tem mais aplicação ao crente.
Novamente, em Romanos 7, Paulo diz: “Assim, meus irmãos, também vós estais [fostes tornados – JND] mortos para a lei pelo corpo de Cristo, para que sejais doutro, daquele que ressuscitou dentre os mortos, a fim de que demos fruto para Deus. Porque, quando estávamos na carne, as paixões dos pecados, que são pela lei, obravam em nossos membros para darem fruto para a morte. Mas agora estamos livres [desligados – TB] da lei, pois morremos para aquilo em que estávamos retidos; para que sirvamos em novidade de espírito, e não na velhice da letra” (Rm 7:4-6). A sentença de morte foi executada sobre o crente na Pessoa de Cristo. Morremos na morte de Cristo. E desde que a lei somente tem domínio sobre um homem enquanto ele vive (Rm 7:1), ela já não tem mais nada a dizer ao crente agora que ele está morto. J. N. Darby chamou a atenção que essa libertação do crente quanto à lei não surgiu por meio da morte da lei; é o crente que está morto. Já que você não pode fazer com que um homem morto guarde a lei, a lei não tem poder algum para tocar o Cristão. Ela o matou, e isso é tudo o que ela pode fazer. Portanto, na morte de Cristo, o crente é liberto da lei.
Uma antiga ilustração ajuda apreender isso melhor. Um homem foi executado por homicídio. Posteriormente foi provado que ele era culpado de vários outros homicídios. Mas a lei não tinha poder para tocá-lo. Ela já o havia matado, e não havia mais nada que ela pudesse dizer ou fazer para ele. Esta é a posição do Cristão em relação à lei de Moisés. Ela nos provou culpados e nos matou, e agora que nossa conexão com ela está cortada, a lei já não tem mais nada a nos dizer.
Paulo nos disse como ele morreu – “mediante a lei” (v. 19). Agora ele nos diz quando e onde ele morreu – na cruz de Cristo. Ele diz: “Já estou [fui] crucificado com Cristo” (v. 20). Nosso velho “eu” já se foi judicialmente diante de Deus na morte de Cristo. De fato, a epístola apresenta vários aspectos da morte de Cristo por várias razões:
- No capítulo 1:4, a morte de Cristo coloca de lado meus pecados. - No capítulo 2:20, a morte de Cristo coloca a mim de lado - No capítulo 6:14, a morte de Cristo coloca o mundo de lado
A identificação do crente com Cristo não para na morte. Paulo segue dizendo: “e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim”. O crente também está identificado com Cristo no outro lado da morte – na vida em ressurreição (Jo 20:22; Fp 3:10). Aqui é onde o Cristianismo realmente começa – do outro lado da morte – isso é: da morte de Cristo. É na Sua ressurreição e ascensão que somos trazidos à nossa plena posição Cristã e em contato com nossas bênçãos espirituais, e é onde nossa vida está, “escondida com Cristo em Deus” (Cl 3:3).
O crente não apenas escapa do juízo na morte de Cristo, mas em sua identificação com Cristo em ressurreição ele torna-se um vaso para expressão do novo “eu”, o qual é Cristo vivendo nele. Não é que Cristo pessoalmente habita no corpo físico de crentes (como faz o Espírito Santo), mas antes, a vida de Cristo está no crente. O ponto aqui não é tanto que devemos viver para Cristo, mas antes que devemos viver Cristo. O caráter de Cristo deve ser visto em nós.
Além disso, esta vida é para ser vivida “por fé, a fé do Filho de Deus” (Gl 2:20 – JND). Observe que não é fé no Filho de Deus, mas “a fé do Filho de Deus”. Isso significa que em cada passo da nossa vida Cristã devemos exibir o mesmo tipo de fé que o próprio Senhor exibiu quando andou neste mundo. O artigo “na” (v. 20 – ARC) antes da palavra “carne” não deveria estar no texto quando se refere à vida que o Cristão agora vive. Isto implicaria viver após as sugestões da natureza pecaminosa, e negaria todo o ponto da passagem. Não vivemos a nova vida **“**na carne”, mas antes “em carne”, o que simplesmente significa em nosso corpo humano.
Deus sabe que a nova vida, em que devemos viver por fé, precisa de um objeto para sustentar nosso interesse. Portanto, Ele nos deu um novo Objeto para nossa vida – o “Filho de Deus”. Ele é mais do que suficiente para preencher e satisfazer nosso coração e mente. Note que este Objeto não é a lei de Moisés, mas uma Pessoa viva – Cristo. A fé enxerga a Cristo, o Filho de Deus, e olha para Ele; e, na medida em que estamos ocupados com Ele, como nosso Objeto, receberemos poder do Espírito de Deus para fazer as coisas que são agradáveis a Deus (Rm 8:4).
Não apenas temos um novo Objeto para nosso coração, mas temos também um novo motivo para uma conduta Cristã. Ele diz: “O qual me amou, e Se entregou a Si mesmo por mim”. Observe também que Ele nos amou, e provou Seu amor entregando-Se a Si mesmo na Cruz. Eu verdadeiramente vivo, mas por quão grande custo! Tal amor gera amor em nosso coração, o qual produz obediência em nossa vida. Esta não é uma obediência legalista, mas uma obediência que é nascida a partir de devoção de coração a Cristo. Quando aquilo que Cristo fez por nós faz morada em nosso coração, é então produzida uma resposta de obediência em nossa vida que a lei jamais poderia produzir. Tal amor é a fonte da devoção na vida do crente.
Os oponentes da graça irão argumentar que se a lei não tivesse parte na vida do crente, não haveria restrições para uma conduta pecaminosa. Alguém poderia crer no Senhor Jesus para salvação e então seguir em uma vida de pecado. Paulo mostra aqui que existem novos princípios na vida do crente que o motivam – não a pecar – mas a viver uma vida piedosa.
Quatro Novas Coisas na Vida do Crente
Assim, como resultado da identificação do crente com Cristo em ressurreição, existem agora quatro grandes coisas que governam sua vida. O crente tem:
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Uma nova vida – “Cristo vive em mim”.
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Um novo poder – “fé”.
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Um novo Objeto – o “Filho de Deus”.
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Um novo motivo – “o Qual me amou”.
Paulo conclui dizendo: “Não coloco de lado a graça de Deus; porque se a justiça é por lei, então Cristo morreu para nada” (v. 21 – JND). O propósito todo da morte de Cristo cai por terra como desnecessário se a justiça pode ser obtida por se guardar a lei. Se existisse uma maneira legítima de pecadores serem salvos e terem uma posição justa diante de Deus, por que Deus teria enviado Seu Filho à cruz e permitido que Ele sofresse insondáveis agonias? Cristo poderia ter sido poupado de todo aquele sofrimento para fazer a expiação. Sugerir que haveria na verdade outro meio de salvar pecadores (isto é, pela lei deles) e que ainda assim Deus fez Cristo sofrer no Calvário, é lançar um enorme insulto ao coração de Deus. Isso também despreza a grandiosidade da obra de Cristo. Estas são sérias ramificações que resultam de se ensinar que a justiça pode ser obtida pelo guardar da lei.
A Nova Vida Não Precisa de Lei
O erro de tentar acrescentar a lei à graça é assumir uma premissa que é totalmente falsa. Colocar a nova natureza sob a lei é supor que existe alguma coisa na nova vida que quer fazer o errado. Mas não existe nela tal impulso. A nova vida não deseja nada além de fazer a vontade de Deus, e, portanto, tudo o que ela precisa é instrução quanto a isso. Deus nos deu as Escrituras para que possamos conhecer a Sua vontade, e também nos deu o Espírito Santo para nos dar o poder de fazê-la. Na medida em que o crente olha para Cristo e é assim capacitado pelo Espirito Santo, ele irá fazer aquelas coisas que serão agradáveis a Sua vista. Ele irá cumprir os “justos requerimentos (morais) da lei” sem estar debaixo da lei (Rm 8:4 – JND). Na verdade, ao viver a vida de Cristo, o crente irá muito além dos padrões morais da lei, como exibido na vida do Senhor, enquanto andou aqui.
Logo, pensar que a lei é necessária para guiar a nova vida, manifesta uma grosseira falta de entendimento da lei e da nova natureza no crente. A lei não pode corrigir a carne, e a nova vida não precisa da lei.
Não devemos perder a linha de raciocínio de Paulo na defesa de seu apostolado. A razão para mencionar este terceiro encontro com Pedro é mostrar que Paulo não era nem um pouco inferior a ele, mesmo que Pedro fosse reputado como sendo o principal apóstolo. O ponto que os gálatas precisavam entender aqui era que não somente Pedro tinha sido repreendido por Paulo, mas que Pedro aceitou a correção! A segunda epístola de Pedro mostra que ele tinha recebido a correção de Paulo e que também se beneficiou dela (2 Pe 3:15-16). Os gálatas podiam aprender do exemplo de Pedro; se Paulo tinha o poder de corrigir o principal apóstolo, então certamente ele tinha o poder de os corrigir. Portanto, eles deveriam estar desejosos de receber a correção de Paulo quanto à posição e prática Cristã à parte da lei, como Pedro fez.
Resumo dos Três Encontros de Paulo com Pedro
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Seu primeiro encontro responde à falsa acusação de que Paulo era um pregador renegado que não estava no mesmo passo com os apóstolos. Havia, de fato, perfeita harmonia entre ele e Pedro e os outros na Judeia (cap. 1:18-24).
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Seu segundo encontro responde à insinuação de que Paulo era deficiente em seu entendimento da revelação Cristã e, portanto, não poderia haver confiança em sua pregação. Esse relato estabelece que os outros apóstolos não podiam acrescentar algo a Paulo quanto ao entendimento da verdade. Eles reconheceram isto e deram-lhe “as destras em comunhão” em sua pregação e ensino (cap. 2:1-10).
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Seu terceiro encontro responde à acusação de que ele não tinha autoridade como um apóstolo. O relato em Antioquia estabelece o fato de que a autoridade de Paulo como um apóstolo não era inferior à de Pedro, e isso foi demonstrado em sua repreensão a Pedro (cap. 2:11-21).
Isso prepara o palco para a defesa do evangelho que Paulo pregava nos próximos dois capítulos. Ao entender estes fatos a respeito de seu apostolado, os gálatas estariam prontos para receber o ensino de Paulo quanto à verdade da liberdade Cristã separada da lei.
O Evangelho Defendido por Paulo (Capítulos 3-4)
No capítulo 1, Paulo falou da fonte do seu apostolado – vinha do próprio Senhor. No capítulo 2 ele falou do poder do seu apostolado – capaz de resistir aos judaizantes no concílio em Jerusalém e mesmo de repreender o apóstolo Pedro. Agora no capítulo 3, ele fala da mensagem do seu apostolado – o evangelho e as bênçãos que ele concede àqueles que creem nele.
Se os dois primeiros capítulos foram de caráter pessoal, os próximos dois capítulos (3-4) são de caráter polêmico (defendendo a fé por argumento).
A Bênção de Deus é sob o Princípio de Fé à Parte das Obras
O que a lei não pôde fazer e aquilo que a graça fez pelo crente é agora revelado. Neste capítulo, Paulo enfatiza principalmente os resultados positivos que o evangelho traz ao crente, os quais a lei não pode dar. No capítulo 4, ele enfatizará os efeitos negativos que o legalismo tem sobre o Cristianismo quando os dois são misturados.
Neste capítulo ele não apresenta aos gálatas a verdade do evangelho da maneira como está acostumado a ensinar, mas lhes apresenta razões sobre certos fatos irrefutáveis. Paulo comunica a verdade desta forma porque eles haviam se tornado insensíveis (“insensatos”) e ele queria que eles voltassem a pensar de maneira racional. Portanto, o capítulo é doutrinal, porém toma a forma de súplica, argumentação e perguntas.
Paulo apresenta quatro argumentos que provam irrefutavelmente que a bênção de Deus no evangelho é sobre a base de fé e não de obras. Ele argumenta a partir:
- da experiência dos próprios gálatas (vs. 1-5). - da experiência de Abraão (vs. 6-9). - do testemunho das Santas Escrituras (vs. 10-14). - das bênçãos da promessa feita aos patriarcas do Velho Testamento que são incondicionais (vs. 15-25).
A Experiência dos Gálatas em sua Conversão a Deus
Cap. 3:1-5
V. 1 – Paulo começa fazendo seis perguntas aos gálatas com o propósito de abrir os olhos deles e alcançar a consciência. As respostas a estas perguntas são tão óbvias que ele não as declara.
Sua primeira pergunta é: “Ó insensatos gálatas! Quem vos fascinou para não obedecerdes à verdade?” Ele lhes pergunta “quem” era o responsável por esse erro no qual haviam entrado. Esta palavra no grego está no singular. Aparentemente havia uma pessoa em particular que era culpada. Ele pode ter sido um mestre preeminente, ou como alguns expositores sugerem, tratava-se do próprio diabo. Qualquer que fosse o caso, os gálatas tinham sido feitos presas de seus enganos. Paulo os chama de “insensatos” porque eles não parecem ter o senso espiritual para perceber que tinham sido enganados. Eram como homens “fascinados” sob um feitiço maligno.
Como na maioria dos casos de abandono, houve um curso que os tinha levado a engolir a mentira do diabo. Aparentemente os gálatas tiveram quatro os estágios:
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Eles estavam “passando [desertando – AIBB]” daqu’Ele que os tinha chamado – Cristo (cap. 1:6). Eles estavam fora de comunhão com o próprio Senhor.
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Foram “fascinados” pelo inimigo (cap. 3:1). Seguindo adiante, fora de comunhão com o Senhor, tornaram-se vulneráveis às sutis operações do inimigo que os confundiu quanto à verdade.
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Se “sujeitaram” (TB) à religião terrena da qual haviam se desviado (cap. 5:1).
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Foram “impedidos [parados – JND]” de seguir adiante em verdadeira liberdade Cristã (cap. 5:7).
Paulo prosseguiu, dizendo: “perante os olhos de quem Jesus Cristo foi evidentemente apresentado, crucificado entre vós” (v. 1 – KJV). Isto é o que Paulo tinha feito ao lhes apresentar o evangelho. Ele havia apresentado diante deles Cristo crucificado, e eles creram nesta mensagem para salvação da alma. Pregar Cristo crucificado era a essência da pregação de Paulo em todo lugar que ele foi (1 Co 2:2). É uma característica de um bom pregador ou mestre “apresentar” a verdade de forma “evidentemente” e clara. Falsos mestres são normalmente obscuros – particularmente aqueles arraigados ao legalismo. Independentemente de quão simples e claramente Paulo havia ensinado os gálatas, eles tinham tirado seus olhos de Cristo crucificado e estavam olhando para a lei a fim de obterem justificação e santidade. Eles perderam de vista o propósito e significado da cruz e engoliram uma mentira.
Somos Salvos por Fé
V. 2 – As próximas perguntas de Paulo recuam na história dos gálatas, desde a conversão até ao serviço deles para o Senhor. A própria experiência deles prova a loucura de guardar a lei para justiça. Paulo não questiona a salvação deles; ele toma por certo que eles possuíam o Espírito Santo. Os gálatas haviam “recebido” o Espírito (cap. 3:2); o problema deles é que não estavam sendo “guiados” pelo Espírito (cap. 5:18). Isto é instrutivo; embora tivessem sido salvos e selados com o Espírito Santo, eles se tornaram insensíveis, e foram enganados pelo inimigo das almas. Isso mostra que Cristãos verdadeiros não estão imunes aos ataques e sutis enganos do diabo. Crentes verdadeiros podem ser enganados por “espíritos enganadores e doutrinas de demônios” (1 Tm 4:1). Portanto, não é suficiente ter o Espírito habitando em nós para sermos guardados; devemos andar em comunhão com o Senhor.
Uma simples pergunta resolveria a questão no que diz respeito à salvação de uma pessoa ser ou não “pelas obras da lei”. Como os gálatas foram salvos? Receberam eles o Espírito Santo ao fazer obras da lei ou por crer no evangelho? Obviamente que foi por crer no evangelho. Ninguém jamais recebeu o Espírito por guardar a lei. A experiência dos próprios gálatas deveria tê-los ensinado que bênção vem “no princípio de fé” (v. 9 – JND) e não por guardar a lei.
Muitos Cristãos hoje estão orando para receberem o Espírito Santo, não percebendo que eles já possuem a habitação do Espírito. O Espírito faz Sua morada numa pessoa no momento em que ela crê no evangelho de sua salvação (Ef 1:13). As Escrituras nos dizem que se um crente entende que Deus é seu Pai e consegue elevar sua voz em oração a Ele, clamando: “Aba, Pai”, isso é uma prova de que ele tem o Espírito habitando nele (Rm 8:14-15; Gl 4:6).
Crescemos à Perfeição (Maturidade) Cristã por Fé
V. 3 – Mais duas perguntas são feitas. Elas endereçam outra falsa noção que os gálatas tinham – que perfeição Cristã pode ser alcançada pelas “obras da lei”. Muitos Cristãos hoje pensam isso. Eles irão admitir que um crente é justificado por fé, mas insistirão que ele deve guardar a lei depois de salvo como uma regra para sua vida; caso contrário (eles pensam) não haverá nada para impedir um crente de sair em direção a uma vida pecaminosa. Esta é a essência do legalismo. Legalismo é alguém intentar alcançar perfeição Cristã por meio do estabelecimento de regras e regulamentos para a carne, em lugar de ter a Cristo como a força motivadora em sua vida. Uma pessoa inclinada de tal forma pode fazer uso da lei de Moisés ou usar um conjunto de regras que ela impõe a si mesma, todavia em qualquer dos casos, maturidade Cristã não será produzida.
Paulo demonstra a falta de lógica disso perguntando: “Deus começa fazendo uma obra sob determinado princípio, e então a conclui sob um princípio oposto?” Se eles não puderam obter salvação por esforços carnais, como poderiam esperar crescer em santidade em direção à maturidade (“perfeição”) Cristã por meio de esforços carnais? A verdade é que a lei não justificará uma pessoa diante de Deus, e nem produzirá santidade num crente.
Pensar que o crente precisa da lei para guardá-lo de sair em direção ao pecado é não entender o poder da graça. Quando a graça de Deus toma conta da alma ela não o faz querer pecar; ela faz do crente um servo devoto do Senhor! Tal pessoa desejará andar no “Espírito”. Ela desejará mais de Cristo e viverá sua vida na esfera dos interesses de Cristo (Gl 5:16). Consequentemente, o poder do Espírito será manifesto em sua vida na forma de libertação das paixões malignas que emanam da natureza caída pecaminosa (Rm 8:2).
Sofremos por Causa da Nossa Fé
V. 4 – Os gálatas sofreram perseguição dos judeus por assumirem a posição Cristã, a qual é inteiramente baseada em fé. Paulo pergunta: “Será em vão que tenhais padecido tanto?” Todo aquele sofrimento que eles suportaram não serviu para nada? Aqueles que os tinham perseguido, que eram predominantemente seus irmãos judeus que estavam enganados, o fizeram porque os gálatas creram no evangelho em fé simples à parte da lei. Mas agora, ao se tornarem para a lei eles estavam como que dizendo que seus perseguidores, afinal, estavam certos!
Servimos ao Senhor por Fé
V. 5 – Depois que os gálatas foram salvos eles serviram ao Senhor como trabalhadores Cristãos. Alguém que ministrava entre eles, o fazia pelo Espírito e no Seu poder. A essência do ministério Cristão é dispensar a bênção do Espírito a outros. Isso seria tanto em doutrina como também poderia ser na operação de “maravilhas [milagres – ARA]”. (Havia dons milagrosos e sinais sendo manifestos naqueles primeiros dias do testemunho Cristão – Mc 16:17-18; Hb 2:4). A pergunta de Paulo aos gálatas era: “O poder para operar esses milagres vem de se guardar a lei ou pela “pregação [mensagem – TB] da fé?””. Obviamente que era por fé.
Assim Paulo mostrou, a partir da própria experiência dos gálatas, que a vida Cristã, do começo ao fim, é baseada no princípio de fé, e não tem nada a ver com guardar a lei (2 Co 5:7).
O Exemplo de Abraão Sendo Considerado Como Justo
Cap. 3:6-9
V. 6 – Paulo passa então a falar de Abraão. Seu caso é tanto mais convincente, porque Abraão era aquele que, acima de todos os outros, era mais altamente estimado pelos mestres judaizantes. Eles se vangloriavam de que Abraão era seu pai e se vangloriavam nele como seu grande exemplo (Jo 8:39). O argumento deles era baseado no fato de que Deus tinha dito a Abraão que ele fosse circuncidado – e não apenas ele, mas também a sua família inteira, da qual eles reivindicavam pertencer (Gn 17:24-26).
Paulo, portanto, os apanha no próprio terreno deles. Como então Abraão foi considerado como justo diante de Deus? Ele simplesmente “creu em Deus” (Gn 15:6). E quando foi ele considerado como justo? Antes da lei ser dada! Ele nem mesmo ouviu falar da lei de Moisés em seus dias, e ainda assim foi considerado como justo “no princípio de fé” (v. 7 – JND). Além disso, Abraão foi considerado como justo antes de ser circuncidado! Vemos a partir disso que a circuncisão e a lei não tinham nada a ver com o fato dele ser considerado como justo.
Isso não deveria ser uma surpresa para nós porque a bênção de Deus no princípio de fé sempre foi Seu modo de trazer o homem à bênção. Desde o próprio início de Suas tratativas com o homem Ele somente o abençoou no princípio de fé. Hebreus 11:4 confirma isso: “Pela fé Abel ofereceu a Deus maior sacrifício do que Caim, pelo qual alcançou o testemunho de que era justo”.
Vs. 7-8 – Os judaizantes imaginavam que pela sua (suposta) obediência à lei mosaica eles tinham se tornado herdeiros espirituais das promessas feitas a Abraão. Paulo, todavia, salienta que é somente por fé que uma pessoa se torna um filho de Abraão. Ele diz: “Sabei, pois, que os que são da fé [no princípio de fé – JND] são filhos de Abraão”. Não somente as bênçãos prometidas a Abraão foram cumpridas por fé, mas todos seus “filhos” são abençoados neste princípio também. Isso inclui crentes judeus como também gentios que iriam crer. Paulo dá suporte a este pensamento citando Gênesis 12:3, que diz: “Todas as nações serão benditas em ti”. Isso nos mostra que a promessa feita a Abraão era, em princípio, uma predição do evangelho. Ao ler esta citação de Gênesis 12:3 podemos ficar pensando como Paulo encontrou tal significado nesta passagem, todavia o Espírito Santo, que escreveu aquele versículo no Velho Testamento, o fez com a intenção de que víssemos que o evangelho (o qual é baseado no princípio de fé) estava nesta passagem. Não saberíamos disto se Paulo não tivesse, sob inspiração divina, nos explicado este significado encoberto.
O Testemunho das Santas Escrituras
Cap. 3:10-14
Os judaizantes estavam também reivindicando que as Escrituras do Velho Testamento os apoiavam. Eles imaginavam que as Escrituras davam suporte a ideia deles de que a lei deveria ser guardada para que uma pessoa fosse considerada como justa. Paulo, portanto, volta-se para a lei e para os profetas para mostrar que não havia verdade em tal ideia. Aquelas pobres almas pensavam que a Palavra de Deus suportava sua posição, mas na verdade a Escritura provava justamente o contrário. Isso mostra o quão cegos eles estavam. E, infelizmente, aqueles líderes cegos tinham levado os cegos gálatas para a cova deles. (Mt 15:14).
As Santas Escrituras, portanto, tornaram-se a próxima testemunha de Paulo em sua tese para provar que uma pessoa pode apenas ser considerada justa no princípio de fé. Quatro citações são feitas por Paulo para mostrar a falta de lógica em se dirigir à lei para bênção. Na verdade, em alguns poucos versículos (vs. 6-16) ele faz citações das Escrituras do Velho Testamento não menos do que sete vezes.
- V. 6 – Gênesis 15:6 - V. 8 – Gênesis 12:3 - V. 10 – Deuteronômio 27:26 - V. 11 – Habacuque 2:4 - V. 12 – Levítico 18:5 - V. 13 – Deuteronômio 21:23 - V. 16 – Gênesis 13:15
V. 10 – Moisés e Habacuque são citados como representando a lei e os profetas. O que eles têm a dizer sobre isso? Deuteronômio 27:26 é trazido primeiro para mostrar que a lei demandava perfeição. Moisés disse: “Maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas que estão escritas no livro da lei, para fazê-las”. O ponto aqui é que uma pessoa deve permanecer guardando “todas” as injunções contidas na lei; havia uma maldição sobre aquele que não o fizesse. Não era suficiente guardar a lei por um dia, ou por uma semana, ou um mês; uma pessoa deveria continuar a guardar a lei por toda a sua vida! Tampouco pedia a lei ao homem para tentar guardar seus mandamentos – dar à lei a sua melhor tentativa não seria o suficiente. Ela demandava estrita e perfeita obediência. Alguém sob a lei tinha que guardar seus mandamentos em todos os pontos completa e totalmente. Tiago confirma isto, dizendo: “Porque qualquer que guardar toda a lei, e tropeçar em um só ponto, tornou-se culpado de todos” (Tg 2:10).
Mas isso é exatamente o que ninguém foi capaz de fazer. Se as pessoas fossem justificadas sob o princípio de guardar os mandamentos, então ninguém jamais seria abençoado! No entanto, a Escritura é clara de que os santos do Velho Testamento que estavam sob a lei foram abençoados e estão no céu agora. Assim sendo, como então eles foram abençoados? E em quais bases eles foram para o céu?
V. 11 – Habacuque é o próximo a ser citado a fim de se responder a estas perguntas: Ele mostra que fé era o princípio sob o qual os filhos de Deus foram abençoados naqueles tempos antigos – mesmo que estivessem debaixo da lei! Ele diz: “o justo viverá pela fé” (v. 11 – ARA). Isso é citado três vezes no Novo Testamento, e em cada vez a ênfase está numa parte diferente do versículo. Em Hebreus 10:38 a ênfase está na palavra “fé”, porque o assunto ali é o andar no caminho de fé, como mostra o capítulo 11 da mesma carta. Em Romanos 1:17 a ênfase está na palavra “justo”, pois a epístola é uma tese sobre justificação. Aqui em Gálatas 3:11 a ênfase está na palavra “viverá” porque o ponto que é salientado aqui pelo apóstolo é o de que alguém sob a lei deve continuar por toda a sua vida a viver em obediência à lei. Uma pessoa justa sob a lei, nos tempos do Velho Testamento, era abençoada de Deus por conta de sua fé, e não por conta de suas tentativas débeis e imperfeitas de guardar a lei.
V. 12 – Paulo acrescenta: “A lei não é no princípio de fé” (v. 12 – JND), isso é, a lei não demanda fé; ela demanda obediência. Moisés é citado novamente: “o homem que fizer estas coisas, por elas viverá**”** (ver também Rm 10:5). A pessoa sob a lei é responsável por viver sua vida de acordo com aqueles mandamentos. A promessa conectada com isso era de que a pessoa **“viveria”**. O Senhor, quando falando ao doutor da lei que O havia tentado, confirmou isto, dizendo: **“faze isso, e viverás”** (Lc 10:28). Todavia isso trata-se de um preceito teórico que é impossível de ser alcançado pelo homem na carne. A história confirma este fato, visto que não existe ninguém daqueles tempos antigos vivendo hoje. Isso solidifica o argumento. Alcançar justiça diante de Deus no princípio de se guardar a lei (obras) ainda não foi conseguido por ninguém! Sob esse fundamento, ninguém da raça humana chegará ao céu.
Existem na realidade apenas duas religiões neste mundo. Uma diz: “FAÇA”, e a outra diz: “FEITO”. FAÇA é o que todos os credos e religiões requerem – incluindo guardar a lei, mas FEITO é o que o evangelho anuncia. Cristo consumou a obra de redenção, e tudo o que temos de fazer é crer em tal obra e então somos salvos. A lei diz: “Faça e viva”. A graça diz: “Creia e viva”.
Vs. 13-14 – O Testemunho das Escrituras do Velho Testamento mostrou a incapacidade da lei de abençoar. Ela pode somente amaldiçoar. Agora, nestes próximos versículos, vemos o triunfo da graça de Deus em Cristo. Paulo não nos deixa sem esperança. Ele nos diz: “Cristo nos redimiu para fora da maldição da lei” (v. 13 – JND). Redenção significa colocar em liberdade alguém que está sob servidão. “Nos”, neste versículo, se refere aos crentes judeus, pois os gentios nunca estiveram formalmente debaixo da lei. A morte é a penalidade por violar a lei. Cristo, como o grande Substituto, tomou o lugar daqueles que violaram a lei e sofreu a devida punição (Sl 88; Is 53:8). Ele redimiu aqueles debaixo da lei ao pagar a pena de morte que a lei demandava. A maldição de Deus caiu sobre Ele, e aqueles que creem colhem o benefício disso.
A tradução galesa diz: “Cristo nos redimiu completamente…”. O crente é totalmente liberto da lei. O ponto aqui é que não existe tal coisa como estar parcialmente sob a lei. A Escritura não dá suporte à ideia de que a obra de Cristo na cruz redime o crente parcialmente e que o crente faz o resto guardando a lei.
Observe também que a Escritura não diz que Cristo redimiu o homem da maldição da lei ao guardar os dez mandamentos perfeitamente durante o tempo de Sua vida. Isso é um erro antigo na Cristandade. É verdade que Cristo guardou a lei perfeitamente durante a Sua vida, mas a Sua perfeita obediência à lei não foi imputada a nós que cremos. Não é este o meio pelo qual somos considerados justos. Se Sua vida perfeita pudesse nos considerar justos, qual seria então o propósito de Seus sofrimentos na morte?
A citação neste versículo (v. 13) de Deuteronômio 21:23 é ligeiramente diferente do que está escrito em Deuteronômio. O versículo diz: “porquanto o pendurado é maldito de Deus”. Mas em Gálatas, o Espírito de Deus nos dá um significado mais amplo, dizendo: “Maldito todo aquele que for pendurado no madeiro”. Isso incluiria os gentios. O ponto aqui é que se os gentios se colocassem sob a lei, eles iriam sentir sua maldição também! Mas por outro lado, se gentios possuem a fé de Abraão eles entrariam na “bênção de Abraão” (v. 14). Isso não significa que crentes hoje herdam aquilo que foi prometido a Abraão literalmente – isto é, bênção material na terra de Canaã (Gn 13:14-15). O Espírito de Deus ao escrever isto é cuidadoso em dizer que esta bênção é “em Cristo Jesus” (v. 14 – JND). Este termo refere-se a Cristo glorificado à destra de Deus. As bênçãos do Cristão estão em um Homem ressurreto e glorificado que está à destra de Deus pela “promessa do Espírito”. Estas são bênçãos espirituais alcançadas “pela fé”.
A Imutabilidade da Promessa de Graça Feita a Abraão
Cap. 3:15-25
Até então, Paulo demonstrou que a bênção de Deus é por fé e não por obras da lei a partir da experiência dos gálatas (vs. 1-5), a partir do exemplo de Abraão (vs. 6-9), e a partir do testemunho das Escrituras (vs. 10-14). Agora ele se volta para uma ilustração da vida cotidiana. Num parêntese ele diz: “como homem falo”. Ele compara a imutabilidade de um “testamento” feito em assuntos humanos com a imutabilidade do concerto que Deus fez com Abraão.
Este ponto no argumento era necessário em vista do fato de que alguns estavam prontos para admitir que Abraão foi considerado como justo por fé, mas argumentavam que Deus apenas operou naquele princípio até o momento em que a lei foi dada. Portanto, nesta série de versículos a seguir, Paulo mostra que a promessa em graça feita a Abraão e à sua Semente não era uma coisa temporária. A entrega da lei não alterou ou adicionou condições a essa grande promessa de Deus. Ela era permanente e imutável, e não poderia ser afetada pela subsequente entrega da lei.
V. 15 – Paulo prossegue em mostrar que esse princípio no qual Abraão foi abençoado era de fato permanente e imutável. Seu ponto é simples: em assuntos humanos, um “testamento” é assinado e selado e ninguém pode o “colocar de lado ou acrescer a ele outras disposições” (v. 15 – JND). Uma pessoa não pode vir mais tarde e alterar o documento adicionando ou removendo algo dele. E se testamentos humanos não podem ser violados, muito menos o de Deus! Mesmo assim, em essência, isso é o que aqueles que adicionam a lei à graça estão tentando fazer.
Vs. 16-18 – Além disso, o apóstolo cuidadosamente salienta que quando foi feita a promessa, ela foi feita “à Semente” (singular) de Abraão, e não “às sementes” (plural) (v. 16 - JND). A ausência da letra “s” muda completamente o significado da passagem. Gênesis 13:15 e 22:18 não se referem à família imediata de Abraão, mas ao Senhor Jesus Cristo que viria a partir da posteridade de Abraão. Ele é o Descendente direto de Abraão (Mt 1:1; Lc 3:34). Novamente, não saberíamos disso lendo o relato em Gênesis, mas o Espírito de Deus assim nos diz aqui. O ponto que aprendemos disso é que Deus prometeu abençoar “todas as nações” – judeu e gentio de igual modo – por meio de Cristo. E que a promessa era incondicional. “Deus a deu em graça a Abraão” (v. 18 – JND). A promessa não requereu obras de obediência legal. A vinda da lei 430 anos mais tarde não alterou a promessa.
Se as promessas feitas a Abraão estão agora condicionadas à chegada da lei mosaica, então elas deixam de ser um gracioso favor de Deus e tornam-se algo que alguém merece. Paulo diz: “Porque se a herança é no princípio de lei, já não é no princípio de promessa”. Porém ele segue a dizer: “Mas Deus a deu em graça a Abraão” (v. 18 – JND).
As promessas originais em graça foram dadas à parte da lei e serão cumpridas à parte da lei. A promessa de bênção dada a Abraão passou por baixo das tratativas dispensacionais de Deus com Israel e voltou à superfície quando a redenção foi realizada. A lei não traz as bênçãos da promessa; elas foram asseguradas pela morte e ressurreição do Senhor Jesus.
O Propósito da Lei
Vs. 19-20 – Neste ponto de sua argumentação Paulo se desvia um pouco para responder algumas perguntas que ele antecipa que as pessoas iriam fazer. A primeira é: “Logo, para que é a lei?” Este seria provavelmente o argumento que seus opositores lhe lançariam. Eles diriam: “Se a justificação é somente por fé, então qual era o objetivo de Deus em dar a lei? Ela não tem nenhum propósito real!” A isto Paulo responde: a lei “foi ordenada por causa das transgressões”. Alguns têm erroneamente entendido que isto significa que a lei foi dada para ajudar a refrear o pecado no homem. Todavia, a lei não foi dada como meio de controlar ou restringir o pecado na vida dos homens. A lei não tem o poder de fazer isso – seja em incrédulos ou em crentes. Essa ideia errônea estava no alicerce da doutrina dos judaizantes. Muitos Cristãos hoje têm essa ideia também. Eles pensam que a lei irá restringir o mal em sua vida, e por esta razão, se colocam sob ela. No entanto, a lei não tem poder para restringir o mal na vida de uma pessoa. Ela não dá à pessoa uma natureza que deseja guardar suas ordenanças, nem dá à pessoa o poder para cumpri-las.
A resposta de Paulo aqui indica que a lei foi trazida para realçar os pecados e fazê-los conhecidos como “transgressões”. Antes da lei, os homens estavam transgredindo em seu viver iníquo, mas suas práticas iníquas não eram conhecidas como transgressões, porque a consciência deles não estava totalmente iluminada a respeito de todas aquelas ofensas. Em outro lugar, Paulo disse: “porque onde não há lei, também não há transgressão” (Rm 4:15; 5:13). Há duas coisas na Escritura que estão intimamente relacionadas nesta conexão – ofensas e transgressões. Uma ofensa é passar por cima de um limite conhecido, mas uma transgressão é um consciente afastamento de Deus, tanto no coração como nos caminhos de uma pessoa. Ambas as coisas foram trazidas à luz mediante a entrega da lei. A lei traçou uma linha definida na consciência dos homens quanto ao que era certo e o que era errado, aumentando assim sua culpa. Se você tem um menino que está acostumado a ficar correndo pelas ruas e se misturando com pessoas indesejáveis, trata-se de um mau hábito. Mas se você o proibir de sair com essas pessoas, e então ele o faz novamente, isso já é uma transgressão. O que é muito pior do que um mau hábito.
O propósito da lei, portanto, é iluminar a consciência e fazer com que o pecado “se fizesse excessivamente maligno” (Rm 5:20, 7:13). Se isto é entendido propriamente, uma pessoa aprenderia o quão completamente sem esperança é o caso ela, e isso a pressionaria quanto a sua necessidade da graça de Deus. A lei foi dada como uma medida temporária “até que viesse a Posteridade [Semente – TB] (Cristo) a Quem a promessa tinha sido feita” (v. 19), e Ele realizasse a redenção (Gl 4:4-5).
É importante notar que não há nada de errado com a lei em si mesma. A lei é “santa, justa, e boa” (Rm 7:12). Ela tem sua aplicação própria, não para pessoas justas, mas para os transgressores (1 Tm 1:8-10). O propósito da lei é de revelar o pecado; “porque pela lei vem o conhecimento do pecado” (Rm 3:20). A lei não pode remover o pecado ou guardar um pecador ou um crente de pecar, mas ela revela o verdadeiro caráter do pecado. Da mesma forma como um espelho é utilizado para mostrar a uma pessoa que ela está com o rosto sujo – sua função não é lavar o seu rosto.
A lei “foi ordenada por meio de anjos, pela mão de um mediador” (TB). À primeira vista, Paulo parece estar se gloriando na lei, mas é justamente o contrário. Isso demonstra a inferioridade da lei em relação à promessa. A promessa veio diretamente de Deus a Abraão, mas a lei veio por uma mediação dupla. Portanto, a promessa permanece num plano mais elevado.
No caso do concerto mosaico, ele foi estabelecido por meio de um “mediador” porque havia duas partes envolvidas – Jeová e Israel. Os “anjos” agiram da parte de Jeová (Sl 68:17 – KJV; At 7:53), e Moisés serviu como “mediador” da parte do povo. (A mediação de Cristo é algo completamente diferente e não está em vista aqui). O fato de que havia duas partes, indica que existiam condições envolvidas, e obediência imposta a tais condições. O mediador está lá para certificar-se de que ambas as partes cumpram sua parte do acordo. Tal era o caso quando da entrega da lei. No entanto, no caso da promessa de Deus a Abraão, Ele era a única parte ativa. Não havia necessidade de um mediador. A promessa feita à Semente (Cristo) depende inteiramente daqu’Ele que prometeu – o próprio Deus. Esta era a força da promessa – tudo dependia de Deus. A lei colocou obrigações sobre o homem que ele é incapaz de guardar, enquanto que na graça Deus toma conta de todas as coisas para a bênção do homem.
V. 21 – Paulo antecipa uma segunda questão de seus opositores: “Logo, a lei é contra as promessas de Deus?” Esse era outro argumento que seus opositores lhe lançariam. Eles iriam dizer: “Isso soa como se você estivesse dizendo que a lei está em oposição às promessas”. Paulo responde: “De nenhuma sorte”. A lei teve seu propósito, e a graça tem o seu propósito também; uma não entra em conflito com a outra.
Ele segue a dizer que se Deus tivesse a intenção de que a lei provesse justiça ao homem, Ele a teria dotado de poder para “vivificar” aquele que cumprisse suas imposições. Mas não existe tal lei. A lei instrui, insiste, demanda, e até mesmo ameaça; e quando quebrada condena o transgressor, mas ela não dá vida ou justiça. Como mencionado, a lei não foi dada para este propósito.
Mesmo quando Deus deu a lei, Ele indicou ao Seu povo que bênção nunca viria por meio dela. Isso é ilustrado num acontecimento registrado em Deuteronômio 27:11-26. Moisés, aquele que deu a lei, instruiu a Israel a reunir seis das doze tribos no monte Gerizim “para abençoarem” e as outras seis no monte Ebal “para amaldiçoar”. É significativo que as seis tribos no monte Ebal proferiram suas maldições, mas as seis tribos no monte Gerizim ficaram caladas! Elas nunca abençoaram. Por quê? O acontecimento está registrado nas Escrituras para ilustrar o fato de que A LEI NÃO PODE ABENÇOAR; ela pode somente amaldiçoar.
Corra João e viva, a lei ordena vá,
No entanto, nem pernas ou mãos há;
Excelentes novas o evangelho traz,
Estimas-me voar e asas me dás.
V. 22 – A Escritura, de maneira geral, conclui que “todas as coisas” foram “encerradas” “debaixo do pecado” (v. 22 – JND). Isso foi para que “a promessa no princípio de fé de Jesus Cristo, pudesse ser dada àqueles que creem” (v. 22 – JND).
A Lei Como um Carcereiro e Como um Tutor
Vs. 23-25 – A lei, portanto, serviu para um duplo propósito. Em primeiro lugar, a lei foi como um severo carcereiro que manteve Israel num cárcere. A lei os manteve sob custódia (“encerrados” e “guardados”) das nações que os cercavam até que veio o tempo quando “aquela fé” seria revelada, quando a redenção foi realizada (v. 23). Os judeus foram mantidos separados das nações pelos diversos regulamentos da lei quanto ao casamento, alimentação, propriedade, etc. “Aquela fé” é a revelação Cristã da verdade que veio a nós, por meio da morte e ressurreição de Cristo e da vinda do Espírito Santo (como regra geral, na Escritura, quando o artigo “a” está antes da palavra “fé”, refere-se à revelação da verdade Cristã. E quando o artigo não é usado, está se referindo à energia interior da confiança de uma pessoa em Deus). Observe que Paulo diz: “(nós) estávamos guardados debaixo da lei”. Ele fala em nome dos judeus nacionalmente, pois os gentios nunca estiveram debaixo da lei; ela era uma coisa imposta pelos crentes entre os gálatas por eles próprios, que eram de descendência gentia.
Em segundo lugar, a lei foi como um “aio [tutor – JND]” (v. 24). Observe novamente que Paulo diz: “nos serviu de aio [tutor]”. Isto se refere aos judeus, mas se entendida corretamente, a lei instruirá a todos quantos se atentarem para ela. A lei pode nos ensinar sobre a santidade de Deus e sobre a depravação moral do homem. As palavras: “para nos conduzir a” na versão Almeida Revista e Corrigida não estão no texto grego original. Tais palavras induzem ao erro, e podemos entender a partir delas que a lei tem o poder de trazer uma pessoa a Cristo. No entanto, a lei nunca irá levar uma pessoa ao Senhor Jesus para salvação – somente a graça pode fazer isso. O texto deve ser lido: “De maneira que a lei nos serviu de aio até Cristo**”** (JND). Os judeus estavam sob a lei **“até”** o tempo da morte e ressurreição de Cristo por meio das quais a redenção foi realizada e a revelação Cristã da verdade foi revelada (Gl 4:3-6).
Infelizmente, aqueles que estão debaixo do concerto legal não aprenderam esta lição ensinada pelo aio (tutor). Eles ainda pensam que podem guardar as demandas da lei para sua bênção. Isso é um testemunho ao fato de quão depravado o homem na carne é. Depois de todos esses anos debaixo do tutor, a carne não aprendeu a simples lição de que não há “bem algum” no homem (Rm 7:18). Isso não é uma falha do aio, porque ele é “santo, justo e bom” (Rm 7:12). O problema está no material que o aio está instruindo – o homem na carne – o qual é incorrigível. Isso apenas mostra o quanto a raça humana realmente depende da graça de Deus para lhe prover redenção.
O trabalho de um aio é ensinar. A lei ensina:
- A santidade de Deus. - A total depravação do homem na carne.
A Posição do Cristão no Céu e na Terra
Cap. 3:26-29
O apóstolo agora fala do lugar do Cristão diante de Deus no céu e diante dos homens na Terra, em virtude da realização da redenção. Essa nova posição é resultante da vinda “da fé” (Jd 3). Paulo menciona isso para enfatizar um contraste marcante entre aquilo que uma criança3 de Deus sabia até então sob o sistema legal com aquilo que o Cristão tem agora por graça.
Uma Nova Posição Diante de Deus no Céu Como Filhos
V. 26 – Primeiramente, Paulo diz: “Porque todos sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus”. Na ordem da nova criação, aos Cristãos foi dado um especial lugar de “filhos”4 na família de Deus por meio da fé. Filiação é a mais elevada bênção conferida que temos em relação ao Pai. A palavra no grego significa “lugar de filho” e refere-se ao ato de Deus nos colocar diante de Si mesmo na mesma posição de Seu próprio Filho! Paulo se prende nesta bênção em particular porque ela enfatiza a proximidade e liberdade que o Cristão possui na presença de Deus, as quais aqueles no judaísmo não tiveram. A lei foi introduzida por uma dupla mediação – os anjos e Moisés – indicando que o homem naquele sistema estava a certa distância de Deus. O evangelho por outro lado, traz o homem para perto de Deus, à mesma posição na qual o próprio Filho está.
Deus poderia nos ter colocado no lugar privilegiado dos anjos eleitos, ou mesmo ter nos levantado à elevada posição de um arcanjo, mas Ele escolheu nos dar um lugar muito mais elevado e muito mais abençoado do que o deles. Fomos colocados no lugar de Seu Filho! Filiação é uma posição na família de Deus que foi reservada para aqueles que são salvos por graça durante este tempo presente pelo chamado do evangelho. Abraão, Isaque, Jacó e todos os santos do Velho Testamento são parte da família de Deus como suas crianças, porém eles não possuem esse favorecido lugar de filhos (Gl 4:1-7 – JND). Como parte da família de Deus, os Cristãos são “crianças” de Deus (Rm 8:16 – JND), porém eles também são “filhos” de Deus (Rm 8:14). Além disso, nossa filiação é em “Cristo Jesus” (v. 26). Essa expressão refere-se à posição de aceitação do Cristão diante de Deus no Homem ressurreto. Estar “em Cristo” significa estar no lugar de Cristo diante de Deus. Todo o favor e aceitação que descansam n’Ele, na presença de Deus, é também nossa porção, porque estamos em Seu lugar. A grande bênção da “filiação” é compartilhar:
- O lugar de favor do Filho (Ef 1:6). - A vida do Filho – vida eterna (Jo 17:2). - A liberdade do Filho diante do Pai (Rm 8:14-16). - A herança do Filho (Rm 8:17). - A glória do Filho (Rm 8:18; Jo 17:22).
Uma Nova Posição Diante dos Homens na Terra por Meio do Batismo
V. 27 – Em segundo lugar, os Cristãos não somente possuem uma nova posição diante de Deus no céu, mas eles estão em uma nova posição na Terra por meio do batismo. Paulo diz: “Porque todos quantos fostes batizados em [para – JND] Cristo já vos revestistes de Cristo”. Observe que existe uma diferença nas expressões “em Cristo” e “de Cristo”. Por fé somos colocados numa nova posição diante de Deus “em Cristo” (v. 26), porém por meio do batismo nos revestimos “de Cristo” e estamos numa nova posição diante dos homens na Terra (v. 27).
Quando somos batizados, colocamos o distintivo, ou vestimos o uniforme Cristão, e desse modo nos identificamos com a posição Cristã na Terra. A ordenança do batismo tem a ver com desassociação e associação. Uma pessoa que é batizada é formalmente desassociada da antiga posição em que uma vez esteve na Terra (seja no paganismo ou no judaísmo) e é formalmente associada com uma nova posição – o terreno Cristão. Este novo terreno não tem nada a ver com a segurança da bênção eterna de uma pessoa, todavia a coloca declaradamente num lugar limpo na Terra.
Muitas versões traduzem este versículo da seguinte forma: “batizados em Cristo”, porém deveria ser traduzido: “batizados para Cristo” (JND). O apóstolo acabou de nos dizer no versículo 26 que uma pessoa está “em Cristo” por fé. Ele não poderia estar sugerindo que o batismo com água coloca alguém nesta posição diante de Deus porque isso negaria toda a força do seu argumento na epístola – de que nossa aceitação diante de Deus pode somente ser por fé. Batismo é um ato – algo que uma pessoa pode fazer ou se submeter. Se o batismo colocasse alguém neste elo vital em Cristo, então uma pessoa poderia ser salva pelas suas obras! A palavra deve ser traduzida como “para”, a qual se refere à identificação. Pelo batismo com água somos identificados com Cristo em Sua morte e em Sua ressurreição. Isso nos coloca, professadamente, num novo terreno na Terra.
Uma Parte na Raça da Nova Criação
Vs. 28-29 – Em terceiro lugar, a lei produzia toda a sorte de distinções nacionais e sociais, mas todas essas distinções foram colocadas de lado na nova posição em Cristo do Cristão. Como parte da oração matinal de um homem judeu ortodoxo ele iria agradecer a Deus por não ser um gentio, um servo, ou uma mulher. Estas três coisas eram claramente distintas como sendo inferiores em relação ao lugar que um homem tinha no judaísmo. Porém no Cristianismo estas distinções já não existem. “Nisto não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”.
Como parte da raça da nova criação, não apenas estamos “em Cristo” (v. 26), mas também somos “de Cristo” (v. 29). Isso significa que a própria substância de nossa vida e essência de nosso ser é “de” o mesmo caráter daqu’Ele que é o Cabeça da raça. Portanto, a raça de redimidos da nova criação é da mesma “espécie” do próprio Cristo (comparar Gn 1:21-25, 2:23). Somos “todos de um” tipo, de uma espécie, com Ele e, portanto, completamente adequados a Ele como Seus eternos companheiros (Hb 2:11).
Os gálatas estavam enganados em pensar que se guardassem a lei eles seriam “semente de Abraão” (v. 29 – JND). Pelo contrário, Paulo conclui seus argumentos neste capítulo declarando que somos semente de Abraão por crer no Senhor Jesus para salvação. (A “semente” aqui não é Cristo pessoalmente, como nos versículos 16 e 19). Como resultado, somos “herdeiros conforme a promessa” (v. 29b), e também:
- Somos filhos de Deus **“**em Cristo” por meio da fé (v. 26). - Revestimos-nos **“**de Cristo” por meio do batismo com água (v. 27). - Somos **“**de Cristo” na nova criação (v. 29a). - Somos herdeiros **“**com Cristo” em relação à bênção prometida a Abraão (v. 29b; Rm 8:17 – ARA).
Sumário dos Princípios que Paulo Apresentou até Agora na Epístola
Voltar-se para a lei para justiça e salvação contradiz certos fatos e doutrinas Cristãs que são inegáveis, pois negligencia:
- o fato de que o Cristão está morto para a lei (cap. 2:19-21). - o testemunho da história dos próprios gálatas – que tinham sido salvos à parte da lei (cap.3:1-5). - o exemplo de Abraão que foi considerado justo antes da lei (cap. 3.6-9) - o testemunho da Escritura como apresentado na lei e nos profetas – Moisés e Habacuque – de que a lei não pode abençoar, mas somente amaldiçoar (cap. 3:10-12). - a obra de Cristo e a diminui pois ela redime aqueles sob da lei (cap. 3:13-14). - o fato de que a bênção conectada com a promessa é no princípio de fé à parte da lei (cap. 3:15-25).
As Tristes Ramificações de se Misturar Lei e Graça
(Capítulo 4)
No capítulo 3, Paulo defendeu a verdade do evangelho por meio de vários argumentos doutrinais convincentes. No capítulo 4, ele agora mostra que existem alguns sérios efeitos de caráter prático que resultam de se misturar lei e graça – todos os quais prejudiciais ao Cristão. O capítulo 3 mostrou o que a graça produz; agora o capítulo 4 apresenta o que o legalismo produz.
O próprio Senhor (em Seu ministério terreno) advertiu que se lei e graça fossem ligadas de alguma forma, isso levaria a um desastre na prática Cristã. Ele disse “Ninguém deita remendo de pano novo em vestido velho; doutra sorte o mesmo remendo novo rompe o velho e a rotura fica maior; e ninguém deita vinho novo em odres velhos; doutra sorte, o vinho novo rompe os odres e entorna-se o vinho, e os odres estragam-se; o vinho novo deve ser deitado em odres novos” (Mc 2:21-22). Os novos princípios aos quais a graça nos trouxe no Cristianismo devem ser praticados num cenário completamente novo, à parte dos princípios e práticas do sistema legal do judaísmo.
Sete Mães
No capítulo 3, Paulo nos apresentou o testemunho de vários homens: Abraão – o pai daqueles que creem, Moisés – aquele quem deu a lei, e Habacuque – um profeta. A verdade foi desenvolvida, por assim dizer, do lado paternal. Já no capítulo 4, Paulo desenvolve a verdade do lado maternal. Neste capítulo, as mulheres são proeminentes. Ele menciona não menos do que sete mães. Elas são:
- Maria, a mãe do Senhor (v. 4). - O próprio Paulo (v. 19). - Agar, a mãe de Ismael (v. 22). - Sara, a mãe de Isaque (v. 22). - Jerusalém terrena (v. 25). - Jerusalém celestial, a mãe de todos nós (v. 26). - O Espírito Santo, dando à luz a todos que são livres (v. 29).
Homens na Escritura normalmente nos fala do lado posicional na verdade, enquanto que mulheres frequentemente indicam o desenvolvimento moral da verdade na alma. Quando pensamos em uma mãe na Escritura, pensamos na verdade sendo trabalhada moral e praticamente nas vidas. Portanto, o que está diante de nós agora, no capítulo 4, está mais relacionado com os efeitos morais e práticos de se misturar lei e graça. Paulo mostra que estas duas coisas simplesmente não irão funcionar praticamente na vida de um Cristão. Ele demonstra isso de três formas diferentes neste capítulo: por uma ilustração a partir dos costumes de um lar judaico (vs. 1-11), por uma experiência pessoal em suas próprias interações com os gálatas (vs. 12-20), e por uma alegoria do Velho Testamento (vs. 21-31).
Os Que São Governados pelo Sistema Legal Perdem a Liberdade de Sua Filiação
Cap. 4:1-11
O primeiro resultado negativo de se misturar lei e graça é a perda da liberdade de nossa “filiação”. Isto é uma coisa prática. Nunca podemos perder nosso lugar como filhos diante de Deus, mas a liberdade que acompanha aqueles que estão nesta posição de privilégio, pode ser perdida.
Paulo introduziu o assunto da filiação Cristã no capítulo anterior para enfatizar a posição superior que os crentes agora possuem como resultado da vinda da fé. Filiação, como já vimos, é uma das bênçãos distintas no Cristianismo (cap. 3:25-26). Ele volta-se agora para um costume de um lar judaico para ilustrar a diferença da posição favorecida de “filiação” na família de Deus como oposta a diminutiva posição de um “menino [criança – JND]” na família.
Vs. 1-3 – Os santos nos tempos do Velho Testamento, sob a lei, são assemelhados a crianças em um estado de infância, sob “tutores [guardadores] e curadores [intendentes]”. Eles estavam numa posição onde os princípios elementares da religião judaica eram impostos sobre eles e isso atendeu à condição de imaturidade espiritual deles, sendo necessária a disciplina e cuidado constante da lei. Paulo diz: “Assim também nós, quando éramos crianças estávamos mantidos em servidão debaixo dos elementos do mundo” (JND) – isto é, a religião mundana (terrena) do judaísmo. Três coisas caracterizavam os santos em sua posição no Velho Testamento: Eles não conheciam a Deus como seu Pai, a obra de redenção ainda não havia sido realizada, e o Espírito de Deus ainda não havia sido dado. Os rituais e cerimônias que caracterizavam aquela religião terrena haviam sido designados para aqueles que estavam naquela posição diminuta.
Vs. 4-5 – Na “plenitude do tempo” (v. 4 – ARA), quando o período de provação para o homem na carne se completou (4.000 anos ou 40 séculos desde Adão até Cristo), “Deus enviou Seu Filho”. A vinda de Cristo colocou um fim nas três coisas que caracterizavam aqueles do Velho Testamento. A encarnação de Cristo resultou na revelação do Pai (Jo 1:18); a morte de Cristo trouxe redenção (1 Pe 1:18-19); a ascensão de Cristo resultou na descida do Espírito Santo (At 2:33). Portanto, quando uma pessoa aceita o testemunho do Pai e o Filho e descansa em fé na obra consumada de Cristo para sua salvação, ela é habitada com o Espírito Santo, e dessa forma é capacitada a desfrutar a liberdade e os privilégios de um filho adulto na família de Deus.
Paulo indica que aqueles que foram convertidos do judaísmo por crerem no evangelho são como “crianças” que amadureceram. Elas deixaram aquela posição de um menor, e estão agora numa posição de “filhos” na família de Deus. O Bar Mitzvá judaico ilustra isso. Numa família judaica, quando um menino atinge a idade de 13 anos, ele é formalmente elevado da posição de criança na família para a posição de filho; a partir de então ele desfruta de maiores liberdades e privilégios na família. Esta mudança de posição ilustra a posição de um Cristão na família de Deus como oposta à daqueles em terreno judaico nos tempos do Velho Testamento. Isso é verdade para ambos, tanto crentes judeus como crentes gentios. Observe que quando Paulo diz: “a fim de (nós) recebermos a adoção de filhos” no versículo 5, tal expressão refere-se a crentes judeus, e quando ele diz: “E porque (vós) sois filhos” no versículo 6, essa expressão refere-se a crentes gentios.
Teólogos adeptos da teologia do pacto nos dizem que “a plenitude do tempo” (v. 4 – ARA) é a mesma coisa que a “plenitude dos tempos” de Efésios 1:10. Eles creem que quando o Senhor Jesus veio a este mundo em Sua primeira vinda Ele introduziu a “dispensação [administração – JND] da plenitude dos tempos” – a qual é o Milênio. Portanto, de acordo com os ensinamentos deles, estamos no Milênio agora! Todavia, estas duas expressões não são iguais, “a plenitude do tempo” em Gálatas 4 está no singular, enquanto que em Efésios 1:10 está no plural. A “plenitude dos tempos” tem a ver com a culminação dos caminhos de Deus com o homem na dispensação final (o Milênio), quando a glória de Deus será exibida no reino de Cristo e a Igreja; como mencionado, “a plenitude do tempo” tem a ver com a provação do homem na carne sendo completada depois de 40 séculos de teste. Em Gálatas 3:16, Paulo já havia mostrado que a ausência da letra “s” muda consideravelmente o significado da passagem, o mesmo acontece nesta passagem. Podemos ver a partir disso como o não atentar para detalhes importantes na Escritura pode levar ao erro. Devemos ler a Escritura “preceito após preceito; linha após linha” (Is 28:10 – JND), prestando grande atenção aos seu menores detalhes.
Na versão Almeida Revista e Corrigida o versículo 5 diz: “a fim de recebermos a adoção de filhos**”**. Esta última parte do versículo poderia ser traduzida como **“filiação”**5, pois é a mesma palavra usada para **“adoção”** no grego (conforme nota de rodapé em Rm 8:15 na tradução de JND). Alguns imaginam que, assim como existem duas maneiras de crianças serem introduzidas em nossa família terrena (por nascimento ou adoção), assim também Deus também tem duas maneiras de trazer pessoas à Sua família. No entanto, isto não é verdade. Existe apenas uma forma de entrar na família de Deus – pelo novo nascimento. Adoção é uma _promoção_ de alguém que já está dentro da família para a posição superior de filiação.
No sentido em que a palavra “crianças” é usada em Gálatas 4, pessoas tornam-se “crianças” por meio do novo nascimento, e então se tornam “filhos” ao receberem o Espírito. O apóstolo João não usa a palavra “crianças”6 (1 Jo 2:1, 3:7, 18, etc. – JND) num sentido diminutivo como Paulo faz aqui. Nos escritos de João, “crianças” de Deus são vistas como tendo o Espírito (1 Jo 2:20; 3:24, 4:13), e, portanto, refere-se àqueles a quem Paulo chama de filhos. “Crianças” nos escritos de João estão na posição Cristã completa na família de Deus, mesmo aqueles que João classifica como “filhinhos” (recém-convertidos) estão nesta posição (1 Jo 2:18). João os santos de “filhinhos” porque a ênfase em suas epístolas está na vida eterna e no relacionamento que temos com o Pai em afeição; ele não usa o termo “filhos” – embora a versão Almeida Revista e Corrigida traduza “crianças” como “filhos” erroneamente em sua epístola.
V. 6 – Todas as três Pessoas da Divindade são encontradas neste versículo garantindo a liberdade de filiação aos crentes. Paulo diz: “Deus enviou aos nossos corações o Espírito de Seu Filho, que clama: Aba, Pai”. Esta bênção tremenda é a possessão comum de todos os crentes – tanto aqueles que eram judeus como aqueles que eram gentios. Isto é visto no uso do pronome “nós” no versículo 5, que indica crentes judeus, e dos “vós” no versículo 6a, que indica crente gentios. Na última parte do versículo 6, ele une os dois juntos dizendo “nossos”.
A ênfase aqui não está tanto na bênção e posição de filiação, mas nos privilégios práticos conectados com isso. É “o Espírito de Seu Filho” clamando em nosso coração. Isso é, o Espírito nos dá a consciência desta revelação, e a resultante ousadia para nos achegarmos ao Pai com a mesma intimidade que o próprio Filho de Deus Se achega a Ele. Isso é indicado na expressão: “Aba, Pai”. Estas são as mesmas palavras que o Senhor usou quando falou com Seu Pai (Mc 14:36).
- “Aba” indica intimidade - “Pai” indica inteligência
A liberdade de filiação é a de se achegar a Deus como nosso Pai “livremente se dirigindo a Ele” (JND) em todas as nossas orações e louvores (1 Tm 4:5 – JND). Isso não significa que podemos ser irreverentes quando falando com Deus – devemos sempre nos achegarmos a Ele reverentemente. Mas podemos fazer isso com franqueza e intimidade porque somos filhos.
V. 7 – O apóstolo esclarece o fato de que este maravilhoso privilégio de filiação deve ser exercitado individualmente, dizendo: “és filho”. Observe que tal expressão está no singular. Enquanto uma companhia de crentes, somos todos **“**filhos de Deus” (Gl 3:26), mas o exercício prático de nossa liberdade diante do Pai é inteiramente uma questão individual. O que isso significa é que não podemos desfrutar das liberdades da filiação por outra pessoa, e vice-versa; é algo que devemos experimentar individualmente. “Herdeiro de Deus” também é mencionado no singular aqui, talvez pela mesma razão.
Vs. 8-11 – Tendo declarado este maravilhoso privilégio de filiação, o apóstolo agora aponta para o retrocesso dos gálatas. Eles haviam sido salvos e estavam na posição de filhos, porém tinham voltado para a lei. Uma pessoa sob a lei se achega a Deus por meio de um sistema de formas, cerimônias e rituais, os quais a colocam numa certa distância de Deus. Este era o caso do judaísmo, que era uma religião dada por Deus projetada para um povo terreno que não tinha a posição de filiação. Aqueles que viviam no tempo do Velho Testamento se achegavam a Deus desta forma porque “ainda o caminho do santuário [santo dos santos – ARA] não estava descoberto” (Hb 9:8). Ao se dirigirem para esse sistema legal os gálatas perderam a liberdade de sua filiação. O retrocesso deles não era em sua posição diante de Deus como filhos – isto é algo imutável – mas em sua conduta como filhos. Não podemos jamais perder nossa posição de filiação, mas podemos perder a liberdade dela – e este era o problema dos gálatas.
Antes de serem convertidos eles serviram “aos que por natureza não são deuses” e estavam em sujeição a essas falsas deidades escravizantes (v. 8). Isso mostra que, enquanto havia alguns entre eles que eram de descendência judaica, a maioria dos gálatas eram gentios convertidos. E agora, depois de serem salvos, ao se voltarem para a lei, estavam retornando à servidão dos “rudimentos [princípios – JND] fracos e pobres” da religião terrena. A diferença era que o sistema legal mosaico era uma religião de cerimônias e rituais ordenada por Deus, enquanto que a adoração pagã possuía rituais corruptos. Ambas tinham rituais e cerimônias que ficavam entre o adorador e a deidade que ele adorava. Portanto, para um Cristão adotar agora o judaísmo – mesmo tendo sido uma religião ordenada por Deus – é colocar-se em servidão (At 15:10) e perder sua liberdade como um filho.
Isto aconteceu em grande medida na Cristandade. Adoração formal e estruturada veio a ser aceita em muitas denominações como sendo o ideal de Deus, e tomou o lugar da liberdade de filiação que Cristãos possuem de se achegarem a Deus. Na maioria dos casos, esta ordem semi-judaica teve suas raízes no catolicismo e nas igrejas reformadas que surgiram do catolicismo quando crentes tinham pouca luz quanto à revelação Cristã da verdade. Naqueles dias, eles tinham acabado de sair das trevas do catolicismo e não entendiam a verdadeira natureza e chamado da Igreja. Eles (como muitos fazem hoje) creram que a Igreja é o Israel espiritual, e que todas as promessas de Deus para os patriarcas do Velho Testamento se cumpriram hoje na Igreja num sentido espiritual. Sendo assim, eles não veem nada de errado em se misturar ideias judaicas de aproximação de Deus com adoração Cristã.
Consequentemente, em lugar de se achegarem a Deus na liberdade de filiação “livremente se dirigindo a Ele” em oração espontânea, Cristãos nesses sistemas foram reduzidos ao uso de livros de oração e programas de adoração pré-arranjados. A linguagem usada nesses livros de oração indica um povo adorando a Deus a certa distância. A partir disso vem a ideia de se “fazer uma reza”, que é a recitação de uma oração previamente escrita. Nestes sistemas, Deus é tratado como “nosso Pai celestial” como se Ele estivesse bem longe nos céus – embora as Escrituras digam que Cristãos estejam assentados em lugares celestiais na mais próxima posição de Deus possível que uma criatura poderia ter (Ef 2:6). Cristãos estão numa posição onde nenhum sacerdote de ordem aarônica jamais pôde estar – na imediata presença de Deus, no santuário celestial, o verdadeiro “santo dos santos” (Hb 10:19 – ARA). Estando em tal lugar de proximidade de Deus é adequado que nos dirijamos a Ele simplesmente como “Pai”. Além disso, salmos do Velho Testamento são utilizados para expressar os sentimentos de Cristãos em suas orações e louvor. Os salmos, como sabemos, estão cheios de expressões que indicam que o adorador não tem a certeza de salvação e aceitação diante de Deus por meio da obra consumada de Cristo. O grande efeito de Cristãos adotarem estas expressões é que a liberdade de filiação na presença de Deus, o Pai é, na prática, perdida inteiramente. Os que assim fazem acabam essencialmente se aproximando de Deus no terreno do Velho Testamento.
Grupos Cristãos que possuem maior luz e entendem que a adoração Cristã formal nas grandes igrejas eclesiásticas da Reforma não é o ideal de Deus, também podem perder a liberdade de filiação na presença do Senhor. Se o espírito de legalismo penetrar em tal ajuntamento de Cristãos, isso se fará evidente pelas orações dos santos sendo rígidas e cheias de chavões frequentemente repetidos.
Vs. 10-11 – Os gálatas desviaram-se entrando em cerimônias e rituais rudimentares de religião terrena. Estavam guardando “dias, e meses e tempos, e anos”. Fazendo isso, estavam se voltando para um sistema que os colocaria, na prática, no terreno do Velho Testamento. Esta era uma grande preocupação para o apóstolo. Ele disse: “Receio de vós, que não haja trabalhado em vão para convosco”. Isso significa que ele temeu por eles no que diz respeito à vida espiritual deles, porque estavam num caminho totalmente errado. Além disso, Paulo viu seu “trabalho” despendido com eles como sendo de nenhum efeito.
Em suma, o primeiro ponto de Paulo no capítulo 4 é que se um Cristão mistura princípios de lei com graça, ele irá se colocar sob a “servidão” da religião terrena e perderá a liberdade de sua filiação na presença do Pai.
Os Que São Governados pelo Sistema Legal Tornam-se Frios e sem Empatia
Cap. 4:12-20
O apóstolo agora passa a falar de outro efeito negativo resultante de se misturar lei e graça – o crente torna-se frio e sem empatia em suas interações com outros. Paulo aponta para a própria conduta dos gálatas para com ele como uma prova disso. Isso mostra que se um Cristão vive sob princípios legalistas, isso não afetará somente sua liberdade na presença de Deus, mas também afetará sua conduta entre seus irmãos.
V. 12 – Paulo começa rogando-lhes: “sejais como eu”. Ele está falando aqui daquilo que ele era na prática – completamente liberto da lei. Ele queria que eles tivessem a mesma liberdade que ele tinha. Ele também diz: “porque também eu sou como vós”. Isto é, em posição eles eram como Paulo era, porque todos crentes estão na mesma posição diante de Deus como filhos. Existe um princípio importante que Paulo emprega aqui que não podemos perder. O princípio é: Não podemos esperar ter poder sobre outros para guiá-los para fora de algo se nós mesmos não estivermos limpos disso. Paulo podia rogar aos gálatas para que se livrassem da lei porque ele próprio estava liberto dela. Então ele acrescenta: “nenhum mal me fizestes”. Embora estivesse triste com o retrocesso deles, ele queria assegurar-lhes de que não estava pessoalmente ofendido pelas suas ações recentes para com ele.
Vs. 13-16 – Paulo volta ao princípio da experiência deles e lhes mostra o que o legalismo havia feito na vida deles. Como recém-convertidos, os tenros brotos da graça começaram a se desenvolver neles, e isso era muito bonito. Isso pôde ser observado no seu genuíno amor e cuidado para com o apóstolo. Ele tinha uma “fraqueza na carne”, alguma doença (talvez com os seus olhos) que era uma verdadeira prova para ele no serviço ao Senhor. Todavia, eles não o “desprezaram” nem o “rejeitaram” com “desdém” por conta disso, antes o trataram com ternura e o receberam “como um anjo de Deus” (v. 14 – JND). O cuidado deles para com ele chegou ao ponto em que, se fosse possível, arrancariam seus próprios olhos para lhe dá-los. Porém agora, voltando-se para a lei, aqueles tenros brotos de graça haviam sido expulsos deles. Os gélidos ventos do legalismo fizeram com que seus corações se esfriassem para com ele – a tal ponto que ele agora estava sendo tratado como um inimigo! Ele diz: “Fiz-me acaso vosso inimigo dizendo a verdade?” Tal é o triste e lamentável resultado que um espírito legalista produz; ele enfraquece e restringe o fluxo das afeições de um crente para com os outros.
O ponto de Paulo é claro; legalismo tende a fazer do crente frio e sem empatia. Alguém que vive em linhas legalistas geralmente faltará com graça em suas interações com outros, tenderá a ser severo em suas ações em lugar de ser gracioso. Normalmente tomará uma linha dura em questões que se levantam na assembleia, em vez de adotar uma linha mais branda e graciosa. Não estamos dizendo que tais pessoas não possuam momentos graciosos, porém o que as caracterizam é a insensibilidade, dureza e, frequentemente, um espírito crítico. Isso é normalmente apontado para aqueles que não aderem às suas regras e regulamentos.
Outra coisa que pode ser aprendida a partir disso é que a doutrina de uma pessoa afeta sua conduta. Má doutrina leva à má prática (2 Tm 2:16). No caso dos gálatas eles haviam se encharcado de má doutrina em relação à lei, e isso produziu má conduta.
Os Que São Governados pelo Sistema Legal Perdem seu Discernimento
Cap. 4:17-19
Paulo agora se atém em outro triste resultado de se misturar lei e graça, que é: Aqueles que vivem por princípios legalistas perdem seu discernimento espiritual. Novamente, os gálatas eram uma prova viva disso. Paulo toca em ao menos três coisas que indicam que eles tinham perdido sua sensibilidade espiritual.
V. 17 – Primeiramente, eles não discerniram os motivos malignos que estavam operando nos mestres judaizantes em seu meio. A fim de expor estes motivos encobertos Paulo falou em grande clareza de discurso: “Eles têm zelo por vós, não como convém [corretamente – JND]”. Os legalistas haviam impressionado os gálatas com o seu zelo; fizeram uma exibição de devoção e exercício espirituais e os santos na Galácia foram enganados por isso. Isso mostra que eles estavam bem desprovidos de discernimento. Infelizmente, estes falsos mestres tinham desígnios para levarem os gálatas para longe do apóstolo e após si mesmos. Paulo, portanto, foi adiante e disse: “querem excluir-vos de nós para que sejais zelosos após eles” (v. 17 – JND). Era evidente que eles estavam buscando por seguidores (At 20:30) e, infelizmente, os gálatas caíram em sua armadilha. Como isso aconteceu? Ao misturar a lei com o Cristianismo eles se tornaram insensíveis aos movimentos destes obreiros malignos que consequentemente os enganaram.
Muitos queridos Cristãos hoje têm sido enganados desta forma. Um obreiro Cristão cheio de energia e entusiasmo aparecerá e os impressionarão com uma exibição de piedade e devoção e eles se deixarão levar por isso. Frequentemente quando pessoas são impressionadas de tal forma, é porque não estão firmadas na fé (Cl 2:7). Em Romanos 16:25, Paulo nos diz que existem duas coisas que são necessárias para “confirmar [estabelecer – JND]” o crente, elas são: ter entendimento do seu “evangelho”, e ter entendimento da “revelação do mistério”. Estarem firmados nestas coisas teria ajudado os gálatas a detectar o erro e refutar os avanços dos mestres judaizantes.
V. 18 – Paulo explica que zelo é bom, mas ele deve ser “naquilo que é correto” (v. 18 – JND). Zelo nas coisas de Deus não é suficiente; ele deve ser de acordo com a verdade. Uma pessoa pode ser sincera acerca de algo, mas ser sinceramente errada. O teste não é o quão entusiástica uma pessoa é, mas antes se o que ela apresenta é a verdade. Isto mostra que não podemos julgar a mensagem que uma pessoa traz meramente pela conduta externa dela. É verdade que a vida dos servos deveria estar de acordo com a mensagem que eles trazem (1 Ts 2:1-8), mas mais importante que tudo, eles têm que trazer a verdade. Muitos têm sido enganados simplesmente porque homens são zelosos e sinceros. Em outro lugar Paulo diz: “com suaves palavras e lisonjas” eles “enganam os corações dos símplices” (Rm 16:18). “Julguemos”, portanto, “todas as coisas”, retendo “o que é bom [correto – JND]” (1 Ts 5:21 – ARA).
Vs. 19-20 – Uma segunda coisa que provava que o discernimento dos gálatas tinha sido afetado de forma prejudicial era que eles não conseguiram discernir os motivos legítimos do apóstolo Paulo, que era genuíno em seu amor e cuidado pelo bem-estar espiritual deles. Ele desejava o bem e a bênção deles, porém eles não discerniam isso e estavam tratando Paulo como um inimigo!
Em vista do estado confuso deles, Paulo suplica-lhes, como suas queridas “crianças” pelas quais “ele sentia novamente as dores de parto até que Cristo” fosse “formado” neles. Ele sentiu como se ele tivesse que começar novamente com eles, porquanto tinham regressado de tão terrível forma. Ele usa a figura de uma criança no ventre de sua mãe para expressar a servidão restritiva do legalismo no qual estavam; quando uma mulher dá à luz, sua criança é libertada. Paulo falou dos seus trabalhos com eles como uma mãe sentindo as dores de parto para dar à luz crianças à verdadeira liberdade Cristã. Este era um verdadeiro exercício maternal. Ele não apenas deu à luz aos seus convertidos, mas também criou aqueles crentes recém-nascidos com as verdades simples da Escritura (1 Ts 2:7-8). Com os gálatas, Paulo teve que sentir as dores de parto “de novo”, porque ele já o tinha feito quando eles eram recém-convertidos. Ele os havia libertado da servidão do paganismo, e agora teria que fazer isso de novo libertando-os da servidão do legalismo.
Vemos aqui como Cristo é formado nos santos – por meio do ensino sadio. Doutrina correta leva à prática correta. Uma coisa é estar “em Cristo” (cap. 3:26), outra coisa é ter “Cristo … formado” em você (cap. 4:19). Esta última tem a ver com o lado moral da verdade tendo seu efeito prático no crente, de maneira que as características de Cristo – tal como graça, benignidade, paciência, amor, etc. – são vistas nele. Maturidade Cristã é ser como Cristo, mas infelizmente, isso tinha sido impedido nos gálatas pelo legalismo.
Em vista do retrocesso deles, Paulo queria estar com eles e “mudar” sua “voz” para mostrar-lhes exatamente o quão preocupado ele estava. Ele estava “perplexo” quanto à maneira em que eles tinham se afastado para tão longe do caminho e não pareciam perceber isso. Da mesma forma devemos ficar profundamente entristecidos – e mesmo justamente irados quando alguém desvia uma pessoa do caminho (2 Co 11:29).
V. 21 – Uma terceira coisa que indicava que o discernimento dos gálatas tinha sido afetado é o claro fato de que eles não estavam discernindo aquilo que a lei estava realmente dizendo. Paulo argumenta com eles dizendo: “Dizei-me, os que quereis estar debaixo da lei, não ouvis vós a lei?” Os gálatas haviam se tornado tão insensíveis que não estavam ouvindo aquilo que a lei estava demandando, tão pouco estavam percebendo aquilo que a lei tinha produzido na vida deles. Isso mostra que eles tinham perdido seu discernimento.
Esta evidência pode ainda ser vista em Cristãos que se colocam debaixo de princípios legais nos dias de hoje. Se você fosse apresentar-lhes os perigos do legalismo, eles honestamente não iriam entender do que você está falando. Uma influência cegante na sua mente legalista os faz bastante insensíveis para todo raciocínio lógico. Eles normalmente recusarão qualquer exortação dada a eles por pessoas preocupadas, imaginando que estão sendo fiéis ao Senhor.
A prova de que os gálatas tinham se tornado insensíveis por meio de seu entusiasmo com a lei é testemunhada pelo fato de que:
- Eles não conseguiram discernir o verdadeiro caráter dos judaizantes que estavam operando entre eles (vs. 17-18). - Não conseguiram discernir o legítimo caráter de Paulo de genuíno amor e preocupação pelo bem-estar espiritual deles (vs. 19-20). - Não conseguiram discernir o que a lei estava realmente dizendo e fazendo com eles (v. 21).
Os Que São Governados pelo Legalismo Tornam-se Uma Fonte de Contenda Entre Seus Irmãos
Cap. 4:22-31
Paulo passa a falar de outro triste resultado de se misturar lei e graça. O qual é: Aqueles que vivem nos princípios do concerto legal perseguirão aqueles que andam em graça e serão uma fonte de contenda entre seus irmãos. Novamente, os gálatas eram uma prova viva disso; eles estavam se mordendo e devorando uns aos outros (Gl 5:15)
Para demonstrar este efeito devastador da mistura de princípios de sistema legal com graça, Paulo se volta para uma “alegoria” do Velho Testamento. Os gálatas afirmavam entender a lei mosaica e estavam desejosos de ser confinados pelos seus preceitos; então certamente eles puderam ver a força de uma ilustração extraída de um dos livros de Moisés. A alegoria ilustra a incongruência que existe entre a lei e o evangelho e o inevitável antagonismo entre aqueles que são governados por princípios legalistas e os que andam em graça.
Vs. 22-23 – A alegoria apresenta Sara e seu filho em oposição com Agar e seu filho. Essas duas mulheres tinham dois relacionamentos totalmente diferentes com Abraão, os quais produziram resultados completamente distintos. Os dois filhos ilustram a diferença entre a servidão que existe no sistema legal e a liberdade no Cristianismo.
Vs. 24-27 – As duas mães representam dois concertos: Sara o novo concerto da graça, e Agar o antigo concerto da lei. “Agar” refere-se ao “monte Sinai”, o qual gera “filhos para servidão” e corresponde àquilo que “Jerusalém” é presentemente – o sistema legal. Por outro lado, a “livre” (Sara) vivia na casa de Abraão como sua esposa escolhida. Ela corresponde à “Jerusalém que é de cima” (Jerusalém celestial) – o inteiro sistema de graça divina. Ela é a mãe daqueles que permanecem na graça. Paulo cita Isaías 54:1 para enfatizar a liberdade que a graça traz. Quando a lei foi imposta no monte Sinai ninguém irrompeu em cânticos. Mas quando a graça alcançar a nação de Israel, num dia vindouro, haverá alegria e cânticos. “Canta alegremente, ó estéril, que não deste à luz: exalta de prazer com alegre canto”. Nota: Este gozo que a graça traz não é um resultado de suas obras e esforços; aqueles que “não” estão “de parto” são os que darão à luz suas crianças naquele dia!
Paulo então ensina uma lição muito tocante a partir desta alegoria. A “escrava” (Agar), que era uma serva na casa de Abraão vivendo sob ordens e regulamentos pertencentes ao seu papel naquela familia, podia somente dar à luz a um escravo (Ismael) – um que era tal como ela. Isso é o que a lei irá produzir – escravos! No entanto, Deus não quer escravos no Cristianismo – isso é, aqueles que são governados por regras e regulamentos. Temos notado que aqueles que são governados por princípios legalistas parecem abordar a conduta Cristã como uma questão de dever ao invés de um feliz privilégio. Por outro lado, a “livre” (Sara) vivia na casa de Abraão como a sua esposa escolhida. Ela deu à luz a um filho (Isaque) que não era um escravo, mas herdeiro de tudo quanto Abraão possuía. Ela é uma figura do que a graça produz; ela gera aqueles que andam na feliz liberdade e privilégio de filiação. Isso é o que Deus quer no Cristianismo.
O resultado dos dois filhos nascidos sob dois princípios opostos e habitando na mesma casa era que “aquele que era gerado segundo a carne perseguia o que era segundo o Espírito” (v. 29). Os dois meninos não podiam viver juntos pacificamente; Ismael zombava da verdadeira semente, Isaque. A conclusão à qual Abraão chegou (por meio da sugestão de Sara) foi que o escravo-servo deveria dar lugar ao filho. A decisão, portanto, foi: “Lança fora a escrava e seu filho”. Ambos tinham de ir.
- Agar corresponde à lei. - Ismael corresponde à carne sob a lei.
Vs. 28-31 – Paulo faz uma aplicação poderosa a partir disso. Desde que os gálatas insistiam em seguir o exemplo de Abraão, Paulo aponta para uma coisa que Abraão fez e que eles precisavam seguir – ele lançou fora a serva e seu filho! Eles precisavam lançar fora a lei (como regra de vida) e a carne que desejava viver sob a lei. A coisa foi “mui má [dolorosa – JND]” para Abraão – e isso provavelmente também era para os gálatas – mas Abraão o fez (Gn 21:9-14). Agora era a vez dos gálatas o fazerem também.
A perseguição de Ismael a Isaque ainda existe hoje, como Paulo disse: “assim é também agora” (v. 29). Estes dois princípios opostos de lei e graça não podem habitar juntos na Igreja. Aqueles governados por princípios legalistas serão contrários àqueles que vivem em graça, e serão uma fonte de contenda e divisão entre seus irmãos. O que temos observado é que assembleias que são marcadas por aqueles que vivem nesses dois princípios opostos são assembleias divididas; a unidade prática é constantemente ameaçada. É um fato triste que o legalismo alimente a contenda e a divisão entre os santos de Deus. A razão é que aqueles que vivem em linhas legalistas estão na verdade vivendo o Cristianismo “segundo a carne” – embora não vejam isso. Aqueles que andam na graça são o objeto da hostilidade e criticismo deles porque não andam pelas suas regras e regulamentos.
Se permitirmos o pensamento de que nosso favor com Deus seja o resultado de nosso bom andar e esforços para agradar o Senhor (a essência do legalismo), duas coisas negativas inevitavelmente resultarão. Em primeiro lugar, desenvolveremos uma postura de justiça própria de estarmos orgulhosos por estarmos guardando nossas regras e regulamentos. Em segundo lugar, faltaremos com graça em nossas interações com outros e nos tornaremos críticos daqueles que não aderem nossas regras. Isto certamente irá promover contenda e divisão entre irmãos.
Aqueles que insistem em princípios legalistas para governo dos santos manifestam:
a) Falta de entendimento da maneira pela qual Deus desenvolve crescimento espiritual nas almas. Espiritualidade e santidade não podem ser alcançadas ao se insistir em restrições legalistas impostas sobre crentes. Pode parecer funcionar por um tempo, porém tais meios não irão produzir resultados positivos e duradouros em Cristãos.
b) Falta de fé para confiar em Deus para realização de uma obra real em nossa alma de verdadeira espiritualidade e piedade. Esta falta de fé é manifesta em sua tentativa de realizar o trabalho de Deus em almas pelos meios carnais do legalismo.
V. 31 – O capítulo 3 terminou com o crente sendo visto como “semente” de Abraão, no que se refere a sua posição diante de Deus. O capítulo 4 encerra com o crente sendo visto como “crianças” de Sara no que diz respeito ao andar prático entre os homens. No entanto, é bem possível ser semente de Abraão, mas viver como filho de Agar! Este era o erro dos gálatas.
Resumo das Tristes Ramificações de se Misturar Lei e Graça
Assim, no capítulo 4, Paulo nos ensinou que existem alguns perigos sérios e práticos em se misturar lei e graça. Os resultados são devastadoramente destrutivos, não apenas na vida do crente individualmente, mas também na assembleia coletivamente. Afeta também a vida pessoal do Cristão na presença de Deus, assim como sua vida entre seus irmãos. Em suma, viver nos princípios do sistema legal:
- Vs. 1-11 – Coloca o crente em servidão, fazendo-o perder a liberdade de sua filiação na presença de Deus. - Vs. 12-16 – Enfraquece e restringe a manifestação das afeições de um crente para com outros. - Vs. 17-21 – Causa uma perda de discernimento no crente e impede o desenvolvimento do caráter de Cristo ser formado nele. - Vs. 22-31 – Leva uma pessoa a perseguir aqueles que vivem na liberdade da graça, e ser assim uma fonte de contenda entre irmãos.
Exortações à Graça e à Liberdade Cristãs
(Capítulos 5-6)
Nos capítulos 3-4 somos ensinados que o crente é justificado à parte da lei e que misturar lei com princípios de graça é prejudicial à vida Cristã num sentido prático. Agora nos capítulos 5-6, o apóstolo exorta os gálatas à conduta Cristã correta no que diz respeito a essas verdades.
Sete Exortações
Nesta última seção da epístola existem sete exortações distintas à vida normal Cristã. Elas resumem a vida prática de um crente andando em graça. Estas exortações são acompanhadas de explicações e razões quanto ao porquê é dada atenção a elas. Esta é uma das muitas belezas do Cristianismo; não apenas somos exortados à vida Cristã correta, mas nos é dito o porquê. Não era assim no judaísmo; aos filhos de Israel era dito que fizessem o que Moisés os havia ordenado, sem explicações. Por vezes Moisés mesmo não sabia porque o Senhor queria que eles fizessem aquelas coisas. Mas isso não é assim no Cristianismo; temos um “culto racional [serviço inteligente – JND]” (Rm 12:1). Fazemos as coisas que Deus pediu para fazer com entendimento.
1) Permanecei Firmes na Liberdade Cristã
Cap. 5:1-15
O capítulo 4 terminou com aquilo que o crente é pela graça de Deus – “livre”. Isso atua como uma transição para o que se segue nestas exortações. Paulo começa com: “Estai [permanecei – AIBB], pois firmes na liberdade com que Cristo nos libertou, e não torneis a meter-vos debaixo do jugo da servidão”. Esta é uma exortação à firmeza na nossa posição e crença quanto à “fé que de uma vez para sempre foi entregue aos santos” (Jd 3 – AIBB). Isso requer um entendimento claro da verdade que Paulo apresentou nos capítulos 3 e 4. “Permanecer firme” na verdade deve necessariamente vir primeiro nas exortações dos capítulos 5 e 6; as que se seguem fluem a partir desta. É imperativo, portanto, que os gálatas estivessem firmados na fé Cristã – particularmente naquilo que pertence à liberdade do crente. Se eles estivessem firmes na verdade, os charlatões que os enganaram não teriam sido capazes de desviá-los para dentro do “jugo da servidão” (Jo 8:32).
A posição a que Paulo se refere aqui não é a nossa posição diante de Deus em Cristo pela fé em Sua obra consumada na cruz (Rm 5: 2; 1 Co 15:1; 1 Pe 5:12). Essa posição é uma coisa posicional que é perfeita e completa e nunca pode ser alterada. Portanto, não há exortação na Escritura em conexão com nossa posição em Cristo; é firme e certa em Cristo no alto. O “permanecer firme” mencionado aqui é algo prático em que alguém se mantém firme em suas convicções sobre a verdade (1 Co 16:13; Ef 6:11-14; Fp 1:27, 4:1; 1 Ts 3:8; 2 Ts 2:15).
Nos versículos seguintes (2-15), Paulo apresenta um número de razões pelas quais eles precisavam permanecer firmes na verdade.
a) Adotar a Lei com Efeito Nulifica a Obra Expiatória de Cristo
V. 2 – Para enfatizar a importância de se atender à exortação para “permanecer firme”, Paulo fala com todo o peso de sua autoridade apostólica, dizendo: “Eis que eu, Paulo, vos digo”. O ponto neste versículo é que a obra de Cristo é o único terreno verdadeiro de aceitação diante de Deus para o crente. Se uma pessoa tomar qualquer outro terreno para sua aceitação, ela, com efeito, nulifica o único terreno de expiação que existe.
Não foi dito aos gálatas pelos judaizantes que abandonassem sua fé Cristã, mas que acrescentassem a guarda da lei à obra de Cristo como um terreno adicional de aceitação para com Deus. Paulo mostra que isso é impossível. Ele diz: “se vos deixardes circuncidar (um termo que ele utiliza para se referir à adoção do sistema legal), Cristo de nada vos aproveitará”. Simplesmente não pode existir duas bases de aceitação para com Deus, duas salvações, dois caminhos de vida. A aceitação de um implica a rejeição do outro. Não pode haver nenhum comprometimento; qualquer desvio destrói todo o sistema de graça. Portanto, para os gálatas terem aceitado guardar a lei como seu terreno de aceitação, significava que eles haviam efetivamente rejeitado a obra expiatória de Cristo. A gravidade disso é impossível de ser exagerada. Se uma pessoa está confiando em guarda da lei para sua justificação e aceitação diante de Deus, então ela claramente não está descansando em fé na obra consumada de Cristo para sua justificação. Se este é o caso, essa pessoa absolutamente não é salva! Portanto, é como se Paulo estivesse dizendo: “Eu não penso que você quer adotar este terreno, porque se o fizer, estará se colocando na posição de uma pessoa que absolutamente não é salva!”
b) Adotar a Lei Coloca a Pessoa Sob a Maldição da Lei
V. 3 – Outra razão para “permanecer firme” naquilo que a graça realizou e não se embaraçar com a servidão do sistema legal é que aqueles que adotam o sistema legal se colocam sob a obrigação de fazer tudo o que a lei ordena. Paulo diz: “E de novo protesto [testemunho] a todo homem que se deixa circuncidar, que está obrigado a guardar toda a lei”. A pessoa se compromete em obediência ao sistema inteiro e é obrigada a guardar “toda a lei”. O problema aqui é que ninguém foi capaz de fazer isso! Além disso, falha em guardar a lei – o que é inevitável – traz sobre a pessoa a maldição da lei! Tiago confirma isso, dizendo: “Porque qualquer que guardar toda a lei, e tropeçar em um só ponto, tornou-se culpado de todos” (Tg 2:10).
Os gálatas (e muitos Cristãos hoje) precisavam entender que uma pessoa não pode adotar a lei de um modo fragmentado – selecionando e escolhendo quais partes quer reter e praticar. Se você adota o terreno da lei então você tem que tomar ele todo. Paulo tinha já declarado no terceiro capítulo: “Maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas que estão escritas no livro da lei, para fazê-las” (cap. 3:10)
Portanto, ao adotarem a lei, como seu terreno de aceitação, os gálatas não haviam apenas se desviado para longe do único real meio de aceitação diante de Deus (na obra consumada de Cristo), mas também tinham adotado aquilo que tão somente os condenava! Não é de se surpreender que Paulo tenha dito: “Ó insensatos gálatas” (cap. 3:1)
c) Adotar a Lei Priva a Pessoa do Benefício Assegurado Pela Graça
Vs. 4-6 – Outra razão para “permanecer firme” no que a graça realizou e não se embaraçar com o sistema legal é que ao adotar tal terreno o crente é separado de Cristo e das muitas bênçãos que possui n’Ele. Paulo diz: “Privados estais de todo benefício de Cristo como separados d’Ele, tantos quantos são justificados por lei” (v. 4 – JND). (Ele não estava querendo dizer que alguém pudesse realmente ser justificado pela lei, mas se referia àquilo que eles achavam que poderiam ser ao tentar guardar a lei). Cristo morreu para toda aquela ordem legal de coisas, e ao ressuscitar dos mortos, Ele está numa nova posição onde a lei não tem conexão alguma com Ele. O Cristão está associado com Cristo naquela nova posição, do outro lado da morte, e portanto, a lei não tem nenhum direito sobre ele também (Rm 7:1-6). Ao adotarem o terreno legal, os gálatas estavam (se isso fosse possível) se removendo do terreno Cristão, onde estão todas as suas bênçãos Cristãs. Eles tinham, com efeito, se “separado de Cristo” e de todas as coisas que Ele assegurou para eles na redenção!
Ao adotar tal posição eles tinham “caído da graça”. Observe que Paulo não diz: “da salvação tendes caído”; A Escritura é clara quanto à impossibilidade de um crente em Cristo perder sua salvação. No entanto, é muito possível para um crente “cair da graça” – isso é, naquilo que diz respeito a seu entendimento e prática. Portanto os gálatas tinham “caído” (em experiência) do lugar no qual a graça os havia colocado.
V. 5 – Paulo então dá um exemplo daquilo que eles tinham perdido ao caírem da graça. Ele diz: “Porque nós**, por meio do Espírito, no princípio de fé, aguardamos a esperança da justiça”** (v. 5 – JND). Ele fala disso como algo que é normal para alguém permanecendo em graça. Ele diz: **“nós”**; ele não podia dizer **“vós”** (como ele fez no versículo 4) porque havia uma dúvida quanto ao fato deles estarem ou não verdadeiramente em terreno Cristão, e quanto ao fato deles verdadeiramente possuírem esta esperança. Observe também que ele não diz que o Cristão aguarda por justiça – que era a posição do legalista – porque a justiça foi assegurada em Cristo (2 Co 5:21). O Cristão está esperando agora pela **“esperança da justiça”**, isso é, o estado glorificado, o qual será nosso no Arrebatamento. (Isto é o mais perto que chegamos da vinda do Senhor na epístola). Esperança na Escritura não é usada como se usa hoje – possuindo juntamente uma medida de incerteza – antes, trata-se de uma certeza adiada.
É “o Espírito” Quem infunde em nós esta esperança e nos dá sentimentos e desejos em acordo com ela. A posição Cristã normal é de expectação. No entanto, se uma pessoa adota o sistema legal como meio de obtenção de justiça e como sua regra de vida, o Espírito de Deus é impedido de gerar estes pensamentos e sentimentos Cristãos normais em sua alma. Quando uma pessoa toma para si a lei, ela normalmente abandona a vinda do Senhor como uma esperança. Isso mostra que existem algumas ramificações graves ao se adotar a guarda da lei.
Nos versículos 5-6 temos “esperança”, “fé” e “amor [caridade]”. Estes três elementos são necessários para viver a vida Cristã apropriadamente. Se um destes estiver faltando em nossa vida nosso andar prático será afetado. “Esperança” nos concede olhar adiante com confiança; “fé” e “amor” nos dão a energia para andar neste mundo que é oposto a Deus. Paulo diz que a fé é incitada pelo amor; e amor Cristão não pode ser produzido pelos rituais legais do judaísmo.
Nos versículos 1-6 Paulo mostrou que ter a lei como a base para a justificação do crente coloca em dúvida sua posição perante Deus; agora nos versículos 7-15 ele mostra que este mal também afeta o estado do crente na Terra. Ele tocou neste assunto no capítulo 4, mas agora retorna a ele para enfatizar a necessidade de permanecer firme na verdade da liberdade Cristã.
d) Adotar a Lei Traz o Juízo Governamental de Deus
Vs. 7-10 – Paulo continua apresentando outra razão pela qual os gálatas deveriam “permanecer firme” naquilo que a graça realizou e não adotar o sistema legal. Aqueles que promovem tal erro entre os santos trazem sobre si o juízo governamental de Deus. Paulo diz: “Corríeis bem; quem vos impediu, para que não obedeçais à verdade?” Eles tinham tido um bom começo em sua vida Cristã, mas alguém impediu seu progresso. Ao perguntar aos gálatas “quem” era que os tinha desviado, Paulo indicava que havia um certo líder do elemento judaizante que era particularmente responsável pelo abandono da verdade pelos gálatas. Ao fazer isso, Paulo estava rastreando o problema até a sua origem. Eles tinham absorvido má doutrina desse mestre.
Paulo diz: “Esta persuasão não vem daqu’Ele que vos chamou”. Isso mostra que esse movimento em direção ao sistema legal não era um movimento divino. O Senhor certamente não os havia persuadido a se voltarem para a lei.
Paulo queria que eles entendessem como isso começou. Alguns entre eles absorveram “um pouco de fermento” (uma figura do mal na Escritura) de uma fonte errada acatando a mistura de lei e graça; e assim, como o fermento se espalha pela massa, também a má doutrina havia se espalhado a outros, até que muitas assembleias naquela região da Galácia fossem levedadas por ela. Desta forma, Paulo ilustra como o fermento funciona. No versículo 10 ele diz: **“**aquele que vos inquieta”; e então no versículo 12 ele diz: **“**aqueles que vos andam inquietando”. Aparentemente o problema começou com uma pessoa que ensinava má doutrina, porém ela se espalhou rapidamente a outros que passaram a promovê-la. O ensinamento pervertido dos judaizantes havia afetado gravemente os gálatas; isso nos mostra o quão cuidadosos precisamos ser quanto àquilo que ouvimos (1 Ts 5:21). Paulo usa essa mesma figura do fermento no que se refere ao mal moral (1 Co 5:6-8); aqui em Gálatas o fermento é usado em conexão com o mal doutrinal. Ambos os males, moral e doutrinal, possuem um efeito corruptivo nos santos de Deus. Assim como o fermento, o mal nunca é estático; ele irá ganhar terreno entre os santos até que seja julgado.
Embora isso fosse verdade com relação àqueles que eram promotores do mal, Paulo não desejava implicar que todos os gálatas eram responsáveis no mesmo grau daqueles que ensinavam o erro. Ele disse: “Confio de vós, no Senhor, que nenhuma outra coisa sentireis [não tereis outro modo de pensar – TB]” (v. 10). Ele cria que o Senhor não iria permitir que a maioria dos gálatas fosse tão profundamente afetada por esse mal de maneira que não pudessem ser recuperados. Ele cria que eles poderiam ser libertados do lamaçal em que estavam presos. Isso mostra a atitude adequada de um que ministra a Palavra de Deus; ele deve proclamar a verdade em fé confiando que Deus irá fazer a verdade benéfica às almas e produzir resultados positivos.
Paulo, todavia, acrescenta: “mas aquele que vos inquieta, seja ele quem for, sofrerá a condenação [levará a culpa disso – JND]”. Ele sabia que Deus certamente iria executar juízo governamental sobre aqueles que eram responsáveis – especialmente o líder do movimento. Este princípio permanece assegurado: aquele que “corrompe” a casa de Deus, Deus julga (1 Co 3:17 – JND). Existem muitos que estão perturbando o povo do Senhor hoje com doutrinas e práticas errôneas, e eles vão levar seu juízo.
Podemos imaginar porque Paulo não exortou os gálatas a colocarem fora de comunhão os judaizantes e assim por um fim àquele elemento que estava operando em seu meio. Entretanto, no estado deles, isso teria sido impossível. Os judaizantes tinham uma base tão forte nas assembleias da Galácia que não havia poder naquelas assembleias para lidarem com eles – a maioria, senão todos, tinham sido enganados por estes falsos mestres e estavam apoiando o programa deles.
Quando este é o caso em uma assembleia, devemos, assim como Paulo fez, nos apoiar na soberania de Deus, e descansar no fato de que Deus irá lidar com aqueles que fazem o mal em Sua casa. Enquanto isso, eles podiam apelar ao Senhor acerca da questão. Paulo falou sobre isso aos coríntios. Ele disse que se eles não soubessem o que fazer com aquele que praticava o mal em seu meio, ou não tivessem poder na assembleia para exercer o julgamento necessário sobre tal pessoa, eles poderiam então ter encomendado a questão ao Senhor e “lamentado”. Deus poderia responder a súplica deles e fazer com que a pessoa “fosse tirada” pela morte (1 Co 5:2 – ARA; 1 Jo 5:16; 1 Pe 4:17). A resposta para tamanha fraqueza não é abandonar a assembleia, mas esperar por Deus na questão.
e) Adotar a Lei Remove o Escândalo da Cruz
Vs. 11-12 – Paulo havia tocado no caráter fermentador do ensino dos judaizantes; agora ele fala da natureza enganadora do ensinamento deles.
Falando hipoteticamente, ele diz: “Eu porém irmãos, se prego ainda a circuncisão, por que sou, pois, perseguido? Logo o escândalo da cruz está aniquilado”. Uma coisa que caracteriza a verdade do Cristianismo é que existe feroz perseguição contra ela, especialmente por parte dos judeus (1 Ts 2:14-16). Isso acontece porque a verdade do Cristianismo coloca inteiramente de lado o judaísmo e isso era ofensivo para os judeus. Mas se Cristãos adotassem o sistema legal, os judeus seriam menos hostis para com o evangelho, e a perseguição em grande parte cessaria. Os legalistas que estavam inquietando os gálatas estavam promovendo isto. Eles usaram isso como uma “isca” colocada diante dos gálatas para fazer com que aceitassem seu ensino. Eles ensinavam que se os crentes adotassem a lei, isso iria fazer com que “o escândalo da cruz” terminar, e assim, os gálatas escapariam da perseguição que enfrentavam diariamente. Desejar escapar da perseguição é compreensível; no entanto, perseguição é normal ao Cristianismo. Se obedecermos à verdade do evangelho é impossível evitar perseguição; a própria natureza do Cristianismo é contrária a tudo aquilo para o que o homem na carne se dispõe. Portanto, havia um elemento enganador no ensino dos judaizantes. Eles estavam apresentando uma falsa vantagem aos gálatas para que assim aceitassem seu ensinamento.
Vendo o efeito causado pelo mal dos judaizantes, Paulo desejou que estes, que estavam lançando os gálatas em confusão, se “cortassem fora a si mesmos” (v. 12 – JND). Ele desejou que eles se separassem dos santos, de maneira que os santos ficassem livres de suas influências. Hamilton Smith disse: “Seu amor (o de Paulo) pela verdade e bem-estar dos crentes o fez intolerante para com aqueles cujo ensinamento era destrutivo da verdade Cristã, roubando os santos da verdadeira liberdade e os levando a praticar aquilo que era inconsistente com o Cristianismo”.
f) Adotar a Lei Abre a Porta para a Manifestação da Carne na Vida do Crente
V. 13 – Outra razão para “permanecer firme” no que a graça realizou e não se voltar para os princípios legais da lei é que o legalismo abre a porta para a carne operar na vida do Cristão – exatamente aquilo que o legalista está tentando restringir. Guardar a lei não produz santidade, como os judaizantes supunham, mas, pelo contrário, excita a carne.
Ao confiar no Senhor para livrar os gálatas da lei (v. 10), Paulo sabia que haveria outro perigo muito real à espreita – o de cair na licenciosidade. Este era o ditado: “a vala no outro lado da estrada”. Alguns, que foram libertos de princípios legais, não foram cuidadosos quanto a isso e permitiram que o “pendulo” oscilasse longe demais, para o outro lado e deram liberdade para a carne agir em sua vida. Isso não é Cristianismo mais do que a guarda da lei. Paulo, portanto, achou necessário advertir os gálatas, afirmando: “Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade. Não useis então da liberdade para dar ocasião à carne”. Isso mostra que é possível abusar da liberdade que a graça nos trouxe (Jd 4). Lembremo-nos de que a liberdade ensinada pela Escritura é libertação do pecado e não liberdade para pecar! Liberdade Cristã não é licença para a carne agir, mas liberdade para o Espírito operar na vida do crente. É liberdade para a nova vida se expressar, e não liberdade para a expressão da velha natureza. Portanto, Paulo acrescenta: “servi-vos uns aos outros pelo amor”. Amor é uma característica própria da nova vida. Se o Espírito de Deus tem liberdade na vida do Cristão, ela será manifestada em expressões práticas de amor entre os santos. A verdadeira liberdade Cristã resulta nessa feliz atividade.
Vs. 14-15 – Paulo então diz: “Porque toda a lei se cumpre numa só palavra, nesta: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Se vós, porém, vos mordeis e devorais uns aos outros, vede não vos consumais também uns aos outros”. Isto pode parecer contraditório com o que ele vem ensinando na epístola. Ele tem insistido que a lei não tem aplicação ao Cristão; mas agora ele vem e cita a lei e fala dela, aparentemente como sendo algo para o Cristão seguir! No entanto, os versículos 14 e 15 devem ser lidos juntamente. Paulo não está se contradizendo; ele está mostrando aos gálatas que eles estavam apenas enganando a si mesmos ao pensar que estavam guardando a lei. A lei demanda que a pessoa que está sob ela ame o seu próximo. Se os gálatas estivessem verdadeiramente guardando a lei, eles estariam fazendo isso. Mas eles estavam mordendo e devorando uns aos outros! Esta era a prova definitiva de que eles não estavam guardando a lei. Apenas ressalta seu argumento no capítulo 4 de que misturar lei e graça causa séria perda de discernimento a alguém. E se de fato estavam guardando a lei, pessoalmente provava que a lei não pode produzir santidade e amor na vida de uma pessoa! A lei demanda amor, mas não dá a capacidade de atender às suas demandas.
Tentar guardar a lei na verdade abre a porta para a carne na vida do Cristão; tal tentativa resultará em todos os tipos de manifestações carnais. Isso acontece porque o legalismo promove a justiça própria. Ficamos orgulhosos de que estamos guardando certas regras e regulamentos que estabelecemos para nós mesmos. Isso levará a acharmos falhas nos outros e a calúnias – particularmente contra aqueles que não consentem com as nossas ideias legalistas. Isso apenas produz contenda entre irmãos. Os gálatas eram um vivo exemplo disso. Eles haviam adotado a lei como uma regra de vida, pensando que isso aperfeiçoaria a santidade em sua vida, mas tudo o que ela fez foi excitar a carne. Paulo os alerta dizendo que era melhor que eles “tomassem cuidado (vede)” porque se aquele espírito prosseguisse sem ser julgado por algum período de tempo, os santos seriam “consumidos” uns pelos outros.
É um fato que o legalismo numa assembleia é destrutivo. Assembleias que possuem legalismo em seu meio são normalmente assembleias marcadas por contenda. Legalismo não produz feliz unidade e legítimo amor de um para com o outro, antes produz discussões, criticismo, brigas internas, etc. Hamilton Smith disse que ele tinha visto muitas assembleias que foram separadas e espalhadas por conta do legalismo.
2) Andai no Espírito
Cap. 5:16-26
A primeira exortação era para “permanecer firme” na verdade que a graça realizou para nós pela obra consumada de Cristo (v. 1). A próxima exortação é para “andar no Espírito” (v. 16). Esta ordem é significativa. Devemos permanecer firmes na verdade antes de podermos andar naquelas coisas de maneira prática. Isto confirma a verdade daquele antigo ditado: “Nossa doutrina forma o nosso andar”. C. H. Brown disse: “Você tem que crer corretamente antes de poder andar corretamente”. Quão verdadeiro é isto. A primeira exortação pertencia àquilo que a graça realizou para nós; essa segunda exortação tem a ver com o caminho da verdadeira santidade.
A mente legalista que não entende a verdadeira liberdade Cristã tentará aperfeiçoar santidade por meios legalistas. Isso é o que os gálatas estavam fazendo. Paulo agora mostra a eles o caminho de Deus de santidade e consagração; ele apresenta a maneira ordenada por Deus de restringir a carne. É simplesmente essa: “Andai no Espírito, e não cumprireis a concupiscência da carne”. Que declaração simples da verdade é esta! Não há necessidade da complicada aderência aos mais de 600 mandamentos, estatutos e ordenações da lei; o poder para santidade na vida Cristã é por meio do Espírito Santo. A responsabilidade do crente, portanto, é “andar no Espírito” e o resultado será a santidade prática.
Três Maneiras em que um Cristão Pode Viver em Relação a Carne
- Por lei – numa falha tentativa de restringir a carne. - Por libertinagem – deixando a carne se manifestar livremente e fazer o que agradar a ela. - Por liberdade do Espírito – na qual a carne é restringida por poder divino.
Portanto, liberdade Cristã é ameaçada pelo legalismo, pervertida pela permissividade, e somente é aperfeiçoada pelo andar no Espírito.
Quando Paulo disse “Andai no Espírito” ele não estava se referindo ao recebimento e possessão do Espírito de Deus. Todos crentes possuem o Espírito Santo habitando neles (1 Ts 4:8; Tg 4:6; 1 Jo 3:24), mas nem todos Cristãos necessariamente “andam no Espírito”. Isso é uma espécie de afirmação abstrata que necessita de mais explicação. “Andar” significa seguir o curso diário da vida. Andar “no Espírito” significa ter nossa ocupação diária na esfera “das coisas do Espírito”, que são os interesses de Cristo na Terra (Rm 8:5). Isso significa que devemos usar nosso tempo lendo as Escrituras, orando, cantando hinos, lendo ministério são, ouvindo são ministério gravado, meditando nestas coisas durante o dia, indo nas reuniões de assembleia, visitando e encorajando outros Cristãos (comunhão), exercitando nosso dom conforme a direção do Senhor, engajando-nos com trabalho de evangelismo, servindo ao Senhor com boas obras, etc. Quando nos ocupamos com essas coisas em comunhão com Deus, estamos andando no Espírito. Quando vivemos nessa esfera, o Espírito de Deus estará livre para trabalhar em nós e por meio de nós, e Seu poder estará presente para restringir a carne. O resultado será que “não cumpriremos as concupiscências da carne”.
Romanos 8 se estende no assunto da libertação do crente da atividade da natureza caída pecaminosa. Os quatro primeiros versículos daquele capítulo apresentam o princípio de libertação da carne. O Espírito de Deus vem habitar no crente para dar a ele poder e liberdade da “lei do pecado e da morte”. (Esta é uma expressão técnica usada para indicar a operação da velha natureza – a carne). Para efetuar esta vitória sobre a carne, Deus introduz um novo princípio na vida do crente, chamado “a lei do Espírito de vida em Cristo Jesus”. O Espírito de Deus, habitando no crente, supera os desejos da carne de maneira que ele já não é mais um escravo das tendências dela.
Para ilustrar isso, pense na lei científica da gravidade; todo objeto está sendo atraído para baixo, em direção ao centro da Terra por uma força invisível chamada gravidade – isso acontece por toda a Terra. É chamada lei ou princípio da gravidade. Segure qualquer objeto sólido; um livro, por exemplo; eleve-o à distância de um braço estendido, solte-o, e ele cai no chão. Ele cairá no chão todas as vezes que você fizer o experimento; trata-se de um princípio universal. Agora no que se refere à natureza pecaminosa, também se trata de um princípio universal, o qual está presente em todos os seres humanos. Tal princípio quer fazer uma coisa – puxar a pessoa abaixo, em direção ao pecado.
Levando nossa ilustração um pouco adiante, vamos supor que queremos alterar as coisas de modo que, quando soltássemos o livro da nossa mão, ele não mais caísse no chão sob a força da gravidade. Então, amarramos ao livro alguns balões cheios de gás hélio (que é mais leve que o ar) em quantidade suficiente para que a força levantadora proveniente dos balões seja maior do que o peso do livro; quando soltarmos o livro da nossa mão, ele irá subir em vez de cair em direção ao chão. Isso acontece não porque a lei da gravidade foi removida, mas porque introduzimos sobre o livro uma lei ou princípio mais poderoso.
Isso ilustra o que Deus fez pelo crente. A natureza caída não é removida quando uma pessoa é salva. Não estaremos livres desse inimigo interno até que o Senhor venha. Aprouve a Deus nos deixar aqui neste mundo com a natureza caída ainda em nós (e o estado de nossa alma é constantemente testado por ela), porém Ele fez completa provisão para vivermos acima do poder desta coisa maligna. O poder do Espírito Santo em nós, chamado “o Espírito de vida em Cristo Jesus”, assim como o gás hélio, foi introduzido em nossa vida para se sobrepor a força da natureza pecaminosa, de maneira que possamos viver livres das atividades da carne. Este é o modo de Deus para santidade.
Em Romanos 8:5-14, Paulo apresenta o modo como libertação continuada pode ser obtida. Ele explica que existem dois domínios, ou esferas nas quais uma pessoa pode viver; uma esfera que pertence à carne, e uma esfera que pertence ao Espírito. Ele fala de uma esfera como sendo “as coisas da carne” sem entrar em detalhes, porém todos sabemos após qual tipo de coisa a carne se inclina. Ele diz: “os que são segundo a carne inclinam-se para as [põem sua mente nas – TB] coisas da carne”. “Por a mente” em alguma coisa significa “dar atenção a algo”. Esse é o lugar onde o perdido vive: ele não conhece outro domínio, porém é possível que Cristãos também vivam nessa esfera. Então ele menciona uma segunda esfera – “as coisas do Espírito”, novamente sem apresentar especificações. Como já mencionado, estas seriam coisas que têm a ver com os interesses de Cristo.
Estas duas esferas são exatamente o oposto uma da outra. Seus interesses são polos opostos. Uma serve aos interesses próprios e a outra serve aos interesses de Cristo. Uma estrada, por assim dizer, se estende a partir de cada uma dessas esferas as quais levam para longe uma da outra. Uma leva àquilo que é verdadeiramente “vida e paz”, e a outra leva à “morte”. O apóstolo não está falando da morte física aqui, mas de morte moral na vida do crente. Morte, como sabemos, sempre traz a ideia de separação. Neste versículo ela se refere à separação em nosso elo de comunhão com Deus.
Então em Romanos 8:12-13, Paulo apresenta uma sóbria conclusão dizendo: “Porque, se viverdes segundo a carne, morrereis; mas, se pelo Espírito mortificardes [colocardes na morte – JND] as obras do corpo, vivereis”. Seu ponto é simples: se vivermos (andarmos) na esfera da carne, podemos esperar que isso irá gerar morte. Quando alimentamos a carne, ela irá se manifestar em nossa vida e nos dominar, e destruirá nossa comunhão com o Senhor no processo. Mas se vivermos na esfera do Espírito, o Espírito tomará o controle de nossa vida e então teremos poder o bastante para viver uma vida santa para a glória de Deus. Cada Cristão tem uma escolha quanto à esfera em que ele quer viver, e isto constantemente nos testa em relação ao quanto de Cristo realmente queremos.
Vs. 17-18 – Voltando para o nosso capítulo, o apóstolo nos diz que haverá uma luta constante com a carne na vida do crente se ele não andar no Espírito. Isso não precisa ser assim, porque Deus fez completa provisão para vivermos acima das propensões da carne, como já indicamos. Ele descreve esta luta – que todos conhecemos muito bem – dizendo: “a carne cobiça contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e estes opõem-se um ao outro, para que não façais o que quereis”. Tendo uma nova vida com novos desejos pelas coisas de Deus, o crente naturalmente deseja fazer a vontade de Deus, porém se ele não andar no Espírito, a carne estará ativa e ele não será capaz de fazer as coisas que a nova vida deseja. O resultado é que há uma luta (um conflito) na alma e o crente frequentemente experimenta falha. Isso leva à frustração. Muitos Cristãos não conhecem nada além dessa desapontadora e recorrente experiência em sua vida. Alguns são tão desencorajados que eles culpam a Deus por isso, pensando que o Cristianismo funciona apenas na teoria, mas não na prática. Todavia, o problema é que eles não estão andando no Espírito.
Este conflito de alma não é exatamente o mesmo de Romanos 7:14-24, que contempla uma pessoa com a nova vida, porém sem a habitação do Espírito Santo. Ela luta para fazer o bem, mas falha porque não possui o poder para fazê-lo – que consiste em ter o Espírito. Tampouco deveria ser este conflito confundido com o de Efésios 6:10-12, o qual tem a ver com o crente combatendo os enganos dos espíritos malignos nas regiões celestiais. Eles estão lá tentando estragar o nosso desfrutar de nossas bênçãos espirituais em Cristo. Gálatas 5:17 descreve um conflito contra a carne que é resultante do crente não estar andando no Espírito; enquanto que Efésios 6:10-12 descreve um conflito que ocorre quando o crente está andando no Espírito.
Paulo acrescenta: “Mas se sois guiados pelo Espírito, não estais debaixo da lei”. Ele mostra que se andamos em Espírito, iremos experimentar vitória sobre a carne, e isso será realizado sem a lei. A lei não poderia jamais produzir uma vida santa. Deus nunca intentou que produzisse. O meio de santidade de Deus está em andar no Espírito. A graça dá ao crente vida e o Espírito Santo; se o crente anda no Espírito e é guiado pelo Espírito, ele irá viver para a glória de Deus.
“Obras” e “Fruto”
Vs. 19-21 – Seja a permissividade imoral ou debates irados, o crente precisa entender que tudo isso é proveniente de uma mesma fonte – a carne. Paulo, portanto, segue a falar das “obras da carne”. Ele lista 16 coisas que emanam da carne.
- Males morais, que são voltados contra o próprio indivíduo – o “eu” – “prostituição [fornicação], impureza, lascívia [licenciosidade]” (v. 19). - Males espirituais, que são voltados contra Deus – “idolatria, feitiçarias [magias]” (v. 20a). - Males sociais, que são voltados contra o homem – “inimizades [ódio], porfias [contendas], emulações [ciúmes], iras, pelejas [contenções], dissensões [disputas], heresias [escolas de opinião, ou partidos], invejas, homicídios, bebedices, glutonarias” (vs. 20b-21).
Paulo acrescenta: “e coisas semelhantes a estas” indicando que esta não é, de forma alguma, uma lista completa. Um crente pode falhar e a carne pode se manifestar em uma ou mais destas coisas, porém elas não o caracterizam. Por outro lado aqueles que “praticam” estas coisas habitualmente não são filhos de Deus e “não herdarão o reino de Deus”.
Vs. 22-23 – Paulo passa a falar sobre o “fruto do Espírito”. Quando estamos andando no Espírito, estas maravilhosas características serão vistas em nossa vida. Frequentemente as chamamos de “frutos” (plural) do Espírito, mas elas são na verdade o “fruto” (singular) em nove partes. Talvez não sejamos todos mestres e pregadores dotados, mas todos podemos manifestar o fruto do Espírito. As nove coisas que Paulo lista aqui, como descrevendo o caráter normal Cristão, são na realidade características morais do próprio Cristo. Portanto, o crente que anda no Espírito manifestará Cristo em sua vida.
- “amor, gozo, paz” são talvez voltadas para Deus (v. 22). - “longanimidade, benignidade, bondade” são voltadas para o homem – para com outros (v. 22). - “fé [fidelidade], mansidão, temperança [controle próprio]” são voltadas para o próprio indivíduo (vs. 22-23).
Paulo acrescenta: “contra estas coisas não há lei”. Isso não significa que a lei é contrária a estas excelentes qualidades morais, mas significa que não existe lei que pode produzir estas características próprias de Cristo num crente; elas somente são produzidas pelo Espírito de Deus quando o crente anda no Espírito.
A mudança óbvia de palavras, de “obras” (ao descrever a carne) para “fruto” (ao descrever o Espírito), tem a intenção de trazer o pensamento de que vontade e energia humanas estão envolvidas com um e de que a energia passiva do Espírito está envolvida com outro. Ao chamar aquelas coisas carnais de “obras” Paulo indica que a vontade do homem é operante ao fazê-las, e de que o homem é, portanto, responsável por elas. A carne tem as suas obras, porém ela não produz fruto algum para Deus. Ao chamar aquelas coisas que são produzidas pelo Espírito de “fruto”, isso indica que aquelas qualidades excelentes de Cristo não são um resultado de nosso esforço, mas o resultado do silencioso trabalho de Deus no crente. Se ao Espírito é dado o Seu devido lugar na vida do crente, Seu poder irá manter a carne sob controle e irá formar as belezas morais de Cristo nele.
Vs. 24-25 – Em conclusão, Paulo diz: “E os que são de Cristo crucificaram a carne com as suas paixões e concupiscências”. Isso significa que a posição que tomamos ao professarmos ser Cristãos envolve a aceitação do juízo de Deus sobre a carne. Por fé vemos nossa carne julgada na cruz de Cristo. Paulo então diz: “Se vivemos no Espírito, andemos também no Espírito”. Nossa posição Cristã é “viver no Espírito”, e desde que isso é assim, a prática normal no Cristianismo é “andar no Espírito”. Portanto, para sermos consistentes com o estado Cristão normal, devemos andar no Espírito, porque vivemos no Espírito. Em relação a isso, F. B. Hole disse: “Um pássaro não pode ter a sua vida no ar e mesmo assim ter todas suas atividades debaixo d’água. Um peixe não pode ter sua vida na água e ainda assim ter suas atividades sobre a terra. E Cristãos não podem ter sua vida no Espírito e suas atividades na carne”. Portanto, nosso andar deve certamente estar de acordo com a nossa vida no Espírito.
O Sr. Darby escreveu uma nota de rodapé7 em sua tradução indicando o uso de duas palavras diferentes para “andar” nesta parte prática da epístola. Em Gálatas 5:16 a palavra se refere a nossa conduta geral de vida, enquanto que em Gálatas 5:18, 25, 6:16 se refere à regra característica de nossa vida.
V. 26 – O comentário final de Paulo, em relação ao andar no Espírito revela, o estado triste no qual os gálatas haviam caído. A falsa busca por santidade por meio da lei tinha apenas dado lugar a carne em seu meio. A vida nas assembleias da Galácia havia se degenerado em um carnal competição, cada um procurando superar o outro em santidade, numa tentativa de atingir uma espiritualidade superior. Portanto, a palavra cautelosa de Paulo é, “Não sejamos cobiçosos de vanglórias, irritando-nos [provocando-nos – TB] uns aos outros, invejando-nos uns aos outros” Aprendemos com isso que a carne irá até mesmo se encurvar para usar as coisas de Deus para colocar-se acima dos outros. Que isto seja um aviso para nós.
Paulo tocou em duas grandes coisas que resultam no crente que anda “no Espírito”:
- Temos vitória sobre os desejos da carne (vs. 16-21). - As características de Cristo são vistas em nós (vs. 22-23).
Estas são as duas coisas que os legalistas estavam tentando alcançar ao guardar a lei, porém somente falharam.
3) Restaurar os que São Surpreendidos em Alguma Falta
Cap. 6:1
A primeira exortação de Paulo aos gálatas no capítulo 5:1-15 foi baseada no fato de que a posição Cristã e aceitação diante de Deus não são por guardar a lei. Sua segunda exortação no capítulo 5:16-26 mostra que a conduta Cristã também não é sustentada pela guarda da lei. Agora no capítulo 6, ele mostra que tampouco o serviço Cristão é realizado por meios legalistas. As exortações restantes neste capítulo têm a ver com o crente guiado pelo Espírito, manifestando amor e cuidado por outros em verdadeiro serviço Cristão. Legalismo tende a aprisionar as afeições de uma pessoa e fazer com que ela não pense nos outros, porém a graça, operando no crente que anda no Espírito, o levará a se sacrificar pelo bem dos outros. O que se segue neste capítulo são coisas que somente a graça levaria uma pessoa a fazer.
V. 1 – O resultado inevitável de uma pessoa andar em princípios legais é a falha. Paulo mostrou que a lei não irá restringir a carne na vida do crente, mas somente irá excitá-la, e assim, fazer com que ele falhe. Ele irá cair em qualquer uma das coisas mencionadas no capítulo 5:19-21, e necessitará de restauração. É adequado, portanto, que a próxima exortação de Paulo seja: “Irmãos, se algum homem for tomado em alguma falta, vós, que sois espirituais, restaurai o tal num espírito de mansidão, considerando a ti mesmo, para que não sejas também tentado” (v. 1 – JND)
Observe que ao crente “tomado em alguma falta” não é dito para que se restaure a si mesmo; o ônus e responsabilidade de recuperá-lo estão sobre seus irmãos. Mas quem entre seus irmãos deveria fazê-lo? Paulo diz: “vós, que sois espirituais, restaurai o tal”. Uma pessoa espiritual não é necessariamente aquela que conhece muito da verdade, ou aquele que é dotado em pregar e em ensinar, mas aquele que anda no Espírito. A maneira pela qual aquele que é espiritual deve restaurar uma irmã ou irmão caído é “num espírito de mansidão”. Mansidão envolve não ofender. Precisamos ser especialmente cuidadosos para não ofendermos o caído em nossa tentativa de alcançá-lo. Isso requer sabedoria, a qual flui somente da comunhão com o Senhor. Não iremos alcançar a pessoa apontando o dedo para ela. Censurar ou intimidar o caído não irá restaurá-lo, mas somente o leva para mais longe. F. C. Blount disse: “Você não pode lavar o pé de seu irmão com um porrete. Você o fará ficar todo roxo, porém isso não irá limpá-lo”. Paulo acrescenta: “considerando a ti mesmo, para que não sejas também tentado”. Isso nos fala de juízo próprio. Devemos ir ao caído no espírito de havermos julgado nós mesmos, estando ciente de que poderíamos ter feito exatamente a mesma coisa. O efeito da restauração numa pessoa será impedido se formos a ela com um espírito de justiça própria.
Paulo especificou três coisas quanto a este trabalho de recuperação do caído:
- Quem deve fazê-lo – aqueles que são “espirituais”. - O que deve ser feito – “restaurai o tal”. - Como deve ser feito – “num espírito de mansidão, considerando a ti mesmo”.
Observe que ele não diz: “vós que sois legalistas, restaurai o tal”, porque um Cristão cuja vida é ordenada em linhas legalistas provavelmente usará princípios legalistas na tentativa de restaurar a pessoa caída, e isso não irá produzir restauração. A lei cobra obediência e condenará a mínima falha em cumprir suas demandas, todavia ela é incapaz de restaurar o crente – apenas a graça pode fazê-lo. Também não é dito aos que são “espirituais” para que corrijam a carne na pessoa que caiu, porque a carne não pode ser corrigida – nem por lei, nem por graça; a carne é incorrigível. O crente tomado em alguma falta apenas será colocado no caminho correto pela percepção de sua posição de liberdade diante de Deus em graça e pelo andar no Espírito – a essência das duas grandes exortações no capítulo 5.
4) Levar as Cargas uns dos Outros
Cap. 6:2
A graça não somente nos levará a buscar o caído (v. 1), mas também nos levará a ajudar nossos irmãos que estão sob cargas (fardos) da vida (v. 2). Portanto, Paulo diz: “Levai as cargas uns dos outros, e assim cumprireis a lei de Cristo”. Estas “cargas” são as provações, sofrimentos, enfermidades, etc., que uma pessoa experimenta na vida. Seu ponto aqui é que devemos ser sensíveis àquilo que nossos irmãos estão passando e procurar aliviá-los de alguma forma, se pudermos. Isso pode ser os confortando, dando conselhos, ou ajudando em alguma questão prática – mesmo se for num sentido financeiro. Cristãos, neste sentido, devem ser carregadores de cargas, porque somos “guardadores de nossos irmãos” (Gn. 4:9).
Ao carregarmos os fardos de outros, cumprimos “a lei de Cristo” – a qual é viver pela regra que Ele viveu quando estava aqui na Terra. Sua vida inteira foi despendida em sacrifício pelos outros. A lei de Cristo é a regra da nova criação.
Sacrificar-se ao ajudar outras pessoas é algo que aqueles presos pelo legalismo normalmente não irão pensar em fazer. Um espírito crítico frequentemente se manifesta quando há uma necessidade evidente. Em vez de carregar os fardos de outros, a mente legalista criticará a pessoa por estar em tal situação. Tais pessoas tendem a perturbar a paz e a unidade prática na assembleia local ao invés de promovê-las.
Os gálatas eram zelosos da lei, mas infelizmente, eles tinham a lei errada diante de si, eles precisavam da “lei de Cristo”.
5) Provar sua Própria Obra Fazendo-a
Cap. 6:3-5
Outras tendências naqueles que vivem linhas de pensamentos legalistas são o orgulho e o ciúme. A próxima exortação de Paulo trata disso. Ele diz: “Porque se alguém cuida ser alguma coisa, não sendo nada, engana-se a si mesmo. Mas prove cada um a sua própria obra, e terá glória só em si mesmo, e não noutro”. Quando estabelecemos regras para nós mesmos, e as seguimos de alguma forma bem-sucedida, podemos nos tornar orgulhosos disso. Podemos acreditar que estamos fazendo essas coisas para o Senhor, porém se elas emanam da carne religiosa, há uma grande probabilidade de que produzirão um espírito de ciúme e competitividade para com os outros.
O remédio de Paulo para isso é que “cada um” deveria estar diante do Senhor quanto àquilo que Ele quer que seja feito. Ele deveria “provar a sua própria obra” fazendo-a no temor de Deus, sem olhar ao redor para aquilo que outros estão fazendo. É algo formoso servir ao Senhor com humilde contentamento e possuir um senso secreto de Sua aprovação no trabalho que é feito. A pessoa que faz isso terá “glória só em si mesmo e não noutro”. Isso é algo que uma pessoa legalista não tem, e uma das razões é porque ela tenta regular a vida de outros de acordo com seus princípios. Ela imagina que paz e aprovação vêm de outros seguirem suas ideias e isso a leva a interferir na vida e serviço dos outros para o Senhor.
Paulo acrescenta: “Porque cada qual levará a sua própria carga”. A palavra “carga” neste versículo no grego é diferente daquela usada no versículo 2, embora ambas sejam traduzidas “carga” na versão Almeida Revista e Corrigida. No versículo 2, a palavra refere-se a fardos que podemos carregar pelos outros; aqui no versículo 6, refere-se ao fardo que carregamos no cumprimento de nosso serviço para o Senhor. Existem dificuldades e provações que são peculiares ao particular serviço que nos foi dado a fazer que outros não podem carregar por nós. Se eles o fizessem, estariam fazendo o nosso trabalho. Portanto, cada um de nós tem que carregar “sua própria carga”.
Em Números 4:19 há uma figura desses dois tipos distintos de fardos. “Aarão e seus filhos virão e a cada um porão no seu ministério [serviço] e no seu cargo [fardo]”. Literalmente, o “serviço” dos levitas se refere ao seu trabalho quando o tabernáculo era erigido e o povo se chegava a Jeová com seus sacrifícios; o “fardo” de cada levita refere-se ao seu trabalho de transportar o tabernáculo em suas jornadas para um novo lugar. Aarão é um tipo de Cristo aqui, que está presentemente dispensando a cada crente um “serviço” para ser feito para Ele e um “fardo” para carregar para Ele. Ambos, o “serviço” que temos para executar, assim como o “fardo” conectado com a realização daquele serviço, são as coisas que nós mesmos temos que carregar, e ninguém pode carregar esse fardo por nós – o Senhor nos dará graça para isso (Tg 4:6). No entanto, é interessante notar que em relação ao primeiro tipo de fardo, no versículo 2, os filhos de Israel deram aos levitas “carros” e assim os ajudaram a carregar seus “fardos” (Nm 7:3-8), mas eles não puderam ajudar os levitas em seu “serviço” no tabernáculo, porque somente a eles era permitido manipular os vasos santos.
6) Comunicar com Aqueles que Ministram a Palavra
Cap. 6:6-9
Até então neste capítulo tivemos a graça para com o caído (v. 1), graça para com um irmão sob fardos (v. 2), graça em relação ao nosso trabalho para o Senhor (vs. 3-5), e agora vemos graça Cristã para com um irmão que está engajado em ensinar a Palavra de Deus aos santos (vs. 6-9).
Paulo diz: “E o que é instruído [ensinado – TB] na palavra reparta [comunique – JND] de todos os seus bens com aquele que o instrui [ensina – TB]”. O ponto aqui é que aqueles que recebem o benefício do ministério da Palavra por meio de um dos dons no corpo de Cristo (a saber, um mestre) possuem a responsabilidade pessoal de “repartir [comunicar]” com ele as coisas materiais. Essa é a maneira pela qual Deus suporta o ministério de Sua Palavra entre Seu povo. Paulo não faz menção alguma de estabelecimento de um sistema no qual o pregador possui uma folha de pagamento fixa – tal como é praticado na maioria das denominações hoje. Comunicar na forma de que Paulo fala aqui é puramente num nível pessoal, porém tal comunicação também deveria ser feita num nível coletivo de igual forma. Filipenses 4:14-16 indica que assembleias deveriam estar exercitadas quanto a ministrar financeiramente àqueles que ensinam e pregam a Palavra.
Nos versículos 7-8, Paulo introduz o princípio do governo de Deus para encorajar os gálatas a comunicarem aos servos do Senhor. Ele mostra que nas tratativas governamentais de Deus existe algo como semear e ceifar. Ele não tem apenas juízos disciplinares para corrigir o Seu povo, mas tem também favores governamentais (num sentido prático), se eles fazem o bem. Portanto, semear e ceifar possuem resultados tanto positivos como negativos. Esses versículos são normalmente tomados em um sentido negativo e usados como um aviso, mas o contexto é de um sentido positivo do governo de Deus. Paulo está nos encorajando a semear no Espírito, porque certamente iremos ceifar de uma forma positiva. É verdade que se semearmos na carne iremos “ceifar a corrupção”, mas também é verdade que se semearmos no Espírito iremos “ceifar a vida eterna”. Desde que isso é assim, a conclusão de Paulo é: “não nos cansemos de fazer o bem, porque a seu tempo ceifaremos”. Isso era uma exortação necessária aos gálatas porque a mente legalista, por não entender a verdadeira liberdade Cristã, normalmente é mesquinha com posses materiais.
Paulo tinha outra razão para trazer o assunto do governo de Deus. Os oponentes da graça argumentavam que se a lei não tivesse parte na vida do crente, não haveria restrições quanto a uma conduta pecaminosa. Uma pessoa poderia crer no Senhor Jesus para salvação e então entregar-se à uma vida pecaminosa e ainda assim ela seria aceita por Deus. Paulo mostra aqui que embora o crente seja sempre aceito (Ef 1:6), ele não ganha nada em viver pecando. Se um filho de Deus escolhe viver após a carne, existe algo como o governo do Pai na vida de Seus filhos disciplinando aqueles que voluntariamente pecam no caminho. Um crente não consegue seguir pecando em sua vida sem pagar um preço de sofrimento sob as mãos do Pai. O medo de ficar sujeito a Seu juízo governamental em nossa vida deveria ser uma forte motivação para julgarmos a carne e andarmos no Espírito (1 Pe 1:16-17). Nosso problema é que semeamos na carne e então oramos por uma má colheita! Todavia, nada passa despercebido aos olhos de Deus; Ele toma a conta de tudo e trata conosco segundo Seu grande amor e perfeita sabedoria. Um de nossos hinos corretamente diz: “Todos os Seus atos para conosco são puro amor”.
Se temos semeado na carne não devemos desistir em desespero e pensar que não há esperança em seguir adiante. É importante perceber que embora haja o juízo governamental em relação com os nossos feitos errados, há também o perdão governamental para com aqueles que se arrependem e julgam a si mesmos (1 Jo 1:9; Tg 5:15).
Se Deus vê um espírito humilhado e contrito em nós, Ele pode tirar de sobre nós (perdoar) o juízo disciplinar que havia colocado sobre nós. Todos experimentamos Sua misericórdia de uma ou outra forma. O Sr. Grant disse: “Não procede a ideia de que Deus não pode intervir e nos livrar daquilo que necessariamente seria o fruto de tal semeadura, se tão somente houver verdadeiro julgamento próprio quanto a tal mau proceder na alma; porque para um Cristão a sega de tal semeadura tem por objetivo produzir julgamento próprio, e se a julgamos antes, pode ser que não haja necessidade alguma de colhê-la”. Portanto, se falharmos, julguemo-nos a nós mesmos de maneira que possamos ser restaurados e experimentarmos Seu perdão governamental; pode ser que não nos seja necessário ceifar aquilo que semeamos. Há misericórdia com o Senhor.
7) Façamos o Bem a Todos
Cap. 6:10
A última exortação de Paulo é: “façamos o bem a todos”. “Todos” é uma palavra bem ampla, alcançando mesmo aqueles que estão fora da comunidade Cristã. Isso mostra claramente que devemos ter um interesse no bem-estar dos outros; é a disposição normal do coração que é “confirmado com graça” (Hb 13:9 – ARA). Tal graça para com os perdidos pode ser o meio pelo qual se abra uma porta para alcançá-los com o evangelho. John Wesley adequadamente disse: “Faça todo o bem que puder, de todas as formas que puder, a todos quantos puder, enquanto puder”.
Legalismo, por outro lado, tende a produzir uma disposição interna que olha somente para si mesmo e para seus próprios interesses. Alguns estão tão presos com o legalismo que nem mesmo pensariam em orar por aqueles que estão fora da assembleia – muito menos em ajudá-los. A mente legalista que não está estabelecida em verdadeira liberdade Cristã não será rica em boas obras para com os outros.
Paulo acrescenta que a graça Cristã e as boas obras devem ser “principalmente aos da família da fé” (v.10 – ARA). Isso mostra que nossa primeira responsabilidade é para com os nossos irmãos, mas também não devemos nos esquecer daqueles fora da família da fé.
Sumário das Exortações Práticas nos Capítulos 5-6
- “Permaneçamos firmes” na liberdade em que a verdade colocou todo Cristão (Gl 5:1-15), porque adotar a lei:
- Nulifica a obra expiatória de Cristo – v. 2. - Coloca a pessoa debaixo da maldição da lei – v. 3. - Priva a pessoa do benefício assegurado pela graça – vs. 4-6. - Traz o juízo governamental de Deus – vs. 7-10. - Remove o escândalo da cruz, o qual é normal ao Cristianismo – vs. 11-12. - Abre a porta para a manifestação da carne na vida do crente – vs. 13-15.
-
“Andemos em Espírito” e assim não cumpriremos as concupiscências da carne (Gl 5:16-26).
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“Restauremos” aqueles tomados em alguma falta (Gl 6:1).
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“Levemos” os fardos uns dos outros (Gl 6:2).
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“Provemos” nossas próprias obras fazendo-as no temor de Deus (Gl 6:4-5).
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“Comuniquemos” em coisas materiais àqueles que ensinam a verdade, porque há grande recompensa em fazê-lo (Gl 6:6-9).
-
“Façamos o bem” a todos (Gl 6:10).
Os Motivos do Apóstolo Paulo em Contraste com os dos Judaizantes
Capítulo 6:11-16
Nas observações finais de Paulo o vemos descobrindo seu coração diante dos gálatas, esperando que eles enxergassem que seus motivos eram puros. Ele não queria nada além daquilo que era para a glória de Deus e para bênção dos gálatas. Ao mesmo tempo, ele expôs os motivos encobertos dos judaizantes que desviaram os gálatas do caminho.
V. 11 – Paulo escreveu com suas próprias mãos apenas duas de suas epístolas inspiradas– Gálatas e Filemon (Gl 6:11; Fm 19). As outras foram ditadas para alguém que as escreveu, e então ele colocou suas saudações finais aos endereçados, de seu próprio punho, desta forma autenticando-as. (2 Ts 3:17).
Ele aponta para o fato de que ele havia escrito esta epístola com “grandes letras”. Isso até pode ter sido porque ele tinha uma visão deficiente e não podia enxergar bem (Gl 4:15), mas muito provavelmente ele tenha escrito assim para enfatizar a importância de sua mensagem. A gravidade do erro no qual os gálatas haviam caído requeria que ele pessoalmente escrevesse a eles, e isso com ênfase – portanto, o uso de grandes letras. Seu sério e sincero desejo para com os gálatas era de que eles fossem libertados dos ensinamentos dos mestres judaizantes. Ele não tinha nenhum motivo encoberto ao insistir com eles a respeito da liberdade Cristã. Isso deve ter mostrado a eles que ele não tinha nada além do bem deles diante de si; seus motivos eram puros.
Vs. 12-13 – Por outro lado os falsos motivos dos judaizantes eram totalmente egoístas e interesseiros. Paulo, portanto, passa a falar destes charlatões que haviam enganado os gálatas, dizendo: “Todos os que querem mostrar boa aparência na carne…” Isso é tudo que os esforços dos judaizantes buscavam – dar à carne algo em que se gloriar.
Paulo indica que havia talvez duas razões para as atividades judaístas deles. Em primeiro lugar, eles estavam procurando um caminho mais fácil do que aquele que é normal ao Cristianismo. Ao adotar a lei (isso é, sendo circuncidados), os judeus incrédulos seriam muito mais tolerantes à mensagem Cristã. Aqueles que acatavam o judaísmo queriam evitar sofrer “perseguição por causa da cruz de Cristo” (v. 12). Isso foi oferecido aos gálatas como sendo algo positivo. Já que nenhum Cristão deseja sofrer dessa forma, não foi difícil fazer os gálatas aceitarem o legalismo por essa razão.
Em segundo lugar, os judaizantes estavam buscando seguidores, e estavam usando a lei para conseguirem isso. Paulo diz: “Esses querem que vos circuncideis, para se gloriarem na vossa carne”. Possuir seguidores ministrava ao orgulho religioso dos judaizantes, mas isso também era um meio de obter uma vida mais confortável (2 Co 2:17 – ARA – “mercadejando [negociando com – JND] a Palavra de Deus”). Este falso motivo está operando hoje. Aqueles que são governados pelo legalismo frequentemente são marcados por reunir seguidores após si. Pode não parecer ser assim, mas dado suficiente tempo, isso se tornará evidente. E eles irão invariavelmente fazer uso de princípios e práticas legalistas para trazerem as pessoas sob seu controle. Eles até podem crer que estão genuinamente ajudando as pessoas, mas na verdade trata-se da carne operando nas coisas de Deus. Esta não é a maneira de Deus de santidade e consagração.
V. 14 – Em contraste com as tentativas carnais dos judaizantes, Paulo diz: “Mas longe esteja de mim gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo”. Eles se gloriavam na carne; Paulo se gloriava na cruz que colocou um fim à carne. Ele não tinha desejo algum pelo favor do mundo que havia crucificado o Senhor Jesus. Novamente, isso mostra o caráter legítimo de Paulo.
V. 15 – Em contraste com as tratativas judaístas desses falsos obreiros, Paulo fala da verdadeira posição Cristã. Como um resultado da morte e ressurreição de Cristo e da descida do Espírito Santo, Cristãos estão agora numa nova posição diante de Deus “em Cristo Jesus”. Como parte da raça da “nova criação”, “nem a circuncisão é coisa alguma, nem a incircuncisão” (v. 15 – JND).
V. 16 – Paulo desejou que houvesse “paz” sobre todos Cristãos que andavam segundo a “regra” da nova criação. Essa nova regra é a lei de Cristo mencionada no versículo 2. Para aqueles que querem andar segundo regras e regulamentos, esta é a regra para eles; esta é a única regra que Cristãos devem seguir. Paulo fala de duas companhias de crentes:
- “eles” – crentes de entre a incircuncisão (gentios) que estão agora na Igreja. - “o Israel de Deus” – crentes de entre a circuncisão (judeus) que estão agora na Igreja. Eles são um “resto [remanescente – ARA] de acordo com a eleição da graça” entre a nação de Israel que possui fé (Rm 11:5).
Ele também desejou que misericórdia fosse mostrada ao “Israel de Deus”. O ímpeto de suas observações na epístola foi repreender Cristãos por tomarem para si a lei de Moisés, e ele sabia que seria especialmente difícil para aqueles que cresceram no judaísmo, abrir mão do velho sistema legal. Portanto, ele desejou que os santos nas assembleias da Galácia mostrassem a eles misericórdia e paciência nesta questão.
Desejos Finais do Apóstolo
V. 17 – O grande desejo e oração de Paulo eram que “ninguém” o “inquietasse” fazendo a obra do inimigo colocando os santos sob a servidão da lei. Ele tinha pago um preço para os santos obterem a verdade e não queria que eles a perdessem. Ele disse: “porque trago no meu corpo as marcas do Senhor Jesus”. Isso é uma referência aos açoitamentos, apedrejamentos, etc., que ele havia sofrido por conta do evangelho. Se alguém ousasse questionar a legitimidade de seu amor e cuidado pelos santos, tudo o que eles tinham de fazer era olhar para essas marcas – elas eram provas de seu sincero amor por eles. Isso era algo que os judaizantes não podiam mostrar, porque eles não haviam sofrido nada.
V. 18 – Conhecendo a tendência do coração humano, Paulo percebeu que havia uma grande chance de que os gálatas pudessem se sentir ofendidos ao falar com eles tão severamente – então ele lhes dá uma palavra final de advertência – “A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja com o vosso espírito”. Paulo desejou que eles não se sentissem ofendidos com o que ele disse, mas que aceitassem a correção com um espírito correto. É tão fácil para nosso espírito ficar irritado quando alguém nos corrige, porém se reagirmos de tal modo, não iremos obter o benefício da correção.
Outra característica dessa epístola – que a torna diferente das outras epístolas de Paulo – é que ele não saúda ninguém ao terminá-la. Ao fazer isso, estava mostrando a eles que ele não podia ter comunhão, enquanto eles retivessem esse sério erro doutrinal.
CONTRACAPA
Paulo escreveu esta epístola para corrigir o erro no qual os gálatas haviam caído. Mestres judaizantes os enganaram fazendo com que recebessem um “outro evangelho”, que envolvia guardar a lei de Moisés (Gl 1:6; At 15:1). Eles eram judeus que professavam sua conversão ao Cristianismo, mas Paulo não os considerava como verdadeiros crentes, chamando-os “falsos irmãos” (Gl 2:4). Eles se infiltraram entre os irmãos desavisados da Galácia e, tendo encontrado lugar entre eles, iniciaram sua obra de minar o evangelho da graça de Deus.
Esses “falsos apóstolos” e “obreiros fraudulentos” (2 Co 11:13) ensinaram que era necessário guardar a lei para garantir aceitação com Deus (justificação) e para ter santidade prática na vida (santificação). Insistir na guarda da lei para a salvação é essencialmente afirmar que o homem na carne pode obter justiça de Deus por seus próprios esforços. Além do mais, insistir na guarda da lei como maneira de ter uma vida santa é mal entender a maneira de Deus para se andar em santidade no Espírito. O efeito dessas coisas era devastador. Havia, portanto, uma urgente necessidade de correção desses erros e de se restabelecer a verdade da aceitação e da liberdade Cristãs.
Notas
[←1]
N. do T.: Ortodoxo provém da palavra grega “orthos” que significa “reto” e “doxa” que significa “fé”. É o que está em conformidade com a doutrina tida como verdadeira.
[←2]
N. do T.: Heterodoxo provém da palavra grega “hetero” que significa “diferente” e “doxa” que significa “fé”. É o que se opõe aos padrões, normas, regras ou à uma doutrina pré-estabelecida. É o que está em desconformidade com a doutrina tida como verdadeira.
[←3]
N. do T.: Provém da palavra latina “creāntia” que é uma inflexão de “creāns” cujo particípio é criando, gerando, preparando, escolhendo.
[←4]
N. do T.: É de vital importância perceber a grande diferença entre os termos “nascido de Deus” (“uihos” em grego) e “filho de Deus” (“teknon”), como revelados no Novo Testamento, pois nos capacita a desfrutar de que não apenas somos nascidos na família de Deus pelo Seu ato soberano ao nos conceder vida divina – a qual todos em Sua família têm – mas quão distinguidos Deus nos quis tornar em Sua família ao nos trazer à posição de “filhos de Deus”, na própria aceitação que Cristo mesmo tem diante de Deus. Nessa posição temos relacionamento, entendimento e comunhão que nenhum outro “nascido de Deus” desfruta. A expressão “Aba Pai” foi apenas revelada no Novo Testamento e somente pronunciada pelos “filhos de Deus”, pois receberam o “espírito de adoção” (Rm 8:15; Gl 4:6).
[←5]
N. do T.: tanto em Romanos 8:15, 23 quanto em Gálatas 4:5 encontramos a mesma palavra o grego “uihothesia” que está como “adoção de filhos” na versão King James e como “filiação” na de J. N. Darby)
[←6]
N. do T.: A palavra grega “teknion”(diminutivo de “teknon”), traduzida na KJV com “criancinhas” e na JND como “crianças”, é empregada em 1 Jo 2:1, 12, 28, 3:7, 18, 4:4, 5:21; Jo 13:33; Gl 4:19 e, conforme nota de rodapé da versão JND em 1 Jo 2:1, “é um termo de afeto paterno que se aplica aos Cristãos, independentemente do crescimento”; a palavra grega “paidion”, traduzida na KJV e JND como “criancinhas”, é empregada nos cap. 2:13 e 18 de 1 João e significa os que são imaturos na fé, como em 1 Coríntios 14:20. Em todas as versões em português todos esses versículos são traduzidos como “filhinhos” indistintamente.
[←7]
N. do T: Nota de rodapé “h” da tradução de J. N. Darby em Gl 5:25: “A expressão ‘pelo Espírito’ ocorre nos vs. 18 e 25; mas no v. 16 ‘andar’ refere-se ao modo geral de vida, como Rm 8.4, então deixei ‘em’. No vers. 18 e 25 ‘andar’ refere-se à regra ou linha seguida, como Gl 6:6; Rm 4,12; Fp 3.16 É característico do andar, da condução e da vida, sendo o Espírito o instrumento e o poder”.